Texto de apoio ao curso de Especialização Atividade física adaptada e saúde Prof. Dr. Luzimar Teixeira Genética do Comportamento do Transtorno Bipolar Carmen Doris Joseph Reichelt Um consistente conjunto de evidências indica a existência de fatores genéticos na suscetibilidade para as doenças afetivas. Os dados disponíveis no momento não identificam de modo inequívoco nenhum gene de vulnerabilidade, mas a velocidade com que surgem novas tecnologias e abordagens na área de genética molecular apontam que, provavelmente nos próximos anos, alguns dos genes relacionados à vulnerabilidade para a depressão e para o transtorno afetivo bipolar serão identificados. Muito provavelmente, essa identificação também propiciará uma revolução na prática clínica com os benefícios advindos da elucidação das vias bioquímicas relacionadas à patogênese dessas doenças afetivas. (Ivanor Velloso Meira Lima et al, 2004) 1 INTRODUÇÃO Há muito tempo o homem deseja compreender o funcionamento e a origem das doenças. Sabe-se, que desde Hipócrates, a medicina tem estudado fatores exógenos e endógenos na etiologia das doenças; atualmente, nas últimas décadas, as técnicas de epidemiologia e da genética possibilitaram identificar as contribuições ambientais e hereditárias de várias doenças (Yudofsky & Hales, 1988). Nos últimos anos a pesquisa das causas do transtorno bipolar evoluiu muito, mas ainda se desconhece o mecanismo exato que origina. Os estudo indicam que o componente genético é fundamental, predispondo parentes próximos a um risco maior de desenvolver a doença que a média das pessoas. O estudo da genética do transtorno do humor bipolar se faz útil em razão dos atuais índices de prevalência, que apontam para 4.09% da população (Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo, 1995). Isto representa, que até 1995, aproximadamente 2,5 milhões de brasileiros apresentavam a forma grave da doença, sendo o risco maior em parentes de primeiro grau. A prevalência aponta para a relevância do estudo, em vista da necessidade de prevenção e de tratamento do transtorno do humor bipolar. Tanto prevenção como tratamento estão intimamente ligados ao correto diagnóstico e compreensão da doença. Estabelecer o diagnóstico correto do paciente é de vital importância, pois assim é possível propor uma ação terapêutica adequada, já que outros transtornos mentais podem estar associados ou até mesmo confundidos, e, portanto tratados de forma equivocada. Inclui o diagnóstico diferencial: Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa, Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Transtorno de Pânico, Fobia Social, Depressão Maior, Esquizofrenia, Transtornos Relacionados a Substâncias e Síndrome de Alzheimer. Além disto, para o DSM IV existem algumas evidências de que uma doença da tireóide não tratada piora o prognóstico de Transtorno Bipolar I. Também os clínicos podem tender a superdiagnosticar Esquizofrenia (ao invés de Transtorno Bipolar) em alguns grupos étnicos e em indivíduos mais jovens. Aproximadamente 10 a 15% dos adolescentes com Episódios Depressivos Maiores recorrentes evoluem para um Transtorno Bipolar I. Um diagnóstico equivocado produz uma consequentemente ineficácia de tratamento, aumentando o risco de cronicidade da doença, além do fato de que o suicídio completado ocorre em 10 a 15% dos indivíduos com Transtorno Bipolar I, segundo o DSMIV. É estudado neste trabalho o conjunto de evidências genético-epidemiológicas que indicam a presença de fatores genéticos na vulnerabilidade para os transtornos afetivos. Também são apresentados os dados obtidos até o momento, através de estratégias de genética molecular na busca de genes de susceptibilidade para o transtorno afetivo bipolar e para a depressão. 2 GENÉTICA DO COMPORTAMENTO DO TRANSTORNO BIPOLAR 2. 