ANÁLISE DOS MECANISMOS CELULARES DURANTE A OSSEOINTEGRAÇÃO DOS IMPLANTES Carlos Nelson Elias, Viviane de Souza L. de Vasconcellos, Celso R de Souza Resende Engenharia Mecânica e Ciência dos Materiais, Instituto Militar de Engenharia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil E-mail: [email protected] Resumo Existem diferenças nos índices de sucesso dos implantes dentários disponíveis no mercado. Estas diferenças podem estar associadas às características na escala macro e nanométrica dos implantes. As diferenças macrométricas envolvem o material usado na fabricação, a forma do corpo do implante, o perfil dos filetes de rosca, dimensões dos implantes e o modo de fixação dos componentes protéticos. As diferenças nas escalas micro e nanométrica são identificadas na morfologia da superfície do implante, as quais influenciam nos mecanismos de interação com células durante o período de cicatrização e reparo dos tecidos. O objetivo do presente trabalho é analisar os diferentes mecanismos envolvidos na osseointegração e as interações das células com a superfície dos implantes osseointegráveis de titânio comercialmente puro. A análise do envolvimento das proteínas da matriz extracelular, da membrana celular e do citoesqueleto permitirá entender a razão que o titânio com e sem tratamento da superfície apresenta osseointegração e este fenômeno não é obervado em outros metais. As fases de adesão, proliferação e diferenciação das células ósseas e a adesão de proteínas ao titânio estão intimamente relacionadas com as propriedades da superfície dos implantes, como rugosidade, composição química, molhabilidade e energia de superfície. Palavras-chave: osseointegração, proteínas, adesão de células, interação de células, implantes dentários 1. Introdução Conforme mostrado na Figura 1, existem no mercado várias formas de implantes dentários. Entre as formas mostradas, os implantes cilíndricos com roscas foram os primeiros a serem usados. Com o entendimento da biomecânica, verificou-se que os implantes cônicos possuem maior capacidade de compactação do osso durante a inserção e apresentam maior estabilidade primária. Ainda, na tentativa de aumentar o índice de sucesso dos implantes, temse adotado o controle da rugosidade da superfície com o objetivo de selecionar o tipo de célula que irá interagir com o implante. Sabe-se que as células osteoblásticas aderem mais rapidamente em superfícies rugosas de titânio onde há proliferação mais acentuada da síntese da matriz extracelular, do que em superfícies lisas1. Mesmo assim, apesar dos avanços da implantodontia, a explicação da influencia da superfície dos implantes na osseointegração permanece incompleta. As novas superfícies melhoram os resultados das aplicações clínicas em casos com baixa qualidade e quantidade de osso. No entanto, ainda existem perdas inexplicáveis de implantes. O mercado atual dos implantes dentários no Brasil é da ordem de 1,5 milhão por ano com perda da ordem de 3%, o que significa que cerca de 45.000 implantes por ano são perdidos por razões que envolvem a técnica cirúrgica, qualidade do osso, características da superfície do implante, resposta inadequado do organismo, seleção errônea do tipo do implante, biomecânicos e razões desconhecidas. As pesquisas são realizadas com o objetivo de solucionar estes problemas e entender os mecanismos que envolvem a cicatrização e a osseointegração. Figura 1: Exemplos de formas de implantes dentários comercializados. Após a confirmação que os implantes dentários de titânio comercialmente puro possuem osseointegração, a reabilitação estética e funcional tornou-se possível e hoje é uma realidade difundida e comprovada clínica e cientificamente. Atualmente, com o advento e domínio da biologia molecular, da engenharia genética e das pesquisas de diferenciação celular com células-tronco, a odontologia entra em uma nova fase, onde os tratamentos de regeneração tecidual devem ser cada vez mais previsíveis, com melhores resultados e procedimentos menos invasivos. Para tanto, é necessário um conhecimento do fisiologismo humano cada vez maior. Entender o metabolismo celular, a síntese de proteínas, as substâncias reguladoras das células e a gênese das mesmas devem ser o caminho a ser percorrido. O objetivo do presente trabalho é analisar os diferentes mecanismos envolvidos na osseointegração e as interações das células com a superfície dos implantes osseointegráveis de titânio comercialmente puro. 2. Mecanismos envolvidos na cicatrização óssea Para fins de análise, os mecanismos envolvidos na cicatrização óssea peri-implantar após a prepração do leito cirúrgico e