CAATINGA: Conhecer para preservar Jarcilene S. Almeida-Cortez Fernanda Meira Tavares Bárbara Laine Ribeiro da Silva Maria Olívia de Oliveira Cano Rita de Cassia Araújo Pereira Arne Cierjacks Prefácio Esta cartilha é um produto do projeto INNOVATE sigla do título em inglês: “Interplay between the multiple use of water reservoirs via innovative coupling of substance cycles in Aquatic and Terrestrial Ecosystems” tem como objetivo desenvolver cenários para uso sustentável da água e do solo, associados à produção de energia em regiões semiáridas, visando a redução do processo de eutrofização em reservatórios e os impactos das mudanças climáticas, tendo como área de estudo o entorno do reservatório de Itaparica, localizado no trecho submédio do rio São Francisco. Este projeto coordenado pela Profa. Dra. Maria do Carmo Sobral (UFPE) e pelo Prof. Dr. Johann Köppel da Universidade Técnica de Berlin (TU-Berlin), com apoio financeiro do Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil MCTi/CNPq e pelo Ministério de Educação da Alemanha (BMBF), conta com a participação de diversas instituições brasileiras e alemães. A intenção dos autores ao elaborar esta cartilha é além de informar sobre alguns aspectos da Caatinga, despertar no leitor a paixão pela natureza e assim ajudar a divulgar e debater a necessidade sobre o uso sustentável dos recursos dessa Floresta Tropical Seca. Os Autores 2 Você conhece a Caatinga? A Caatinga é uma floresta seca que ocupa quase toda a região Nordeste e o norte de Minas Gerais, como mostra o mapa ao lado. Ela abrange uma área de cerca de 850.000 km2, aproximadamente 10% do território do Brasil. Apesar da Caatinga ser menor que a Amazônia, o Cerrado e a Mata Atlântica, ela tem relevância significativa quando se fala de dimensão social e ambiental, abrangendo 36 milhões de habitantes, o que representa 16% da população do país. Boa 3 parte destas pessoas trabalha na roça e convive diariamente com os desafios de viver na região mais seca do Brasil. Na língua indígena tupi, a palavra Caatinga significa mata branca, isto provavelmente deve-se ao período de seca, quando as árvores perdem as suas folhas e seus caules apresentam cor clara ou esbranquiçada. A vegetação é formada por arbustos, árvores (entre os quais crescem cactos, bromélias) e uma ampla variedade de plantas herbáceas. O clima é do tipo semiárido apresentando basicamente duas estações: um período curto, com chuvas concentradas e um período longo de estiagem (seca). Durante o período de seca, as árvores perdem as folhas, destancando na paisagem os catos e bromélias que permanecem verdes devido a sua capacidade de armazenar água. 4 O Decreto Federal de 20 de agosto de 2003, publicado no Diário Oficial da União, seção 1, edição 161, página 5, de 21 de agosto de 2003 institui o Dia Nacional da Caatinga, a ser comemorado no dia 28 de abril de cada ano. A data homenageia o professor João Vasconcelos Sobrinho (1908-1989), pioneiro na área de estudos ambientais no Brasil. O Dia Nacional da Caatinga foi celebrado oficialmente pela primeira vez no Seminário “A Sustentabilidade do Bioma Caatinga“, ocorrido nos dias 28 e 29 de abril de 2004 em Juazeiro, na Bahia. 5 A Biodiversidade da Caatinga Fonte: http://www.meuportal.net/caracteristicas-dacaatinga-brasileira; Fernanda Meira Tavares. A Tabela abaixo mostra quantos tipos de diferentes plantas e animais nós conhecemos na região da Caatinga. A última coluna representa o numero de espécies endêmicas, ou seja, espécies que são encontradas apenas na Caatinga. Grupo Número de espécies Flora (árvores, 5.344 arbustos, herbáceas) Aves 510 Peixes 240 Herpetofauna 172 (Lagartixas, cobras, sapos...) Mamíferos 156 (tamanduás, morcegos, veados, preás, raposas) Fonte: Ministério do Meio Ambiente 6 Número de espécies endêmicas 744 15 109-135 24 12 A Flora da Caatinga A Caatinga é muito rica em espécies de plantas, as quais muitas não se encontram em nenhuma outra floresta. Estas plantas são adaptadas às condições de clima semiárido, que apresenta solos rasos, altas temperaturas e chuvas irregulares. As plantas da Caatinga fornecem produtos para os mais variados fins: alimentação (umbu, maracujá-do-mato), fibras (carnaúba, caroá), móveis (jatobá, catanduva, pau-branco), produtos medicinais (aroeira, angico, mandacaru, algumas herbáceas), forragem para animais (feijão-bravo, faveleira, catingueira), alimento para abelhas (marmeleiro), entre outros. O umbuzeiro é uma árvore da qual tudo se aproveita. As folhas