Um Estudo sobre Personalidade Humana para

Propaganda
Ricardo Pereira Ramos
Um Estudo sobre Personalidade Humana para Implementação
de uma Metáfora Computacional para Atores Digitais
Autônomos
Joinville
2012
Ricardo Pereira Ramos
Um Estudo sobre Personalidade Humana para Implementação
de uma Metáfora Computacional para Atores Digitais
Autônomos
Relatório Final de Trabalho de Conclusão de Curso
(TCC) apresentado ao Curso de Graduação em
Ciência da Computação, da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), como requisito
parcial da disciplina de Trabalho de Conclusão de
Curso.
Orientador: Profo Ms. Rogério Eduardo da Silva
Joinville
2012
Ricardo Pereira Ramos
Um Estudo sobre Personalidade Humana para Implementação
de uma Metáfora Computacional para Atores Digitais
Autônomos
Relatório Final de Trabalho de Conclusão de Curso
(TCC) apresentado ao Curso de Ciência da Computação da UDESC, como requisito parcial para a
obtenção do grau de BACHAREL em Ciência da
Computação.
Aprovado em
BANCA EXAMINADORA
Profo Ms. Rogério Eduardo da Silva
Ms. Juliane Cristine Koerber Reis
Profo Dr. Kariston Pereira
Profo Dr. Rui Jorge Tramontin Júnior
“Quod est inferius est sicut quod est superius, et quod est superius est sicut quod
est inferius...”
– Hermes Trismegisto, em A Tábua de
Esmeralda
Agradecimentos
A todos aqueles que, antes de mim, dedicaram o seu tempo e esforço para a realização
do progresso científico, tanto na Psicologia como na Computação, e que hoje me permitem
atingir os objetivos e realizações deste trabalho.
A minha família que, mesmo nas minhas “traquinagens”, ofereceram apoio nestes
(longos) anos de faculdade e por sua dedicação na minha formação, enquanto pessoa.
Aos amigos do grupo Colméia, que tornaram estes anos na graduação mais agradáveis
e alegres, me ensinaram muito e ajudaram a me tornar o acadêmico que sou hoje.
Ao meu orientador, Rogério Eduardo da Silva, por acreditar neste projeto; fornecer
dicas preciosas, disponibilizando seu conhecimento para ajudar a “mudar o Mundo”.
À psicóloga Juliane Cristine Koerber Reis, que ofereceu seu tempo para me auxiliar
e melhorar muitos dos aspectos deste trabalho, em especial nos conteúdos da Psicologia.
Resumo
A criação de um agente credível (believable agent) depende de vários fatores, sendo
um dos principais a representação da personalidade. Este trabalho apresenta o desenvolvimento de uma metáfora computacional que possui uma componente de personalidade
para ser utilizada nos atores digitais autônomos do projeto Developing Rational Agents
to Mimic Actors. Através do estudo de teorias da personalidade e seus instrumentos de
avaliação, foi possível desenvolver um modelo que a considere, tanto em termos de sua
descrição, quanto em relação à sua dinâmica. A implementação, na forma de uma rede
neural artificial, obteve um índice de acerto de 75% para os casos de testes e mostra-se
adequado para a aplicação aos atores digitais autônomos a fim de determinar o seu comportamento.
Palavras-chave: Humanos Virtuais, Personalidade, Modelos Computacionais,
Traços, Motivação
Abstract
The creation of a believable agent depends on several factors, one of the most important is personality. This research presents the development of a computational metaphor
that includes a personality component, to be used with autonomous digital actors developed by the Developing Rational Agents to Mimic Actors project, in order to make
their behavior individualized. By the study of personality theories and their assessment
instruments, it was possible to develop a model that consider personality, both in terms
of its description, and relatively to its dynamics. The implementation, in a form of an
artificial neural network, obtained a success rate of 75% on our test cases and it has been
considered appropriate to be used to determine the behavior of autonomous digital actors.
Keywords: Virtual Humans, Personality, Computational Models, Traits, Motivational
Sumário
Lista de Tabelas
7
Lista de Figuras
9
1 Introdução
10
1.1
Objetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.2
Organização do trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
2 Fundamentos Teóricos
14
2.1
Humanos Virtuais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2
Atores Digitais Autônomos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.2.1
2.3
2.4
2.5
Projeto D.R.A.M.A. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
Psicologia da Personalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
2.3.1
Descrição da Personalidade: Teoria dos Traços . . . . . . . . . . . . 24
2.3.2
Dinâmica da Personalidade: Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . 26
Instrumentos de Avaliação da Personalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.4.1
Five Factor Model
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.4.2
Myers-Briggs Type Indicator . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2.4.3
Reiss Motivational Profile . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
Considerações do Capítulo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
3 Modelo Computacional
35
3.1
Trabalhos Relacionados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
3.2
Arquitetura da Metáfora Computacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
3.3
3.2.1
Visão Geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
3.2.2
Descrição dos Módulos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
Considerações do Capítulo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
4 Desenvolvimento
45
4.1
Ferramentas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
4.2
Implementação da Metáfora Computacional . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
4.2.1
Conjunto Motivacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
4.2.2
Outros Módulos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
5 Testes e Resultados
56
5.1
Caso de Exemplo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
5.2
Dados do Questionário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
5.3
Dados do Modelo Computacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
5.4
Resultados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
5.4.1
Limitações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
5.4.2
Publicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
6 Conclusão
65
Referências Bibliográficas
67
A Apêndice
71
A.1 Nova Arquitetura proposta para o projeto D.R.A.M.A. . . . . . . . . . . . 71
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário . . . . . . . . . . . . . . . . 72
Lista de Tabelas
2.1
Descrição da personalidade: tipos, traços e fatores . . . . . . . . . . . . . . 22
2.2
Five Factor Model e traços relacionados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2.3
Exemplo de perguntas presentes em um questionário MBTI. . . . . . . . . 29
3.1
Dicionário parcial de traços de personalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
5.1
Comportamentos esperados para as personagens de acordo com o questionário 59
5.2
Comportamentos esperados para as personagens de acordo com o modelo
computacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
Lista de Figuras
2.1
Taxonomia de humanos virtuais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.2
Arquitetura do projeto D.R.A.M.A.
2.3
Pirâmide de necessidades de Maslow . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
3.1
Modelo computacional SPOT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
3.2
Visão geral da metáfora computacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
3.3
Dimensões de emoção e exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
4.1
Modelo de um neurônio artificial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
4.2
Representação de um Perceptron Multicamada . . . . . . . . . . . . . . . . 53
5.1
História utilizada para o questionário - Turma da Mônica
5.2
Tira utilizada para a primeira pergunta do questionário
5.3
Tira utilizada para a segunda pergunta do questionário . . . . . . . . . . . 58
5.4
Tiras utilizadas para os quadros 3, 4, 5 e 6. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
. . . . . . . . . 57
. . . . . . . . . . 58
A.1 Arquitetura para atores virtuais que contém um módulo de personalidade . 71
A.2 Distribuição de gênero dos participantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
A.3 Distribuição das idades dos participantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
A.4 Nível de Escolaridade dos participantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
A.5 Distribuição das respostas para a Quadro 1 - Questão 1 . . . . . . . . . . . 73
A.6 Distribuição das respostas para a Quadro 1 - Questão 2 . . . . . . . . . . . 74
A.7 Distribuição das respostas para a Quadro 2 - Questão 1 . . . . . . . . . . . 74
A.8 Distribuição das respostas para a Quadro 2 - Questão 2 . . . . . . . . . . . 75
A.9 Distribuição das respostas para a Quadro 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
A.10 Distribuição das respostas para a Quadro 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
A.11 Distribuição das respostas para a Quadro 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
A.12 Distribuição das respostas para a Quadro 6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
10
1 Introdução
Atualmente (anno 2012), a interação humano-computador passa por um período de
mudanças, graças a novas propostas apresentadas pelos pesquisadores da área. As novas
demandas por trabalhos neste setor acabaram por proporcionar a criação de um novo segmento na computação: a computação afetiva (affective computing), que trata dos sistemas
computacionais que se relacionam a ou que fazem uso das emoções, seja expressando-as
ou reconhecendo-as (PICARD, 1995).
Uma das aplicações que faz uso dos princípios desta recente disciplina são os humanos
virtuais. Humanos virtuais são modelos computacionais de pessoas, cujos comportamentos são inspirados naqueles encontrados em humanos, podendo ser equipados com sensores, percepção, memória e comportamento motor, de modo que os faça reagir a eventos
(THALMANN et al., 1999).
Apesar dos avanços obtidos com a modelagem gráfica, tornando possível a criação
de humanos virtuais mais realistas, e que servem de apoio em áreas como publicidade
e entretenimento digital, o realismo observado nas feições e formas animadas não pode
ser percebido no desenvolvimento dos processos cognitivos destes agentes virtuais, que
possuem pouca individualidade e ainda são mecânicos e inexpressivos (EGGES et al.,
2003).
A credibilidade do comportamento do ator virtual depende de diversos fatores, entretanto um deles merece destaque: a personalidade, que é compreendida como o conjunto
de características de um humano virtual que o distingue dos demais (KSHIRSAGAR;
MAGNENAT-THALLMAN, 2002), mantendo-se consistente através do tempo e das situações vividas (POZNANSKI; THAGARD, 2005).
Uma das possibilidades para a utilização de humanos virtuais está nas pesquisas
realizadas pelo projeto Developing Rational Agents to Mimic Actors (D.R.A.M.A.), do
qual este trabalho faz parte. O projeto propõe a criação de um subgrupo de humanos
virtuais, chamados de atores digitais autônomos e objetiva a criação de uma metáfora
computacional ao processo utilizado por atores humanos, com a intenção de utilizar estes
atores na criação de filmes animados.
1 Introdução
11
O presente trabalho contribuirá com a inserção de um componente que considere
a personalidade de um ator digital autônomo (ADA), levando a exibição de um perfil
individualizado para cada ator digital.
De acordo com Russell e Norvig (2010), ao mesmo tempo em que Gottlob Frege
lançava as primeiras luzes sobre a lógica de primeira ordem, Hermann von Helmholtz e
seu aluno Wilhelm Wundt, em 1879, realizavam importantes avanços na forma de avaliar
os processos fisiológicos e psicológicos aos quais estavam sujeitos os seres humanos.
Enquanto Von Helmholtz, aplicou o método científico para explicar o funcionamento
fisiológico da visão humana, Wundt dava início ao funcionamento do laboratório de psicologia experimental da Universidade de Leipzig, possibilitando o estabelecimento da Psicologia enquanto ciência, dando início a uma nova disciplina que mais tarde se tornaria
conhecida como Psicologia Cognitiva (RUSSELL; NORVIG, 2010).
Esta disciplina consolidou-se durante o período conhecido como Revolução Cognitiva,
um movimento onde pesquisadores das áreas da Psicologia, Antropologia e Linguística,
inspirados por avanços na computação, na inteligência artificial e na neurociência, tinham
por objetivo descobrir e descrever formalmente a maneira como a mente humana se relaciona com seu meio, permitindo propor hipóteses a respeito dos processos de tomada de
decisão realizados (BRUNER, 1990).
Poznanski e Thagard (2005) elegem, na Psicologia, três teorias relevantes para o
entendimento do que é personalidade e de que maneira modelá-la computacionalmente:
as psicobiológicas, de aprendizado social (social learning) e de traços (traits).
As teorias psicobiológicas procuram explicar a personalidade através de mecanismos
biológicos e da hereditariedade, enquanto que as de aprendizado social focam no desenvolvimento da personalidade mediante a interação com o ambiente. Por fim, os traços de
personalidade são estimados através da observação das tendências comportamentais de
um indivíduo.
Por meio do estudo das teorias envolvendo a personalidade e avaliando os modelos
propostos pela Psicologia para a sua aferição, pretende-se projetar uma solução computacional que utilize os princípios já consolidados nos modelos psicológicos, de modo que
possam ser utilizados para os atores autônomos do D.R.A.M.A., dando-lhes individualidade no seu comportamento.