instalação dos implantes de titânio podem ser divididos em três fases: osteocondução (migração de células osteogênicas para a superfície do implante através de um arcabouço temporário de tecido conjuntivo), formação de osso “de novo” (deposição na superfície do implante de uma matriz interfacial mineralizada, equivalente às linhas de cemento do tecido ósseo natural) e remodelação óssea. A osteogênese por sua vez pode ser de contato e a distânia. Na osteogênese de contato, o osso é formado na superfície do implante, diferentemente da osteogênese à distância, em que o osso novo se forma na superfície do osso do sítio periimplantar após a atividade osteoclástica. Para ocorrer a osseointegração há necessidade da estabilidade primária, a qual depende da forma do implante. Logo após a instalção do implante os mecanismos celulares que culminam com a osseoibtegração são iniciados, nesta fase as características da superfície do implante exercem uma grande influência. A morfologia da superfície é crítica no fenômeno “bone bonding” concomitante à formação de osso “de novo”. Esta é a razão que as empresas e pesquisadores procuram alterar o acabamento superficial dos implantes para otimizar as respostas biológicas2. A análise do fenômeno “bone bonding”, ou a habilidade do tecido ósseo se ligar à superfície de um material sintético, exige o enetendimento tanto dos processos de reabsorção óssea quanto a formação da linha de cemento. O recrutamento e migração de uma população de células potencialmente osteogênicas não são suficientes para ocorrer a formação do osso na superfície do implante, há necessidade que ocorra a diferenciação dessa população em células secretoras maduras. Tais células migram através do coágulo sanguíneo e alcançam a superfície do implante ou do osso antigo, onde iniciam a síntese de matriz em uma superfície sólida. Em seguida, elas se diferenciam e formam o osso “de novo” pela secreção da matriz da linha de cemento, que contém proteínas ósseas não colagenosas, proteoglicanas e cristalitos de fosfato de cálcio. Para favorecer os mecanismos envolvidos no fenômeno “bone bonding”, é necessário que o implante tenha característica micro e nanotopográficas que permitam as ligações do cemento com a superfície3. Existem diferença nos mecanismos que levam a osteoindução, osteocondução e osseointegração. Os conceitos envolvidos nestes três fenômenos foram definidos por Albrektsson e Johansson4. A osteoindução é o processo que induz à osteogênese, através do recrutamento de células imaturas e estímulo dessas células para se desenvolverem em pré-osteoblastos. É observada na parte inicial de qualquer tipo de cicatrização óssea. Já a osteocondução é um fenômeno que ocorre nos implantes endósseos e significa que o osso está crescendo em uma superfície. O termo osseointegração é baseado na ancoragem estável de um implante alcançada através do contato direto osso-implante e depende de prévia osteoindução e osteocondução. Tanto a osteocondução quanto a osseointegração dependem da resposta a um corpo estranho. A resposta à osteocondução deve ser curta, porém bem sucedida para que a osseointegração seja mantida por um longo período. Dependendo do material usado na fabricação dos implantes, estes fenômenos podemn ou não serem obervados. As diferentes fases da osseointegração dos implantes dentários foram descritas por Berglundh5. Inicialmente ocorre a formação do coágulo e de um tecido de granulação, que substitui a matriz provisória. A formação óssea é iniciada durante a primeira semana e, após 1 a 2 semanas, o tecido ósseo formado nas regiões de contato com o implante é reabsorvido e sustituído por um novo osso viável. O osso primário constituído por trabéculas de osso imaturo é substituído por osso e medula lamelares. Assim, concluíram que a osseointegração é um processo dinâmico, tanto na fase de estabelecimento, quanto na fase de manutenção. Na fase de estabelecimento, há uma interação entre reabsorção óssea nas regiões de contato e formação de osso nas áreas livres de contato. Durante a fase de manutenção, a osseointegração é garantida pela contínua remodelação e adaptação à função. Durante a cicatrização perimplantar, enquanto o osso cortical cicatriza-se através de remodelação osteonal, o osso trabecular invoca os fenômenos da osteocondução e formação de osso “de novo”, que combinados resultam na osteogênese de contato. O osso trabecular, muitas vezes caracterizado como osso de “baixa qualidade” para os implantes, na verdade é um tecido biologicamente superior, pois apresenta uma rápida cicatrização em relação ao osso cortical, explicada por sua maior vascularização. Deve-se