1 Economia chinesa para principiantes Marco Antonio Tourinho Furtado1 Observação: Este é um trabalho dedicado aos alunos do “Grupo livre de estudo de economia chinesa e relações China-Brasil”, que funciona na Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto. Ele surgiu da necessidade de alguns alunos que entram no grupo de estudo com ele em andamento. Assim este texto serve de um mínimo de nivelamento de conhecimento introdutório sobre a história econômica chinesa. Ele resultou de solicitação do aluno Diego Barcellos, que viveu esta situação. A ele se deve a iniciativa deste texto. 1. Aspectos gerais: China como espaço físico, populacional. A China é o terceiro maior país do mundo, com 9,526 milhões de quilômetros quadrados. Tem um grande litoral de 32 mil quilômetros, e território que vai se afunilando em direção ao oeste. A China é um grande país, maior que o Brasil (aproximadamente 1,12 vez nosso país, o que seria um Brasil mais aproximadamente um estado do Pará). Mas por possuir um grande litoral a China possui uma área jurisdicional marítima muito grande (quatro milhões e setecentos mil quilômetros quadrados), e um mar territorial extenso (dois milhões e setecentos e sessenta mil quilômetros quadrados). O país tem mais de 5.000 ilhas, e a proximidade com o Japão e outros países tem levado a diferenças e fontes de tensão na interpretação de quem teria a jurisdição e a posse de áreas do mar territorial. O relevo da China é constituído do que denominam de três andares. Um primeiro junto ao litoral, onde há planícies e pequenos montes que não ultrapassam a mil metros. Neste primeiro andar se concentram a grande população da China, uma atividade agrícola e industrial intensa, os portos e grandes cidades, como Shangai, Hong Kong, Tianjin, Pequim, etc. Um segundo andar, em que se tem altitude entre um mil e quatro mil metros, onde há planaltos como o de Yunann-Ghizhou, Bacia de Tanin, Jungjar, Ordos e Sichuan. Nele há vales dos grandes rios, planaltos e uma grande densidade populacional. O terceiro andar onde as altitudes se situam num patamar acima de quatro mil metros, localiza-se na margem oeste do país, onde a densidade populacional é baixa, com presença de desertos e terras geladas e cadeias de montanhas como as do Himalaia, Karakorum, Nayan Qantazhe. O país possui 28 montes acima de 8.000 metros de altitude (Himalaia, Karakorum, etc). 1 Professor da Escola de Minas – Universidade Federal de Ouro Preto 2 Figura 1- Relevo da China - Fonte: www.chinatravel.com A China é um país de características muito diferenciadas no grande espaço de mais de 9,6 milhões de quilômetros quadrados, e não só pelo relevo. Nela predomina o clima árido e semi-árido. Os dois climas somam mais de 54% do território (ou mais de cinco milhões de quilômetros quadrados). Possui alguns desertos como o de Taklimakano (segundo maior do mundo), Gobi, e regiões onde a presença de água é escassa. Nas altas montanhas nascem os grandes rios que atravessam a China de oeste para leste, ou que se dirigem ao sudeste asiático (Vietnã, Camboja, Miammar, ou para a Índia). Mas é um país onde se pode dizer que a água é escassa, com exceção da região ao longo dos grandes rios e do sul, onde o regime de monções é o responsável por uma pluviosidade acima de 1.500mm ao ano, onde o clima é quente e úmido. Esses grandes rios que atravessam a China do oeste para leste, como o Yang-tsé (6.300Km, sendo 2.250 navegáveis), Amarelo (Huang He com 5.464 Km), Pérola, Heilongjiang, e partes de rios que se dirigem ao sudeste asiático como Mekong, Bramaputra são fontes importantes de água. Também tiveram e tem importância como vias de transporte, sendo o Yang-Tsé um rio com grande número de portos, que já estiveram sob o domínio de potencias ocidentais em período recente, após a primeira Guerra do Ópio em 1840, quando ocorre a abertura da China ao Ocidente, forçada pela Grã-Bretanha. A China possui também depressões, como a de Tuipan, a 160 metros abaixo do nível do mar. Fig 2: Principais rios da China: destaque para o Yang-Tsé - Fonte: www.chinamap.com 3 Planalto da Mongólia interior Pequim Mar de Bohai Mar Amarelo Bacia de Tanin Shangai Himalaia Mar do Leste da China Planalto de YunanGuizhou Vale do Yang- Tsé Hong Kong Mar do Sul da China Figura 3- China-Vista de satélite e alguns pontos Fonte: www.geology.com/world/china-satellite-image.shtml Figura 4 - Pluviometria: o contraste entre o oeste e o sudeste da China Fonte: www.images.nationmaster.com/images/motw/midell_east_and_asia/china_precip.jpg Outra característica da China é a sua elevada população (1,3 bilhão de habitantes) e sua distribuição populacional diferenciada ao longo do país. Há elevada densidade nas planícies do leste e alguns planaltos e ao longo dos vales dos grandes rios, mas com baixíssima 4 densidade no oeste, em regiões como no Tibet, regiões desérticas ou estepes, como na Mongólia Interior. A China tem atualmente um crescimento populacional de 0,9% ao ano, apesar de medidas que foram tomadas há décadas visando a redução do crescimento populacional do país. Como o Brasil cresce a 1,9% ao ano, a taxa brasileira é atualmente o dobro da chinesa. Mas convém relembrar que a população da China de 1,3 bilhão gera um crescimento anual de 11,7 milhões de habitantes, enquanto o Brasil com 184 milhões tem um crescimento de 3,49 milhões ao ano, à taxa de 1,9% ao ano. Mas ambos os países tem percentuais declinantes de crescimento de população. A China tem política restritiva ao número de filhos, que é variada em função de fatores como pertença ou não a minorias, morador de zona rural, ter tido um filho com deficiência, ou cidades que hoje tem taxas de natalidade muitíssimo baixas, entre outros. Mas muitos chineses urbanos e enriquecidos desrespeitam esta norma. Há cidades como Pequim e Shangai onde o índice de nascimentos por mulher é inferior a um, e que tem preocupado as autoridades, pois o envelhecimento populacional tornar-se-á um problema. Enfim não é verdade quando a imprensa ocidental diz que na China vigora um único modelo de que todas as famílias só podem ter um filho. Isto depende do local de moradia, se urbano ou rural, etc. Figura 5- China: distribuição da população(densidade populacional) - Fonte: www.chinatravel.com A figura acima demonstra bem como as áreas costeiras, vales dos grandes rios e alguns planaltos tem elevada densidade demográfica, enquanto nas regiões áridas do oeste e regiões de grande altitude e estepes esta densidade é baixa. 5 1.1- O governo e indicadores A China é uma república parlamentarista de partido único, com um congresso unicameral (Congresso Nacional do Povo) com 2.979 membros eleitos para mandato de cinco anos, com representantes de regiões, entidades, etc. A organização do governo chinês passou por grandes mudanças após as reformas que se iniciaram em 1978. Mas, principalmente, houve uma delegação e descentralização de muitas iniciativas às províncias e governos locais. A China tem 34 divisões administrativas, sendo 23 províncias, 4 municipalidades sob jurisdição central, 5 regiões autônomas (com minorias étnicas) e 2 regiões administrativas especiais (Macau e Hong Kong). O governo cunhou a expressão de “um país dois sistemas”, em que coexistem os sistemas “socialismo de mercado” que vigora em toda a China, e o capitalismo que vigora nas duas regiões especiais, Hong Kong e Macau. As províncias têm populações que se aproximam de países médios, próximo de noventa milhões de habitantes ou mais, como Henam, Sichuan, Shandong. Províncias Anhui Fujian Gansu Guangdong Ghizhou Hainan Hebei Heilongjiang Henan Hubei Hunan Jianggsu Jiangxi Jilin Liaoning Qinghai Shaanxi Shandong Shanxi Sichuan Yunan Zhejiang Municipalidades Beijing População 63,4 34,7 25,9 78,6 38,4 8 67,4 38,1 96,1 59,9 66,3 73,8 42,2 27 42 5,3 36,7 90,8 32.9 86,7 43,3 46,7 População. 14,2 Chongqing 31,1 Shangai 16,2 Tianjing 10,2 6 Regiões Autônomas Guangxi Zhuang Mongólia Interior Ningxia Hui Xinjiang Uighur Tibet Regiões Especiais Hong Kong Macau População. Nanning Hohhot Yinchuan Urumqi Lhasa 48,2 23,8 5,7 19,1 2,7 População. 6,99 0,58 Fonte: The State of China Atlas A figura abaixo mostra as regiões administrativas da China, com províncias, regiões autônomas, municipalidades e regiões especiais. Figura 6: Divisão administrativa da China - Fonte: www.chinatravel.com A China ainda é um país em desenvolvimento. Mesmo com grandes avanços, possui muitas disparidades regionais e intra-regionais entre a população urbana e rural, e um nível de IDH muito próximo do Brasil. Tem uma baixa taxa de analfabetismo (9 %, 2005), expectativa de vida de 72,5 anos, mortalidade infantil de 22,12 crianças por mil habitantes. É um país ainda rural, com maioria da população no campo (60%), mas com crescente urbanização, com milhões de pessoas trocando o campo pelas cidades. Isto tem feito com que o governo se preocupe com a migração, tentando limitar as concentrações urbanas, por meio 7 da edificação de pequenas e médias cidades, e do controle do crescimento das cidades grandes. Esta migração e a expansão urbana programada fez com que o país possua muitas cidades (mais de 200) com população acima de um milhão de habitantes. 