1.1 Objetivos
1.1
12
Objetivos
O objetivo geral deste trabalho é definir uma representação computacional para um
modelo de personalidade que permita ao ator digital autônomo demonstrar individualidade nas escolhas. Para atingí-lo é preciso cumprir alguns objetivos específicos:
• Compreender os fundamentos teóricos de computação afetiva;
• Compreender os fundamentos teóricos de humanos virtuais;
• Compreender os fundamentos teóricos de algumas teorias da personalidade;
• Compreender os métodos utilizados para a avaliação das características de personalidade de um indivíduo;
• Integrar um modelo psicológico existente aos modelos de decisão de um Ator Digital
Autônomo (ADA);
• Desenvolver um algoritmo para representar personalidades (prova de conceito);
• Determinar estereótipos e suas reações correspondentes, a fim de realizar a avaliação
do modelo proposto.
1.2
Organização do trabalho
Em 2.1 – Humanos Virtuais, são descritos os objetos de estudo, estabelecendo-se um
escopo de atuação do presente trabalho, restrito aos atores digitais autônomos, definidos
em 2.2 – Atores Digitais Autônomos, onde também caracteriza-se o projeto D.R.A.M.A.,
definindo suas funções e atribuições.
Na subseção seguinte, 2.3 – Psicologia da Personalidade, é definido o conceito de personalidade de acordo com os estudos da Psicologia, elencando algumas características que
devem ser observadas para a obtenção de um conceito que demonstre o real domínio do
tema, sendo descritas diversas teorias de personalidade. Alguns modelos mais populares,
utilizados na avaliação ou classificação de indivíduos dentro de um padrão de comportamento, são definidos em 2.4. – Instrumentos de Avaliação da Personalidade.
1.2 Organização do trabalho
13
Em 3 – Modelo Computacional, é descrito o modelo computacional proposto por este
trabalho, apresentando-se os seus elementos e o modo como eles interagem, apresentandose também alguns trabalhos relacionados na área computacional que contribuíram para o
desenvolvimento do modelo proposto.
Em 4 – Desenvolvimento, são descritos o processo de implementação da metáfora
computacional e as ferramentas utilizadas.
No capítulo 5 – Testes e Resultados, são mostrados os testes realizados com o modelo
computacional e discutidos os resultados alcançados, confrontado-os com as respostas
obtidas nos questionários realizados para a validação do modelo.
Por fim, em 6 – Conclusão, são apresentadas as contribuições até então atingidas e a
proposta para as próximas atividades a serem executadas.
14
2 Fundamentos Teóricos
O presente capítulo apresenta a fundamentação teórica utilizada para o desenvolvimento da metáfora computacional. São conceituados: humanos virtuais, apresentando as
suas características e a forma como serão utilizados dentro do projeto D.R.A.M.A., além
dos estudos de algumas das teorias da personalidade existentes.
2.1
Humanos Virtuais
Há algum tempo, o universo da ficção científica especula sobre um mundo repleto
de humanos artificiais. Desde as publicações de Asimov1 a indústria cinematográfica
hollywoodiana, máquinas com comportamento humano realizam as mais diversas tarefas.
Seja como inofensivos assistentes domésticos ou como máquinas de guerra a mudar o curso
da História, este mundo ainda parece distante. No entanto, objetivos mais modestos
podem ser alcançados atradvés da simulação computacional e a utilização de humanos
virtuais.
Humanos virtuais correspondem a modelos computacionais de pessoas que podem
comportar-se de maneira autônoma e inteligente, podendo apresentar individualidade e
personalidade (TORRES et al., 2002), com o objetivo final de simular o comportamento
de um humano real (MAGNENAT-THALMANN; THALMANN, 2004).
Uma característica importante para um humano virtual é a sua credibilidade (believability). Um agente credível é um agente autônomo, com personalidade, que herda
propriedades de personagens artísticos (LOYALL, 1997), não sendo necessário ser uma
cópia fiel do comportamento humano, mas apenas apresentar a ilusão de vida (BATES,
1994).
Loyall (1997) define uma série de requisitos necessários para que um agente seja considerado credível:
1
Isaac Asimov foi um escritor norte-americano de ficção científica, conhecido por séries literárias como:
Foundation, e livros como “Eu, Robô” e Nightfall
2.1 Humanos Virtuais
15
• Do ponto de vista da concepção artística da personagem:
(a) Personalidade: um conjunto de detalhes particulares que o definem como
único;
(b) Emoção: apresentação de um estado emocional coerente com a sua personalidade;
(c) Auto-motivação: realizar seus desejos e vontades intrínsecos, em oposição a
um comportamento estritamente estímulo-resposta;
(d) Mudança: modificações do estado corrente de um agente, de acordo com a
sua personalidade;
(e) Relações sociais: consiste na necessidade de interação com outros personagens;
(f) Consistência: atuação conjunta de todos os canais de comunicação para a
representação coerente de uma mensagem.
• Do ponto de vista do agente autônomo:
(a) Propósitos: deixar aparente propósitos e objetivos do personagem;
(b) Concorrência: realização de múltiplas atividades ao mesmo tempo;
(c) Reativo: reação às ações de maneira coerente;
(d) Situados: alteração de seu comportamento, de acordo com as situações do
ambiente;
(e) Limitações físicas e mentais;
(f) Contexto social: o agente deve respeitar as convenções sociais do ambiente
em que está inserido;
(g) Integração: operações realizadas pelo agente computacional devem ser fluidas, de maneira que não apresentem sinais de separação entre as etapas de
processamento de informação;
A complexidade com que são desenvolvidos estes fatores é resumida na figura 2.1,
onde é demonstrada a taxonomia de humanos virtuais, conforme listado a seguir:
2.1 Humanos Virtuais
16
Figura 2.1: Taxonomia de humanos virtuais
Fonte: traduzido de Iurgel (2006)
Digital Extras: personagens coadjuvantes criados digitalmente, utilizados no povoamento de cenas com multidões.
Personagem não jogável (Non Player Character ): personagens não controlados por
um jogador, mas que se envolvem no contexto do jogo com a finalidade de simples
interatividade com o usuário.
Ator digital autônomo (Autonomous Digital Actor ): personagens virtuais que são
empregados na criação de histórias lineares, capazes de obedecer a comandos de um
diretor humano, que os oriente a atuar de maneira adequada (IURGEL, 2008).
Assistente virtual (Virtual Assistant): agente virtual para a interação com o usuário que responde a perguntas com base em algum conhecimento prévio armazenado,
utilizando processamento de linguagem natural e sem a intervenção humana.
Agente personificado de conversação (Embodied Conversational Agent): compreende
a um humano virtual capaz de demonstrar características humanas na conversação
face-a-face, sendo capaz de reagir a impulsos verbais ou não verbais e de reproduzílos, lidando com funções de conversação, de modo a contribuir com novas proposições
(CASSELL, 2000).
Humano virtual (Virtual Human): corresponde ao mais alto nível de representação
computacional de um humano real, como já definido anteriormente, são autônomos
e podem apresentar alguma individualidade.
2.2 Atores Digitais Autônomos
17
De acordo com os objetivos propostos pelo projeto D.R.A.M.A., ao qual este trabalho
está associado e que prevê modelos para a representação de personagens, a utilização de
atores digitais autônomos torna-se mais adequada, portanto, merece um detalhamento.
2.2
Atores Digitais Autônomos
De acordo com Perlin e Seidman (2008), um ator digital autônomo corresponde a
um personagem tridimensional que se permite ser treinado por um animador, em uma
ferramenta de autoria, para empregar diversos estilos de movimento, linguagem corporal, técnicas para comunicar emoções, melhores escolhas de atuação e outras habilidades
performáticas.
A construção de um modelo de um ator virtual2 obedece a três níveis de modelagem:
Aparência física: utilização de técnicas de modelagem geométrica e de renderização
gráfica, definindo-se aspectos físicos de um ator digital.
Movimentos no espaço: fazer uso de técnicas de captura de movimento e de animação
computacional, definindo-se representações realísticas da movimentação dos personagens ou do cenário.
Processo cognitivo: uso de metáforas computacionais para a representação dos estados
mentais e comportamentos humanos, com especial utilização dos modelos propostos
pela inteligência artificial.
Magnenat-Thalmann e Thalmann (2005), definem estes níveis para a criação de um
humano virtual, mas também devem ser levados em consideração na modelagem de um
ADA.
2.2.1
Projeto D.R.A.M.A.
O processo de autoria de personagens animados é realizado por profissionais treinados e capacitados em aspectos específicos do processo de animação, tornando-se uma
2
Os termos “ator digital autônomo” e “ator virtual” são empregados como sinônimos
2.2 Atores Digitais Autônomos
18
tecnologia extremamente cara, viabilizando sua utilização quase que apenas pelas grandes corporações de entretenimento. A ideia da construção de estruturas autônomas que
comportem-se de maneira similar a atores reais, criaria um novo paradigma na autoria de
personagens animados.
O projeto D.R.A.M.A. surge na tentativa de especificar um modelo computacional da
arquitetura e implementar um protótipo funcional de agentes cognitivos capazes de agir
como um ator digital autônomo. A arquitetura atual do projeto é definida na figura 2.2
e traz em destaque o módulo que será desenvolvido.
Esta arquitetura prevê que um roteiro (Script), quando submetido à interpretação
de um conjunto de atores digitais (ADAi ), estimula-os a realizar sugestões de atuação
(Individual Performance). Estas sugestões são submetidas a uma linha de tempo não
linear (Suggested Timeline), que será submetida a uma ferramenta de autoria, na qual o
usuário pode visualizar e alterar o comportamento de seu ator (Performance Criticism).
O processo de interpretação é realizado por um conjunto de módulos, cada um deles é
responsável por uma parte da análise do roteiro. Um dos módulos centrais nesta concepção
é o módulo de ações individuais, (Individual Actions Module) que concentra as informações
produzidas pelos módulos de percepção, interpretação e de estilo de atuação (Perception,
Interpretation, Acting Style Modules) tendo como saída as ações preliminares de um ator
digital.
As interpretações individuais sugeridas são reunidas em um módulo de estrutura
(Structure Module) que as reúne e as submete a uma linha de tempo não linear que
contém todas as sugestões de uma sequência de atuação.
É prevista a alteração do componente central desta arquitetura (Individual Actions
Module), realizada por um outro trabalho associado ao projeto (THUME, 2012), a qual
afeta diretamente na organização dos módulos de script, de percepção, interpretação e de
estilo de atuação. A nova proposta de arquitetura pode ser vista no anexo A.1 (pág. 71),
e traz consigo a posição do módulo de personalidade proposto.
Este trabalho tem por objetivo colaborar na representação destes atores digitais, através da adição e desenvolvimento de um componente (Personality) que permita ao agente
demonstrar uma personalidade, tornando o seu comportamento individualizado e coerente.
2.2 Atores Digitais Autônomos
Figura 2.2: Arquitetura do projeto D.R.A.M.A.
Fonte: projeto D.R.A.M.A.
19
2.3 Psicologia da Personalidade
20
Do ponto de vista computacional, a personalidade é vista apenas como um conjunto
de características que definem um indivíduo. Entretanto, para a composição de uma
metáfora computacional mais robusta, é importante considerar outros fatores inerentes à
personalidade. Tais fatores podem ser estudados através da Psicologia, ciência ocupada
com o estudo da mente e do comportamento humano.
2.3
Psicologia da Personalidade
Apesar de central no entendimento da natureza humana, o estudo da personalidade
foi negligenciado por quase meio século pela Psicologia (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
Desde a abertura do Laboratório Experimental de Psicologia da Universidade de Leipzig, em 1879, caracterizada como o marco do surgimento da Psicologia enquanto ciência,
os estudos acerca da natureza humana se concentraram em três áreas com métodos e
objetivos finais distintos.
A primeira abordagem de pesquisa foi desenvolvida por Wilhelm Wundt, em que o foco
era o estudo dos processos mentais humanos e a maneira como eles poderiam ser afetados
por fatores externos, de forma controlada pelo seu experimentador. Esta linha, fortemente
ligada ao método científico tradicional, não obteve avanços em explicar a personalidade,
já que uma área complexa e multidimensionada como esta, não era compatível com os
métodos utilizados.
No início do século seguinte, outras duas escolas ganharam espaço, a behaviorista,
preocupada com os estudos do comportamento observável de um indivíduo; e a psicanálise,
focada no entendimento dos processos inconscientes. Ambas consideravam o estudo da
personalidade, mas com objetivos e métodos de análise diferentes, sem atingir um ponto
em comum (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).