considerar ainda que a osteocondução ocorre através de uma espécie de resíduo transitório do coágulo sanguíneo peri-implantar, a matriz biológica tridimensional de fibrina, por onde as células osteogênicas migram em direção ao implante. A morfologia da superfície do implante é fundamental na retenção desta matriz de fibrina que, por sua vez induz a atividades celulares, como a ativação de plaquetas e de leucócitos, além de servir como guia para que as células osteogênicas possam migrar em direção ao implante, num fenômeno chamado de osteocondução. Portanto, os resultados clínicos dependem das características da superfície dos implantes6. Após o preparo do leito cirúrgico e instalção do implante, o primeiro tecido a entrar em contato com o implante é o coágulo sanguíneo, particularmente as plaquetas e a fibrina. Dependendo da morfologia da superficie dos implantes e das propriedades indutoras, no primeiro dia da implantação, células mesenquimais, pré-osteoblastos e osteoblastos se aderem à superfície do implante, coberta por uma camada calcificada afibrilar, para produzir fibras de colágeno do tecido osteóide. Após alguns dias, osso imaturo, também conhecido como “woven bone”, e osso trabecular reparador estão presentes no espaço entre o implante e o tecido ósseo. Esse osso trabecular é gradualmente substituído por osso lamelar maduro, sofrendo constantes modificações através dos processos de osteogênese e reabsorção óssea, caracterizando a osseointegração. 3. Adesão das células na superfície dos biomateriais A resposta celular aos biomateriais depende inicialmente da interação de receptores de adesão com proteínas adsorvidas à sua superfície, que podem ser detectadas rapidamente após exposição ao sangue, formando uma monocamada de proteínas adsorvidas em minutos. A fibronectina, a vitronectina e fibrinogênio são proteínas pró-adesivas e reconhecidas por várias integrinas celulares e plaquetas. As proteínas plasmáticas desempenham um papel principal no recrutamento de células para a superfície do biomaterial7. A biocompatibilidade de um material está estreitamente relacionada ao comportamento das células em contato com a superfície, especialmente a adesão celular. As propriedades da superfície do material influenciam no processo de adesão dos osteoblastos8. Quando um implante é instalado em um defeito tecidual ou em um meio de cultura in vitro, inicia-se um processo de adsorção de proteínas em sua superfície. Essa camada de proteínas controla a interação das células do tecido adjacente com a superfície do implante. As moléculas responsáveis pela adesão e envolvidas nesse processo são as integrinas, que podem transmitir as informações da matriz extracelular para a célula, assim como da célula para o meio extracelular. Tais vias de sinalização regulam o comportamento celular em contato com os biomateriais. Após a implantação dos biomateriais, o evento quase imediato que ocorre é a adsorção de proteínas. A natureza deste “filme condicionante” depositado nos biomateriais é responsável pela resposta do hospedeiro, que inclui uma série de eventos celulares e da matriz, culminando na aposição de osso no biomaterial, isto é, na osseointegração9. 3.1. Proteínas da matriz extracelular A matriz extracelular do osso é composta por 90% de proteínas colagenosas (sendo 97% de colágeno tipo I e 3% de colágeno tipo V) e 10% de proteínas não colagenosas (20% de osteocalcina, 20% de osteonectina, 12% de sialoproteínas ósseas, 10% de proteoglicanas, osteopontinas, fibronectinas, fatores de crescimento, proteínas morfogenéticas do osso). Os osteoblastos sintetizam todas essas proteínas e a maioria delas está envolvida no processo de adesão. Algumas dessas proteínas (fibronectinas, osteopontinas, sialoproteínas ósseas, colágeno tipo I, vitronectinas) têm propriedades adesivas ou quimiotáticas, principalmente porque elas contêm a sequência RGD (Arg-Gly-Asp) que é específica para a fixação de receptores de membrana celulares como as integrinas. Diversos trabalhos consideram a importância de peptídeos com a seqüência RGD para promoverem a adesão de células ósseas, havendo a possibilidade de melhoria dos biomateriais, através da adsorção preliminar desses peptídeos8. Uma das mais importantes proteínas da matriz extracelular é a fibronectina, uma glicoproteína encontrada em solução em fluidos corporais e imobilizada em vários tecidos. Essa grande proteína dimérica é conhecida por promover adesão e espalhamento celular em diversas superfícies de materiais10. A fibronectina é um dímero de alto peso molecular, que se liga principalmente às integrinas, podendo interagir com