2- A Economia da China 2.1- Breve histórico A China é um país que tem crescido sua economia de forma sustentada por um longo período. Mesmo que mais recentemente este crescimento tenha se acelerado, o país passou por uma grande transformação desde a revolução comunista em 1949, quando era um dos países mais atrasados do mundo. No período de 1949-1978, a China cresceu a uma taxa média de 5,9% a.a., mesmo tendo vivido períodos difíceis como na década de 60, no chamado período da “Revolução Cultural”. Para entender a China moderna talvez seja necessário se reportar à história mais recente de um país e sua cultura milenar. Estudiosos afirmam que a China teve um nível de renda muito maior que a da Europa no período anterior ao mercantilismo, e que nas grandes navegações era uma nação mais avançada e de melhor nível de vida que o existente entre europeus. Mesmo considerando a dificuldade de medir uma renda por habitante neste período, eles estimam que os chineses tinham maior renda por habitante que a Europa. A China moderna não se abriu ao comércio exterior e ao ocidente por uma decisão própria, mas forçada pela Grã-Bretanha a partir da primeira Guerra do Ópio, em 1840. Antes dela o país era muito fechado ao comércio exterior, que se realizava via Cantão (atual Gaungdong) e Macau. A guerra do ópio e a derrota do império foi um choque para os chineses. Os ingleses impuseram exigências ao país, após ocuparem portos de Shangai e Cantão, através do Tratado de Nanking, de 29/08/1842, que concedeu direitos aos ingleses como: a) abrir os portos chineses ao comércio; b) criar a extraterritorialidade (empresas e cidadãos britânicos são julgados no país de origem); c) conceder à Grã-Bretanha status de nação mais favorecida; d) conceder aos britânicos o porto e cidade de Hong Kong; e) criar tarifa única de imposto de importação de 5%; Além disso, é claro, exigem liberdade de comércio para o ópio, que era o objetivo inicial da disputa e cujo comércio era combatido pelo império chinês. Logo a seguir, outras nações desejaram obter o mesmo status obtido pelos britânicos, como França, Estados Unidos, etc. Durante décadas a China enfrentou países ocidentais que tomam de assalto portos, se apoderar do comércio exterior, exigem parte do território, no que serão seguidos pela Rússia, Japão. Invasões militares e interesses comerciais se mesclam nas muitas guerras, invasões de portos e do território chinês. 8 Com a segunda guerra do ópio, a corte da dinastia Qing se retira da capital. É o fim do Império do Meio, mesmo que a dinastia continue governando. Mas a China passa a viver sob influencia ocidental, em especial da Grã-Bretanha. Ante o fracasso da China diante do poderio ocidental, vai surgir um movimento de “ocidentalização” (movimento Yangzu Yudong), e que vê a necessidade de uma resposta chinesa ao fracasso militar do país diante das potências ocidentais. Este movimento entende que só o fortalecimento militar, absorvendo tecnologia e conhecimento militar ocidental, poderia fazer com que o país fosse capaz de se contrapor à força ocidental. Tornar o país militarmente forte é a meta. A China, então, investiu em instalações industriais militares, e produz navios, armas, equipamento militar em geral. Mas a sua economia é dominada pelos ingleses, que controlam os principais portos, e depois também por outras potências ocidentais que também passam a controlar parte de portos chineses, inicialmente apenas no mar, e posteriormente também no rio Yang-Tsé. O país enfraquecido sofreu outras ameaças internas como revoltas, domínio de áreas pelos senhores de guerra locais, etc., o que reforçava a necessidade de aumento do poderio militar do país. Este primeiro período de “ocidentalização” fez com que o país importasse indústrias militares para produção destes equipamentos e criasse estaleiros modernos. Shangai, principalmente, vai se tornar o centro desta indústria. Mas é o governo quem dirige o setor militar, instalando doze fábricas militares em poucos anos, estaleiros, produzindo navios, canhões, armas. Trazem tecnologia e até pessoal do ocidente para as fábricas militares. O setor privado é supervisionado pelo governo, mas somente em 1878 é que se instala a primeira fábrica têxtil em Shangai, mostrando que a preocupação militar vem antes da construção de uma indústria civil. Na época o grande comércio controlado pelos estrangeiros era a importação de ópio, produto que chega a ter amplo consumo no país, inclusive em área rurais, e depois querosene, para iluminação. O movimento de ocidentalização baseado na busca de uma equiparação militar ao ocidente fracassou, por muitos motivos, como as inúmeras guerras que o país enfrentou com invasões de tropas estrangeiras. A derrota em guerras com outros países como: a invasão francesa de 1884; a guerra sino-russo-japonesa de 1894 na qual a China é obrigada a ceder Taiwan (ao Japão) e as ilhas dos Pescadores, e reconhece a independência da Coréia, além de pagar 230 milhões de tales (a receita anual da China era de 90 milhões de taels), abrir portos aos japoneses, direitos de comercializar, etc. Enfim, a cada derrota mais frágil se torna a China e sua dinastia. A situação do país vai se deteriorando ainda mais, e surgem rebeliões no país: de Niam, dos islâmicos no noroeste, e de minorias no sudeste. Mesmo fracassando, o movimento de ocidentalização foi um primeiro esforço de industrialização da China. Fracassou também devido a uma fraca direção governamental (falta de metas, de liderança, recursos), devido a guerras e conflitos externos e internos, entre outros. Com o fracasso do movimento de ocidentalização surgem pressões por mudanças políticas, muitos vêem na política os entraves a um progresso econômico. Fez-se um reforma que durou cem dias, e a reação conservadora a fez fracassá-la. 9 A precariedade da situação chinesa resultou, na década que se segue, na guerra sino-russojaponesa em que o país foi obrigado a entregar territórios a alemães, britânicos, japoneses. Em 1897-1898 enfrentou uma aliança de oito países que marcham sobre a capital em 1900. Nova guerra sino-russo-japonesa ocorreu em 1904-5 e a China perdeu o controle de províncias do nordeste, o que resultou em danos maiores que o da guerra do ópio. Além da perda de território foi obrigada a pagar pesada indenização. O país, então, teve também os maiores portos, ao longo dos rios, controlados pelos ocidentais (15 em 1870, 40 em 1900). A China era o que poderíamos chamar de uma semicolônia, ou como uns denominam, o “doente da Ásia” à época. Com um estado que se enfraquece, o aumento de ocupações de portos por estrangeiros e as imposições externas impedem o sucesso de quaisquer políticas voltadas a um fortalecimento da economia. Entre as exigências oriundas dos países estrangeiros, a de extraterritorialidade, na qual estrangeiros e investimentos estrangeiros tinham causas julgadas no país de origem, prejudicaram muito os comerciantes e concorrentes chineses frente aos estrangeiros. Isto deu um enorme poder aos estrangeiros e seus negócios na China. As perdas de territórios, as indenizações pagas por guerras, os conflitos internos, a fraqueza militar e econômica, o descrédito da política de ocidentalização, todos esses fatores levaram ao enfraquecimento da dinastia Qing, e preparou a república, proclamada em 1911, através de uma revolução. Entretanto, mesmo após o fim da dinastia Qing, seu legado perdurou com os senhores da guerra/rurais dominando o país e o dividindo até 1920. Em 1920, grande parte do país é reunificada com o governo do Kuomintang (ou Guomindang), KMT ou GMT, ou regime de Nanjing, para onde se transferiu a capital. Mas o regime esteve sob um cerco de japoneses, que no início dos anos 30 anexou o Nordeste da China e, depois em 1937, iniciou oito anos de guerra contra a China, que só terminou em 1945. O regime do KMT se preocupou em fortalecer seu poder, e passou a sofrer oposição de comunistas. O governo focou em combater comunistas, e não estrangeiros, o que lhe custou apoio popular. Na economia, o governo tentou estabelecer algumas políticas como treinar pessoas em finanças no ocidente, fazer uma reforma fiscal e financeira, com orçamento unificado, etc. Além disso, investiu em comunicações e transporte (algumas ferrovias foram implantadas) e criou-se o transporte aéreo. O governo restaurou a soberania em matéria de taxas de importação, recuperou alguns territórios cedidos a estrangeiros. Em 1943, USA e GrãBretanha devolveram alguns territórios como gesto de aproximação da luta comum contra o Japão, e dão fim à extraterritorialidade. Com a república, e ainda com a ocupação de portos por estrangeiros e seu domínio no comércio e negócios diversos (bancos, etc), a China buscou uma industrialização que não se limitou à questão militar. Novas indústrias se instalaram, principalmente na região de Shangai. Mas governos fracos, as lutas internas e com senhores da guerra regionais, e posteriormente novas invasões externas levam também ao fracasso a política republicana. Nela o país teve ainda uma baixa taxa de investimentos por incapacidade do estado de aumentar arrecadações e elevar esta taxa. Este investimento, de 5% do PIB, voltou-se para transportes, e poucos setores mais. No período do Kuomintang a agricultura cresceu entre 1920-1936 (antes da invasão japonesa cresceu 17,5%; indústria 52,3%; transporte 97,5%). 