O Paradigma Civilizacional de Samuel Huntington: uma Análise sobre o Papel Brasileiro na Nova Estratégia de Contenção Ocidental Higor Ferreira BRIGOLA e Edu Silvestre de ALBUQUERQUE Universidade Estadual de Ponta Grossa O presente trabalho tem como objetivo, analisar o paradigma civilizacional de Samuel Huntington como uma nova estratégia de contenção do século XXI, identificando as ameaças reais e/ou potenciais a hegemonia estadunidense, por fim busca entender se o Brasil possui um papel relevante ou se apresenta a margem desse paradigma. Palavras-chave: Defesa. Estado-nação. Território. Fundados na perspectiva do realismo político, alguns estrategistas elaboraram formulações conhecidas por “estratégias de contenção”, desejando conter o avanço de inimigos reais ou potenciais e defender o interesse nacional. No atual sistema internacional hegemonizado por um pequeno grupo de potências econômicas e militares, aquelas “estratégias de contenção” capazes de formatar uma ordem internacional são justamente as que atendem às necessidades desses países líderes. A geopolítica do século XX foi marcada pela concentração dos fluxos econômicos no Atlântico Norte, com a hegemonia mundial do poder marítimo anglo-americano. As principais ameaças a essa longa hegemonia anglófona foram representadas por Estados periféricos eminentemente baseados no poder terrestre, casos de Alemanha e União Soviética. Já a geopolítica do século XXI apresenta a consolidação da distribuição dos fluxos econômicos também na direção da Bacia do Pacífico, resultando que a nova ordem internacional permaneça com algumas incógnitas, especialmente quanto ao papel da Rússia póscomunista e da emergente China no sistema de poder. A inserção brasileira na ordem internacional vigente ao longo do século passado já foi amplamente estudada, mas a atual dinâmica econômica globalizada e a emergência de novas “estratégias de contenção” a partir da potência hegemônica fazem desta tarefa algo mais complexo. Nesse sentido, nos propomos a examinar o paradigma SEMANA DE GEOGRAFIA, 16., 2009. A PLURALIDADE NA GEOGRAFIA. PONTA GROSSA: DEGEO/DAGLAS, 2009. ISSN 2176-6967 62 HIGOR FERREIRA BRIGOLA E EDU SILVESTRE DE ALBUQUERQUE civilizacional do cientista político norteamericano Samuel Huntington a partir da projeção dos interesses nacionais brasileiros. METODOLOGIA Examinar o paradigma civilizacional de Huntington a partir do realismo político, que se propõem a ler as relações internacionais a partir da noção de equilíbrio de poder. Busca-se ainda uma análise aos cenários que apresentem ameaças a hegemonia americana no período pós- Guerra Fria. RESULTADOS E DISCUSSÕES Para Samuel Huntington, os conflitos no pós-Guerra Fria não seriam como os anteriores, orientados por fatores econômicos ou ideológicos, e sim de caráter cultural. Os Estados-nações continuariam os principais atores dos acontecimentos no mundo, porém, os conflitos ocorreriam entre Estados de diferentes civilizações, enquanto que as alianças seriam mais facilmente articuladas entre Estados da mesma civilização no que denominou de “síndrome dos países parentes”. Segundo Huntington, a civilização seria definida por elementos objetivos comuns, como língua, história, religião, costumes e instituições, bem como pela auto-identificação subjetiva dos povos. Prossegue o autor, que o mundo estaria dividido fundamentalmente entre apenas oito civilizações: ocidental, ortodoxa, latino-americana, confucionista, hinduísta, japonesa, islâmica e uma possível civilização africana. A funcionalidade desse paradigma civilizacional para a nova “estratégia de contenção” norteamericana fica explicitada quando Huntington alerta sobre a aproximação entre os Estados confucionista (a China) e muçulmanos e os riscos dessa conexão econômica e militar à hegemonia ocidental. A China, a Coréia do Norte e vários Estados do Oriente Médio estão ampliando significativamente a capacidade militar e intercambiando tecnologias sensíveis para o desenvolvimento nuclear e o lançamento de mísseis de longo alcance. Mas segundo Huntington é, sobretudo, o aprofundamento dessa aliança confuciana-islâmica que deve ser