uma série de moléculas como colágeno, proteoglicanas, fibrina, heparina, ácido hialurônico, trombospondina, plasmina, bem como com ela mesma. Apenas o reconhecimento do tripeptídeo RGD presente na fibronectina não satisfaz a condição para que as células sejam instruídas a formar tecidos. Ou seja, no vocabulário da matriz extracelular (MEC), as células respondem ao ler a palavra inteira “fibronectina”, ao invés de lerem apenas a seqüência RGD. Os osteoblastos reconhecem e se aderem à fibronectina adsorvida na superfície do biomaterial, porém o espalhamento celular ocorre mais rapidamente sobre os revestimentos com fibronectina a um pH de 4,554. Existem indícios que, neste pH, a palavra fibronectina expõe todas as suas sílabas aos osteoblastos, para que seja reconhecida por receptores das superfícies celulares. A tradução das informações contidas na palavra “fibronectina” e a resposta dos osteoblastos à leitura resultariam no espalhamento ou na incorporação das células às superfícies do titânio comercialmente puro11. A presença de alguns componentes da matriz extracelular ou de peptídeos relacionados (RGD) na superfície do implante ativam o processo de osseointegração, pois servem como um sinal e transmitem instruções para as células, tais como: aderir à superfície, espraiar, diferenciar e induzir a formação de tecido ósseo12. Além da fibronectina, outra proteína importante envolvida na osseointegração é a sialoproteína óssea, a qual é encontrada em tecidos mineralizados, incluindo osso, dentina, cemento. Essa proteína contém uma seqüência terminal de adesão celular (RGD) e dois domínios de ácido glutâmico. Nucleia a formação de hidroxiapatita e estimula a remodelação óssea, bem como promove a mediação da adesão de fibroblastos, osteoblastos e osteoclastos13. 3.2. Proteínas do citoesqueleto Os sítios de adesão entre as células e o substrato são chamados de contatos focais ou placas de adesão, sendo a distância de união entre ambos em torno de 10-15 nm. As faces externas dos contatos focais apresentam proteínas receptoras específicas como as integrinas. Na face interna, proteínas como as talinas, paxilinas, vinculinas e tensinas são conhecidas por mediarem as interações entre filamentos de actina e integrinas. A formação de contatos focais geralmente ocorre em células com baixa motilidade e pode ser produzida in vitro através de proteínas da matriz extracelular como as fibronectinas ou vitronectinas8. 3.3. Proteínas da membrana celular As moléculas de adesão são caracterizadas pela capacidade de interagirem com ligantes específicos, que podem estar situados na membrana de células vizinhas ou serem proteínas da matriz extracelular. Essas moléculas de adesão pertencem a diferentes famílias. Porém, em relação aos osteoblastos, são consideradas as caderinas e integrinas. As adesões entre as células são mediadas pelas caderinas, glicoproteínas transmembranares que agem com os parceiros intracelulares chamados cateninas, as quais interagem com as proteínas intracelulares. As comunicações intercelulares podem ocorrer através da troca direta de íons via “gap junctions” ou através de sinais produzidos pela ação das caderinas. “Gap junctions” são derivados da família de proteínas chamadas conexinas. Junções bem aderentes e apertadas ou desmossomas fornecem uma ancoragem para as células e permitem a troca de íons ou de pequenas moléculas entre as mesmas. Já a adesão entre célula e substrato é realizada pela família das integrinas, que é composta por 22 heterodímeros de 2 tipos de sub-unidades e , ligadas não covalentemente entre si. Essa diversidade de estruturas ocorre devido às várias possibilidades de ligantes (colágeno, laminina, fibronectina, osteopontina, vitronectina, sialoproteína, trombospondina). As integrinas agem na interface entre os meios intra e extracelulares, podendo traduzir a adsorção de ligantes externos em informações internas que induzem à adesão, espalhamento ou migração celulares e, conseqüentemente regulam o crescimento e a diferenciação celulares8. As integrinas se ligam aos sítios de ligação específicos dentro das proteínas da matriz extracelular, principalmente à seqüência do tripeptídeos RGD. Essa interação das integrinas com as proteínas do meio extracelular (MEC) é necessária para a expressão gênica dos osteoblastos. Após a ligação, as integrinas se agrupam em contatos focais, áreas de contato íntimo entre células e MEC, onde moléculas sinalizadoras e do citoesqueleto são recrutadas e ativadas. Além disso, a ativação das integrinas também resulta na modificação do citoesqueleto, afetando a adesão e a mobilidade celulares. Quando as