10 Mas a crise de 1929 reduziu o número de indústrias de um período numa situação de industrialização incipiente. O governo do Kuomintang sofreu de déficit crônico, o que levou a hiperinflação, e desincentivo às indústrias. Mas os gastos militares e poder militar era grande, decorrente dos problemas internos e externos. Após a invasão japonesa de 1937 (quando se iniciou a segunda guerra mundial para os chineses), os comunistas e o Kuomintang se uniram para enfrentar a invasão japonesa. A figura abaixo demonstra como a China, ao longo da história, foi se distanciando da Europa, o que explica como um império importante como o chinês se transformou no “doente da Ásia”, e foi alvo de cobiça de território, de riquezas minerais, de portos e de domínio de comércio exterior inicialmente por países ocidentais, e depois pelo Japão. Vê-se também o crescimento da população nos dois territórios. Na China o maior incremento populacional se deu entre 1400 e 1820 (maior incremento ocorre nos séculos XVI a XVIII) Ano Produto bruto por habitante População milhões hab Europa Ocidental (US$ 1985) China (US$ 1985) Europa Oc. China 1400 430 500 43 74 1820 1034 500 122 342 1950 4902 454 412 547 Tabela 1: Evolução da população e da renda da população chinesa e da Europa Ocidental Fonte: Aiguo, Lu 2000. Por outro lado a tabela abaixo nos dá uma visão de como o comércio exterior da China evoluiu no período final da dinastia Qing e do período republicano até a crise de 1929. Nela podemos observar que no período republicano há um crescimento deste comércio. Período Exportação Importação Comércio total Por Hab. % do comércio 1871-84 102,5 106,2 208,7 0,58 1,3 Exportação como % do 2,5 1885-1900 110,2 143,5 253,7 0,66 1,3 _____ 1901-1914 201,0 293,8 494,8 1,19 1,5 _____ 1915-19 521,2 570,8 1092,0 2,47 ___ 1920-1929 619,6 799,0 1418,6 _____ 3,01 2,4 7,3 Tabela 2: Importação, exportação e comércio total da China: 1871-1929 (Milhões de dólares correntes) Fonte: Aiguo, Lu 2000. 11 No entanto mesmo com o crescimento do comércio exterior no período republicano, a renda por habitante no país não cresceu, e ao contrário, o início do século XX foi um período de redução de renda na China. Enquanto os países ocidentais e outros crescem a sua renda por habitante, na China ocorreu o contrário. País/área 1900 1913 1950 Média de 16 2374 2937 4693 China 539 498 454 Argentina 1724 2377 3121 Brasil 586 700 1441 México 872 1104 1570 Índia 508 536 482 Indonésia 67 710 650 Tabela 3: Renda por habitante de alguns países e da China entre 1900 e 1950 (US$/hab.) Fonte: Aiguo, Lu 2000. Obs: 16 países: Austrália, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Noruega, Suécia, Suíça, Estados Unidos, Grã-Bretanha. Por outro lado no período republicano os Estados Unidos crescem suas influencias no comércio exterior chinês, o que de certo modo também reflete a crescente importância deste país no mundo. 1929 1934 IMPORTAÇÃ USA 18,02 26,16 Japão 25,22 12,21 Alemanha 5,23 8,99 Grã-Bretanha 9,30 12,21 Hong-Kong 16,74 2,86 França 1,42 2,16 USA 13,37 17,60 Japão 24,87 17,60 Alemanha 2,18 3,58 Grã-Bretanha 7,21 9,30 Hong-Kong 16,83 18,85 França 5,46 3,95 EXPORTAÇÃ Tabela 4: Participação no comércio exterior da China em % - Fonte: Aiguo, Lu 2000. 12 A estrutura da economia chinesa entre 1840-1949 Mesmo com a abertura da China ao comércio exterior, com a chegada de investimentos estrangeiros e um início de industrialização, a China continuou um país muito pobre. Os estrangeiros logo se voltaram para domínio do comércio exterior, atividade que dominaram e se tornaram quase monopolistas. Eles financiavam o comércio exterior com seus bancos, e dominavam o comércio através de portos sob seu domínio. Posteriormente os bancos passaram a financiar a cadeia produtiva militar entre 1864 e 1894, permitindo a aquisição de fábricas no ocidente. Após a guerra sino-russo-japonesa de 1894, o Japão adquiriu o direito de instalar fábricas na China, o que logo foi ampliado para outras nações. Com a abertura a investimentos, os estrangeiros investiram em outros setores além do comércio exterior e bancos. Eles construíram ferrovias, minas e estabeleceram fábricas em muitos locais. Entre 1894 e 1914 os investimentos externos passam de 109 para 962 milhões de dólares. Entre 1902 e 1930 os investimentos externos forma de 2 bilhões de dólares na China. Shangai era o local predileto do investimento estrangeiro, recebendo mais da metade dele, e 33% se situaram no nordeste do país. Em 1900 os grandes investidores estrangeiros eram a Grã-Bretanha (374 empresas de um total de 636 estrangeiras), seguido do Japão, Rússia e EUA. Eles dominavam o setor bancário, pesca, ferrovias, mineração, energia. Em 1937, 60% do carvão do país era produzido por empresas estrangeiras. Mas os investimentos estrangeiros estavam estabelecendo uma economia dual, onde algumas poucas cidades eram modernas, mas o interior permanecia apenas produtor de artesanato, muito forte na China inclusive o de tecelagem, e a agricultura. Os portos se tornaram centros metropolitanos modernos, com Shangai sendo a maior deles. De lá partiam 63% do comércio exterior da China. Eram também enclaves modernos numa economia que tem a agricultura estagnada, com queda de produtividade. Os investimentos estrangeiros tiveram pouco impacto no interior. A dicotomia interior e cidades portuárias caracterizam a época. No interior as populações viviam de artesanato e agricultura, e só em algumas cidades estavam localizadas as indústrias e o comércio com o exterior, bem como o consumo de bens industriais. No interior a maioria da população utilizava produtos artesanais. Este artesanato fazia com que a China fosse auto-suficiente em muitos produtos, pois ele era barato e isso o mantinha como capaz de concorrer com produtos industriais. Os únicos produtos não produzidos e consumidos no campo eram o ópio e o querosene, que eram importados e de amplo uso nas áreas rurais. O setor moderno da economia chinesa não era muito importante no conjunto do PIB, mas vai crescendo ao longo do tempo. Era 4,9% da economia em 1920, 10,8% em 1936 e 17% em 1949. O artesanato representava 10,8 % em 1920, 20,5 % em 1936 e 23,1% em 1949. Isto mostra que mesmo a indústria e a economia moderna crescendo, o artesanato não perdeu importância. Pelo contrário, cresceu de importância. O sistema dual, de artesanato e produtos industriais conviveram, e não foi barreira à incorporação da China ao mercado mundial. No meio da década de 1930 a China começou a produzir bens de capitais, antes importados do ocidente, e se iniciou uma substituição de importações. 13 No entanto destaque-se que, enquanto vigorou a extraterritorialidade, a competição entre empresas chinesas e estrangeiras era desleal, pois chineses eram julgados por leis chinesas e estrangeiros tinha extraterritorialidade, conforme vimos anteriormente. Os governos chineses nunca deram proteção à industria chinesa devido aos acordos comerciais impostos pelo ocidente, a contrário do que ocorreu em inúmeros países de industrialização tardia. Questão acadêmica: ocidentalização da China foi positiva ou negativa? Uma questão acadêmica é se a “ocidentalização” da China foi positiva ou negativa para o país. A primeira observação é que a “ocidentalização” foi um ato defensivo e não esforço para alcançar o ocidente em todas as dimensões deste, mas apenas no sentido de defesa militar. A China, que era uma economia maior que a da Europa até 1500, distanciou-se do ocidente após esta data, e seu declínio relativo se deveu ao isolamento, crescimento muito forte da população nos séculos XVI a XVIII e outros problemas internos. Isto fez com que a China se tornasse um dos mais pobres países do mundo, na primeira metade do século XX, e a ocidentalização não melhorou a situação. Pelo contrário, a inserção do país na economia mundial agravou o declínio. Na análise das razões pelas quais a inserção chinesa na economia mundial pós-1840 não mudou a situação do país, estudiosos enumeram algumas razões: a) falta de industrialização. Não há consenso sobre o por que a China não conseguiu se industrializar. b) sociedade permaneceu rural. c) inércia social. Ocidentalização foi apenas um movimento superficial, mas a sociedade demandava uma revolução que mudasse socialmente o país. d) uns vêem no imperialismo ocidental uma barreira para o sucesso da ocidentalização. e) outros comparam a China e o Japão e concluem que razões diferentes levaram ao fracasso chinês e ao sucesso japonês. Na China o estado enfraquecido não pode desenvolver o papel que o governo japonês teve, protegendo sua indústria, acumulando capital, etc. A própria ascensão do Japão ocorreu ao mesmo tempo em que este passa a ter uma atitude agressiva com vizinhos, e particularmente com a China, tomando territórios, obrigando a pagar indenizações de guerra, etc. g) outro motivo poderia ser a fraqueza da burguesia chinesa, que sempre foi muito fraca para ter um papel destacado na industrialização. h) a aliança entre donos da terra e governo sempre foi um dificultador do processo. Estes proprietários não desejavam mudanças sociais. Enfim, a China chega ao regime comunista como um país muito pobre, rural, de baixíssimo nível industrial, com grande analfabetismo e como um país destroçado pelas guerras e lutas externas e internas. 