A formalização do estudo da personalidade ocorreu somente no final da década de 30,
através dos trabalhos de Gordon Allport, o primeiro autor a publicar um livro sobre a personalidade. Sua obra: Personality: A psychological Interpretation é tida como um marco
no estudo da área, a partir do qual surgiram inúmeras teorias acerca deste componente
da natureza humana (NETO, 2010).
Allport definiu a personalidade como a organização dinâmica dos sistemas psicofísicos
2.3 Psicologia da Personalidade
21
do indivíduo que determinam seus comportamentos e pensamentos. Apesar da importância histórica, esta definição não é a mais utilizada, pois desconsidera importantes conceitos
contemporâneos da personalidade (NETO, 2010).
Autores mais modernos, como Schultz e Schultz (2009) enumeram alguns aspectos
que devem nortear definições contemporâneas para personalidade. São eles:
• A forma como o indivíduo é visto pela sociedade;
• Características estáveis e duradouras, no tempo;
• Individualidade;
• Gênero e etnia;
• Valores culturais e costumes.
A observância destes fatores, leva a uma definição moderna da personalidade como um
sistema no qual um conjunto de padrões inatos do indivíduo interage com o ambiente social
nas dimensões afetivas, cognitivas e comportamentais para produzir ações e experiências
de uma vida individual (NETO, 2010).
A partir de uma definição sobre o que é a personalidade, teóricos da área realizam
algumas considerações, para a sustentação de suas teorias de personalidade. A estruturação de seu pensamento é definida de modo a responder três perguntas fundamentais
(CLONINGER, 2004):
Descrição da personalidade: Preocupação com o estabelecimento de medidas para a
comparação das diferenças individuais. Três formas são dominantes: a abordagem
de tipos, que lida com a categorização de indivíduos em um número limitado de
grupos de similaridade; a abordagem de traços, características que variam de pessoa
para pessoa; e fatores, os quais reúnem um conjunto de traços correlacionados. As
três abordagens são vistas com detalhes na tabela 2.1.
Dinâmica da personalidade: Análise e compreensão dos mecanismos pelos quais a personalidade é expressa, com foco nas motivações que direcionam o comportamento.
Diretamente influenciada pelo processo cognitivo, valores culturais e adaptação ao
meio.
2.3 Psicologia da Personalidade
22
Desenvolvimento da personalidade: De que maneira a personalidade se desenvolve e
se ocorrem mudanças ao longo do tempo.
Tabela 2.1: Descrição da personalidade: tipos, traços e fatores
Tipos
Constituem variáveis qualitativas. Um indivíduo pode somente fazer parte de uma categoria. Teoricamente, um pequeno número de
tipos descrevem toda uma população.
Traços
Variáveis quantitativas. Um indivíduo recebe um valor numérico
que indica o quanto de uma característica ele possui. Em teoria,
existe um número significativo de traços que descrevem uma população.
Fatores
Variáveis quantitativas. Um indivíduo recebe um valor numérico
que indica o quanto de um fator ele possui. Um pequeno número
de fatores podem ser utilizados na descrição de uma população e
uma pessoa pode estar descrita em cada um dos fatores.
Fonte: Cloninger (2004, p. 4)
Para responder a estas questões fundamentais, psicólogos e pesquisadores da área têm
criado diversas teorias de personalidade, na tentativa de compreender melhor o funcionamento do comportamento humano.
Teoria Psicanalítica: abordagem mais popularizada das teorias de personalidade, onde
o inconsciente, compreendido como os processos mentais que não são conhecidos por
um indivíduo, determina o desenvolvimento da personalidade. Tem como principal
representante Sigmund Freud.
Teoria Comportamental (behaviorista): abordagem focada no desenvolvimento da
personalidade como resultado de estímulos aprendidos, posicionando sua avaliação
estritamente no comportamento observável do homem e a total desconsideração de
componentes conscientes ou inconscientes. Entre outros, dedicaram-se ao estudo
do aspecto comportamental os psicólogos Burrhus F. Skinner, John Watson e Ivan
Pavlov.
2.3 Psicologia da Personalidade
23
Teoria dos Traços de Personalidade: inspirada na incorporação de adjetivos aos indivíduos como indicativos de seu comportamento, investigando como ocorre a distinção entre duas ou mais pessoas (conjunto de traços que as definem) e o quanto que
elas diferem. Os mais distintos autores nesta área são Gordon Allport e Raymond
B. Cattell.
Teoria Humanista: teoria em que há a exaltação dos valores humanos e das experiências
pessoais positivas, em detrimento dos aspectos negativos e neuróticos do psiquismo
humano. Traz considerações importantes sobre o papel hereditário e do ambiente
na formação da personalidade. Abraham Maslow e Carl Rogers são os principais
autores da teoria.
Teoria Social-cognitiva (social learning ): extensão da teoria behaviorista, possuindo
as mesmas premissas, mas com a adição de um componente cognitivo influenciando
a tomada de decisão. Alfred Bandura, principal psicólogo da teoria, promove a inclusão do contexto social e do comportamento observacional durante o processo de
construção da personalidade.
Teoria Biológica (psicobiológica): pode ser definida como uma extensão da teoria de
traços, em função das importantes contribuições empíricas na determinação das
categorias. Cultiva uma estreita relação com as ciências naturais (evolução e neurologia), em que o foco concentra-se nos aspectos comportamentais fundamentais
da natureza humana, existentes desde as civilizações pré-históricas, e na influência
da carga genética na formação do temperamento, este, um componente biológico da
personalidade. Jean Piaget e Hans Eysenk foram nomes que contribuiram para esta
linha teórica.
De acordo com Poznanski e Thagard (2005), três abordagens são importantes do
ponto de vista computacional: a teoria de traços, a abordagem psicobiológica e a socialcognitiva. Neto (2010) também atribui importância à abordagem de traços, pelo nível
de aprofundamento descritivo proposto pela teoria, que permite avaliar e classificar a
personalidade por meio de testes e observações.
Para os objetivos deste trabalho, de acordo com as razões expostas acima, a metáfora
computacional deverá ser baseada na teoria de traços de personalidade, descrita com
detalhes a seguir.
2.3 Psicologia da Personalidade
2.3.1
24
Descrição da Personalidade: Teoria dos Traços
De uma maneira geral, um traço de personalidade é uma forma de descrição para
uma dimensão básica da personalidade, realizando-se medições destes traços por meio de
questionários como uma maneira de quantificar as diferenças individuais existentes entre
as pessoas (CLONINGER, 2004).
A ideia em definir a personalidade através de características ou por um conjunto delas
remete aos antigos gregos. Hipócrates (470 - 377 a.C.) definiu o homem como sendo uma
composição de 4 tipos: melancólicos, sanguíneos, coléricos e fleumáticos. Estas são definições atribuídas às pessoas de acordo com os fluidos corpóreos, os quais o grego chamou de
humores; logo a química corporal determinava diretamente a personalidade (PASQUALI,
2000). Outra hipótese foi proposta por William Sheldon, em 1940, onde características
corporais de um humano determinam a personalidade. Entretanto, hipóteses que partiram destas premissas não se sustentaram mediante a avaliação científica (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2009).
Dois pesquisadores obtiveram grande êxito na definição de elementos que descrevem
a personalidade utilizando o conceito de traços, Gordon Allport e Raymond Cattell. O
primeiro definiu vários dos argumentos teóricos em favor da representação da personalidade através de traços, ao passo que Cattell definiu como determinar os traços relevantes
de maneira empírica, com a utilização de métodos de análise estatística.
Allport é referenciado como o criador do estudo da personalidade de maneira acadêmica, buscando estruturar suas ideias com bases empíricas e diferindo das linhas até
então dominantes em aspectos como, por exemplo, a forma de avaliação do objeto de
estudo (pessoas), já que abordava indivíduos psicologicamente saudáveis; a consideração
de fatores hereditários na constituição da personalidade e na unicidade do indivíduo.
Considerou um traço de personalidade como uma pré-disposição de responder de forma
igual ou similar a diferentes estímulos. Resumiu os traços e suas características da seguinte
maneira (ALLPORT, 1937 apud SCHULTZ; SCHULTZ, 2009):
• Traços são reais e existem em cada sujeito, não sendo construções ou abstrações
teóricas;
• Traços determinam comportamentos, motivando a busca por certos estímulos;
2.3 Psicologia da Personalidade
25
• Podem ser demonstrados de maneira empírica;
• São inter-relacionados e podem se sobrepor. Traços distintos podem atuar ao mesmo
tempo;
• Variam de acordo com a situação.
Ainda segundo Allport (apud SCHULTZ; SCHULTZ, 2009), os traços podem ter
intensidades variáveis, determinadas pela frequência com que determinada característica
é expressa, que se enquadram em 3 categorias:
Traços cardinais: uma característica influente que é percebida em quase todos os aspectos da vida de um indivíduo.
Traços centrais: Um conjunto de 5 a 10 traços que auxiliam na descrição do comportamento.
Traços secundários: Outros traços que são de fraca percepção.
A definição das características que deveriam ser compreendidas para a construção de
um modelo descritivo da personalidade é motivo de discussões. Gordon Allport iniciou
a partir da abordagem léxica, que consiste na determinação de traços, examinando as
construções linguísticas sistematicamente, como por exemplo através de um dicionário.
Entretanto, a linguagem pode ser de difícil entendimento e não apresenta uma interpretação livre de ambiguidades como as construções científicas (CLONINGER, 2004).
Os trabalhos de Cattell preenchem esta lacuna, no sentido de determinar de modo
mais específico uma lista de características universais. Sua abordagem realizou intenso uso
da análise fatorial, uma técnica estatística que se baseia em correlações (coeficiente de
correlação) entre algumas variáveis, estabelecendo uma medida de relacionamento entre
dois grupos numéricos, que podem ser explicadas em termos de fatores fundamentais
(underlying factors).
Utilizando os resultados da pesquisa léxica de Allport, Cattell analisou as informações
por meio da técnica estatística mencionada anteriormente e conseguiu determinar 16 fatores primários que descrevem características presentes na personalidade humana (NETO,
2010).
2.3 Psicologia da Personalidade
26
Algumas destas características teóricas e experimentais definidas nas pesquisas de
Allport e Cattell serviram como base para a criação de modelos para a avaliação da
personalidade, vistos em detalhes na seção 2.4.
2.3.2
Dinâmica da Personalidade: Motivação
O estudo da dinâmica da personalidade consiste em uma área em si mesma, com um
amplo escopo, onde as pressuposições a seu respeito variam de acordo com as teorias de
personalidade onde estão inseridas.
Na teoria psicanalítica, Freud institui a existência de duas pulsões: as de vida (Eros)
e as de morte (Thanatos), sendo o comportamento humano direcionado para a realização
destas pulsões. Do lado da teoria psicobiológica surgem duas abordagens: a teoria dos
instintos, que define um conjunto de padrões inatos que permitem a sobrevivência; e a
teoria da redução de pulsões (Drive Reduction Theory), desenvolvida por Clark Hull, que
promulga que os motivos ou necessidades geram tensões que devem ser saciadas.
De forma similar, a Teoria da Excitação afirma que somos levados a manter um certo
nível de excitação, a fim de nos sentirmos confortáveis. A excitação refere-se a um estado
de atividade emocional, intelectual e física (HEFFNER, 2001).
Em uma das interpretações mais populares sobre a motivação, a humanística, desenvolvida por Abraham Maslow, define-as enquanto uma hierarquia de necessidades distribuídas em 5 níveis: necessidades fisiológicas, de segurança, amor e aceitação, necessidades
de estima e auto-realização. A hierarquia é organizada na forma de uma pirâmide de prepotência, onde a motivação mais prioritária (base da pirâmide) domina a consciência para
servir como centralizador para o comportamento, até que seja saciada e dê lugar à motivação no nível seguinte. A precedência das necessidades é vista na figura 2.3 (MASLOW,
1943).
Apesar das diversas abordagens propostas, cada uma com as suas nuances, há um
ponto em comum nas teorias de motivação, que trata da existência de desejos básicos ou
necessidades de um indivíduo que correspondem a um estado interno ou uma condição
que servem para ativar um comportamento e dar a ele uma direção (HUITT, 2001).