integrinas são agrupadas e ativadas pelas proteínas do MEC, também recrutam os receptores de fatores de crescimento, ampliando os efeitos sinalizadores dos fatores de crescimento. Tanto a composição química do material, quanto sua topografia, influenciam na interação das integrinas com o substrato e das integrinas com o comportamento celular14. A migração celular requer uma integração entre célula, substrato e citoesqueleto. Primeiramente, as células desenvolvem uma protrusão formando o lamelipódio e, em seguida, utilizam as interações adesivas para gerar tração e energia para o movimento. Por último, ocorre a liberação dos pontos de adesões, seguida pelo destacamento e retração. As integrinas são envolvidas nesse migração celular8. 4. Fatores envolvidos na adesão celular As propriedades da superfície do material como topografia, rugosidade, composição química, cargas da superfície, energia superficial e molhabilidade são determinantes na adesão celular e, subseqüentemente, no seu comportamento1. Em consequência o processo de osseointegração depende das propriedades da superfície do biomatewrial. O contato das células com a superfície do implante e a adesão celular à superfície varia que a molhabilidade da superfície do implante e esta influencia o comportamento das células. Contudo, a adesão celular à superfície de implantes não é suficiente para garantir a osseointegração. As células devem receber alguns sinais ou informações para induzi-las a diferenciar e proliferar. Neste sistema, as características da superfície do material são importantes. A topografia do implante, a energia de superfície e a composição química desempenham um papel essencial na adesão celular em implantes dentários, especialmente em termos de adesão de osteoblastos. Assim, adsorção, adesão e espalhamento são as primeiras fases de interação entre a célula e o biomaterial. A qualidade desta primeira fase irá influenciar na capacidade das células em contato com o material, em proliferarem e diferenciarem12. 4.1. Topografia e rugosidade Existem dúvidas quanto ao procedimento que deve ser usado para obter a melhor resposta biológica do Ti cp, uma vez que existem vários parâmetros que influenciam no sucesso do tratamento com implantes osseointegráveis. Quando se analisa a importância da superfície do implante para ocorrer a osseointegração, deve-se separar a análise da influência da forma do implante (design), morfologia da superfície, da técnica cirúrgica, condições de carregamento e condições do osso. Na análise da influência da forma consideram-se as dimensões do implante (comprimento, diâmetro, espessura das paredes), perfil (cilíndrico, cônico, híbrido, coneiforme), tipo das roscas (triangular, quadrada, trapezoidal, arredondada, microroscas, “groove”), altura dos filetes das roscas, ângulo dos filetes da rosca, passo da rosca e tipo de conexão (hexágono externo, conexão interna na forma de hexágono, cone Morse, star grip). Estes parâmetros influenciam na estabilidade primária, na distribuição das forças e na resistência mecânica do implante. Quanto à morfologia da superfície devem-se analisar a macro, micro e nanomicroestrutura, bem como a homogeneidade da superfície, as propriedades químicas e físicas. Segundo Cooper15, o aumento da área das superfícies de titânio melhora o contato ossoimplante e as propriedades mecânicas da interface. Em modelos de cultura, o aumento da superfície afeta positivamente nas atividades celulares pro-osteogênicas. Em animais, aumentam o contato osso-implante. Em superfícies rugosas existe maior quantidade de proteínas séricas e fibronectina, comparados às superfícies lisas. Essa maior adesão celular em superfícies rugosas de titânio pode ser explicada pela adsorção preferencial de fibronectina ao substrato rugoso16. A morfologia da superfície do implante afeta a biocompatibilidade do titânio e a função celular. A rugosidade altera a força de adesão celular na superfície e modifica a conexão entre ambos. Essa força de adesão pode ser modificada pela presença de diferentes células, que são mais numerosas quando a fibronectina está presente na superfície do implante. As diferentes rugosidades influenciam na formação de osteoblastos e osteoclastos12. Embora as nanoestruturas das superfícies possam regular a proliferação de osteoblastos, a diferenciação de osteoblastos não é sensivelmente afetada na ausência de rugosidades em microescala. No entanto, a combinação de rugosidade de superfície em escala micro e sub-micro com uma alta densidade de estruturas em nanoescala resultam em um aditivo na diferenciação celular e produção de fatores locais17. 