e frutos servem de alimentação para bovinos, caprinos, ovinos. O fruto é muito apreciado, rico em vitamina C, largamente utilizado in natura, sendo a coleta extrativista. Esta prática tem reduzido o número de plantas jovens. A foto acima e ao lado mostra a cuca, estrutura da raiz tuberosa capaz de armazenar água conhecida pelos cientistas como xilopódio. Durante períodos de seca prolongada o sertanejo desenterra a cuca para servir de alimento e aliviar sua sede e dos animais 7 Diversas espécies de bromélias como o caroá, fornecem fibras. Já as folhas da macambira, quando queimadas servem para alimentação de caprinos, ovinos e bovinos. Em época de seca prolongada também serve para fazer farinha. As bromélias também criam um ambientes que servem de refúgio aos pequenos animais, principalmente répteis e anfíbios. Todas essas plantas citadas são chamadas de arbóreas, por possuírem caule lenhoso e crescimento secundário. No entanto existem também as plantas herbáceas, que também possuem elevado valor ecológico e econômico. O que são plantas herbáceas? Herbáceas são plantas que se caracterizam por apresentarem caule macio ou maleável, apenas com crescimento primário e em geral possuem porte baixo, mas podendo chegar a 2 metros de altura. Podem ser encontradas em locais sombreados ou em locais totalmente ensolarados. Podem ser perenes (quando continuam vivas, mesmo em condições de seca) ou anuais, quando morrem ao final da estação chuvosa (são plantas que normalmente germinam, florescem e morrem completando seu ciclo de vida em um ano ou menos, ficando as suas sementes, que darão origem a novas plantas.) 8 Qual a importância destas plantas para a Caatinga e para a população? As herbáceas representam uma parcela significativa da biodiversidade da caatinga. Estas plantas apresentam um importante papel ecológico, funcionando como alimento para herbívoros que vão desde insetos até animais de médio e grande porte, atuam facilitando o estabelecimento de outras plantas, ajudam a manter a umidade do solo, retêm sementes de outras espécies através de suas raízes e promovem sombra para as plântulas (indivíduos que germinaram a pouco tempo) se estabelecerem. Além do papel ecológico desempenhado pelo componente herbáceo, as ervas também apresentam uma elevada importância econômica, já que muitas possuem valor medicinal e são usadas constantemente por populações locais, outras possuem valor apícola e algumas são essenciais para a elaboração de fármacos e na indústria de cosméticos. Então agora vamos conhecer algumas das herbáceas encontradas na Caatinga que possuem importante valor econômico e que são usadas pelas populações locais, muitos as utilizam para fins medicinais. Selaginella convoluta (Arn.) Spring. Conhecida como erva de Jericó, erva da ressurreição, é utilizada como afrodisíaco e diurético e contra amenorreia. 9 Alternanthera brasiliana (L.) Kuntze popularmente conhecida como Penicilina, terramicina e perpétuado-mato. Esta planta é utilizada na medicina popular, é amplamente utilizada no tratamento de diversas patologias, sendo comprovadas a ação anti-inflamatória, analgésica e ainda a atividade inibidora do vírus que provoca a herpes simples. Boerhavia coccinea Mill. Popularmente chamada de pega pinto esta planta é indicada no tratamento de infecções urinárias. Centratherum punctatum Cass. Popularmente conhecida por perpétua do mato; balainho de velho; aletria, suspiro-de-cachorro. A flor e as folhas possuem utilidade medicinal. Borreria verticillata (L.) G. Mey. conhecido popularmente como cabeça-de-velho, esta espécie herbácea é uma importante fonte de néctar para as abelhas nativas para produção de mel. 10 Hyptis suaveolens (L.) Point. É conhecida como bamburral, sambacoité, mentrasto do grande, cheirosa, alfavacão, alfavaca de caboclo, alfazema de caboclo, alfazema brava, salva limão, betônica brava, metrasto graçú, São Pedro caá, melissa de pison, pataquera, betônia branca e chá de França. É empregada na medicina caseira em algumas regiões, principalmente na região Nordeste. O óleo essencial dessa espécie tem sido estudado quanto a sua ação antisséptica e antibacteriana e antifúngica larvicida contra Aedes aegypti, anticonvulsivante e nematicida. Indigofera microcarpa Desv.. Conhecida como anileira, erva de anil, anil do mato. Algumas substancias encontradas nesta planta posem ser usadas no combate de algumas bactérias, com ação anti-inflamatória e anti-séptica e auxiliar no processo de cicatrização. 