1 O QUE É O TRANSTORNO DO HUMOR BIPOLAR Segundo a Faculdade de Medicina de São Paulo (1995), o Transtorno Bipolar é uma enfermidade que se caracteriza pela alternância de episódios de euforia (mania) e episódios de depressão, com épocas de normalidade nos intervalos. Em geral, os episódios se repetem a intervalos menores com o passar dos anos, embora isso possa variar, existindo casos em que a pessoa tem apenas um episódio de mania ou de depressão. Casos exclusivos de mania são muito raros. O suicídio completado ocorre em 10 a 15% dos indivíduos com Transtorno Bipolar I. Abuso da criança, abuso do cônjuge ou outro comportamento violento pode ocorrer durante Episódios Maníacos severos ou com aspectos psicóticos. Outros problemas associados incluem gazeta à escola, repetência, fracasso profissional, divórcio ou comportamento antisocial episódico. Outros transtornos mentais associados incluem Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa, Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Transtorno de Pânico, Fobia Social e Transtornos Relacionados a Substâncias. Estudos epidemiológicos recentes nos Estados Unidos indicam que o Transtorno Bipolar I é quase tão comum em homens quanto em mulheres (diferentemente do Transtorno Depressivo Maior, que é mais comum em mulheres). O gênero parece estar relacionado à ordem de aparecimento dos Episódios Maníaco e Depressivo Maior. O primeiro episódio em homens tende mais a ser um Episódio Maníaco. O primeiro episódio em mulheres tende mais a ser um Episódio Depressivo Maior. As mulheres com Transtorno Bipolar I têm um risco aumentado para o desenvolvimento de episódios subseqüentes (em geral psicóticos) no período pós-parto imediato. Algumas mulheres têm seu primeiro episódio durante este período. O especificador Com Início no Pós-Parto pode ser usado para indicar que o início do episódio ocorre dentro de 4 semanas após o parto. O período pré-menstrual pode estar associado com a piora de um Episódio Depressivo Maior, Maníaco, Misto ou Hipomaníaco em andamento. 2. 2 PREVALÊNCIA Para o DSM IV a prevalência do Transtorno Bipolar I durante a vida em amostras comunitárias tem variado de 0,4 a 1,6%. Entretanto estes números aumentam, o que informa a Faculdade de Medicina de São Paulo, através do Hospital de Clínicas, pois nos estudos populacionais na Europa e nos EUA, estima-se que ao redor de 1,6% da população sofra da doença bipolar, taxa que aumenta para 4,9% levando em conta os que apresentam hipomania (a forma mais leve da mania) alternando com depressão. Pessoas com hipomania não se julgam doentes e sentem-se bem; assim sendo são os familiares que percebem as mudanças e elas freqüentemente não são diagnosticadas como bipolares pelo médico. Como a prevalência dos transtornos do humor parece ser a mesma no mundo todo, de um total de quase 8 milhões de pacientes com transtorno bipolar, aproximadamente 2,5 milhões de brasileiros apresentam a forma grave da doença, sendo o risco maior em parentes de primeiro grau. Homens e mulheres têm chances iguais de apresentarem transtorno bipolar com mania, mas a forma associada de hipomania (bipolar tipo II) é mais freqüente em mulheres. 2. 3 CURSO Para o DSM IV, o Transtorno Bipolar I é um transtorno recorrente — mais de 90% dos indivíduos que têm um Episódio Maníaco Único terão futuros episódios. Aproximadamente 60 a 70% dos Episódios Maníacos freqüentemente precedem ou se seguem a Episódios Depressivos Maiores em um padrão característico para a pessoa em questão. O número de episódios durante a vida (tanto Depressivos quanto Maníacos) tende a ser superior para Transtorno Bipolar I, em comparação com Transtorno Depressivo Maior, Recorrente. Estudos do curso do Transtorno Bipolar I antes do tratamento de manutenção com lítio sugerem que, em média, quatro episódios ocorrem em 10 anos. O intervalo entre os episódios tende a diminuir com a idade. Existem algumas evidências de que alterações no ciclo de sono/vigília tais como as que ocorrem durante as mudanças de fuso horário ou privação do sono, podem precipitar ou exacerbar um Episódio Maníaco, Misto ou Hipomaníaco. Aproximadamente 5 a 15% dos indivíduos com Transtorno Bipolar I têm múltiplos (quatro ou mais) episódios de humor (Episódio Depressivo Maior, Maníaco, Misto ou Hipomaníaco), que ocorrem dentro de um determinado ano. Se este padrão está presente, ele é anotado pelo especificador “Com Ciclagem