2.4 Instrumentos de Avaliação da Personalidade
27
Figura 2.3: Pirâmide de necessidades de Maslow
Fonte: adaptado de Liu e Lu (2008, p. 1)
2.4
Instrumentos de Avaliação da Personalidade
Ao mesmo tempo em que desenvolveram seus modelos para a explicação do comportamento humano, os pesquisadores da área também construíram maneiras de aferir as
suas descobertas através de instrumentos para avaliação de personalidade. Nas seções a
seguir são vistos alguns destes instrumentos.
2.4.1
Five Factor Model
O Five Factor Model, também conhecido popularmente por “Big Five”, corresponde a
uma generalização empírica a partir da covariação de traços de personalidade (MCCRAE;
COSTA, 1999), organizando-os em cinco dimensões básicas: neuroticismo, extroversão,
abertura a experiências, amabilidade e vontade. Cada uma delas é descrita abaixo (JOHN;
SRIVASTAVA, 1999; MCCRAE; JOHN, 1992) e a definição de possíveis traços associados
é dada na tabela 2.2:
Neuroticismo (neuroticism): Demonstra tendências para sentimentos de aflição, agonia e outras formas de comportamento que derivam destas tendências. .
Extroversão (extraversion): Implica na aproximação entusiasta com o mundo material e social.
Abertura à experiência (openness to experience): Descreve a profundidade, dimensão e complexidade da vida mental e experimental de um indivíduo.
2.4 Instrumentos de Avaliação da Personalidade
28
Amabilidade (agreeableness): Associado aos aspectos mais humanitários de um indivíduo.
Consciência (conscientiousness): Caracterizados pelo pensar antes de agir e a comportamentos direcionados para a realização de tarefas e planejamento.
Tabela 2.2: Five Factor Model e traços relacionados
Fatores (Dimensões)
Traços de Nível Alto
Traços de Nível Fraco
Neuroticismo
nervoso, inseguro
relaxado, seguro
Extroversão
sociável, amigável
introvertido, quieto
Amabilidade
simpático, educado
crítico, rude
Consciência
organizado,
desorganizado, negli-
Abertura
discipli-
nado
gente
criativo, curioso
convencional, não criativo
Fonte: Li et al. (2007, p. 2)
2.4.2
Myers-Briggs Type Indicator
O Myers-Briggs Type Indicator (MBTI) é um questionário psicométrico desenvolvido
para medir preferências psicológicas na forma como indivíduos percebem o ambiente e
tomam decisões. Desenvolvido por Katharine Briggs e Isabel Myers, baseiam-se da teoria
junguiana de atitudes e tipos psicológicos para definir 16 tipos de personalidade. Um
exemplo de perguntas contidas neste instrumento é visto na tabela 2.3 (pág.29).
A estrutura da personalidade desenvolvida pelo psicólogo suíço Carl G. Jung consiste
em 3 dimensões de dicotomias (CLONINGER, 2004):
• Extroversão e introversão (extraverted and introverted );
2.4 Instrumentos de Avaliação da Personalidade
Tabela 2.3: Exemplo de perguntas presentes em um questionário MBTI.
Which answer comes closer to telling how you usually feel or act?
1. When you go somewhere for the day, would you rather
(a) plan what you will do and when, or
(b) just go?
2. Do you tend to have
(a) deep friendships with a few people, or
(b) broad friendships with different people?
3. When you have a special job to do, do you like to
(a) organize it carefully before you start, or
(b) find out what is necessary as you go along?
4. When something new starts to be fashion, are you usually
(a) one of the first to try it, or
(b) not much interested?
Fonte: Schultz e Schultz (2009, p. 119)
29
2.4 Instrumentos de Avaliação da Personalidade
30
• Racional e emocional (thinking and feeling) - Julgamento;
• Sensorial e intuitivo (sensing and intuition) - Percepção;
A primeira delas, compreende as atitudes do indivíduo com relação ao ambiente que
o envolve. A extroversão define que a pessoa é direcionada a experiências externas e a
introversão implica em um indivíduo preocupado com seus estados mentais internos.
As duas dimensões seguintes são conhecidas como funções psicológicas, que descrevem os processos de cognição, onde em cada ato mental, pelo menos uma destas 4 funções
(racional, emocional, sensorial e intuitivo) está atuando. Cada par destas funções é classificado como funções de julgamento (judgement) ou de percepção (perception) (BERENS;
NARDI, 2004; CLONINGER, 2004).
Trabalhando com estas concepções de Jung, Myers e Briggs trataram de desenvolver
um questionário com perguntas que sintetizassem estas características. Além disso, dissociaram as classes de julgamento e percepção das funções psicológicas e as tornaram uma
quarta dimensão, que tem por função explicar quais das funções psicológicas caracterizase por uma atitude extrovertida (BERENS; NARDI, 2004)
.
A seguir, uma lista com os 16 tipos obtidos pelas relações entre as atitudes e os tipos
psicológicos, propostos pelo método:
• ESTP (Extraversion, Sensing, Thinking, Perception);
• ESFP (Extraversion, Sensing, Feeling, Perception);
• ESTJ (Extraversion, Sensing, Thinking, Judgement);
• ENTJ (Extraversion, iNtuition, Thinking, Judgement);
• ENTP (Extraversion, iNtuition, Thinking, Perception);
• ENFP (Extraversion, iNtuition, Feeling, Perception);
• ESFJ (Extraversion, Sensing, Feeling, Judgement);
• ENFJ (Extraversion, iNtuition, Feeling, Judgement);
• ISTJ (Intraversion, Sensing, Thinking, Judgement);
2.4 Instrumentos de Avaliação da Personalidade
31
• ISFJ (Intraversion, Sensing, Feeling, Judgement);
• ISTP (Intraversion, Sensing, Thinking, Perception);
• INTP (Intraversion, iNtuition, Thinking, Perception);
• INTJ (Intraversion, iNtuition, Thinking, Judgement);
• INFJ (Intraversion, iNtuition, Feeling, Judgement);
• ISFP (Intraversion, Sensing, Feeling, Perception);
• INFP (Intraversion, iNtuition, Feeling, Perception);
2.4.3
Reiss Motivational Profile
O Reiss Motivational Profile of Fundamental Goals and Motivational Sensitives ou
simplesmente Reiss Motivational Profile (RMP) consiste em um questionário que avalia
aquilo que motiva os indivíduos, definindo as prioridades e intensidades de seus desejos
psicológicos (psychological needs) e apresentando conexões entre motivos e traços de personalidade (REISS, 2008). Estas motivações são categorizadas em 16 desejos fundamentais
(basic desires).
O RMP, enquanto ferramenta utilizada para determinar a intensidade dos motivos,
os classifica de acordo com três intensidades:
Desejos de forte intensidade (Strong-intensity desires): São desejos cardinais que
apontam necessidades acima da média (em torno de 20%), quando comparado com
a população em geral. Para satisfazer os motivos classificados nesta intensidade,
desenvolvem-se hábitos ou traços que saciem repetidas vezes estas motivações.
Desejos de fraca intensidade (Weak-intensity desires): São desejos secundários que
apontam necessidades abaixo da média (em torno de 20%), quando comparado com
a população em geral. De certo modo, há pouco interesse em satisfazer este tipo de
motivação de maneira constante.
Desejos de média intensidade (Average-intensity desires): São desejos centrais que
apontam necessidades que atingem a média quando comparadas com a população
em geral. A satisfação destes motivos pode ser atingida por meio das atividades
2.4 Instrumentos de Avaliação da Personalidade
32
normais do cotidiano e não apresentam traços significativos que os caracterizem,
podendo ora apresentar características de desejos cardinais, ora de desejos secundários.
Os 16 desejos fundamentais, definidos em Reiss (2008), são descritos a seguir:
Aceitação(Acceptance): Desejo universal presente naqueles que procuram evitar críticas e a rejeição. Motiva o afastamento de pessoas que não simpatizam com um
indivíduo ou o estado de nervosismo durante processos de avaliação e testes.
Curiosidade (Curiosity ): Desejo universal para a atividade intelectual, determinando
o prazer em se trabalhar os aspectos intelectuais e cognitivos.
Alimentação (Eating ): Desejo universal para o consumo de alimentos.
Família (Family ): Desejo para a criação de filhos, ligado diretamente aos instintos maternais e paternais. Define a atenção para as necessidades da família (pais, filhos e
irmãos) em detrimento das próprias.
Honra (Honor ): Desejo associado ao cumprimento de normas morais e códigos de conduta. Quando satisfeito, este desejo favorece expressões de lealdade, responsabilidade ou honestidade, enquanto o oposto gera culpa e vergonha.
Idealismo (Idealism): Desejo universal que motiva melhorias na sociedade, propiciando
o envolvimento em causas sociais e assistenciais.
Independência (Independence): Desejo caracterizado pela auto-suficiência, onde é
definido o modo como uma pessoa toma suas decisões. Motiva uma atitude individual sem a interferência de outros, estimulando o racionalismo em detrimento
de processos intuitivos.
Ordem (Order ): Estabelece o desejo por ambientes ordenados e estruturados, proporcionando senso de conforto, favorecendo atitudes de organização e planejamento de
atividades.
Atividade Física (Physical Activity ): Estabelece a necessidade da estimulação física.
Motiva as pessoas a realização de atividades que exigem vigor físico, como os esportes.
2.5 Considerações do Capítulo
33
Poder (Power ): Desejo pela manifestação de suas ideias ou poder de influência, que
leva à expressão de determinação, liderança e conquista de objetivos.
Romance (Romance): Desejo universal pelo sexo, que decresce à medida que a idade
de um indivíduo aumenta. Motiva a busca por uma melhor aparência e no direcionamento de forças para encontrar potenciais parceiros.
Acumulação (Saving ): Impulso pela acumulação de coisas, delineando a relação entre
um indivíduo e seus objetos e a sua atitude com relação a gastos financeiros.
Contato social (Social Contact): Desejo universal pela companhia de outros indivíduos. Cria uma necessidade psicológica para aquisição de amigos.
Status: Desejo por posição social, baseado na acumulação material, de títulos ou classe
social.
Tranquilidade (Tranquility ): Desejo universal para distanciamento de situações de
dor e ansiedade, influenciando as atitudes frente à segurança, ao perigo ou ao risco
financeiro.
Vingança (Vengeance): Desejo universal para o igualar condições com outras pessoas.
2.5
Considerações do Capítulo
Além das definições dos objetivos do projeto D.R.A.M.A. e um breve funcionamento
de sua arquitetura, neste capítulo estabeleceu-se o que é um humano virtual e quais as
exigências são consideradas para determinar sua credibilidade, uma importante característica para a coerência de um agente computacional, sendo que uma das principais é a
personalidade.
Apresentou-se o que é a personalidade no contexto da psicologia, sendo definido um
conjunto de elementos que devem ser analisados ao se propor uma definição abrangente
do tema.
Também definiu-se a forma como as teorias de personalidade são estruturadas em
termos de três fatores: sua descrição, sua dinâmica e seu desenvolvimento. Neste trabalho
dois deles são considerados: a descrição e a dinâmica.
2.5 Considerações do Capítulo
34
Para a descrição da personalidade, a teoria de traços de personalidade oferece os
fundamentos adequados à modelagem computacional, por conta do seu nível de aprofundamento descritivo e pela relação aproximada com a descrição de uma personagem
contida em um roteiro. Quanto à dinâmica, há o desafio de identificar as motivações ou
necessidades fundamentais que dirigem os comportamentos do indivíduos.
Ainda descreveram-se alguns métodos para a avaliação da personalidade de um indivíduo. Dos citados, o Reiss Motivational Profile, aponta dezesseis motivações universais
e é aquele que oferece a integração entre estas motivações e os traços de personalidade,
que estimulam a exibição de algum comportamento.
35
3 Modelo Computacional
Neste capítulo é descrito o modelo computacional utilizado para a representação de
personalidade, no intuito de expandir e adicionar novas funcionalidades a arquitetura do
projeto D.R.A.M.A.. Igualmente, são explorados alguns trabalhos relacionados já executados, os quais serviram de inspiração para a construção desta metáfora computacional.
3.1
Trabalhos Relacionados
Em Poznanski e Thagard (2005) é apresentado um modelo para simulação de personalidade que varia ao longo do tempo, o qual o autor chama de SPOT (Simulating
Personality Over Time), com o propósito de ser utilizada em jogos que seguem um esR
tilo semelhante ao The Sims
, jogo eletrônico que simula a vida de personagens. O
modelo proposto, tem sua arquitetura mostrada na figura 3.1 e tem quatro componentes
principais:
• A personalidade, sendo representada através do Five Factor Model ;
• As emoções, compostas por uma lista de 6 emoções básicas;
• As situações, sendo uma lista de ocorrências possíveis em um ambiente classificadas
de acordo com o efeito esperado no agente;
• Os comportamentos finais possíveis do agente.
