2740 Trabalho 1894 - 1/3 (RE)APRENDENDO A CUIDAR Dornelles, Soraia1 O presente trabalho é um relato de experiência sobre o cuidado de enfermagem realizado por mim em/com meu filho adolescente, politraumatizado devido a um acidente de trânsito, internado em instituições hospitalares durante o período de 11 meses e 23 dias, dos quais 2 meses com risco iminente de morte em uma Unidade de Terapia Intensiva, 1 mes em uma unidade de terapia semi-intensiva, 6 meses no setor de clínica médica e aproximadamente tres meses em um hospital especializado em reabilitação. Tem como objetivo central socializar uma experiência riquissima e muito complexa, na qual brotam centralmente as seguintes questões: 1) a (re)tomada do cuidado de enfermagem sob outra ótica que não exclusivamente a técnico-profissional, mas sim, aliando elementos essencias e por demais discursados, como o conhecimento profundo do ser cuidado e a necessidade do amor e do respeito durante sua realização – apesar de muito propalada, esta não tem sido a prática cotidiana do trabalho de enfermagem, na qual a patologia sempre precede o sujeito enfermo, quem deverá ser manipulado para o alcance da melhora ou cura. Há, nesta relação um enquadramento do outro a partir de uma lógica própria, e, muitas vezes, predominantemente organicista; 2) Pouco conhecimento da equipe de saúde (incluindo a de enfermagem) sobre lesão medular, seu tratamento e desdobramentos, o que pode ser comprovado até pelas grades curriculares dos cursos de graduação. 3) Sentimentos que afligem o sujeito enfermo e sua família dentro do ambiente hospitalar e as relações de poder que aí se estabelecem, nas quais, indiscutivelmente, o paciente/ doente não tem a mínima possibilidade de participar de seu tratamento, mesmo que ele seja o ator principal e pessoa essencial para que a melhora ocorra. Por outro lado, o acompanhante é considerado alguem que atrapalha o tratamento, uma vez que sua presença é, muitas vezes vista como uma fiscalização à equipe de saúde. 4) Necessidade do estabelecimento de uma relação de parceria entre o enfermeiro e o ser enfermo, para o exercício do cuidado. E, finalmente, a partir da ótica das quatro questões anteriores brota a quinta que é a essencialidade do cuidado de enfermagem para Enfermeira, Doutora em Filosofia da Saúde e Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina, professora do Departamento de Enfermagem da UFSC, membro do PRÁXIS – Grupo de Pesquisa. Endereço eletrônico: [email protected] 1 2741 Trabalho 1894 - 2/3 que o ser enfermo possa enfrentar seu problema e deixar a vida fluir. A enfermagem é vital, tanto é que sua falta pode matar. Não me refiro a atos tecnicamente errados, que já são por demais conhecidos, mas à falta do cuidado: a falta do cuidado de enfermagem pode matar, o descuido pode matar. Somente a enfermagem consegue apreender mudanças muito pequenas e desapercebidas pela maioria da equipe de saúde que são essenciais para que o sujeito enfermo consiga enfrentar seu problema. E isso ocorre porque é a enfermagem que está cotidianamente com o sujeito, a enfermagem cuida ininterruptamente. Urge que nós profissionais de enfermagem nos atentemos para essa essencialidade da nossa profissão, não somente nos discursos e pesquisas, mas na prática, no dia a dia da assistência. DESCRITORES: enfermagem, cuidado, cuidado de enfermagem, sujeito enfermo. Bibliografia Dornelles, Soraia e Leopardi, Maria Teresa. CUIDADO: eixo da vida, desafio da enfermagem, Florianópolis, 2008 (mimeo). Waldow, Vera Regina. Cuidar, expressão humanizadora da enfermagem. Petrópolis, Vozes, 2005. 2742 Trabalho 1894 - 3/3 Relato de experiência A nossa característica essencial, enquanto profissão, é o cuidado terapêutico, e ele é simples e cotidiano. É vital exatamente por sua simplicidade e cotidianeidade. Costumo, a partir de uma comparação muito grosseira, dizer que a enfermagem é como um braço, ou uma perna, só percebemos sua importância quando perdemos, quando sentimos dor, ou se independentemente da causa, ficamos impossibilitados de fazer algo por sua falta. No restante do tempo, nem lembramos de sua existência, como se estes não fossem de grande valia. O trabalho de enfermagem é um trabalho considerado subalterno, de inúmeros feitos pequenos, e só se percebe sua importância quando ele é mal feito ou não é feito. Isto é, sua importância é reafirmada por sua falta, Este relato de experiência tem como objetivo principal mostrar que a enfermagem é vital para o sujeito enfermo, e, exatamente porisso pode , tanto salvar uma pessoa, quanto matá-la; não por erro, mas pela falta do cuidado.