Rápida”. Um padrão de ciclagem rápida está associado com um pior prognóstico. Embora a maioria dos indivíduos com Transtorno Bipolar I retorne a um nível plenamente funcional entre os episódios, alguns (20 a 30%) continuam apresentando instabilidade do humor e dificuldades interpessoais ou ocupacionais. Sintomas psicóticos podem desenvolver-se dentro de dias ou semanas em um Episódio Maníaco ou Episódio Misto anteriormente não-psicótico. Quando um indivíduo tem Episódios Maníacos com aspectos psicóticos, os Episódios Maníacos subseqüentes tendem mais a ter aspectos psicóticos. A recuperação incompleta entre os episódios é mais comum quando o episódio atual é acompanhado por aspectos psicóticos incongruentes com o humor. Ainda segundo o DSM IV, a doença se inicia em geral subitamente na adolescência - entre 15 e 19 anos – ou na idade de adulto jovem, entre 20 e 24 anos. Até os 30 anos a maioria apresentou sintomas do transtorno bipolar, mas ele é raro na infância. Apesar de os sintomas se iniciarem precocemente, por exemplo, aos 16 anos, o quadro clínico completo pode se expressar somente aos 19 anos e demorar mais alguns anos antes que o jovem seja adequadamente tratado. 2. 4. TEMPERAMENTO Para Diogo Lara (2004) os temperamentos são uma expressão genética, da mesma forma como cor de cabelo, altura; assim também é a vulnerabilidade para certos tipos de doenças. Ressalta que o tipo de temperamento é o alicerce para o humor, e por conseqüência para as doenças do humor. O temperamento é herdado geneticamente e regulado biologicamente, podendo ser observado desde os primeiros anos de vida. (Lara, 2004, p.13) O temperamento define o que mais naturalmente se salienta no mundo para cada um e influencia os tipos de experiências em que nos envolvemos e como reagimos instintivamente a elas. Assim, é claro que o temperamento e o caráter se influenciam e interagem e nem sempre é fácil diferenciar o que provém do caráter e o que provém do temperamento. A combinação deste temperamento com o caráter que se forma pela experiência é o que definimos como personalidade. (Lara, 2004, p.14) Os diversos transtornos do humor englobam alterações do humor para cima ou para baixo, positivo ou negativo, podem ser descritos segundo a forma apresentada por Akiskal e Pinto: Para Lara (2004) os “desetabilizadores do humor” mais comuns são em geral drogas com ação com ação estimulante no cérebro, como cocaína, anfetamina, e outras drogas de abuso, antidepressivos, alguns remédios para emagrecer (derivados de anfetamina e sibutramina), antiinflamatórios corticóides (como cortizona), L-dopa para o tratamento de Parkinson, álcool e até a cafeína em excesso. 2.5. PADRÃO FAMILIAR Para Diogo Lara (2004), os temperamentos apresentam uma expressão biológica, que é decorrente da composição genética. Mas o ambiente apresenta uma contribuição fundamental. As experiências, na família de convivência, nas relações sociais e laborais, ajudam a moldar a personalidade, mas, por outro lado, também as escolhas vivências são altamente influencias pelo tipo de temperamento. Este é herdado geneticamente e regulado biológicamente, podendo ser observado nos primeiros anos de vida. O DSM IV refere, que os parentes biológicos em primeiro grau de indivíduos com Transtorno Bipolar I têm índices elevados de Transtorno Bipolar I (4 a 24%), Transtorno Bipolar II (1 a 5%) e Transtorno Depressivo Maior (3 a 24%). Estudos de gêmeos e de adoções oferecem fortes evidências de uma influência genética para o Transtorno Bipolar I. 2. 