A curiosidade e a sabedoria de Sócrates Nadir Antonio Pichler Professor do curso de Filosofia da UPF [email protected] O homem caracteriza-se por pelo menos três qualidades essenciais: a curiosidade, a busca pela verdade e a sabedoria. A curiosidade, no sentido de aprendizagem, leva a consciência do homem a desvendar os mistérios do mundo e da vida em geral. Para Aristóteles, além de racional e social, o homem é um ser curioso. Quanto mais curioso mais inteligente, desenvolvido e sábio ele se torna. Indagar e explicar a realidade, nas suas múltiplas manifestações, faz o homem se sentir mais seguro em sua existência biológica e cultural. São, entre outros, os mistérios da origem, da evolução do universo, da vida, da sociedade, do corpo humano e da consciência que fazem o homem buscar explicações convincentes, mesmo que relativas, para a sua condição de ser em processo, de ser perfectível. A curiosidade é responsável por motivá-lo a “descobrir resquícios” de vida no planeta Marte, estar aberto às novidades da técnica, da moda e do consumo em geral. Um dos produtos da curiosidade é a busca pela verdade. Por verdade entende-se a manifestação e o desvelamento das propriedades das coisas, ou seja, de tudo o que existe, material e imaterial. Mas chegar à verdade das coisas – compreender, por exemplo, o funcionamento do corpo humano – é uma tarefa complexa. Apesar de todos os estudos sobre o corpo humano desde os egípcios, a vasta bibliografia sobre o tema e os extraordinários avanços na medicina, sabe-se ainda muito pouco a esse respeito. A busca pela verdade requer prudência. Poucas pessoas valorizam a ignorância, isto é, o saber que sabem pouco. Hoje se tem a impressão de que alguns setores ligados à divulgação da verdade ou do conhecimento, principalmente certos apresentadores de TV, talvez para aumentar os índices de audiência, não se dão conta do quanto é profunda e complexa a realidade. Isso fica evidente sobretudo quando alguns apresentadores exploram assuntos ligados às ciências humanas, como os mistérios da fé e a dimensão sobrenatural do homem. Parece que todo mundo resolveu falar de tudo: ética, política, estética, direito, teologia, religião... Num contexto como esse, Sócrates, filósofo grego, poderia oferecer bons argumentos para a sociedade refletir. Para ele, o homem é sábio quando admite a sua ignorância. “Só sei que nada sei”, seu lema preferido, era utilizado para persuadir os homens, principalmente os jovens da cidade de Atenas, a buscar o bem e agir eticamente. Quando o homem assume sua condição de ser falível, finito, e busca a humildade diante do saber, ele se torna sábio. Sábio, continua Sócrates, é aquele que sabe que sabe pouco e está aberto à curiosidade, à verdade, mesmo que esta seja quase sempre relativa às referências de cada indivíduo. Essa postura de abertura ao mundo e às mudanças nas áreas dos conhecimentos contribui para que o homem alcance a sabedoria. E sabedoria é saber conjugar teoria e prática, saber e agir. É saber que tudo é complexo, mas passível de ser desvendável e utilizável. Portanto, a ignorância, como busca de curiosidade e de espanto frente à realidade, gera sabedoria. Afinal, como diz Paulo Freire, “o homem é um ser inconcluso”, inacabado. Diante da busca pela verdade, da manifestação das coisas à consciência do homem, “só sei que nada sei”. E, por isso, o homem é um ser sábio.