14 A China sob o regime comunista: Primeira fase-1949-1978 A experiência comunista passou por fases, mas as duas grandes delas podem ser inicialmente distintas, sem que cada uma delas não possa ser sub-dividida em outras. A primeira se situa entre 1949-1978, e a segunda após 1978. Numa primeira fase a China esteve praticamente isolada do mundo dito ocidental, em comércio e relações políticas, sendo que esta foi modificada em 1971-1972, quando os Estados Unidos decidiu reatar laços com a China. A primeira fase se iniciou em 1949, quando os comunistas assumem o governo de um país destroçado por anos de ocupação japonesa e guerra de libertação, e posteriormente por uma guerra civil entre comunistas e não comunistas, estes chamados de nacionalistas republicanos. Além de um país paupérrimo e arruinado (ver evolução da renda por habitante que cai em virtude destes problemas na figura acima), tem de enfrentar logo a seguir outros problemas, como o da guerra da Coréia. A chegada dos comunistas com Mao Tsé Tung em 1949 trouxe aspectos positivos como: a) o país estava unido, com exceção de Hong-Kong, Macau e Taiwan, e livre do semicolonialismo de período 1840-1949. b) o estado assume um desejo de caminhar para desenvolver a China, revitalizando o país. c) desde o fim da dinastia Qing, o regime comunista é o primeiro governo realmente central. E com credibilidade antecorrupção, autoritarismo e violência de donos da terra e senhores regionais. Mas ao regime comunista não traz apenas aspectos positivos. Ele tem de enfrentar desafios que se mostram como: a) o governo herdou um país em ruínas, oriundo de 12 anos de guerra contra o Japão e civil. A infra-estrutura era precária, a agricultura estava estagnada, e o setor industrial incipiente. b) ao assumirem o poder, o país vinha de uma hiperinflação, com a falência financeira do estado, e um caos social. c) logo que assumem estoura a guerra da Coréia (junho de 1950) e EUA decretou o embargo comercial à China. Fica vedado a qualquer país aliado dos Estados Unidos comercializar com a China. Os comunistas traçam sua estratégia baseada em: a) criar capacidade administrativa governamental que fosse capaz de atingir todo o país, da vila à cidade grande. b) reforma agrária: atende pobres e reduz poder de proprietários rurais que exploravam trabalhadores rurais. c) ação voltada para grandes massas pobres, que deu respaldo político e social. 15 d) confisco de propriedades dos chineses que se aliaram a estrangeiros, especialmente aos japoneses. e) o país criou um exército forte, coisa que não ocorreu no período final da dinastia Qing nem no período republicano. Este exército teve papel importante na restauração da ordem e no aparato administrativo estatal, assumindo também funções produtivas, especialmente de armas. f) fins de guerras internas e do poder de senhores regionais. g) Propriedade dos meios de produção pelo estado em grande maioria. Estabelece-se a ditadura do proletariado e busca-se a renda de acordo com o trabalho. h) inicialmente o programa previa restauração do comércio com as nações. O embargo vai impedir esta opção i) o embargo americano forçou autonomia em política externa. A China buscou então uma estratégia de desenvolvimento autônomo e fora da ordem econômica capitalista mundial. A guerra da Coréia criou um contexto difícil para o regime comunista. Muitos países rompem relações diplomáticas e comerciais com a China. Além disso, ela aumenta a demanda por bens urbanos e militares, e força a busca de apoio externo na URSS. Ao longo do tempo o governo evoluiu no controle do processo produtivo e em 1956 já tinha o controle da maioria da propriedade, até porque muitas indústrias se instalam após o regime comunista e no âmbito do acordo de cooperação com a URSS, que passa a exercer uma influencia nos rumos políticos e econômicos da China. O embargo americano tem efeito decisivo no comércio exterior da China. Entre 1950 e 1956 o comércio da China com países ocidentais cai de 36% para 8% do comércio exterior do país. Os países sob influencia americana reduzem comércio com a China: Japão passa de 4,3% para 2,3%, Hong-Kong de 13,3 para 6%, países do ASEAN de 6,5% para 1,4%. A Malásia proibiu comércio com a China, e o isolamento faz crescer ainda mais o comércio com a URSS, única opção disponível para obtenção de equipamentos e bens de capital para instalação de indústrias na China naquele contexto. O acordo comercial entre a China e URSS, de fevereiro de 1950 falava em “30 anos de aliança”. Com ele a URSS passou a apoiar o desenvolvimento da China, e o comércio da China com países do Leste Europeu passa de 32% em 1950 para 72% do total do comércio exterior em 1955. Mas a “aliança” com a URSS durou pouco. O medo de ficar sob nova influencia externa levou a China a romper com a URSS e ficar praticamente isolada no mundo. Neste isolamento implantou um modelo de crescimento baseado em recursos internos e não em alianças e apoios externos. Friedrich List, economista que inspirou a Alemanha no séc. XIX foi uma das inspirações da formulação da estratégia do país, junto com Marx. A estratégia traçada para a industrialização se voltou para a criação de uma base de indústria local desligado do mercado mundial. Só depois seria possível abrir o país a mercados externos, quando a economia estivesse mais forte para competir com países e indústrias mais antigas e fortes. Entretanto políticas deste tipo exigem governos muito fortes, onde o governo vai ter um papel central na 16 capitalização para a industrialização. Só após o fortalecimento da economia é que então se faz a abertura para o mercado externo, e se reintegra o país no sistema mundial. A política econômica se voltou inicialmente para o pleno emprego em áreas rurais. A coletivização das áreas rurais foi realizada com custo alto e conflitos, com a criação de fazendas coletivas. O governo comunista conseguiu o aumento da taxa de investimento no país, com o estado desenvolvendo o papel de agente de apropriação de excedentes para aplicá-los na industrialização. Esta taxa passou de 5% ao ano até 1949, a 10% logo após a revolução comunista e atingiu 25% no plano 1953-57 (quinto). Durante a maior parte do tempo foi de 30% do PIB investido ao ano. O aumento do investimento foi direcionado para setores industriais pesados e para uma capacidade militar independente, diante do isolamento e clima de guerras dos anos 50-60. Como a China não tinha acesso a recursos, investimento e financiamento externo, o desenvolvimento só se fez através de recursos próprios, com os negócios conduzidos pelo estado e com planejamento central. Num pequeno período houve crédito da URSS na década de 50. A política de auto-suficiência também influenciou internamente o país, e os grupos mais radicais chegaram a advogar uma revolução cultural autônoma chinesa, que renegasse práticas culturais precedentes. A meta primordial econômica do país foi a de se industrializar rapidamente, com indústrias pesadas, mas tendo a agricultura como o fundamento. O estado liderou a meta de industrialização através da criação de empresas estatais industriais pesadas, não só como um objetivo econômico, mas também militar, pois o contexto hostil da guerra da Coréia e da guerra fria forçou investimentos na segurança do país, que a partir de uma indústria de base e uma indústria bélica poderia fazer frente a possíveis invasões, fato que a China vivenciou nos séculos XIX e XX, e que permanecia na consciência do povo e de suas elites. Para atingir estas metas o planejamento central rígido foi instituído, e a execução era feita pelo próprio estado. Além disto o regime adotou a política de manter custos de investimento baixo através de taxas de juros baixas, preços de energia, de matérias primas e de câmbio baixos. Assim em 1950 a indústria era 30% do PIB, mas só 5% era de indústrias pesadas. Isto vai mudar radicalmente no período. O planejamento era feito em vários níveis (nacional, regional, local), com o estado central dirigindo, executando e fiscalizando. Os salários foram mantidos baixos (custos baixos) até 1978 para facilitar a industrialização pesada e o sistema comunal na agricultura garantia emprego rural a todos com preços baixos dos bens de subsistência básicos. Os serviços essenciais e renda eram distribuídos de forma igualitária. Nas áreas urbanas as empresas deveriam atingir metas, mas lucros e eficiência não eram o determinante. O país tinha um sistema bancário submetido ao Banco do Povo da China, que fazia um papel de banco central. Mas existiam bancos setoriais (construção, agricultura e Banco da China). 