Outros dois elementos, utilizados como entradas, oferecem suporte à lista de situações
e são eles: o relacionamento, que define o tipo de relação entre dois agentes (positiva ou
negativa); e o humor (mood ), que pode ser definido como neutro, bom ou ruim.
Através de uma rede neural, implementada no simulador de redes neurais JavaNNS,
os relacionamentos entre os nós são efetuados com base em valores numéricos associados aos nós dos componentes de personalidade. Desta maneira a decisão sobre quais
comportamentos são adequados é dada após o processamento da rede.
3.1 Trabalhos Relacionados
36
Figura 3.1: Modelo computacional SPOT
Fonte: traduzido de Poznanski e Thagard (2005, p. 8)
Outro trabalho associado a modelos de personalidade e que faz uso de redes neurais é
o desenvolvido por MacNamee e Cunningham (2003), pelo qual descrevem um modelo de
personalidade, para a introdução de comportamentos diversos em Non Player Characters
que interagem em um ambiente virtual que simula um bar. Como citado na seção 2.1,
NPCs são agentes que servem como apoio à interatividade, mas que não são autônomos
no sentido de predisporem-se a uma ação.
Apesar de apresentar estrutura similar ao modelo explicado anteriormente, traz uma
importante contribuição na definição dos elementos que são universais no comportamento
entre indivíduos. Enquanto que Poznanski e Thagard (2005) definem apenas uma dimensão para relacionamentos entre indivíduos (like/dislike), MacNamee e Cunningham (2003)
estabelecem cinco aspectos presentes no comportamento humano quando em sociedade
(MACNAMEE; CUNNINGHAM, 2003; WISH et al., 1976):
• Gostar ou não gostar (friendly or hostile);
• Atratividade (attractedness);
• Dominante ou submissivo (equal or unequal );
• Intimidade (emotional or task-oriented );
• Interesse (Interestedness);
De outra forma, Kshirsagar e Magnenat-Thallman (2002) propõem um modelo multicamadas para a personalidade que é centrado nos humores. Um humor corresponde à
3.2 Arquitetura da Metáfora Computacional
37
camada que realiza a conexão entre a personalidade e as emoções, esta última controlada
pelo humor, representando uma condição mental prolongada. O propósito deste modelo é
para a utilização nos agentes de conversação ALICE 1 , um projeto open source de chatbots
que faz uso de AIML2 .
Mediante um texto de entrada contendo marcadores de emoção que possuem probabilidades, após o processamento realizado pelo ALICE, é submetido ao modelo de personalidade. Este modelo é uma rede bayesiana onde, a partir do humor atual e do marcador
de emoção recebido, atualiza o estado do robô de conversação e aponta para o próximo
estado emocional a ser exibido pelo robô.
3.2
Arquitetura da Metáfora Computacional
Como visto na figura 2.2 (pág. 19), a arquitetura atual do projeto não contempla o
uso de personalidade. Uma mudança parcial da arquitetura do D.R.A.M.A. é proposta
em Thume (2012), que faz parte de um outro trabalho integrante do projeto.
Esse trabalho relacionado propõe o desenvolvimento do módulo Individual Actions
Module, que influencia no fluxo dos dados de outros módulos previstos na arquitetura do
projeto.
A nova configuração dos fluxos de dados é exibida no anexo A.1 (pág. 71). Nele,
há a definição do posicionamento de um módulo para a personalidade, foco do estudo
deste trabalho, o qual tem sua estrutura exibida na figura 3.2 e é descrito em detalhes
nas seções a seguir.
3.2.1
Visão Geral
O modelo recebe como entrada a descrição da personalidade de uma personagem, em
termos de traços que são mapeados para os desejos ou motivações básicos correspondentes.
Estes desejos são distribuídos em três níveis, de acordo com a sua intensidade e resultam
em objetivos priorizados. Esta lista com os objetivos relevantes, influenciam as ações a
serem realizadas pelo indivíduo.
1
2
Artificial Linguistic Internet Computer Entity
Artificial Intelligence Mark-up Language
3.2 Arquitetura da Metáfora Computacional
38
A lista de objetivos e ações se relaciona com outros três fatores externos à personalidade, mas que determinam o comportamento de uma pessoa: os relacionamentos, que
tratam da interação com outros indivíduos; as emoções, que serão representadas por um
modelo de humores e o ambiente em que está inserido o indivíduo.
Estes três elementos, combinados com os objetivos almejados pelo sujeito, direcionam
o seu possível comportamento.
Figura 3.2: Visão geral da metáfora computacional
Fonte: do Autor
3.2.2
Descrição dos Módulos
A primeira parte da arquitetura do modelo consiste no recebimento de uma lista, proveniente de um script, com a descrição das personagens. Esta descrição é dada na forma
3.2 Arquitetura da Metáfora Computacional
39
de traços ou características que descrevam uma personagem (atlético, guloso, indeciso,
neurótico, obediente, etc). Este fluxo de características é sujeito a uma função de mapeamento que realiza a correlação de cada uma das características com um dos 16 desejos
básicos desenvolvidos por Reiss (2008).
Por exemplo, uma personagem que seja indecisa estaria associada a um valor de forte
intensidade para o desejo de aceitação ou ordem; um sujeito guloso, apresentaria um valor
de forte intensidade para alimentação e assim sucessivamente, de acordo com a tabela 3.1,
que mostra um fragmento dos relacionamentos entre traços e motivos. A tabela completa
possui aproximadamente 500 traços.
Após o mapeamento entre traços de personalidade e motivos fundamentais, são definidas as intensidades destes últimos nas três categorias, conforme já descritas na seção
2.4.3, em forte, média ou fraca intensidades.
Tabela 3.1: Dicionário parcial de traços de personalidade
Traço
Motivo provável
Estereótipo
Atlético
↑ Atividade Física
Atletismo
Guloso
↑ Alimentação
Apetite
Indeciso
↑ Aceitação
Dúvida
Neurótico
↑ Tranquilidade
Ansiedade
Obediente
↓ Poder
Submissivo
Fonte: adaptado de Reiss (2008, p. 157)
O posicionamento em uma das três categorias interfere diretamente em duas características dos desejos fundamentais: a saciedade e o valor intrínseco.
A saciedade diz respeito a quanto (intensidade e frequência) o indivíduo tentará satisfazer um motivo. No modelo proposto, o nível de saciedade corresponderá a um valor
inteiro de 0 a 100, que respeitará as intensidades definidas no mapeamento realizado
3.2 Arquitetura da Metáfora Computacional
40
anteriormente.
Esses valores foram definidos arbitrariamente, visto que a literatura de apoio não
oferece meios para confirmá-los.
O limite para os níveis de saciedade, respeitando a sua categorização quanto à intensidade do desejo, é visto a seguir:
• de 0 a 20 para desejos de baixa intensidade;
• de 21 a 80 para desejos de intensidade moderada;
• de 81 a 100 para desejos de forte intensidade;
Os níveis de saciedade ainda definem a quantidade de ações possíveis que um indivíduo
tem disponíveis para satisfazer suas motivações.
Uma pessoa gulosa, com o desejo básico de alimentação em um nível de valor 100,
irá satisfazer este desejo com um maior número de ações ligadas à alimentação (desde
variações de cardápio ou quantidade e alimentos consumidos); um indivíduo atlético,
com parâmetros similares, não se contentaria apenas com uma corrida de 30 minutos,
mas sim procuraria realizar uma série de outras atividades físicas a fim de satisfazer seu
motivo fundamental. Por outro lado, um sujeito obediente, com saciedade em nível 15
apresentaria momentos de submissão com bastante frequência.
No mesmo patamar das saciedades estão os valores intrínsecos, os quais relacionamse com objetivo central do motivo fundamental e direcionam o domínio das ações. A
motivação para aceitação reflete na necessidade de evitar críticas; a curiosidade busca a
aquisição de conhecimento e assim por diante.
As ações que o agente tem acesso são originárias de um banco de dados externo
(repertório de ações), provido pelo modelo descrito no anexo A.1. Visto que o projeto
possui o objetivo de criar atores digitais que seguem o estilo talking heads, ou seja, agentes
que possuem apenas animações com a cabeça, para o desenvolvimento dos testes deste
modelo, um repertório de ações simplificado foi criado, com base nas expressões faciais
fundamentais, descitas por Ekman (1992), que compreendem a: raiva, desprezo, desgosto,
medo, alegria, tristeza e surpresa.
A definição quanto ao número de ações que serão efetivamente utilizadas pelo agente
3.2 Arquitetura da Metáfora Computacional
41
estão definidas no conjunto motivacional, que contém a lista com os motivos, objetivos e
níveis de saciedade de cada um dos desejos, mapeados dos traços de personalidade.
Outros três componentes são utilizados para a determinação do comportamento do
agente computacional: emoções, relacionamentos e ambientes ou situações.
O modelo de representação para as emoções é inspirado por Lang (1995), onde assumese que as emoções são disposições a ações, refletindo na ativação e preparação para uma
ação. Neste contexto, elas correspondem a um modelo que sintetiza as emoções humanas
em duas dimensões: a de excitação (arousal ), que corresponde a intensidade de um estímulo (calma e excitação); e a valência afetiva (affective valence), em que os estímulos são
classificados como positivos ou negativos (atração e prazer/aversão e desprazer).
No modelo, a componente emoção é composta por dois parâmetros. Um representando
a excitação e outro a valência afetiva, ambos com intervalos reais definidos em [-1,1]. A
junção destes dois valores resulta em um tipo de emoção vivenciada em alguma situação
e têm exemplos exibidos na figura 3.3.
Figura 3.3: Dimensões de emoção e exemplos
Fonte: traduzido de MacNamee e Cunningham (2003, p. 5)
Para os relacionamentos, a pesquisa desenvolvida por Wish et al. (1976) e o modelo
desenvolvido por MacNamee e Cunningham (2003) serviram como base. Como já definido
em 3.1 – Trabalhos Relacionados, MacNamee e Cunningham (2003) utilizam cinco dimensões para caracterizar os relacionamentos. No entanto, para este trabalho, respeitam-se
as dimensões definidas pela Psicologia identificadas em Wish et al. (1976):
3.2 Arquitetura da Metáfora Computacional
42
1. Gostar ou não gostar (friendly or hostile);
2. Atratividade (attractedness);
3. Dominante ou submissivo (equal or unequal );
4. Intimidade (emotional or task-oriented );
Estes parâmetros também estão definidos em valores no intervalo fechado de [-1 a 1].
Desta forma, uma personagem que possuir as dimensões de atratividade e dominância
em 0.80, influenciará comportamentos que levem a aproximar-se dos agentes e estabelece
com eles uma relação de dominância. A intensidade destes relacionamentos será efetuada
no momento em que os parâmetros de um outro agente presente forem confrontados.
Por fim, há uma lista de ambientes ou situações as quais uma personagem estaria
sujeita. Representada por uma lista literal de lugares e situações, esta componente permite
que seja realizado um ajuste fino nos comportamentos observados.
Esta lista foi definida com base na observação das situações e ambientes vivenciados
nos exemplos utilizados para a validação do modelo e estão definidas como:
1. Divertida;
2. Competitiva;
3. Afetiva;
4. Rejeição;
5. Perigosa;
6. Segura;
7. Auxílio;
8. Desconhecida;
9. Neutra;
O inter-relacionamento destes elementos: conjunto motivacional, emoções, lista de
relacionamentos e lista de ambientes, ocorre na função de integração (integrador), onde
serão realizados processamentos para a escolha de uma ação coerente para o agente. No
3.3 Considerações do Capítulo
43
capítulo 4 – Desenvolvimento, vê-se como isto foi desenvolvido na forma de uma rede
neural artificial.
Após o processamento na função de integração, serão sugeridas ações possíveis para
uma função de planejamento. Outro dado que será disponibilizado para um módulo
externo a esse modelo de personalidade são os objetivos do agente, que alimentarão uma
base de dados, identificada no modelo como “desejos”.