detido pelo ocidente por todos os meios necessários, inicialmente através de pressão econômica e política para o cumprimento dos acordos de não-proliferação de armas de destruição em massa: O Estado teocrático islâmico do Irã tem abertamente confrontado os Estados Unidos e investido em tecnologias nucleares duais. Foi o 63 O PARADIGMA CIVILIZACIONAL DE SAMUEL HUNTINGTON: UMA ANÁLISE SOBRE O PAPEL … Paquistão, outro país islâmico, quem passou a tecnologia de centrifugação de urânio aos iranianos. Mas suspeita-se que é a China quem esteja por detrás do repasse dessas tecnologias, sobretudo interessada na contenção da Índia através do fortalecimento do rival Paquistão e no petróleo do Irã. A China também auxiliou aos nortecoreanos a desenvolver a sua bomba atômica e mísseis balísticos, exportou para a Líbia e o Iraque materiais que podem ser usados na produção de armas nucleares e químicas, e ajudou a Argélia a construir um reator para pesquisa e produção nuclear. Para Suano (2003) a real ameça à hegemonia norte-americana em Huntington estaria no continente europeu, mais exatamente na Europa Unificada. O paradigma civilizacional seria apenas um factóide criado pelo teórico norte-americano para auxiliar na justificação do atual status quo da Aliança Atlântica, isto é, a aceitação da hegemonia dos Estados Unidos por parte dos europeus, cristalizada na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Suano afirma que com a unificação da Europa, o continente teria a população, os recursos, a riqueza econômica, a tecnologia e a força militar real para ser a grande potência do século 211. CONCLUSÕES Efetivamente, para S. Huntington o Brasil estaria na famigerada civilização latino americana, constituindo unidade à parte do Ocidente. Mas não apenas pela exclusão o paradigma civilizacional não serve ao Brasil, pois não existe aqui uma questão interna civilizacional relevante como a que eventualmente pode existir em países divididos como Estados Unidos e França. Na ordem bipolar a função dos países latino-americanos foi de apoiar a política externa norte americana de contenção ao comunismo. Talvez Huntington pense que essas novas funções hoje poderiam ser de contenção dos novos inimigos dos Estados Unidos. Porém, a hegemonia norte americana na América Latina já não é mais a mesma ,desde as décadas de 1950 e 60 a participação dos Estados Unidos tem caído no subcontinente. Mas, principalmente, o Brasil não tem motivos para assumir como seus os inimigos atuais dos Estados Unidos (seja Irã, China ou qualquer outro país), ao contrário, ao explorar autonomamente 1 A conclusão de Suano é que mesmo com a unificação da Europa, o mundo dificilmente tenderá para uma ordem bipolar como na Guerra Fria, o mais provável é que EUA, Europa e China componham um trio de superpotências que venha a organizar um sistema multipolar. 64 HIGOR FERREIRA BRIGOLA E EDU SILVESTRE DE ALBUQUERQUE as vantagens da globalização poderá até mesmo tirar proveito político e comercial das disputas entre o mundo ocidental e o não-ocidental. Para Fiori (2007), a política externa brasileira deveria se formar no fortalecimento das relações dos países do Hemisfério Sul, especialmente China, Índia e África do Sul, e com a Rússia no Hemisfério Norte. O autor afirma que a formação de um novo espaço econômico entre esses países poderia representar a base material de uma nova ordem internacional. O problema é que esses países são justamente o alvo da preocupação norte americana atual, pela posição de destaque que ocupam em suas respectivas regiões, sejam pelo tamanho do território, da economia ou da população. REFERÊNCIAS ARBEX JUNIOR, J. Guerra fria: terror de estado, política e cultura. São Paulo: Moderna, 1997. GUIMARÃES, S. P. Desafios brasileiros na era dos gigantes. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005. HUNTINGTON, S. The clash of civilizations and the remaking of world order. New York: Touchstone, 1997. MEIRA MATTOS, C. Geopolítica e modernidade: a geopolítica brasileira. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 2002. MELLO, L. I. A. Quem tem medo da Geopolítica? São Paulo: Hucitec, 1999.