17 A partir de 1953 o planejamento se torna mais rígido, com a alocação centralizada de matérias-primas e bens industriais. As empresas não podiam comprar matérias-primas diretamente do mercado. O estado é quem negociava, o que tornou o sistema ineficiente e rígido. O planejamento central levou a rápido crescimento inicial. Em 1957, a indústria chinesa era a que mais crescia na Ásia. Em 1958, o excessivo otimismo levou o governo a criar um plano muito ambicioso que se revelou desastroso. O governo foi obrigado então a rever seus planos, e a economia se recuperou até 1963. 1 Plano qüinqüenal 2 plano qüinqüenal 1963-1965 3 plano qüinqüenal 4 plano qüinqüenal 1976-1978 Agricultura Indústria leve Indústria pesada Outros 7,1 6,4 36,2 50,3 11,3 6,4 54,0 28,3 17,6 3,9 45,9 32,6 10,7 4,4 51,1 33,8 9,8 5,8 49,6 34,8 10,8 5,4 49,6 33,7 Tabela 5: China: percentual de investimentos no período 1949-1978 - Fonte: Aiguo, Lu 2000. 1949 1980 70 24,6 Indústria leve 22,1 35,4 Indústria pesada 7,9 40,4 Agricultura Tabela 6: Percentual de composição do PIB da China: 1949-1980 - Fonte: Aiguo, Lu 2000. No período entre 1949-1978 a economia cresceu a uma taxa de 5,9% a.a., e o investimento atinge 35% do PIB. O país pobre vai, aos poucos, saindo do caos do pós-guerra, e se tornou auto-suficiente em alguns itens como energia, insumos diversos, e se desenvolve em aspectos militares como a fabricação da bomba atômica, mísseis, etc. Continuou um país eminentemente rural por opção, e sem possuir uma indústria leve voltada para o consumo de massas. Mas atingiu desenvolvimento em itens industriais pesados como química, cimento, fertilizantes, aço, energia, etc. A composição do PIB na figura acima mostra como a indústria pesada se desenvolveu no período 1949-1980, passando a ser o maior item da economia do país, num país em que os serviços não tinham a importância que ocorre na economia ocidental, e só recentemente passam a ter expressiva composição do PIB do país (comércio, bancos, etc). 18 No final dos anos 70 a indústria pesada era capaz de suprir o país com qualquer matéria-prima necessária à industrialização leve, agricultura (fertilizantes, pesticidas, etc), materiais de construção civil, indústria atômica, militar, etc. Mas a produção tinha padrões de eficiência baixa. Faltavam incentivos e autonomia operacional para empresas, com gerenciamento muito rígido. Nesta época a população ainda vivia no campo. Como a industrialização pesada é capital intensiva, mas absorve pouca mão de obra, isto ajudou a manter o país essencialmente rural, pois a indústria pesada absorvia pouca mão-de-obra. Isto fez com que o planejamento central mantivesse uma rigidez de deslocamento espacial de mão-de-obra. Para morar em cidades é preciso ter o cartão que autoriza o cidadão a viver ali e obter emprego. Este fato, para um país de 1,3 bilhão de habitantes reduziu os riscos de uma favelização, comum nos países em desenvolvimento. Neste período o papel do comércio exterior era secundário, pois o país esteve sob embargo até 1972, com destaque apenas para o período inicial de comércio com a URSS. Como o processo de industrialização voltou-se para a indústria pesada, o país se desenvolveu com um certo grau de igualitarismo de distribuição de renda em comparação a países de mesmo nível de renda. A política de pleno emprego no campo mantinha uma renda mínima e a aliança política com os camponeses era importante elemento. Como o crescimento econômico não enriqueceu uma classe interna específica, nem foi expatriado por investimento estrangeiro por remessas de lucros nem juros, isto permitiu uma renda aproximadamente igualitária. Interessante observar que a China manteve uma boa taxa de crescimento da economia mesmo sob embargo ocidental imposta a partir de 1950. À época havia a visão de que o ocidente viveria sem a China, mas a China não poderia viver sem o ocidente. Esta visão mostrou-se equivocada, pois: a) a China tinha sido introduzida no mercado mundial antes de 1949 (desde 1840), mas foi tornado um país periférico do sistema mundial. b) a implementação de uma estratégia de auto-suficiência e de desconexão com o sistema mundial foi implementada com sucesso pelos chineses, o que permitiu um crescimento industrial e econômico mesmo sob embargo. c) a China pela primeira vez, nos tempos modernos, estava se tornando uma nação moderna e poderosa e com um forte senso de vontade nacional. As hostilidades externas apenas solidificaram esta vontade. Assim, neste período o comércio exterior teve apenas a função de catalisar o desenvolvimento com compra de instalações industriais necessárias, e fornecer divisas para pagar emergências alimentares, de modo a não perturbar o mercado interno e de alguns outros produtos. Para isto não era necessário um intenso comércio exterior. Mesmo assim, no período inicial do regime comunista, o intenso comércio com o bloco soviético gerou déficits externos. No período entre 1953-56 os chineses compraram 156 grandes plantas industriais na URSS, além de assistência tecnológica e treinamento a chineses. Este déficit com o bloco soviético desafiava a política de auto-suficiência. Convém não esquecer que, mesmo neste período, os chineses mantiveram algum comércio com outros países e em 1952 a China assinou um primeiro acordo de comércio com o Japão. Mesmo com paises que não tinham relações diplomáticas e outros do ASEAN o comércio cresceu 12 % a.a. entre 1950-58, em decorrência do próprio crescimento da economia. 19 Em 1960 culmina uma crise diplomática entre a China e a URSS, o que põe fim ao comércio entre estes países. Uma orientação mais voltada para o mercado interno se seguiu, o que prejudicou o comércio exterior. Após esta crise com a URSS, o país se voltou mais para o Japão, com a assinatura de memorandum Liao Chengzhi-Takasaki Tatsumoto em 1960. A partir daí a China passou a comprar fábricas inteiras do Japão, que se tornou o seu primeiro parceiro comercial com 13% do comércio exterior do país. Mas, aos poucos, Hong Kong se tornou também um entreposto da China, com grande crescimento de comércio (16% a.a.). Como a política interna chinesa foi cíclica, ora com hegemonia de grupos mais radicais que pregam maior auto-suficiência e independência do exterior, ora com a hegemonia de grupos mais pragmáticos, isto se refletiu no comércio externo e na diplomacia chinesa. Nos períodos de maior extremismo político advogava-se a saída do mercado externo, e elevar a política de auto-suficiência ao extremo. Mesmo neste período ele não foi abandonado, e o comércio exterior cresceu 5,3% ao ano entre 1966-1972. O estado manteve durante toda a etapa do regime entre 1949-1978 um enorme poder de planejamento, e este poder facilitou a etapa seguinte, em que o próprio estado vai administrar as mudanças. Um aspecto determinante das transformações que a China passaria a partir de 1978, foi a abertura americana ao país, e fim do embargo comercial. Em 1971-72 os Estados Unidos resolveram mudar sua política em relação à China, decretando o fim do embargo comercial, estabelecem relações diplomáticas com os chineses e levam a China a ser membro da ONU e do Conselho de Segurança. Os acordos China-EUA finalizam a situação de embargo e “isolamento”. Em 15 de julho de 1971 os EUA anunciaram mudanças na sua política com a China. Altos funcionários americanos foram até Pequim para conversações. Em outubro de 1971 a China é admitida na ONU. Em 1972 Nixon visitou a China e os EUA abandonam embargo à China. Os motivo desta guinada na política externa americana seriam vários. Há muitas interpretações deste fato. Uma delas é que como foram os Estados Unidos que mudaram sua política, e porque mesmo sob embargo a China cresceu a taxas expressivas, e buscando a auto-suficiência. Há quem julgue que a China demonstrou que a sua política de autonomia e auto-suficiência saiu vitoriosa. Outros associam a abertura americana a interesses estratégicos, e principalmente aos lucros que comércio internacional China-Japão e triangulações, via Hong Kong, davam a empresas destes locais bons lucros, pois os japoneses não estavam seguindo o embargo americano. Estes lucros no comércio com a China poderiam ser obtidos por empresas americanas a partir da abertura. Além disso, por sua política independente e auto-suficiente, a China mantinha distancia de interesses soviéticos, o que poderia ser interessante para os americanos em suas divergências e guerra-fria com a URSS. Além disso, o crescimento da China em vários aspectos, como na fabricação de bomba atômica, dava ao país um novo status que foi reconhecido pelos Estados Unidos. O fim do embargo foi visto pelos chineses como vitória de sua política de auto-suficiência, e em pouco tempo o comércio China-EUA cresce vertiginosamente. 