Estes dois elementos, planejamento e base de desejos, não fazem parte do escopo deste
trabalho e têm o seu desenvolvimento desconsiderado na implementação desta metáfora
computacional.
3.3
Considerações do Capítulo
Neste capítulo foram explorados alguns trabalhos relacionados, apresentando seus
principais componentes e conceitos desenvolvidos, que serviram de inspiração para o desenvolvimento da metáfora computacional. Em seguida são descritos cada um dos elementos utilizados para a metáfora, apresentando a arquitetura correspondente ao fluxo
das informações (figura 3.2), que parte do mapeamento das características de um personagem nos 16 desejos fundamentais, constituindo um conjunto motivacional, o qual será
integrado com as demais dimensões que influenciam no comportamento de um agente:
emoção, relacionamentos e ambientes.
No desenvolvimento deste modelo computacional, os elementos estarão dispostos em
entradas, correspondendo a:
• Conjunto Motivacional
– intensidades dos 16 desejos universais (REISS, 2008).
• Emoções
– intensidade e valência afetiva.
• Relacionamentos
– dominância, afetividade, intimidade e atratividade.
• Ambientes/Situações
3.3 Considerações do Capítulo
44
– divertido, competitivo, afetivo, rejeição, perigoso, seguro, auxílio, desconhecido, neutro.
Tendo como saída um repertório de ações, definido por:
• Repertório de ações
– Expressões universais (EKMAN, 1992): raiva, desprezo, aversão, medo, alegria,
tristeza, surpresa.
Os detalhes da interação entre entradas, saídas e a interação entre estes elementos são
apresentados no capítulo seguinte.
45
4 Desenvolvimento
Este capítulo apresenta as etapas do desenvolvimento da metáfora computacional
proposta no capítulo 3. Inicialmente são apresentados o conjunto de ferramentas utilizados
para a implementação dos requisitos que foram definidos e em seguida é discutida a
maneira como o desenvolvimento foi realizado para duas etapas do modelo: o mapeamento
dos traços de personalidade e o processo de relacionamento com os outros módulos do
modelo (ambientes, emoções e relacionamentos).
4.1
Ferramentas
O desenvolvimento do trabalho foi realizado na linguagem Python, com o apoio das
bibliotecas xmltodict e a pybrain, além da implementação em Python para a SQLite. A
descrição e motivos de utilização destas ferramentas são expressos a seguir:
Linguagem Python: a linguagem Python1 trata-se de uma linguagem interpretada
de alto nível e multiparadigma, com uma sintaxe clara e expressiva. Criada por
Guido Van Rossum, em 1991, permanece sendo desenvolvida por sua comunidade
de usuários sob uma licença aberta.
O projeto D.R.A.M.A. estabeleceu que seus atores digitais e animações seriam desenvolvidos na suíte de criação de aplicações 3D Blender 2 . A linguagem Python é
a base do desenvolvimento de add-ons e plugins, responsáveis por estender a funcionalidade deste software, sendo a linguagem escolhida para o desenvolvimento de
trabalhos associados ao projeto.
Além da sintonia com os objetivos do projeto D.R.A.M.A., outras características
como a extensa documentação e a possibilidade de ser executada em múltiplas
plataformas, contribuem para a escolha desta linguagem de programação para o
desenvolvimento da metáfora computacional proposta.
1
http://www.python.org
2
http://www.blender.org
4.1 Ferramentas
46
Biblioteca xmltodict: As informações a respeito dos traços de personalidade de um
personagem são organizadas em arquivos XML. A biblioteca xmltodict3 possibilita a
análise léxica e sintática para a linguagem XML (Linguagem de marcação extensível)
e foi utilizada para organização destes dados para o processo de mapeamento dos
traços de personalidade em desejos fundamentais, organizando estas informações em
dicionários de dados, durante o tempo de execução.
Biblioteca pybrain: A biblioteca pybrain4 corresponde a uma implementação modular de diversos algoritmos para aprendizagem de máquina, desenvolvida para a
linguagem Python(SCHAUL et al., 2010). Tem por objetivo ser de fácil utilização,
oferecendo uma forma flexível e poderosa para a utilização, teste e comparação dos
algoritmos para aprendizagem de máquina.
O desenvolvimento da metáfora computacional foi realizado na forma de uma rede
neural, justificando o uso desta biblioteca.
SQLite: O SQLite5 corresponde a um sistema gerenciador de banco de dados relacionais
desenvolvido em uma biblioteca C. Esta biblioteca, em contraste com os sistemas de
gerenciamento tradicionais, não é um processo que executa em separado, atendendo
requisições de uma aplicação cliente em uma máquina servidora, mas atua como
parte integral da aplicação.
Implementa parte do padrão SQL e garante também conformidade com as propriedades ACID, sendo adequado para criação e manipulação de bases de dados em
aplicações que armazenam dados localmente, sendo utilizado em aplicações desktop,
browsers e sistemas embarcados.
No desenvolvimento deste trabalho, tem função de armazenar as informações referentes aos traços de personalidade e aos desejos fundamentais, auxiliando no processo de mapeamento entre traços e desejos.
3
https://github.com/martinblech/xmltodict
4
http://pybrain.org/
5
http://www.sqlite.org/
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
4.2
47
Implementação da Metáfora Computacional
A implementação da metáfora computacional consiste em duas fases distintas que,
quando combinadas, resultam na escolha das ações possíveis de execução pelos agentes
computacionais. A seguir são tratados os detalhes no desenvolvimento destas duas etapas.
A primeira etapa, consiste na criação do conjunto motivacional da personagem, que é
resultado do mapeamento entre suas características para os desejos fundamentais e corresponde efetivamente à personalidade do ator digital. Em seguida, é descrito o processo de
integração entre as informações reunidas no conjunto motivacional com as demais partes
do modelo: lista de ambientes, emoções e relacionamentos.
4.2.1
Conjunto Motivacional
A primeira fase da implementação da metáfora computacional consiste na definição
das características de um personagem e na associação entre estas características, que correspondem aos traços de personalidade, com os desejos fundamentais, já tratados na seção
2.4.3. Na arquitetura original do projeto D.R.A.M.A., estas características serão extraídas
automaticamente de um script, contendo a descrição dos personagens; no entanto, neste
trabalho estas características já estarão definidas, com base na descrição dos personagens
usados para os exemplos 6 .
As características, que consistem em uma lista de adjetivos para cada personagem, são
organizados em um arquivo XML e suas informações servirão como entradas no modelo.
O primeiro nível hierárquico corresponde às definições para as personagens, consistindo no
nome da personagem e no conjunto de traços identificados. O arquivo reúne as informações
de todos os personagens, e tem sua estrutura demonstrada no algoritmo 4.1.
Cabe aqui lembrar que a lista de traços pode não ser capaz de correlacionar qualquer característica, uma vez que ela possui um número limitado de traços e que termos
sinônimos podem não existir no banco de dados desenvolvido.
6
Os exemplos que utilizados foram os quadrinhos da “Turma da Mônica”, sendo tratados no capítulo
5. As descrições das personagens que auxiliaram na definição dos traços podem ser encontrados em:
http://www.monica.com.br/ingles/personag/t-monica.htm
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
48
Algoritmo 4.1: Estrutura XML para descrição das características de um personagem
1
2
<personality>
<character>
3
<name>Maggy</name>
4
<trait>Gluttonous</trait>
5
<trait>Sweet</trait>
6
<trait>Sympathetic</trait>
7
8
</character>
</personality>
9
A operação seguinte é a de mapeamento destas características nos desejos fundamentais. Reiss (2008) identifica uma lista de aproximadamente 500 traços de personalidade
e os correlaciona com os 16 desejos fundamentais, definindo ainda suas intensidades em
alta ou baixa.
Este relacionamento entre traços e características foi codificado na forma de um banco
de dados, contendo duas tabelas. A principal delas, traits_dictionary, reúne as informações sobre o traço de personalidade, o desejo a que ele corresponde, a intensidade do
desejo e o estereótipo a que ele pertence. A tabela seguinte, basic_desires, é uma tabela
auxiliar que contém os desejos fundamentais e tem como função restringir o acesso da
aplicação aos 16 desejos conhecidos, além de disponibilizar informações extras, como o
objetivo e o valor intrínseco do desejo.
Para cada traço encontrado no arquivo de entrada, é estabelecido um relacionamento
com um desejo e definida a sua intensidade. Estas intensidades estão restritas a níveis
altos e baixos. Uma vez que o conjunto motivacional de um personagem é definido com o
uso de todos os desejos básicos, aqueles que não estão relacionados a nenhum traço, são
definidos como de média intensidade.
Independente dos níveis de intensidade, seus valores foram definidos de forma aleatória, respeitando as definições impostas no capítulo 3, como mostra o algoritmo 4.2.
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
49
Algoritmo 4.2: Definição aleatória da intensidade dos desejos
1
2
if intensity == ’Strong’:
intensity = random.randrange(81,100)
3
4
5
if intensity == ’Weak’:
intensity = random.randrange(0,20)
6
7
# present_desires corresponde a uma lista de desejos nao definidos no
mapeamento
8
9
if desire not in present_desires:
intensity = random.randrange(21,80)
10
11
O resultado final deste mapeamento é exemplificado no algoritmo 4.3 e se estrutura
em um outro arquivo XML, contendo apenas as características referentes ao conjunto
motivacional de um personagem. Informações como objetivo e valores intrínsecos dos
desejos serão utilizados por outras partes da arquitetura geral do projeto, enquanto que
as suas intensidades servirão como entradas para o processo de integração, que reunirá
estes dados com as outras partes da metáfora.
Algoritmo 4.3: Exemplo reduzido de saída, para um personagem
1
2
3
<character name="Monica">
<basicdesires>
<desire>
4
<name>Tranquility</name>
5
<goal>Safety</goal>
6
<value>Caution</value>
7
8
9
10
<intensity>7</intensity>
</desire>
</basicdesires>
</character>
11
Ao término da identificação das características do personagem e consequente mapeamento para a construção de um conjunto motivacional para um ator digital, inicia-se um
procedimento que reúne e processa estas informações, correlacionando-as aos outros aspectos que influenciam no comportamento do ator digital autônomo. A esta etapa deu-se
o nome de integração e é tratada em detalhes a seguir.
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
4.2.2
50
Outros Módulos
Na implementação do modelo computacional, a etapa de integração é responsável
por quantificar e combinar um conjunto de fatores externos à personalidade com os dados
fornecidos pelo conjunto motivacional, o que resultará no comportamento do agente. Para
a realização desta tarefa foi escolhida a implementação do modelo sob uma rede neural
artificial, um método para classificação de dados proveniente da inteligência artificial.
O desenvolvimento desta estrutura foi realizado utilizando-se da biblioteca pybrain,
desenvolvida para a linguagem Python e que reúne uma série de funções e algoritmos para
aprendizado de máquina.
Uma rede neural artificial corresponde a um modelo computacional, inspirado no
funcionamento de um cérebro humano, que realiza um massivo processamento paralelo de
informação executado por simples unidades de processamento (neurônios), assemelhandose a um cérebro biológico em dois aspectos (HAYKIN, 2007):
• O conhecimento do ambiente é adquirido por meio de um processo de aprendizado;
• O conhecimento adquirido é armazenado nas interconexões dos neurônios (sinapses).
Figura 4.1: Modelo de um neurônio artificial
Fonte: Adaptado de (HAYKIN, 2007)
Computacionalmente, um neurônio artificial é representado como na figura 4.1. Na
figura, W(nj) correspondem a pesos que simulam as sinapses; xn são os valores de entrada
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
P
e
corresponde a soma ponderada que define um nível de ativação α, dado por:
αi =
n
X
wij xj
51
(4.1)
j=1
Os níveis de ativação, como nas sinapses humanas, podem ser definidos em dois tipos:
excitatórias e inibitórias. As excitatórias possuem valores positivos, wnj > 0; as inibitórias
possuem valores negativos, wnj < 0.
Finalmente, uma função de ativação ϕ que age sob α, é responsável pela normalização
do valor de saída do neurônio em um intervalo típico [0,1] ou, de maneira alternativa, [-1,1]
e representa o valor final da rede.
