WORD - CASO 89 UFMG - Unimed-BH

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Imagem da Semana: Tomografia computadorizada (TC)
Imagem 01. Tomografia computadorizada de crânio, não-contrastada, corte axial, janela
de partes moles (TCC).
Imagem 02: Tomografia computadorizada de crânio (TCC) não-contrastada, corte axial,
janela óssea.
Imagem 03. Tomografia computadorizada de crânio (TCC) com contraste venoso corte
sagital, janela de partes moles.
A.S.R., masculino, 57 anos, vítima de trauma cranioencefálico após colisão entre dois
caminhões. Admitido 60 horas após o acidente com pontuação 3 na Escala de Coma de
Glasgow (ECG), anisocoria com midríase à esquerda e afundamento craniano. Após
suspensão da sedação, apresentou: ECG 5 descerebrando à direita e decorticando à
esquerda, após estímulo doloroso; anisocoria com midríase à esquerda, reflexo corneano
preservado bilateralmente e reflexo oculocefálico abolido bilateralmente.
Com base na história clínica e nas imagens apresentadas, qual o diagnóstico
mais provável?
a) Contusão do tronco encefálico
b) Trombose da artéria basilar
c) Mielinólise Pontina
d) Lesão Axonal Difusa
Análise da imagem
Imagem 1: TCC evidenciando hipodensidade difusa do tronco (seta vermelha) e hemorragia
subaracnoidea traumática pré-mesencefálica (seta amarela).
Imagem 2: TCC – Janela óssea evidenciando fratura longitudinal do clivus (círculo
amarelo)
Imagem 3: Angiototomografia mostrando uma falha no preenchimento da artéria basilar
após a injeção de contraste (seta amarela), evidenciando interrupção do fluxo sanguíneo nesse
vaso. Perfusão preservada em ramo da artéria cerebral posterior (seta vermelha).
Diagnóstico
Observa-se na TC de crânio a presença de uma fratura longitudinal de clivus (Fig2), que está
relacionada a um alto risco de lesão daartéria basilar. A obstrução dessa artéria é
confirmada na angiotomografia, a qual mostra uma interrupção no fluxo sanguíneo em sua
porção distal, sugerindo trombose (Fig3). Também se observa uma hipodensidade difusa
do tronco encefálico compatível com um quadro de isquemia em território irrigado por ramos
da artéria basilar (Fig1).
As contusões cerebrais são raras no tronco encefálico, sendo derivadas de traumatismo
craniano e, na TC de Crânio, caracterizam-se por imagens petequiais (imagem em “sal e
pimenta”).
A mielinólise pontina poderia explicar os sintomas e a imagem visualizada na TC de crânio
(hipodensidade do tronco). No entanto, esta patologia está classicamente relacionada à
correção excessivamente rápida de uma hiponatremia. Além de não ter sido constatado
nenhum distúrbio hidroeletrolítico no paciente, a interrupção no fluxo da artéria basilar
evidenciada pela angiotomografia reforça o diagnóstico de trombose.
A lesão axonal difusa está frequentemente associada ao trauma cranioencefálico e pode
ter uma clínica semelhante à do caso. Nesse tipo de lesão, geralmente, os pacientes se
apresentam comatosos, apesar de a TCC não demonstrar alterações parenquimatosas
evidentes, apenas as lesões graves que contêm sangue são visualizadas na TC, em geral no
corpo caloso. Os achados mais notórios da LAD são microscópicos e consistem no dano
axonal.
Discussão do caso
O clivus (Imagem 4) é uma estrutura óssea muito resistente, e fraturas nessa região são raras
(0,2%-1,2%). No caso relatado, observa-se a presença de uma fratura de clivus do tipo
longitudinal, estendendo-se do dorso da sela túrcica para a região anterior do forame magno.
Esse tipo de fratura está relacionado a uma alta taxa de mortalidade, pois devido às suas
relações anatômicas, associam-se a lesões neurovasculares.
A trombose da artéria basilar é bastante frequente nesses casos e pode ter consequências
variáveis de acordo com as anastomoses do sistema arterial cerebral e com o nível da lesão. A
hipodensidade difusa do tronco visualizada na TC de Crânio do paciente é um sinal de
isquemia e indica o comprometimento dessa região. A causa mais comum de coma após TCE
é a LAD, mas também pode ocorrer na vigência de obstrução de artéria basilar. Considerando
que a lesão da artéria basilar está frequentemente associada à fratura do clivus, recomendase a investigação dessa hipótese nos casos de coma após TCE, mesmo quando a lesão não foi
evidenciada em exames de imagem prévios, pois esse tipo de fratura é frequentemente
subdiagnosticada, devido à dificuldade de ser detectada em radiografias simples, podendo ser
visualizada na TC de Crânio com janela óssea.