20 Ano Exportação dos EUA para. China Exportação da China para. EUA Saldo EUA 1972 66 32 34 1975 304 156 148 1980 3755 1059 2696 Tabela 7: Comércio China-Estado Unidos após fim do embargo americano (milhões de dólares correntes) Fonte: Wu, Jinglian 2005. Os dados acima demonstram que os americanos tinham boas razões comerciais para colocarem um fim no embargo à China. Os saldos crescentes e bilionários que tiveram com a nova política em relação a este país justificavam esta mudança de posição. A China, ávida de tecnologia e bens que antes lhe era impossível obter, compraram nos Estados Unidos o que precisavam. Assim entre 1972-1978 a China começou a viver uma etapa de transição, com abertura comercial ao exterior, volta ao sistema mundial através da ONU e Conselho de Segurança. Internamente isto reforçou grupos menos radicais e levantou a questão da necessidade de uma política voltada para a auto-suficiência, pois ela se tornou desnecessária com a nova inserção chinesa no mundo. Os resultados do período 1949-78 possibilitaram a discussão de uma nova política, pois o estado chinês não era mais um estado fraco, ao contrário era um estado forte e as ameaças de intervenções externas como aconteceram até 1945 não eram mais plausíveis. Além disto o país dispunha de uma força armada grande e bombas atômicas; e a economia se fortaleceu em indústria pesada que poderia servir de base para outro tipo de crescimento e novas prioridades econômicas. Assim, entre 1972-78 pode-se ver o crescimento do comércio exterior chinês, que passou de 4,8 bilhões de dólares em 1972 para 20,6 bilhões em 1978. Neste período há vários anos com déficits externos e os chineses começam a se preocupar em ter produtos de exportação para fazer frente a estes déficits. Ano Export. Import. Total % cresc. Saldo 1971 2636 2205 4841 - 431 1972 3443 2858 6301 30,2 585 1973 5819 5157 10976 74,2 662 1974 6949 7619 14568 32,7 -670 1975 7264 7487 14751 1,3 -223 1976 6855 6578 13433 -8,9 277 1977 7590 7214 14804 10,2 376 1978 9745 10893 20638 39,4 -1148 Tabela 8: Comércio exterior da China: 1972-1978 (valores em milhões de dólares USA) Fonte: Wu, Jinglian 2005. 21 Um aspecto importantíssimo das reformas chinesas é que elas aconteceram enquanto a economia crescia de forma vigorosa, diferentemente da URSS que quando decidiu introduzir mudanças o fez em período de crise econômica. Isto fez com que a decisão de mudanças de diretrizes econômicas e reformas na China acontecessem em clima muito mais favorável. A China sob o regime comunista: segunda fase pós-1978 Já vimos que a China volta ao mercado externo. Logo a seguir adotou política de reformas e abertura. Por que abertura e reformas? As respostas divergem: a) há quem ache que foi porque faliu a estratégia da auto-suficiência. b) outros pensam exatamente o contrário: foi o sucesso da industrialização do período da busca da auto-suficiência que possibilitou a China a retornar ao mercado externo, agora com nova posição, com melhor relação de troca. A primeira característica importante das reformas chinesas é que elas nascem no estado, são e continuam até aqui dirigidas por ele. Mesmo que o estado descentralize decisões e ações econômicas, o estado é quem dirige o processo de mudanças. Ele direciona suas reformas para maior eficiência econômica, para a indústria leve, a eficiência da produção agrícola, introduz parâmetros de mercado, desenvolveu um setor econômico não estatal, estabeleceu parâmetros de investimento externo, etc. É o estado o agente de mudanças e reformas, que acontecem de modo gradual, monitorado e avaliado ao longo do processo. Quando aconteceu a reintegração da economia chinesa ao mercado mundial ela não estava em colapso como na URSS, pelo contrário, crescia. Críticos internos diziam que para evitar problemas eram necessárias mudanças. E a China, então, percorre os caminhos da mudança num contexto macroeconômico positivo. Assim as reformas foram conduzidas sem desacreditar o planejamento central. Pelo contrário, elas são, em grande parte, resultado da capacidade de planejar, mesmo que o plano fosse criar um setor que crescesse “fora do plano”, com mais liberdade. As reformas visavam criar um novo dinamismo na economia, que não se baseasse nos parâmetros de preços protegidos, que geravam ineficiência econômica. Essas reformas são também decorrentes de uma geração nova que substituiu a geração de Mao Tsé Tung. Era uma geração nacionalista, mas menos marxista que a anterior. A estratégia das mudanças era para criar condições para que o país crescesse como alguns vizinhos, e possibilitar melhoria de condições da população. Alguns países dos NIC asiáticos eram antigos países periféricos da China, e estavam se desenvolvendo a taxas maiores do que ela. E aprender com vizinhos era importante. Daí vai surgir a estratégia de voltar economia para exportação como eles fizeram (Japão, Coréia, Taiwan, Singapura, Hong Kong, etc). As novas condições externas vão favorecer a reintegração da China, pois estreitou relações com EUA, reintegrou no sistema internacional através da ONU. Interesses de empresas americanas eram vender produtos e serviços para a China e se possível penetrar no seu mercado. Isto favoreceu a reintegração da China ao sistema mundial, agora como um país com status diferente da época em que fora o “doente da Ásia”. 22 A frase de Deng Xiaoping bem expressa esta necessidade de se reintegrar ao sistema mundial. Afinal a história mostrou que na dinastia Qing a China esteve isolada do mundo, mas isto acabou por lhe custar um preço elevado posteriormente nos séculos XIX e XX. “Se mantivermos o protecionismo como nossa via maior de desenvolvimento da economia nacional, nós certamente nos isolaremos do ciclo da economia mundial. Isto temporariamente protege a indústria e o comércio nacional, mas é péssimo do ponto de vista do longo prazo”. Para se lançar às reformas, a liderança chinesa tinha confiança na abertura em função dos fundamentos macroeconômicos do país, que eram muito diferentes daqueles existentes em 1949. Se a capacidade produtiva da indústria pesada chinesa era um estímulo à reinserção do país na economia mundial, por outro lado um incentivo era a necessidade de desenvolver uma indústria leve, para preencher o gap da indústria chinesa em termos de produtos leves, praticamente inexistentes no país, e de melhoria de qualidade e eficiência da economia. Os próprios déficits iniciais de comércio com os Estados Unidos eram estímulos a mais abertura, pois era preciso exportar para fazer frente a estes déficits. Mas desenvolver novo padrão de consumo, agora baseado a produtos de consumo de massa requereu inclusive mudanças de padrão da população em termos de poder aquisitivo. As reformas introduzidas tiveram algumas características gerais como: a) não foi realizada como terapia de choque, mas gradualmente, setor por setor econômico. Levou mais tempo para passar da economia planificada para a de mercado do que o contrário. b) envolveu macro e microeconomia. c) incluiu a descoletivização da agricultura; descentralização das decisões econômicas; encorajamento do setor não estatal; incentivos para que empresas se tornassem rentáveis financeiramente; adoção de políticas fiscais e tributárias. d) o processo foi e é conduzido e planejado pelo estado; e) objetivo inicia: reformas e revitalização da economia através da introdução de elementos de mercado; f) transição lenta, mas muito ampla; g) abrangeu todos os setores da economia Se a revolução comunista teve no campo uma de suas prioridades e experimentou várias tentativas distintas de organização da produção agrícola, também é no campo que as reformas se iniciam. Elas se concentraram inicialmente na criação de uma produção agrícola mais eficiente, com maior estímulo pessoal e familiar, criando-se unidades rurais familiares não proprietárias da terra, mas que pagam arrendamento (por tempo determinado, podendo ser renovado). Concedeu-se ampla liberdade de produção, de preços e extinguiram-se as comunas agrícolas. Isto foi feito para aumentar eficiência e melhoria da atividade agrícola, com incentivos individuais (às famílias). As diferentes etapas de mudança no campo, tão bem descritas em vários estudos econômicos, vão criando um clima favorável e aumentam a produtividade agrícola. Isto levou à criação de indústrias rurais, muitas ligadas ao processo de produção da agricultura, as chamadas TVE (Town Vilages Enterprises), que são descritas como empresas industriais rurais, a maioria voltada ao processo de produção agrícola. 