Na metáfora computacional, são usadas como entradas 31 elementos, definidos na
seção 3.3 e que na rede neural correspondem aos neurônios:
• 16 neurônios, para a representação dos desejos fundamentais de uma personagem
(REISS, 2008);
• 2 neurônios para as duas dimensões de emoção: valência afetiva e intensidade;
• 4 neurônios para as dimensões de relacionamento: dominância, afetividade, intimidade e atratividade;
• 9 neurônios para descrição dos ambientes ou situações;
As saídas são descritas por 7 neurônios, representado as emoções básicas, identificadas
na seção 3.2.2: raiva, desprezo, desgosto, medo, alegria, tristeza e surpresa.
Os valores definidos tanto para as entradas, como para as saídas, respeitam intervalos
fechados em [-1,1]. Estes intervalos já foram definidos na descrição do modelo computacional para as dimensões de emoções e relacionamentos. No entanto, os valores para a
intensidade dos desejos básicos, definidos no intervalo [0,100], sofreram uma modificação
para se adequar à rede neural, sendo divididos por um fator 10.
Por sua vez, os ambientes possuem uma representação absoluta, quantificada em 0
ou 1, representando o fato da personagem estar ou não inserida em um ambiente com as
características identificadas pelo seu rótulo.
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
52
Com relação à função de ativação, optou-se pelo uso da função sigmoide, definida
na equação 4.2 e utilizada na maioria das redes neurais modernas por possuir a característica de ser diferenciável (não-linear) e de reproduzir período refratário7 dos neurônios
biológicos.
ϕ(α) =
1
1 + e−α
(4.2)
Quando são reunidos grupos de neurônios artificiais, tem-se formada uma rede neural
artificial que pode possuir diferentes arquiteturas, de acordo com a organização destes
neurônios, exercendo influência na forma de aprendizado da rede.
As arquiteturas para redes neurais, em geral, estão relacionadas a 3 grupos (HAYKIN,
2007):
• Redes Perceptron (Feedforward Networks): São redes onde os neurônios estão organizados em duas camadas, em que o fluxo de dados ocorre das entradas
para as saídas, onde será processada a informação. São adequadas para problemas
estritamente lineares;
• Redes Perceptron Multicamadas (Multilayer Feedforward Networks): É
uma evolução do modelo anterior em que são adicionadas uma ou mais camadas
ocultas (hidden layers), onde são realizados os processamentos de informação. Estas
camadas ocultas permitem a resolução de problemas mais complexos e possibilita a
rede adquirir uma perspectiva mais generalizada dos resultados;
• Redes Recorrentes (Recurrent Networks): As redes recorrentes diferenciamse das arquiteturas anteriores por possuírem pelo menos um laço de realimentação.
Este laço pode ser entendido como o uso dos resultados gerados pelas entradas que,
além de servirem para as camadas de saída, podem ser utilizados novamente pelas
próprias entradas. Este tipo de arquitetura possui significativo impacto no processo
de aprendizado da rede.
A disposição destes neurônios, observando-se a implementação da metáfora, obedece
aos preceitos da arquitetura Perceptron de múltiplas camadas sendo organizada em 3
7
O período refratário corresponde ao tempo para que a membrana que recobre os neurônios biológicos
esteja apta a receber um segundo estímulo.
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
53
camadas, dispostos como na figura 4.2: uma de entrada, contendo os 31 neurônios correspondendo aos fatores para representação da personalidade; uma camada de saída, com os
7 comportamentos possíveis e uma camada oculta contendo 55 unidades.
Uma vez que não há consenso quanto ao número necessário de unidades na camada
oculta para o funcionamento ideal da rede neural, o estudo conduzido por Elisseeff e
Paugam-Moisy (1996) serviu como base na definição deste valor. A equação utilizada
para a definição deste número de unidades ocultas é vista a seguir:
Noculto
Ntreinamento ∗ Nsaida
=2
Nentrada + Nsaida
(4.3)
De acordo com a equação 4.3, o número de unidades ocultas da rede (Noculto ) é resultado da razão entre a multiplicação do número de dados disponíveis para o treinamento
(Ntreinamento ) e o número de saídas da rede (Nsaida ) pela soma das entradas (Nentrada )
pelas saídas.
Figura 4.2: Representação de um Perceptron Multicamada
Fonte: (HAYKIN, 2007)
As redes neurais artificiais possuem a característica de aprender por exemplos e realizar interpolações e extrapolações do que aprenderam e uma forma de obter este aprendizado é na determinação da intensidade das conexões entre os neurônios. O processo
de aprendizagem ocorre de maneira iterativa, ajustando-se parâmetros e os pesos das
conexões entre as unidades que compõem a rede neural, que ao final armazenam o conhecimento do ambiente (BRAGA et al., 2000).
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
54
Diversas abordagens para o treinamento destas redes foram desenvolvidas, dividindose em dois paradigmas principais: aprendizagem supervisionada e aprendizagem nãosupervisionada. Na aprendizagem supervisionada há a interferência de um mediador
externo, que fornece os dados de entrada à rede, cabendo a ela a identificação dos padrões;
enquanto que no paradigma não-supervisionado é a própria rede quem infere os resultados
finais, com base nas entradas que lhe são fornecidas.
Optou-se por desenvolver a metáfora computacional no modelo supervisionado, com
o uso do algoritmo de aprendizado back-propagation. A escolha é pautada tanto pela
arquitetura que foi proposta para a rede neural, como pelo conhecimento das relações
entre as dimensões que compõem a personalidade e o seu comportamento resultante,
utilizados para os casos de exemplo.
O algoritmo back-propagation é um método supervisionado que utiliza pares (entrada,
saída) e que, através de um mecanismo de correção de erros, realiza ajustes nos pesos da
rede. O processo de treinamento ocorre em duas fases, cada uma percorrendo a rede em um
sentido. A primeira fase, conhecida como forward, define a saída da rede correspondente
a um padrão de entrada; a fase seguinte, backward, utiliza-se da saída desejada e a saída
encontrada pela rede como forma de atualizar os pesos das conexões (BRAGA et al.,
2000).
Os conjuntos de treinamento utilizados para alimentar o algoritmo de aprendizagem
foram construídos manualmente. Com base nas observações de aproximadamente 100 histórias em quadrinhos da “Turma da Mônica” 8 , foram criados 150 casos para treinamento.
Os valores foram dispostos em um vetor com 31 posições representando as entradas e identificados por um único valor de saída, quantificado com um valor de 0 a 6, relacionando
a entrada a um rótulo de saída que compreende aos comportamentos observados.
Após a fase de treinamento da rede, foi realizada a sua validação com base na comparação das respostas obtidas pelo modelo computacional e aquelas identificadas em um
questionário para captar a percepção humana das expressões esperadas para uma personagem. Também foram executados alguns exemplos para demonstração dos diferentes
comportamentos gerados com o uso deste modelo computacional. As informações da fase
8
A “Turma da Mônica” é uma série de histórias em quadrinhos criada por Mauricio de Sousa no ano
de 1959. É a principal série criada pelo cartunista, possuindo ainda minigrupos, nos quais os personagens
passam por várias peripécias cotidianas.
4.2 Implementação da Metáfora Computacional
de testes e exemplos são explicados no capítulo a seguir.
55
56
5 Testes e Resultados
Nesta seção são avaliados os resultados do questionário sobre a percepção humana
dos comportamentos esperados para personagens inseridos em uma história, com base
apenas na descrição da cena e conhecimento prévio das personalidades das personagens
envolvidas.
São exibidos os dados mais relevantes ao desenvolvimento da proposta de validação,
sendo que informações detalhadas a respeito das respostas dadas no questionário estão
presentes no anexo A.2.
Depois de apresentados os dados obtidos por meio desta consulta, é realizada a comparação entre as respostas de maior incidência neste questionário, com aquelas obtidas pelo
uso modelo computacional nas mesmas situações usadas para a composição do conjunto
de perguntas.
5.1
Caso de Exemplo
O exemplo utilizado para a realização dos testes com o público foi retirado de uma
história em quadrinhos1 , apresentada na figura 5.1.
A história foi dividida em 6 quadros, onde em todos era dada a descrição da cena
juntamente com a pergunta: Considerando-se o conjunto motivacional da personagem
X. Qual o comportamento esperado para ela?. Sem que fossem fornecidas ilustrações, o
participante deveria optar por uma opção entre sete alternativas de comportamento que
ele considerasse coerente.
As próximas seções apresentam os resultados finais obtidos com este questionário e
sua relação com as informações obtidas pelo modelo computacional.
1
http://www.monica.com.br/comics/tabloide/tab010.htm
5.2 Dados do Questionário
57
Figura 5.1: História utilizada para o questionário - Turma da Mônica
5.2
Dados do Questionário
Antes do início do questionário, cada participante preencheu uma ficha virtual contendo informações a respeito do sexo, idade e grau de escolaridade. No total, 124 pessoas
preencheram estas informações prévias e estavam aptas a iniciar o questionário. Deste
número, 68 (54.8%) são mulheres e 53 (42.7%) são homens; 60.4% dos participantes
concentra-se na faixa etária entre 15 a 34 anos, sendo que 69.3% declararam cursar ou já
ter concluído o ensino superior.
O primeiro quadro disponível para análise é ilustrado na figura 5.2, onde é questionado sobre o comportamento das personagens, enquanto brincam de cabo-de-guerra.
Foram obtidas 124 respostas válidas para o comportamento da personagem Mônica e 119
respostas para o comportamento de Magali.
Tendo à disposição somente a descrição da cena e as informações do conjunto motivacional das personagens, o comportamento esperado para Mônica foi definido como
5.2 Dados do Questionário
58
Figura 5.2: Tira utilizada para a primeira pergunta do questionário
raiva, por 50 votos; por sua vez, Magali deve apresentar um comportamento de alegria,
de acordo com 77 pessoas.
A segunda pergunta refere-se aos acontecimentos ilustrados na figura 5.3, onde é
analisado o comportamento observado após o recado dado pela mãe de Magali, o que
envolve novamente as duas personagens. Os resultados obtidos para as perguntas deste
quadro foram: a expressão de alegria de Magali, com 107 votos (de um total de 122) e a
de surpresa para Mônica, com 34 votos (de um total de 117).
Figura 5.3: Tira utilizada para a segunda pergunta do questionário
Para o terceiro quadro, foi avaliada a reação de Mônica à derrota no cabo-de-guerra.
Houve a participação de 113 pessoas, onde a maioria, correspondente a 69 votos, indicou
um comportamento de raiva.
Na continuidade da história, a personagem Mônica convida um outro amigo para
participar da brincadeira. O personagem Cascão passa a fazer parte da história e a sua
reação ao convite de Mônica é considerada para a pergunta do quadro 4 (figura 5.4).
De acordo com os entrevistados, a reação mais coerente para Cascão é a de alegria,
apontada com 43 votos (37.4%). Neste quadro, outra resposta que obteve votos significativos foi a expressão de surpresa que compreende a 31.3% das escolhas.
Cascão é novamente protagonista no questionamento realizado no quadro 5, quando a
chuva se aproxima. Para a maior parte dos participantes do questionário, nessas condições
a personagem deve demonstrar medo (63 votos).
Por fim, é realizada a análise do sexto quadro, onde há a fuga de Cascão, por medo,
5.3 Dados do Modelo Computacional
59
Figura 5.4: Tiras utilizadas para os quadros 3, 4, 5 e 6.
da chuva e uma nova derrota da personagem Mônica. 107 pessoas responderam a esta
pergunta, das quais 74 acreditam que a personagem deve reagir expressando raiva.
A tabela 5.2 apresenta um resumo das informações citadas acima, reunindo os comportamentos esperados para os personagens por toda a história de exemplo.
Tabela 5.1: Comportamentos esperados para as personagens de acordo com o questionário
Quadros
Mônica
Magali
Cascão
1
Raiva
Alegria
—
2
Surpresa
Alegria
—
3
Raiva
—
—
4
—
—
Alegria
5
—
—
Medo
6
Raiva
—
—
Fonte: do Autor
5.3
Dados do Modelo Computacional
As informações da história exemplo foram codificadas para o modelo computacional
na forma de uma lista, contendo as 31 entradas necessárias, submetidas a rede neural
para que retornem um comportamento desejado.