O exame padrão ouro para detectar a trombose de artéria basilar é a arteriografia digital, mas
angiotomografia e angioressonâcia também podem ser utilizadas. A sensibilidade da
angiotomografia é semelhante à da angioressonância.
A ausência de alterações no território de irrigação da artéria cerebral posterior sugere que o
fluxo de sangue nessa área foi suprido pelas anastomoses no polígono de Willis. O paciente
apresentava reflexo corneano (Imagem 5) preservado bilateralmente, demonstrando que o
nervo facial e a sua conexão com o nervo trigêmeo no tronco cerebral não foram afetados. O
reflexo oculocefálico (Imagem 6) estava abolido bilateralmente, indicando o
comprometimento do fascículo longitudinal medial, responsável pela integração dos nervos
cranianos. O rebaixamento da consciência pode ser explicado por qualquer lesão que afete o
tronco, uma vez que este é o local onde o sistema ativador reticular ascendente (SARA) se
encontra.
Caso a oclusão da artéria basilar seja percebida precocemente, será possível a instituição de
terapia com trombolíticos ou trombectomia endovascular, reduzindo os déficits causados. No
entanto, mesmo com a terapia trombolítica, o prognóstico desses pacientes é reservado,
variando de acordo com os locais acometidos, tempo de inicio do tratamento e com a
distribuição da rede de colaterais presentes no cérebro, que é bastante variável entre os
indivíduos.
Imagem 4: Clivus (seta azul) é formado pela fusão dos ossos esfenóide e occipital, encontrase entre a sela túrcica e o forame magno. Localização anatômica da artéria basilar (seta
vermelha).
Imagem 5: O impulso aferente do reflexo corneano passa pelo ramo oftálmico do trigemeo,
chegando ao núcleo sensitivo principal do trigêmeo. Fibras sensitivas originadas nesse núcleo
conduzem os impulsos aos núcleos do nervo facial em ambos os lados.
Imagem 6: Os receptores para esse reflexo são as cristas dos canais semi-circulares. A
movimentação da cabeça determina sensibilização das células sensorias das cristas,
estimulando neurônios do gânglio vestibular, que originam impulsos nervosos que seguem
pela porção nervo vestíbulo-coclear, atingindo os núcleos vestibulares. Desses núcleos saem
fibras que ganham o fascículo longitudinal medial e vão aos núcleos do III, IV e VI pares
cranianos, determinando movimento do olho em sentido contrário ao da cabeça.
Aspectos relevantes
- Fratura do clivus é rara e possui prognóstico reservado, pois está associada a traumas
envolvendo forças de alto impacto, quase sempre sendo acompanhada por lesão vascular e
nervosa.
- Na vigência de fratura de clivus deve-se conduzir investigação de comprometimento da
artéria basilar.
- O exame padrão ouro para detectar a trombose de artéria basilar é a arteriografia digital,
mas angiotomografia e angioressonâcia também podem ser utilizadas.
- É possível a prevenção da isquemia e redução dos danos por meio de procedimento
endovascular ou da administração de anticoagulantes ou antiagregantes plaquetários se o
diagnóstico for precoce.
Referências
- Bonilha L, et al. Bilateral internuclear ophthalmoplegia and clivus fracture following head
injury. Arq Neuropsiquiatr 2002; 60:636-8.
- Evers J, et al. Management of an extended clivus fracture: a case report. BMC Research
Notes 2013; 6:554.
- Sato S, Iida H, Hirayama H, Endo M, Ohwada T, Fugii K. Traumatic basilar artery
occlusion caused by a fracture of the clivus. Neurol Med Chir 2001; 41:541-4.
Responsáveis
Berenice Calegar Camarinha, acadêmica do 10º período de Medicina da Faculdade de
Ciências Médicas de Minas Gerais.
E-mail: berenice.camarinha[arroba]gmail.com
Patrícia Rafaela Rezende, acadêmica do 9º período de Medicina da Faculdade de Ciências
Médicas de Minas Gerais.
E-mail: pat_lr[arroba]hotmail.com
Amanda Marcos de Oliveira, acadêmica do 11º período de Medicina da Universidade Federal
de Minas Gerais.
E-mail: amanda.marcos.oliveria[arroba]gmail.com
Orientador
Rodrigo Moreira Faleiro, Neurocirurgião do Hospital João XXIII.
E-mail: r.m.faleiro[arroba]hotmail.com
Revisores
Luísa Bernardino, André Guimarães, Luana Monteiro, Profa. Sandra Dumont e Profa.
Viviane Parisotto.
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