6. ESTUDO DE FAMÍLIAS Angst, em 1966 na Suíça, e Perris, no mesmo ano na Suécia, independentemente, apresentaram os primeiros resultados de estudos sistemáticos em famílias, utilizando a subdivisão de Leonhard. Ambos demonstraram agregação familiar das alterações do humor e, mais ainda, validaram a subdivisão da psicose maníaco-depressiva, encontrando maior freqüência de bipolares entre os familiares de bipolares e de unipolares entre os parentes de depressivos unipolares. A maioria dos estudos que se seguiram concordam com estes autores tanto na agregação familiar quanto na subdivisão (Revisado em Meira-Lima e Vallada, 1998). No artigo “Genética dos transtornos afetivos” de Ivanor Velloso Meira Lima, do Núcleo de Assistência, Ensino e Pesquisa em Transtornos Afetivos - Departamento de Neuropsiquiatria da Universidade Federal de Pernambuco, estudando pacientes com transtorno do humor e famílias, confirma que o risco para a depressão unipolar está aumentado três vezes, enquanto o risco para doença bipolar nesses parentes está aumentado cerca de sete vezes. Os resultados de estudos em famílias de pacientes com transtorno do humor podem ser sumarizados assim: o risco de parentes em primeiro grau de indivíduos não-afetados representativos da população geral é de quase 1% para doença bipolar e cerca de 5% para depressão unipolar. Quando comparamos este risco com o dos parentes em primeiro grau de pacientes com depressão, observamos que, para doença depressiva unipolar, o risco está aumentado aproximadamente três vezes, enquanto o risco de transtorno bipolar nesses familiares é quase o mesmo da população geral. Finalmente, quando comparamos o grupo de familiares de indivíduos da população geral com o grupo de parentes em primeiro grau de portadores de transtorno bipolar, verificamos que o risco para a depressão unipolar está aumentado três vezes, enquanto o risco para doença bipolar nesses parentes está aumentado cerca de sete vezes. Com respeito à elevada prevalência de depressão entre familiares de bipolares, é importante lembrar que 10% a 20% dos pacientes bipolares apresentam os primeiros episódios como quadro depressivo (pseudo-unipolares). (Melo, 2003) 2.6.1 Estudos com gêmeos Entre os mais relevantes estudos com gêmeos nos transtornos do humor, podemos destacar: • Bertelsen et al.(1977), investigaram na Dinamarca 123 pares de gêmeos e encontraram uma concordância, com relação à doença bipolar, de 79% para gêmeos monozigóticos (MZ) e de 19% para gêmeos dizigóticos (DZ), enquanto na depressão unipolar as taxas de concordância de MZ:DZ foram de 64%:24%. • Torgersen (1986), em uma amostra norueguesa de 102 probandos predominantemente unipolares, encontrou um taxa de concordância em MZ:DZ de 51%:20%. • McGuffin e Katz (1991) investigaram, na Inglaterra, 141 pares de gêmeos em sua maioria depressivos unipolares e observaram uma concordância entre MZ de 53% e em DZ de 28%. • Kendler et al.(1993), em uma amostra de 486 gêmeos suecos, verificaram uma concordância de 69% em pares MZ e de 34% em pares DZ. (Melo, 2003) Melo et al. (2003) consideram, com base nos dados apresentados acima, que a taxa de concordância para problemas do humor em gêmeos MZ é duas a três vezes maior do que nos DZ, reforçando a hipótese de um componente genético nessas enfermidades. Até o momento, a maioria dos estudos realizados com gêmeos, permite estimar a herdabilidade na depressão unipolar em torno de 40%, enquanto o transtorno afetivo bipolar teria uma herdabilidade de aproximadamente 70% a 80%. 2.6.2 Estudo com Adotados Melo et al.(2003) consideram que há poucos relatos de investigações com adotados em distúrbios do humor, que são em sua maioria consistentes com a presença de um componente genético na determinação das enfermidades afetivas. Ainda para Melo et al. (2003), o primeiro estudo foi conduzido na Bélgica por Mendlewicz e Rainer (1977), que verificaram 29 adotados com doença maníaco-depressiva e observaram uma prevalência de transtornos afetivos em 31% dos pais biológicos desses indivíduos, comparada a uma prevalência de 12% nos pais adotivos. Novos apontam para uma freqüência seis vezes maior de depressão em filhos adotados ao nascimento com mães com doenças afetivas. Um segundo estudo nessa área foi conduzido por Cadoret (1978) que, estudando uma amostra de mães com doenças afetivas (bipolar e unipolar), evidenciou uma freqüência seis vezes maior de depressão em seus filhos adotados ao nascimento, comparados aos filhos de mães com outras condições clínicas também adotados ao nascimento. Um outro estudo com adotados suecos, realizado por Von Knorring et al.