Estrelas Politrópicas Newtonianas Carregadas

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Anais do 12O Encontro de Iniciação Científica e Pós-Graduação do ITA – XII ENCITA / 2006
Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil, Outubro, 16 a 19, 2006
Estrelas Politrópicas Newtonianas Carregadas
Eder Nascimento de Albuquerque
Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias
CEP 12228-900 – São José dos Campos – SP – Brasil
Bolsista PIBIC-CNPQ
[email protected]
Manuel Máximo Bastos Malheiro de Oliveira
Instituto Tecnológico de Aeronáutica – Departamento de Física, Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias
CEP 12228-900 – São José dos Campos – SP – Brasil
Orientador
[email protected]
Resumo
Este trabalho tem como principal objetivo fazer um estudo numérico da equação de Lane-Emden para estrelas
politrópicas carregadas. Investigamos o efeito da carga na estrutura da estrela e, para isso, utilizamos a hipótese
de uma relação linear entre as densidades de massa e de carga. Verificou-se que a equação de Lane-Emden não
muda, mas esta hipótese gera um novo escalonamento do raio, com efeito no volume e, conseqüentemente, na
massa total da estrela. A estrela carregada aumenta de volume e é mais massiva.
Palavras-chaves: estrelas politrópicas, carga, equação de Lane-Emden.
Anais do XII ENCITA 2006, ITA, Outubro, 16-19, 2006
,
1. Introdução
A presença de carga nas estrelas, principalmente, na superfície, é um fenômeno que merece ser analisado,
tendo-se em vista os processos que ocorrem no interior dessas estrelas. Modelando-se a estrela como uma bola de
gás ionizado, temos que os elétrons tenderiam a mover-se para a superfície. Isso geraria um campo elétrico, que
provavelmente seria de enorme intensidade, a ponto de influir na força gravitacional resultante, ou seja, cirar um
campo gravitacional aparente.
Apesar disso, vale a pena fazer um estudo teórico de como seria o efeito de uma carga distribuída em todo o
volume da estrela, isto é, considerando a estrela como um isolante. O Sol é tomado como modelo de estrela para
análise.
Este trabalho objetivou realizar um estudo numérico da equação de Lane-Emden para estrelas politrópicas
newtonianas carregadas. Inicialmente, elas foram consideradas sem carga e, posteriormente, analisou-se a
influência da presença de carga na massa e no raio dessas estrelas.
Consideramos a inclusão da força coulombiana na equação de equilíbrio hidrostático, conseqüência da
hipótese de carga na estrela. Trabalha-se no sistema CGS, uma vez que este simplifica os cálculos (neste sistema,
1/ 4πε 0 = 1 ). Modifica-se a equação proveniente do equilíbrio hidrostático, tal como vista em Reddy [1],
acrescentando-se a parcela originada pela força coulombiana:
dP
ρ GM ρ Q
= − 2 + ch2
dr
r
r
(1)
Fazendo-se a hipótese de que a densidade volumétrica de carga da estrela está relacionada com a densidade
da estrela pela relação
ρch = αρ
e substituindo esta hipótese na Eq. (1), temos:
(2)
dP
ρ GM αρ Q
=− 2 + 2
dr
r
r
⇔
dP
αQ  M ρ

= −G −
.

dr
M  r²

Define-se uma nova constante gravitacional
(3)
G* = G −
αQ
M
. Desta forma, devido à hipótese usada, o efeito
resultante da carga pode ser entendido como um enfraquecimento da força gravitacional atrativa. Usando esta
nova constante gravitacional, pode-se deduzir novamente a equação de Lane-Emden conforme a referência [2],
porém a constante a, definida como r/x, onde x é adimensional, fica alterada. Temos uma nova constante a*
definida da seguinte forma:
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,
[a* ]2 =
(n + 1) K
*
4π G ρc
n −1
n
.
(4)
G * > 0 (para que a força resultante mantenha-se atrativa), tem-se que há um limite para α .
Como
Ainda, pode-se afirmar que, sendo
r = a* x e G * < G , tem-se a* > a , de onde resultam maiores raios e, por
conseguinte, maiores massas, visto que a massa é proporcional ao volume da estrela.
O próximo passo foi desenvolver um programa de modo a resolver numericamente a equação de LaneEmden, visto que ela apresenta solução analítica apenas para três casos (n = 0, 1 e 5). Utilizou-se a linguagem
Fortran e aplicou-se o método de Runge-Kutta de 4 ordem.