5.3 Dados do Modelo Computacional
60
Os níveis de intensidade dos desejos básicos, que permanecem os mesmos durante todo
o desenvolvimento da trama, estão definidos da seguinte forma:
• Mônica: [0.09, 0.48, 0.63, 0.34, 0.49, 0.34, 0.36, 0.55, 0.61, 0.89, 0.54, 0.56, 0.36,
0.64, 0.07, 0.99]
• Magali: [0.41, 0.46, 0.99, 0.39, 0.41, 0.85, 0.33, 0.33, 0.69, 0.33, 0.68, 0.42, 0.95,
0.67, 0.61, 0.52]
• Cascão: [0.71, 0.37, 0.46, 0.58, 0.40, 0.51, 0.50, 0.48, 0.68, 0.61, 0.75, 0.36, 0.96,
0.21, 0.97, 0.43]
Os valores definidos para as outras dimensões são alterados durante a história, sendo
diferentes em cada quadro. No quadro 1, os valores de entrada, foram definidos da seguinte
maneira:
• Mônica:
– Valência Afetiva e Intensidade: [0.80, 0.50]
– Dominância e Afetividade: [0.60, 0.90]
– Intimidade e Atratividade: [0.80, 0.80]
– Situação: [1, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0] (Divertida)
• Magali:
– Valência Afetiva e Intensidade: [0.70, 0.10]
– Dominância e Afetividade: [0.60, 0.90]
– Intimidade e Atratividade: [0.80, 0.80]
– Situação: [1, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0] (Divertida)
Nestas condições, a saída do modelo indica o comportamento de alegria para as duas
personagens.
No quadro 2, visto que há uma interação com a mãe de Magali, os valores definidos
para as relações da personagem Magali sofre mudanças:
5.3 Dados do Modelo Computacional
61
• Mônica:
– Valência Afetiva e Intensidade: [0.80, 0.50]
– Dominância e Afetividade: [0.60, 0.90]
– Intimidade e Atratividade: [0.80, 0.80]
– Situação: [1, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0] (Divertida)
• Magali:
– Valência Afetiva e Intensidade: [0.80, 0.30]
– Dominância e Afetividade: [0.10, 0.30]
– Intimidade e Atratividade: [0.40, 0.40]
– Situação: [1, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0] (Divertida)
Apesar das mudanças para a personagem Magali, as respostas permanecem as mesmas
das encontradas no quadro anterior, ambas personagens exibem a expressão alegria.
Para o quadro 3, são alterados os parâmetros da personagem Mônica, ajustados para
a derrota na brincadeira:
• Mônica:
– Valência Afetiva e Intensidade: [-0.40, -0.20]
– Dominância e Afetividade: [0.60, 0.90]
– Intimidade e Atratividade: [0.80, 0.80]
– Situação: [0, 0, 0, 1, 0, 0, 0, 0, 0] (Rejeição)
Esta disposição dos dados favorece a exibição do comportamento raiva, de acordo com
o modelo computacional.
Para o quadro 4, são ajustados os parâmetros da personagem Cascão:
• Cascão:
– Valência Afetiva e Intensidade: [0.50, -0.80]
– Dominância e Afetividade: [0.70, 0.70]
5.4 Resultados
62
– Intimidade e Atratividade: [0.70, 0.70]
– Situação: [0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 1] (Neutra)
A saída indicada pelo modelo computacional para Cascão é a de alegria
No quadro 5, são realizadas mudançãs para a personagem Cascão, em virtude da
chuva que se aproxima:
• Cascão:
– Valência Afetiva e Intensidade: [-0.50, 0.60]
– Dominância e Afetividade: [0.70, 0.70]
– Intimidade e Atratividade: [0.70, 0.70]
– Situação: [0, 0, 0, 0, 1, 0, 0, 0, 0] (Perigosa)
Com esta configuração de entrada, o modelo aponta para exibição do comportamento
medo por parte da personagem.
Com uma nova derrota, no quadro 6, a configuração das entradas para a personagem
Mônica ficam desta maneira:
• Mônica:
– Valência Afetiva e Intensidade: [-0.70, 0.80]
– Dominância e Afetividade: [0.70, 0.70]
– Intimidade e Atratividade: [0.70, 0.70]
– Situação: [0, 0, 0, 1, 0, 0, 0, 0, 0] (Rejeição)
Onde o modelo computacional indica que Mônica expressará um comportamento de
raiva.
5.4
Resultados
A comparação entre as duas tabelas de comportamentos mostra que o modelo computacional consegue atingir com certo êxito o seu objetivo na representação de uma personalidade. Considerando um total de 8 ações, o modelo conseguiu reproduzir os comportamentos estimados em 6 ocasiões, resultando em um índice de acerto de 75%.
5.4 Resultados
63
Tabela 5.2: Comportamentos esperados para as personagens de acordo com o modelo
computacional
Quadros
Mônica
Magali
Cascão
1
Alegria
Alegria
—
2
Alegria
Alegria
—
3
Raiva
—
—
4
—
—
Alegria
5
—
—
Medo
6
Raiva
—
—
Fonte: do Autor
De acordo com Carvalho (2012), o principal resultado de uma pesquisa científica é o
conhecimento aplicável a um propósito. A validação da pesquisa nestes termos é verificada
em quatro quesitos:
• Análise do sucesso do conhecimento produzido:
Utilidade: o modelo proposto mostra-se útil para a representação de personalidades, que atuem de forma coerente com as situações impostas por um ambiente.
Apesar de não ser aplicável a todos os casos conhecidos, pode ser expandido
sem alterações à estrutura da metáfora.
Eficácia: o modelo desenvolvido demonstra ser possível gerar respostas coerentes
e individuais para a maioria dos casos.
Eficiência: não existem uma medida para a eficiência do sistema, em virtude dos
poucos testes executados.
• Generalização: sendo respeitados os parâmetros de entrada da rede neural criada
e alimentando a base de dados para treinamento com novos registros, é possível criar
outras personalidades sem alteração da arquitetura proposta para o modelo.
• Inovação: a metáfora computacional criada apresenta inovações na forma de sua
concepção. Observados os requisitos acerca da Teoria da Personalidade, ela consi-
5.4 Resultados
64
dera tanto a descrição como as motivações do indivíduo para a geração dos comportamentos possíveis, tendo por base o instrumento Reiss Motivational Profile.
• Explicação: foi proposto o desenvolvimento de uma metáfora que garantisse a
exibição do comportamento individualizado e coerente para que fosse utilizada nos
atores digitais autônomos do projeto D.R.A.M.A. Além das exigências provenientes
da Psicologia no que se refere aos processos que determinam o comportamento humano (características do indivíduo e motivação), foram identificados outros fatores
que determinam as ações de um indivíduo, como as emoções que ele vivencia, os
relacionamentos com os demais indivíduos e o ambiente em que está inserido. A utilização de uma rede neural artificial para combinar estes elementos possibilitou que
a combinação deste conjunto de fatores e permitiu a exibição de um comportamento
coerente para o agente.
5.4.1
Limitações
Embora o modelo possa ser expandido para o uso de mais personalidades, a implementação atual da metáfora possui limitações quanto à representação de comportamentos
e variabilidade de personalidades disponíveis. A limitação ocorre em função dos conjuntos
de treinamento, que foram construídos com base em apenas quatro personalidades dos
principais personagens da “Turma da Mônica”, não garantindo precisão na determinação
do comportamento fora destes limites.
5.4.2
Publicações
Como produto deste trabalho de conclusão, foi publicado um artigo (short paper ) para
o Simpósio Brasileiro de Jogos e Entretenimento Digital (SBGames).
RAMOS, Ricardo P. ; SILVA, Rogério Eduardo da. ; REIS, Juliane Cristine K.
A Personality Model based on Reiss Motivational Profile for Autonomous Digital
Actors. In: Simpósio Brasileiro de Jogos e Entretenimento Digital. Brasília, Distrito
Federal, nov 2012.
65
6 Conclusão
Os humanos virtuais, que correspondem a modelos computacionais inspirados no
comportamento humano, representam uma nova maneira de pensar a interação homemmáquina.
Embora tenha-se obtido avanços quanto a sua representação gráfica, estes agentes
computacionais ainda não são comprometidos com o comportamento humano, principalmente do ponto de vista cognitivo.
Vários fatores contribuem para a credibilidade de um humano virtual, tanto através da
sua concepção artística, como pela perspectiva do agente computacional, sendo merecedor
de destaque a personalidade.
Embora para um humano virtual a representação da personalidade não necessite ser
totalmente fiel a um humano real, requerindo apenas que o comportamento apresentado
seja coerente ao contexto em que ele está inserido, observar o funcionamento da personalidade humana pela visão da Psicologia é determinante na construção de um modelo que
aproxime os agentes virtuais e os indivíduos reais.
A partir de um estudo de teorias de personalidade, foi possível identificar questões
fundamentais a seu respeito: na forma de identificação das diferenças individuais e na
maneira como a personalidade é expressa. Estas questões direcionaram a pesquisa para
duas abordagens apropriadas ao desenvolvimento de um modelo computacional para a
personalidade: a teoria de traços de personalidade, como forma de descrevê-la e a consideração dos aspectos motivacionais de um indivíduo. A escolha pela teoria de traços é
reflexo de seu aprofundamento descritivo e da maneira como pode ser medida, através de
testes e observações.
Neste contexto, o Reiss Motivational Profile surge como um instrumento para a avaliação da personalidade considerando uma integração entre os traços e as motivações de
um indivíduo.
Com base neste instrumento e nos trabalhos relacionados na área, sugeriu-se um
modelo computacional que relaciona os traços de personalidade a 16 desejos básicos, os
6 Conclusão
66
quais combinados resultam em possíveis comportamentos para o indivíduo.
Estes comportamentos propostos ainda sofrem influências de outras três componentes:
os relacionamentos entre indivíduos, as emoções a que ele está submetido e o ambiente
em que está inserido.
A implementação desta metáfora foi realizada na forma de uma rede neural artificial,
que corresponde a um conjunto de técnicas para a classificação de dados, organizados
como uma rede Perceptron multicamada e implementando o algoritmo de aprendizagem
back-propagation.
Os resultados obtidos com o uso deste modelo foram confrontados com informações
obtidas de questionários, com o objetivo de identificar os comportamentos aceitos por
uma população em determinados tipos de situações. Demonstrou-se que os resultados
alcançados pelo modelo computacional atingem os objetivos de coerência comportamental
estipulados pela população.
Apesar do conjunto de treinamento limitar-se a personalidade dos personagens de
histórias em quadrinhos, o modelo pode ser estendido e aplicado para outros propósitos,
sendo-lhe fornecidos dados de treinamento mais abrangentes, que contemplem um maior
número de personalidades.
Como sugestão para futuros trabalhos, uma vez que há poucas referências quantificáveis entre as relações de personalidade e comportamentos observáveis, sugere-se o
desenvolvimento de um questionário mais elaborado para que o modelo possa responder
adequadamente a cenários mais complexos.
Há também a possibilidade do desenvolvimento de umeditor de personalidades para
atores digitais autônomos, que possibilite a criação de personalidades e manipulação de
seus parâmetros, como as intensidades dos desejos básicos.
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71
A Apêndice
A.1
Nova Arquitetura proposta para o projeto D.R.A.M.A.
Figura A.1: Arquitetura para atores virtuais que contém um módulo de personalidade
Fonte: Thume (2012)
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário
A.2
Detalhes das respostas obtidas no questionário
Figura A.2: Distribuição de gênero dos participantes
Fonte: Do Autor
Figura A.3: Distribuição das idades dos participantes
Fonte: Do Autor
72
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário
Figura A.4: Nível de Escolaridade dos participantes
Fonte: Do Autor
Figura A.5: Distribuição das respostas para a Quadro 1 - Questão 1
Fonte: Do Autor
73
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário
Figura A.6: Distribuição das respostas para a Quadro 1 - Questão 2
Fonte: Do Autor
Figura A.7: Distribuição das respostas para a Quadro 2 - Questão 1
Fonte: Do Autor
74
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário
Figura A.8: Distribuição das respostas para a Quadro 2 - Questão 2
Fonte: Do Autor
Figura A.9: Distribuição das respostas para a Quadro 3
Fonte: Do Autor
75
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário
Figura A.10: Distribuição das respostas para a Quadro 4
Fonte: Do Autor
Figura A.11: Distribuição das respostas para a Quadro 5
Fonte: Do Autor
76
A.2 Detalhes das respostas obtidas no questionário
Figura A.12: Distribuição das respostas para a Quadro 6
Fonte: Do Autor
77
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