11 Sida galheirensis Ulbr., também conhecida por malva branca, ervanço, malva de vassoura. É conhecida e utilizada por apresentar substancias com capacidade de atividade antioxidante. Waltheria rodundifolia Schrank. Conhecida como malva preta, esta espécie é uma importante fonte de néctar para a produção de mel. Turnera subulata Poir. Popularmente chamada de Chanana, flor do Guarujá, esta planta é utilizada contra a menorréia na forma de chá e suas folhas são usadas para o tratamento de tumores. Eclipta prostrata (L.) L. Também conhecida como Erva-botão, suas folhas e flores são empregadas na medicina popular para combater problemas pulmonares como a asma (PEREIRA & MELO, 2005). 12 Richardia grandiflora (Cham. & Schltdl.) Steud. Conhecida popularmente como asa-depato. Essa planta desempenha um papel fundamental na manutenção e na conservação das espécies de abelhas nativas. Por que cuidar da Caatinga? Mais de 35 milhões de brasileiros vivem na região da Caatinga. São pessoas com forte vínculo histórico e cultural com essa floresta, e na maioria das vezes dependem dela para sobreviver, porém, através de atividades que nem sempre são sustentáveis, como as atividades extrativistas ou criação de caprinos sem o manejo adequado. A colheita excessiva de frutas pode afetar seriamente a estrutura populacional da maioria das espécies, como acontece com o umbu, uma das espécies mais importantes e endêmicas da Caatinga. Algumas áreas de Caatinga já estão em processo de desertificação, com solos degradados, por uso de práticas inadequadas, como a queimada, ou o sobrepasto, processos de salinização por uso muitas vezes de poços artesianos que além de água traz os sais a superfície, deixando o solo inapropriado ao plantio. A extração indiscriminada de madeira para produção de carvão ou para fins industriais. Todas essas questões podem dizimar a vegetação original. A Caatinga tem um imenso potencial para a conservação de serviços ambientais, o uso sustentável e bioprospecção (maneira de se extrair valor econômico da biodiversidade de 13 uma região ou floresta (SACCARO JÚNIOR, 2011). Desta forma, se a caatinga for bem explorada, será decisiva para o desenvolvimento da região e do país. Quanto mais estudos forem desenvolvidos com esse objetivo, mais fácil será a elaboração de manejos adequados para a correta exploração desta floresta, assim como ocorre nas Unidades de conservação da Estação Ecológica da Serra da Canoa, são destinadas a preservação, pesquisa e educação ambiental. Estação Ecológica da Serra da Canoa A Estação Ecológica da Serra da Canoa foi criada em abril de 2012, está localizada no município de Floresta, Pernambuco, possui 7.598,71 hectares, situada entre o Rio Pajeú e o Riacho do Navio, em Floresta, no Sertão Os dois cursos d’água, além de suas importâncias hídricas, ganharam notoriedade graças aos poetas populares e aos escritores sertanejos. A segunda unidade estadual de conservação da caatinga, a Estação Ecológica Serra da Canoa, tem valor simbólico único e resultou de parceria entre o estado e a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). A Codevasf colaborou com a implantação da estação por meio da realização de estudos técnicos, em parceria com equipes da Agência Estadual de Meio Ambiente e da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas). A Estação Ecológica da Serra da Canoa atende à solicitação do Comitê Estadual da Reserva da Biosfera da Caatinga (CERBCAA/PE) e da organização SOS Caatinga 14 Bibliografia Consultada ALMEIDA-CORTEZ; CORTEZ, P.H.M.; FRANCO, J.M.V.; UZUNIAN, A. Caatinga. São Paulo: Harbra ltda, 2007. v. 01. 64p LEAL, I.R.; TABARELLI, M.; SILVA. J.M.C. Ecologia e Conservação da Caatinga. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2003. p. 804 SACCARO JUNIOR, NILO L. A regulamentação de acesso a recursos genéticos e repartição de benefícios: disputas dentro e fora do Brasil. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada: Brasília, 2011. SAMPAIO, E.V.S.B. Overwiew of the Brazilian Caatinga. In: BULLOCK, S.H.; MOONEY, H.A.; MEDINA, E. (eds.) Seasonally Dry Tropical Forests. Cambridge: Cambridge University Press, 1995. p35-63. http://blogs.diariodepernambuco.com.br/meioambiente/tag/ serra-da-canoa/ e Codevasf. Crédito das Fotografias Bárbara Laine Ribeiro da Silva Fernanda Meira Tavares Jarcilene S. Almeida-Cortez Apoio Financeiro Facepe (APQ-0842-2.05/12 e bolsa de mestrado da primeira autora) CNPq (Bolsa Produtividade PQ 307422/2012-7) BMBF (01 LL 0904 A-E) MCTI 15 16