a
2. Resultados
Para uma estrela politrópica definida por uma equação de estado onde a pressão é proporcional à densidade
de acordo com
P = Kρ
1+
(5)
1
n
a equação de equilíbrio hidrostático, Eq. (3), e a equação da conservação da massa
dM = 4π r²ρdr podem ser
reescritas numa única equação diferencial de segunda ordem, conhecida como equação de Lane-Emden:
d 2 y 2 dy
+
+ yn = 0
dx ² x dx
(6)
onde n é o índice politrópico da Eq. (5) e as variáveis adimensionais x e y são definidas como
ρ = ρc y n
(7)
r=a x
(8)
em que a constante a é dada por:
a2 =
(n + 1) K
4π G ρc
n −1
n
Tomando n = 3 (considerado o modelo politrópico padrão), será estudado o caso de uma estrela com massa
1MS e raio 1RS, onde MS e RS são a massa e o raio do Sol, respectivamente, com ausência de carga. Podem-se
(9)
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,
encontrar os valores das constantes K e
ρc , usando
o fato de que a densidade da estrela, seu raio e a pressão são
dadas pelas expressões acima. Tais constantes podem ser calculadas, tendo-se em mente que, na superfície,
r → R, x → x( R) = R / a e ρ → 0 , ou seja, y → 0 . Além disso, no centro da estrela x → 0 e y → 1
para r → 0 . Assim, R = ax ( R ) , ou seja, pode-se determinar a, conhecendo-se RS e x(RS). Para o cálculo de
ρc , notemos que da equação de Lane-Emden, pode-se escrever
como
d ( x² y, )
− x ² y = x ² y + 2 xy =
.
dx
,,
n
,
que pode ser substituída na equação da massa total , ou seja,
x( R)
M = 4π a 3 ρc
∫
x( R )
x ² y n dx = −4π a 3 ρ c
0
Resulta que M = −4π a
3
∫
d ( x² y, ) .
0
4
3
4
3
ρc [ x( R)]² y , ( R). Por outro lado, M = π R ³ ρ = π a ³[ x( R)]³ ρ , em que ρ
éa
densidade média. Comparando as duas últimas expressões, pode-se escrever a razão
ρc
1 x( R)
.
=−
ρ
3 y , ( R)
(10)
Logo, a partir do resultado da equação de Lane-Emden, podem-se achar os valores de a e
valor da densidade média
ρ c , conhecendo-se o
ρ . Com eles, calculam-se ρ , r e P .
No caso em questão, o programa gerou uma tabela contendo valores de x, y e y’. A fim de verificar o
comportamento da curva y versus x, tomaram-se valores de x começando em x = 0,01, depois x = 0,50 e a partir
daí com passo 0,5 até x = 6,5, finalizando com x = 6,9. Para cada x anterior, tomou-se o respectivo valor de y. Os
pares encontrados encontram-se esboçados no gráfico da Fig. (1). Tomaram-se também os valores de y’
correspondentes a cada x e os pares encontram-se no gráfico da Fig. 2.
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,
Fig. 1 – Gráfico da solução da equação de Lane-Emden com n = 3 para uma estrela com massa e raio
iguais a 1MS e 1RS.
Fig. 2 – Gráfico da derivada da solução da equação de Lane-Emden com n = 3 para uma estrela com
massa e raio iguais a 1MS e 1RS.
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Calculando-se as propriedades da estrela em questão, para y = 0, temos da tabela gerada pelo programa que
x(RS) = 6,89001 e y’(RS) = -0,04251. Sendo
RS = ax ( RS ) e RS = 6,96 x 1010 cm, obtém-se a = 1,01 x 1010 cm.
Será admitdo que a densidade média da estrela seja igual à densidade média do Sol. Isso é razoável, uma vez que
estamos lidando com uma estrela com massa 1MS e raio 1RS. Então,
(7), tem-se
ρ = 1, 41g .cm −3 . Assim, utilizando a Eq.
ρc = 76, 4 g.cm −3 . Da Eq. (9), calcula-se a constante K, obtendo-se K = 3,84 x 1014 din.cm².g-4/3.
Para cada par (x,y) gerado pelo programa, é possível calcular
ρ, r
e P correspondentes. Nas figuras 3, 4 e 5,
tem-se o esboço das variações da massa, pressão e densidade da estrela, respectivamente, com o seu raio. A
massa, como mostrado anteriormente, é calculada pela expressão
M = −4π a 3 ρc [ x( R)]² y , ( R).
Raio ( 1010 cm)
Fig. 3 – Gráfico da variação da massa da estrela em função de seu raio.
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,
Raio ( 1010 cm)
Fig. 4 – Esboço da variação da pressão da estrela em função de seu raio.
Raio ( 1010 cm)
Fig. 5 – Esboço da variação da densidade da estrela em função de seu raio.
Os gráficos acima encontram-se condizentes com o estudo de uma estrela com massa 1MS e raio 1RS feito
por Maciel [2], mostrando que se conseguiu reproduzir bem aquele caso.
Será considerada, agora, a presença de carga na estrela estudada anteriormente. Lembrando que
dQ = 4π r²ρchdr
= 4π r ²αρ dr
= α dM ,
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,
integramos e obtemos Q
=αM ⇔
no primeiro relatório, G
*
> 0 ⇒ α < 2,58 x 10-4, considerando-se o valor de G no sistema CGS. Fica claro,
também, que a dimensão de
carga correspondente.