4.2. Energia de superfície e molhabilidade A medida do ângulo de contato de um líquido com a superfície é uma das formas de quantificar a energia livre superficial dos sólidos ou a capacidade do líquido molhar o sólido. Quando o ângulo de contato é maior que 90 graus a superfície é hidrofóbica, ao contrário quando menor que 90 graus a superfície é hidrofílica. A diferença na molhabilidade entre líquidos para a mesma superfície deve-se ao fato que quando uma gota é colocada em contato com a superfície de um sólido existe a interação entre os átomos do líquido, do sólido e do ar circunvizinho, esta interação é observada na forma de força de atração entre os átomos dos três materiais. Quanto maior a interação do líquido com a superfície, maior é o achatamento da gota. A gota colocada em uma superfície inclinada poderá movimentar-se ou não em função da intensidade da força de atração entre os átomos do líquido e do sólido. Na situação de equilíbrio, a relação entre as energias dos átomos da superfície do líquido com o ar (la), a energia na interface do sólido com o líquido (sl) e a energia superficial sólido-ar (sa) são correlacionadas pela equação proposta por Young: sa = sl + la cos Nesta equação, o valor de θ representa o ângulo de contato. O ângulo de contato, medido experimentalmente em goniômetro, é o parâmetro empregado para quantificar a molhabilidade. A energia da superfície medida pela molhabilidade envolve as interações celulares com o biomaterial, afetando vários eventos biológicos a nível celular e sub-celular, como a adsorção de proteínas, adesão e espalhamento celulares18. A manutenção da arquitetura da camada de células endoteliais requer adesões estáveis não somente entre células vizinhas, mas também entre células e matriz extracelular. Enquanto a influência da molhabilidade da superfície dos biomateriais na adesão célula-substrato tem sido bastante estudada, seu impacto na coesão célula-célula não é muito investigada. Um modelo consistindo em vidros hidrofóbicos e hidrofílicos recobertos por fibronectina e fibrinogênio foi utilizado para estudar a molhabilidade nas adesões celulares. Foi demonstrado que a molhabilidade do substrato controla a adesão e organização do citoesqueleto de células endoteliais, tendo um impacto na habilidade das células em estabelecer coesões célulacélula, devido à acessibilidade de domínios específicos de adsorção de proteínas. Enquanto que em substrato hidrofóbico ocorreu maior coesão célula-célula, em substrato hidrofílico predominou a adesão celular ao substrato18. Segundo Lim ET al19, as superfícies hidrofílicas induzem o crescimento de osteoblastos e a deposição de minerais com homogeneidade espacial, aumentando a quantidade e qualidade de mineralização em relação às superfícies hidrofóbicas. Além disso, a energia de superfície afeta a diferenciação osteoblástica e especialmente a mineralização. 5. Conclusões a) as características da superfície dos implantes dentários, como rugosidade, energia de superfície e composição química, influenciam no comportamento das células; b) o modo de adesão das células influencia na diferenciação, proliferação, diferenciação e formação da matriz extracelular; c) as características topográficas, rugosidade, energia e composição química modificam o crescimento e alteram a função das células nos estágios iniciais de osseointegração; d) há necessidade de pesquisas para melhorar a descrição da interação das células com as superfícies dos implantes, bem como a análise da influencia dos diferentes parâmetros na interação com as proteínas, estímulo na formação de osso, emprego de terapêutica individualizada e capaz de apresentar resposta diferenciada para os pacientes considerados críticos. Referências 1. Elias, CN. Factors Affecting the Success of Dental Implants. In Cap 14 Implant Dentistry A Rapidly Evolving Practice. 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The objective of this study is to analyze the different mechanisms involved in osseointegration and the interactions of cells with the surface of dental implants of commercially pure titanium. The analysis of the extracellular matrix proteins, cell membrane and cytoskeletal explain why the titanium with or without surface treatment has osseointegration and this phenomenon is not observable on other metals. The layers of adhesion, proliferation and differentiation of bone cells and adhesion proteins are closely related to the titanium with surface properties of implants, such as roughness, chemical composition, surface energy and wettability. Keywords: osseointegration, proteins, cell adhesion, cell interactions, dental implants