(1983) encontrou poucas evidências de um componente genético em pais biológicos de 56 doentes afetivos adotados. Entretanto, questões metodológicas, como a baixa confiabilidade das informações de fichas de seguro-saúde que estes utilizaram em suas investigações, podem explicar a discrepância com os demais estudos. Finalmente, Wender et al.(1986) investigaram uma amostra dinamarquesa de 71 adotados afetados por transtornos de humor e relataram uma prevalência oito vezes maior de casos de depressão unipolar e quinze vezes maior de casos de suicídio nos pais biológicos desses indivíduos, comparados aos seus pais adotivos. (Melo et al., 2003) Esses estudos podem ser considerados consistentes, marcando a presença de um componente herdado na determinação dos transtornos afetivos, apesar do número limitado de investigações com adotados. 2. 7 ESTUDOS GENÉTICO-EPIDEMIOLÓGICOS Em regra, nos últimos 30 anos, os pesquisadores têm seguido a classificação sugerida por Leonhard (1957), que subdivide os pacientes com transtornos primários do humor em unipolares, no caso de só apresentarem depressão como alteração do humor, e bipolares, se acusam episódios de mania com ou sem depressão, ou ainda episódios de depressão com hipomania. Para Ivanor Lima, desde 1990 a ciência descobre as bases biológicas para o transtorno afetivo bipolar. Estudos recentes relatam a presença do fenômeno de antecipação em famílias com múltiplos afetados pelo transtorno afetivo bipolar. Ao lado disso, investigações independentes utilizando o método RED (Repeat Expansion Detection) - uma estratégia que detecta expansões de repetições trinucleotídicas no DNA genômico sem identificar sua localização - têm mostrado associação entre este distúrbio do humor e longas repetições da seqüência nucleotídica CAG. No presente estudo testamos a hipótese de que loci com repetições CAG estão envolvidos na vulnerabilidade genética ao transtorno afetivo bipolar. Assim, analisamos o comprimento das repetições CAG presentes em quatro loci: o locus ERDA1 na região cromossômica 17q21.3 ao qual tem sido atribuído a maioria das repetições CAG detectadas pelo RED, o locus SEF2-1b que situa-se na região 18q21.1, onde há relatos positivos de ligação e os loci hSKCa3 (região 1q21) e MAB21L (região 13q13), ambos devido a função do gene na qual as repetições residem. Inicialmente, investigamos quatorze famílias brasileiras com múltiplos afetados pelo transtorno bipolar, que tiveram a idade de início da doença comparada na 1a e na 2a geração revelando antecipação. Averiguamos ainda uma amostra de 115 pacientes bipolares não-aparentados e 196 indivíduos controles. As repetições CAG foram amplificadas por PCR, os produtos submetidos a eletroforese em gel de poliacrilamida e as bandas visualizadas após coloração com SYBR gold em aparelho de fluorescência direta (Fluorimager system), possibilitando definir os alelos de acordo com o tamanho da seqüência CAG. O teste ampliado para desequilíbrio de transmissão (ETDT) que utilizamos nas famílias não evidenciou transmissão preferencial de nenhum dos alelos para os membros afetados (ERDA1 X2=11,05/p=0,136; SEF2-1b X2=4,42/p=0,62; hSKCa3 X2=0,88/p=0,92; MAB21L X2=5,76/p=0,45). A análise de ligação por testes paramétricos e não-paramétricos excluiu ligação entre qualquer dos quatro loci e a doença bipolar (ERDA1 lod score= -10,78/ p=0,27; SEF2-1b lod score= 5,87/p=0,6; hSKCa3 lod score=-2,01/p=0,59; MAB21L lod score=-12,46/p=0,83). No estudo caso-controle, a distribuição dos alelos entre pacientes bipolares e controles foi comparada através do teste U de Mann-Whitney e não demonstrou diferenças significativas (ERDA1 z=0,63/p=053; SEF2-1b z=-0,99/p=0,32; hSKCa3 z=-0,57/p=0,56; MAB21L z=1,0/p=0,31). Uma associação entre os alelos considerados longos e o transtorno bipolar foi ainda testada através de um modelo de regressão logística ajustado para controle de etnia, sexo e idade, contudo, os resultados também não apresentaram significância estatística (ERDA1 p=0,79, SEF2-1b p=0,073, hSKCa3 p=0,14, MAB21L p=0,12). Em conclusão, os dados obtidos nessa investigação não apoiam a hipótese de que a expansão de repetições CAG nos loci