23 O crescimento da produtividade rural fez com que a economia como um todo se beneficiasse deste processo. A disponibilidade de maior renda no campo estimulou novos investimentos, e criou o primeiro ciclo de crescimento pós-reforma. O sucesso das primeiras reformas no campo se revelou limitado. Mas o seu sucesso estimulou novas reformas, que se direcionaram então para a criação de empresas urbanas voltadas para a indústria de bens de consumo leves. Ressalte-se que a propriedade das terras permaneceu com as vilas, que as arrenda e muitas vezes investe esta renda em indústrias de transformação de bens agrícolas. Esta vai ser a maior conseqüência da reforma rural até meados dos anos 80. Estas indústrias criadas nas vilas rurais foram responsáveis pelo declínio inicial da importância do valor da produção industrial estatal, que passou de 80% do valor total industrial em 1978 para 50% na metade dos anos 90, e 33% em 1997. Este declínio não se deveu à estagnação do setor estatal, mas ao maior crescimento do setor não estatal. Não são apenas as prioridades econômicas que mudam ao longo do tempo. Também as instituições se transformaram, e o próprio estado se reformou no processo de reformas. Ele o fez em sua estrutura institucional, suas empresas, sua economia. Delegou-se cada vez mais a execução e operacionalização das atividades econômicas. Estimulou-se investimentos não estatais, e cresceu o setor não governamental. Estimulou-se investimentos externos, jointventures, etc. O estado ainda hoje intervém, dirige, mas delega cada vez mais tarefas e execução delas a terceiros públicos e não públicos, a províncias e cidades. Após a reforma agrícola a ênfase de investimentos se direciona à indústria leve. Isto fica evidente no período 1978-1992, quando a expansão de indústrias leves muda o perfil do crescimento industrial, e a indústria pesada cresceu apenas dois terços da leve entre 19781992. Esta ênfase na indústria leve vai permitir maior eficiência energética no país, pois a indústria leve é menos intensiva em energia, e ao mesmo tempo permitiu um amplo emprego de mão-de-obra urbana, o que favoreceu à urbanização do país, absorvendo mão-de-obra que migrou do campo para as cidades, inclusive as novas cidades criadas no período. Um ponto relevante das reformas foi a redução do papel do estado na alocação de recursos, com as empresas estatais passando a alocar recursos em função de princípios de mercado. Elas passam a ter autonomia de investimentos, vendas, preços, compras, retenção e alocação de recursos, salários e bônus, escolhas tecnológicas, etc. Estas funções descentralizadas foram sendo delegadas gradativamente. A legislação de falência de empresas estatais força mudanças gerenciais, e como qualquer empresa privada, as ineficientes fecham suas portas. Isto não significou que o setor estatal fosse totalmente livre. Ele ainda desempenha papéis desejados pelo estado, como no caso de organização das três empresas do setor petrolífero chinês. Esta delegação reduziu o papel do planejamento trazido pela descentralização de execuções a partir de metas traçadas. As reformas introduziram estruturas de renda e de emprego mais diferenciadas e estratificadas, muito menos igualitária. Surgiu amplo setor de empregados de setor não estatal, donos de comércio, prestadores de serviços privados, empresários urbanos e rurais. Ainda há proteção social no setor estatal, mas ele se vincula cada vez mais à performance da empresa. As reformas incluíram mudanças no setor de comércio exterior que passou por reestruturação e reforma. Decisões foram descentralizadas fez-se encorajamento do comércio externo. Criaram-se trading companies e empresas de vários tipos. O câmbio manteve-se como área 24 sensível e sob controle governamental, mas aos poucos as empresas e bancos vão tendo alguma liberdade de uso de recursos de exportação. Também a política de preços foi sendo liberalizada. Em 1993, 93% dos preços do varejo eram determinados pelo mercado, 90% dos preços agrícolas e 85% do atacado. O estado que era o fixador de preços vai, aos poucos, se retirando desta tarefa, apesar de manter alguns sob controle como energia, petróleo e seus derivados, etc, o que aliás acontece em muitos países em desenvolvimento. As reformas atingem a abertura de algumas cidades ao capital externo (inicialmente 14, incluindo junto a Shangai, com a área de Pudong). Posteriormente novas cidades vão sendo incorporadas a esta lista. Criaram-se parques tecnológicos para serem centros produtores de inovação e produção de tecnologia, inclusive junto de universidades e centros de pesquisa. Fez-se uma grande descentralização de ações para autoridades locais e provinciais, que são encarregadas de buscarem investimentos. Com investimentos estrangeiros, empresas estrangeiras abrem filias na China, bem como joint-ventures. Esse investimento atinge atualmente o valor de 400 bilhões de dólares. Essas empresas estrangeiras e joint-ventures têm papel destacado na exportação chinesa desde os anos 90, representando mais de 40% das exportações. Tudo isto fez crescer o comércio exterior no período. Os dados a seguir o demonstram: Ano Exportação Importação Saldo 1978 9,8 10,9 -1,1 1983 22,2 21,4 0,8 1988 47,5 55,3 -7,8 1993 91,7 104,0 -12,2 1996 151,1 138,8 12,6 Tabela 9: Comércio exterior da China1978-1996 (bilhões de USA dólar) Fonte: Aiguo, Lu 2000. O objetivo inicial do incentivo às exportações foi o de obter moeda forte para pagar importações e ter acesso a altas tecnologias e equipamentos. Para isto o governo adota várias ações, onde a entrada no comércio exterior foi facilitada a produtores e governos locais. Os déficits iniciais levaram os governos à retenção de recursos, situação que se modifica posteriormente à medida que cresceram os superávits de comércio exterior. Isto levou a maior abertura e descentralização de ações de uso de recursos de exportação para empresas. O comércio externo mudou de composição setorial, com redução da importância de exportações primárias e crescimento de produtos industrializados na pauta exportadora. 25 1980 1990 2002 50,2 25,5 8,8 16,5 10,6 4,5 9,5 5,7 1,7 23,5 8,4 2,6 49,8 74,5 91,2 6,2 6,0 4,7 B2-Tëxteis 22,1 20,3 16,3 B3-Eletromec. 4,7 9,0 39,0 B4-Miscelanänea (inclui roupas). 15,7 20,4 31,1 C-Outros não class. 1,2 18,7 0,02 A-Produtos. Primários A1-Alimentos A2-Agricultura A3-Combustíveis fóssil B-Produtos acabados B1-Química. Tabela 10: Exportações da China: participação percentual de setores Fonte: Wu, Jinglian 2005. A mudanças na estrutura das exportações refletiu uma estratégia política do estado e criou novas situações como: a) empresas estrangeiras ou com fundos estrangeiros se beneficiaram de tratamentos preferenciais, o que não era concedido a empresas estatais e que se tornou mais grave com o tempo. b) diferentes práticas trabalhistas na relação capital-trabalho, com participação do país na divisão internacional do trabalho. Os investimentos estrangeiros se concentraram inicialmente em 12 províncias da costa leste e no sul, onde Guangdong e Fujian se destacaram. Entre 1979 e 1991, 85% dos investimentos estrangeiros se concentravam na costa leste e sul, sendo 53% no sul, e 43% em Guangdong e Fujian, que se beneficiaram da proximidade com Hong Kong e Taiwan fazendo a região sul se tornar atrativa, especialmente para capitais destes locais. A partir de 1992 o governo se empenhou em diversificar geograficamente os investimentos, com sucesso no nordeste do país. Com as reformas o governo continua a ter funções chaves, mas mudou de papel. Tanto na China como em Taiwan o estado teve/tem papel central desenvolvendo políticas que visaram sempre o longo prazo. Em ambos não se pergunta se estado devia ou não intervir, pois ele sempre foi interventor, seja na República Popular da China (continente) ou em Taiwan, capitalista. Na reestruturação, o estado vai abandonando o papel de planejador central com funções delegadas às províncias, ao poder local e às autoridades locais aumentam seu poder. Posteriormente muitos problemas decorrem desta delegação às autoridades locais. Surgiu uma concorrência entre províncias que dificultou a política fiscal. Províncias criaram barreiras e taxas de produtos entre si. O planejamento se viu muitas vezes ultrapassado por ações provinciais, o que se revelou grave quando o poder central desejou reduzir o ritmo de 26 crescimento nacional. Esta delegação das reformas criou poderes locais e provinciais empreendedores, e uma geração de empreendedores públicos, que supriu o país de uma deficiência da existência de empreendedores privados. As autoridades locais criaram serviços de apoio aos empreendimentos como serviços financeiros, treinamento, coordenação, o que facilitou o crescimento econômico de localidades e províncias, mas que também fortaleceu seu poder de determinar o crescimento sem necessitar de apoios do governo central. O estado central chinês passou a ter mais o papel de formulador de metas e de políticas gerais e a usar políticas macroeconômicas mais clássicas na gestão da economia. No entanto muito do poder passou para províncias e localidades. As iniciativas locais e provinciais acabaram por criar ambiente de grande competição interna. A reforma afetou também o papel produtivo do exército nacional, com suas empresas antes voltadas para o setor militar. Ele se envolveu em novos negócios na economia, como empresas lucrativas da indústria leve, com a reorientação do seu parque industrial militar. Surgem inúmeras instituições de apoio a negócios, à criação e apoio a empresas, e a atividades empreendedoras, desde escola a