Q
αQ
*
= α . Como G * = G −
, então G = G − α ². Como foi mostrado
M
M
α
deve ser [ α ] = [G]1/2. Variando-se
α
e sendo M = 1MS, pode-se encontrar a
Alterando o programa Fortran que resolve a equação de Lane-Emden de modo a
*
considerar G no lugar de G, é possível verificar o efeito da carga nas propriedades da estrela. Como G* < G, da
Eq. (7) concluímos que a* > a e, da Eq. (5), vem que o raio será reescalonado (aumentará). Por conseguinte, a
massa e o volume aumentarão.Definindo-se
i=
G*
⇔ G * = iG , portanto iG = G − α ² ⇒ α = G (1 − i ) .
G
Assim, pode-se escolher a razão de G*/G, variando-se o valor de i. Deve-se atentar para o fato de que
o que está de acordo com a condição de que
α< G
,
0 < i < 1.
Foram obtidas as curvas massa versus raio para i = 0,25, i = 0,50 e i = 0,75. Os valores numéricos de
α correspondentes são, respectivamente, 1,29 x 10-4, 1,82 x 10-4 e 2,23 x 10-4. Percebe-se na Fig. 6 que, quanto
maior a carga, maior a massa da estrela. Para i → 1 , temos que
α → 0 e, portanto, Q → 0 . De fato, observa-
se no gráfico da Fig. 6 que a situação para i = 0,75 gera uma curva próxima a da Fig. 3, onde há ausência de
carga. Pelo gráfico, nota-se essa tendência, à medida que i aumenta. Se i = 1, vê-se que o programa gera os
mesmos resultados que gerou para o caso com ausência de carga. Na Fig.7, como conseqüência do aumento do
raio, a densidade cai mais lentamente, chegando a zero na superfície.
Raio ( 1010 cm)
Fig. 6 – Esboço da variação massa da estrela em função do raio, considerando três valores de
ρ.
Anais do XII ENCITA 2006, ITA, Outubro, 16-19, 2006
,
Raio ( 1010 cm)
Fig. 7 – Gráfico da densidade da estrela em função do raio, considerando diferentes cargas.
A Tab. 1 resume os valores de massa, carga e raio para cada valor de i, ou seja, de
α.
De acordo com
Malheiro [3], a carga da estrela pode ser encontrada da seguinte forma:
Q=(
αM
2.998 x10
9
)C = 6.638 x10 23α
M
C
MS
(11)
A massa da estrela é aquela correspondente ao raio máximo na curva massa versus raio. Sendo MS = 1,99 x 1033
g, utilizando a Eq. (11), acha-se a carga correspondente em coulombs.
Tabela 1 - Configuração da estrela para diferentes valores de carga.
i
Alpha (10-4)
Massa (MS)
Carga (10 20 C)
Raio (RS)
0,25
2,23
8,0
1,5
2,0
0,50
1,82
2,8
1,2
1,4
0,75
1,29
1,5
0,9
1,2
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3. Comentários e Conclusão
Conforme esperado, verificou-se que a presença de carga na estrela aumenta o seu raio e,
conseqüentemente, o seu volume. De fato, a carga gera forças repulsivas que permitem uma maior força
gravitacional atrativa (maior massa). Usando a hipótese de que a densidade de carga é proporcional à densidade
massa, o que é razoável, no sentido de que uma massa maior pode segurar uma maior quantidade de carga,
mostrou-se que é possível chegar a uma equação de Lane-Emden idêntica a do caso sem carga. A diferença está
no fato de que o raio muda de escala. Para um mesmo valor de x, o raio passa a ser maior quando a estrela é
carregada.
É válido ressaltar a elevadíssima carga necessária para se variar o raio da estrela. Para aumentar o raio em
20%, a carga correspondente é de 0,9 x 1020 C. Ainda, aumentando-se o valor da densidade central, nota-se que o
raio diminui (o que é esperado, pois a forte concentração de matéria no centro atrai ainda mais a matéria das
regiões periféricas), porém a massa da estrela permanece constante.
O campo de estudos das estrelas carregadas é enorme e há muito ainda por estudar. Neste trabalho, foi
mostrada a influência da carga na estrutura da estrela, de forma simplificada, sem considerar efeitos relativísticos
e baseando-e apenas nas equações da mecânica newtoniana. Há muito o que se pesquisar ao considerarmos outros
efeitos.
4. Agradecimentos
Gostaria de agradecer a minha família pela força de sempre, ao meu orientador Prof. Manuel Malheiro pela
paciência e disponibilidade e, por fim, ao CNPQ pela oportunidade de conhecer o universo da pesquisa.
5. Referências
[1] Maciel, Walter J,1999, “Introdução à Estrutura e Evolução Estelar”,Ed. Edusp.
[2] R. R. Silbar and S. Reddy, Am. J. Phys. 72, 892 (2004).
[3] Subharthi Ray, Aquino L. Espíndola , Manuel Malheiro, José P.S. Lemos e VilsonT. Zanchin – Electrically
charged compact stars and formation of charged black holes, Phys.Rev. D.68.084004 (2003).
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