ERDA1, SEF2-1b, hSKCa3 e MAB21L desempenham um papel na vulnerabilidade ao transtorno afetivo bipolar em pacientes brasileiros. Permanece possível que outros loci com repetições CAG, não relacionados como candidatos em nosso estudo, possam estar implicados na gênese do transtorno bipolar. (LIMA, I. , 2001) Para Yudofsky e Hales (1996) há indicadores que a transmissão do transtorno bipolar está ligada ao cromossoma X. A ausência de transmissão de homem para homem do transtorno do transtorno bipolar em alguma famílias sugeriu uma forma da doença dominante ligada ao X. As análises de segregação não fornecem apoio convincente, tanto para um locus principal único como para a transmissão poligênica-multifatorial do transtorno bipolar. Estas análises presumiram que a depressão maior e o transtorno bipolar eram formas leve e severa da mesma doença. Para a transmissão monogênica, elas poderiam representar variantes alélicas do mesmo locus; para a transmissão poligênica, poderiam representar diferentes limiares do mesmo continuum de vulnerabilidade à doença. Essas análises foram confundidas por um aumento secular na taxa de doenças afetivas nas três gerações passadas (o efeito de periodicidade mencionado acima) e limitadas pela penetrância incompleta e possível heterogeneidade genética não alélica.(Yudofsky et al., 1996, p. 139). As análises de ligação da doença bipolar incluíram estudos de marcadores anônimos implicando o cromossoma 11p15; estudos de loci favorecidos, implicando o cromossoma Xq28; e estudos de genes candidatos, levando-se em conta os genes da tirosina hidroxilase (TH) e o receptor D2. Egeland et al (1987) relataram ligação entre os transtornos bipolar I e transtornos relacionados (transtorno bipolar II: transtorno esquizoafetivo, tipo bipolar; e depressão maior unipolar) e o cromossoma oncogene 11 HRAS1 wm 19 de 81 membros de uma linhagem estendida da ordem antiga dos Amishes. (Yudofsky et al, 1996, p. 139) Outros estudos (Detera-Wadleigh et al, 1987; Hodgkinson et al., 1987) excluiram a ligação entre o locus principal para o transtorno bipolar e estudos marcadores do cromossoma 11. Kelsoe et al., (1989) reavaliaram o relato original de Engeland com as seguintes alterações: início novo do transtorno do humor em 2 membros da linhagem original, novos dados adicionais do genótipo em 10 membros incompletamente tipados previamente na linhagem original, novos dados do genótipo de 6 indivíduos em uma fraternidade incluída como nova ( a extensão “esquerda”) e dados novos do genótipo em 31 parentes adicionais (a extensão “direita”). A ligação foi excluída para marcadores do cromossoma nesses membros nesses 118 membros da linhagem. Voltando aos estudos do cromossoma X, Baron et al., (1987) relataram forte evidência para a ligação entre o transtorno bipolar e dois marcadores fenotípicos do Xq (a visão de cores para vermelho-verde e a deficiência de G6PD) em linhagens israelitas. Além disso, Mendlewicz et al., forneceram evidência mais fraca para a ligação do transtorno bipolar e um lócus de hemofilia B (fator IX). Uma explicação para essas localizações díspares nos dois estudos do cromossoma X é que os intervalos de confiança associados a estes dois achados de ligação são tão amplos que possam implicar o mesmo lócus.” (Yudofsky et al., 1996, p. 139) 2.8 A INCIDÊNCIA ESTÁ CRESCENDO Para Lara (2004), o aumento de casos de pacientes com o diagnóstico de transtorno do humor bipolar tem uma explicação na combinação do ambiente com a característica da personalidade dos colonizadores. A característica de personalidade dos colonizadores compõe o perfil bipolar. São elas: o pioneirismo, o espírito inovador e exploratório, a busca de novidades e a confiança no futuro. “Neste sentido, os Estados Unidos expressão mais a competitividade, a liberdade, o espírito dominador e invasivo; enquanto que o Brasil é mais boêmio e alegre. Ambos são artísticos e criativos.” (Lara, 2004, p. 135) A origem ambiental é expressa por Lara (2004) pelo excesso de estímulos, gerando excitação. Também aponta para a redução da maternagem como fator desestabilizador. A cultura do consumismo regula o humor para além da ansiedade (os brinquedos superestimulantes e descartáveis, as drogas, a escolha pouco criteriosa de parceiros). Para Lara (2004), os ambientes demasiadamente estimulantes geram crianças “turbinadas, que se transformam em adultos turbinados e mais turbinadores da sociedade”. Afirma, que a poluição de informações crescente, como celulares jogos de computador, programas de televisão em “alta rotação” tem sido devastadora. Soma-se a incapacidade da sociedade e dos educadores em formar na criança valores como a persistência, a tolerância para frustrações, a estruturação de limites; e ao contrário, estimulando o excesso e a busca de novidades.Estes superestímulos associados ao fato de que os jovens durmam cada vez mais tarde são fatores de desestabilização da mente. Acredito que o ponto central é a avaliar a influência desta mudança de ambiente desde o nascimento, porque o cérebro até os 10 anos é extremamente maleável e adaptável. O maior exemplo é o aprendizado de idiomas. Se mudar de pais, uma criança até 10 anos aprende o idioma novo sem sotaque ou diferenças de conhecimento em comparação com os nativos. Por que com o resto seria diferente? E mais, o que promove o desenvolvimento cerebral é exatamente o estímulo. (Lara, 2004, p. 135) 3 COMENTÁRIOS FINAIS Os seres humanos apresentam uma propensão a algum problema de saúde. Os componentes genéticos estão associados à variantes ambientais, que levam as pessoas a desenvolver uma doença. Existe um conjunto de evidências científicas que indica a existência de fatores genéticos na suscetibilidade para as doenças afetivas. Provavelmente, com as novas tecnologias e abordagens na área de genética molecular, nos próximos anos, muitos dos genes relacionados à vulnerabilidade para a depressão e para o transtorno afetivo bipolar deverão ser descobertos. O futuro desafio é identificar os genes relacionados com as doenças do humor para a realização de tratamentos mais específicos, pois tais síndromes são bastante comuns e determinam importante prejuízo à sociedade, inclusive por se associarem com elevadas taxas de suicídio. As pesquisas, que buscam as bases etiológicas e fisiopatológicas dessas perturbações afetivas, contemplam evidências clínicas, que apontam para o componente familiar como um dos principais fatores de risco para o aparecimento desses quadros. Percebe-se o aumento de casos de pacientes com o diagnóstico de transtorno do humor bipolar, isto tem uma explicação na combinação do ambiente com a característica da personalidade da população. Elementos como equilíbrio no sono, na alimentação, na atividade física, e adequação nos estímulos e atividades são aspectos que favorecem a harmonia do humor. Para os portadores do transtorno do humor bipolar, atualmente, a psicoterapia promove a consciência da situação, oferecendo o encontro das novas soluções. A medicação é o elemento importante no controle bioquímico do humor. Assim, a energia das pessoas com transtorno do humor bipolar pode ser melhor aproveitada e sua vida gratificante e produtiva. 4 REFEÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMERICAN PSYCHOLOGIAL ASSOCIATION - APA. (2002). AMBULIM, Manual Informativo sobre o Transtorno Bipolar do Humor, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, 1995. DSM – IV. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fourth Edition, Text Revision. LIMA, I. et al. (2004). Genética dos transtornos afetivos. Revista de Psiquiatria Clínica ISSN 0101-6083, versão impressa, São Paulo, 2004. LIMA, I. (2001). O Fenômeno da Antecipação Genética e a Expansão de Repetições Trinucleotídicas no Transtorno Afetivo Bipolar. Tese de doutorado. Orientador: Prof. Dr. Homero Vallada, 2001. In: http://www.unifesp.br/dpsiq/posgrad/teses/ivanorl.htm. Acesso em 08 de novembro de 2004 LARA, D. (2004). Temperamento forte e bipolaridade: dominando os altos e baixos do humor. Porto Alegre: Armazém de Imagens. YUDOFSKY, S. et al. (1996). Compêndio de Neuropsiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas. Carmen Doris Joseph Reichelt - Psicóloga -CRP 07/1289