bancos de fomento locais e provinciais. São tantas as ações privadas ligadas ao estado, províncias e localidades que se chega a um status de “estado quase-business”, onde ficou difícil distinguir onde começa o estado ou a iniciativa privada, pois o estado soma forças com setor produtivo. Economia e estado quase se fundem. A enorme delegação às províncias e localidades se traduziu também nas reformas tributárias, que reduziram o papel do estado central: a receita central caiu de 35,5% do PIB em 1978 para 12% em 1995. Isto se traduziu numa redução do investimento militar, mas não em outros investimentos e na perda de poder do governo central, e crescimento do poder de províncias e localidades que aumentaram muito a sua participação nas receitas. Muitos governos locais e provinciais utilizaram esta receita para criar empresas e investir no desenvolvimento empresarial provincial e local. Isto reforçou ainda mais a descentralização e o poder local e provincial. Há quem diga que se criou na China uma “rica localidade e uma pobre centralidade”. Há movimentos no sentido de se recentralizar parte dos recursos, mas autoridades locais e provinciais resistem a perderem receitas, e se tornaram fortes com grande lobby político. As reformas, a diáspora chinesa e a economia. Um aspecto importante é a aliança estatal com novos capitalistas, especialmente chineses do exterior, da diáspora. Esta aliança vai trazer investimentos de chineses ricos do exterior ao país. A existência de uma comunidade chinesa forte e rica no exterior favoreceu a rede de negócios que se estabeleceu após as reformas. Esta rede foi determinante em três fatores: foi fonte importante de recursos externos que foram investidos na China, fonte de experiência gerencial capitalista, fonte de rede de relações em países com grande população chinesa economicamente forte como em Singapura, Malásia, Indonésia, Filipinas. Também Hong Kong, que reexportava entre 50 e 66% do que a China exportava para a cidade, era uma espécie de entreposto de exportações chinesas. Com a abertura chinesa ela será um dos grandes investidores na China, inicialmente em suas redondezas, e continua a exercer papel importante nas exportações chinesas através destes investimentos. 27 Com as reformas Taiwan liberalizou exportações para China e o comércio com a China cresceu com superávit para Taiwan. No fim dos anos 80 aumentou os investimentos externos na China, e Hong Kong liderava, com 60% deles inicialmente, o que mostra a relevância do papel da Hong Kong na fase inicial dos investimentos externos na China. Aos poucos cresceram também os investimentos de Taiwan na China. Em 1993 ele foi multiplicado por seis. Nos anos 90, 70% dos investimentos externos eram provenientes de Hong Kong e Taiwan, e só 7% dos EUA, e 6% do Japão. Isto mostra como outros países tiveram papel reduzido no estágio inicial de investimentos externos na China. Gradualmente se criou uma rede de negócios entre a China, Hong Kong e Taiwan que se tornou nós de uma rede de negócios, que abrange países do sudeste asiático como Tailândia, Malásia, Filipinas, Indonésia. A rede de negócios chineses da Ásia se iniciou no século XIX, com início de ocupação capitalista da China. Postos de comércio em Hong Kong, Macau e outros locais, e depois a separação de Taiwan pela ocupação japonesa, e de regime pró-ocidente em Taiwan após a saída do Japão deste território, vão criar redes de comércio nestes locais. Com o início do comunismo, a diáspora cresceu, com homens de negócio chineses indo para vários países asiáticos. O poder desta população da diáspora é grande. No início de anos 90 o PIB de países do leste asiático em mãos de chineses era estimado em 2 trilhões de dólares. Estudo da Forbes mostrou que entre 1993-94 existiam 34 famílias chinesas no sudeste da Ásia com ativos que valiam entre um e 6,5 bilhões de dólares, o que mostrava o potencial de investimentos destes chineses da diáspora. Este potencial não foi desprezado pelo governo de Pequim, ao contrário, o governo chinês se aproximou de grandes capitalistas chineses do exterior e os estimulou a investirem na China. Para isto o governo vai atrair capitalistas chineses de Hong Kong que sempre foram discriminados pelos britânicos, que passaram a receber tratamento VIP na China. Laços políticos estreitos se estabeleceram entre o Partido Comunista Chinês e importantes capitalistas chineses do exterior. A criação de zonas especiais de investimentos junto a Shangai (Shenzen), Macau (Zhuhai), Shantou e Xiamen e junto do estreito de Taiwan, vão favorecer esta atração de capitais de Hong Kong e Taiwan. A quinta zona, também no sul da China, foi Hainan, o que mostra como o sul da China e sua proximidade com Taiwan e Hong Kong tiveram tratamento especial no início das reformas. A grande presença de investimentos de Hong Kong, Taiwan e o baixo investimento de multinacionais de outros países se explicam pela cautela destas, que não se lançaram em investimentos e parcerias na China. Elas investiram o mínimo possível esperando regulamentações, legislações mais favoráveis, etc. Isto abriu espaço para os chineses da diáspora estabelecerem negócios na China. Além disto, a afinidade cultural, laços familiares, hábitos e língua comum favoreceram a atuação de empresários chineses da diáspora a investirem na China. Chegou-se a cunhar a expressão ‘chinesidade’, que não seria apenas cultural, mas também uma chinesidade nos negócios. Esta estratégia foi bem sucedida. Em poucos anos os lucros dos chineses do exterior e crescimento de negócios foi muito grande, e em Guangdong 3 a 4 milhões de pessoas trabalhavam para empresas de Hong Kong. A transferência de indústrias de Hong Kong para a China fez com que mão de obra de Hong Kong, envolvida na produção industrial, caísse pela metade em poucos anos, bem como levou a uma queda de salários em Hong Kong. 28 Mas o inverso também acontecia. A China também investiu em Hong Kong e algumas vezes em Taiwan, mas o governo de Taiwan ainda proíbe investimentos de empresas chinesas em seu território. No entanto subsidiárias chinesas do exterior passam a investir em Taiwan, e investimentos chineses indiretos acontecem à revelia da legislação de Taiwan. Tudo isto estreita a rede de negócios China-Hong Kong-Taiwan. Alguns estudiosos, como Arrighi, explicam o processo chinês pelo modelo de Ozawa, desenvolvido para explicar o crescimento asiático. Ele é um modelo hierarquizado, onde setores intensivos em mão-de-obra vão migrando de um país para outro ao longo do tempo, pois países que avançam tecnologicamente tendem a transferir setores mais intensivos em mão-de-obra para outros menos desenvolvidos. Nele os Estados Unidos liderou o processo regional decrescimento no pós-guerra, no segundo estágio o Japão teve a liderança. A China se integraria neste modelo, bem como o Vietnã, como base da pirâmide. Na terceira fase o governo chinês e a diáspora chinesa vão exercer a liderança da expansão da região e contraria a expectativa de apenas se integrar como país exportador de produtos de baixa tecnologia. Da liderança e aliança do governo chinês com capitalistas chineses da diáspora emerge um novo centro regional de desenvolvimento, onde a unificação nacional assumiu um papel importante. Agora se busca é uma unificação nacional através do business, econômica, a unificação nacional política e territorial, poderá ocorrer mais adiante. Deste modo a China também se tornou concorrente de outros países que estão em estágios mais avançados de desenvolvimento no modelo de Ozawa, devido à sua estrutura produtiva. Isto contestou o modelo de que a China só conseguiria ser competitiva em produtos de baixo valor agregado e de mão-de-obra intensiva. Hoje ela concorre em níveis distintos de tecnologia e de intensividade de mão-de-obra, exportando desde computadores e semicondutores a confecções. A criação desta rede e as reformas introduzidas na China fizeram com que o crescimento econômico do país atingisse um período longo de taxas elevadas de crescimento econômico, e de crescimento do comércio exterior sem precedentes. A figura abaixo demonstra com dados esta afirmação. País China Índia Indonésia Filipinas Coréia do Sul Hong Kong Singapura Brasil Am.Lat. Caribe Rússia Países desenv. México 18,1 5,1 10,1 2,2 7,3 ____ 9,2 1,7 Valor export. 80-90 12,9 7,2 -0,3 3,9 15,0 16,8 9,9 5,1 Valor export. 91-95 19,1 11,5 11,7 16,2 12,8 15,9 17,6 9,0 1,4 2,5 3,0 9,1 -9,8 ------ ------- ------ ------ 1,1 1,0 0,5 8,2 13,7 Pib 198090 Pib 199195 Indústria 80-90 Indústria 91-95 10,2 5,8 6,1 1,0 9,4 6,9 6,4 2,7 12,8 4,6 7,6 2,3 7,2 5,6 8,7 2,7 11,1 7,1 6,9 -0,9 13,1 ____ 5,4 2,0 1,7 3,2 1,9 1,0 Tabela 11: Crescimento do PIB, da indústria e exportações de alguns países e regiões. Fonte: Aiguo, Lu 2000. 29 Para finalizar convém apresentar alguns dados do que significou o crescimento da indústria leve chinesa, que no período dos anos 1980-1990 foi muitíssimo grande, transformando o país num grande produtor de eletrodomésticos, com o surgimento de marcas chinesas fortes exportadas para a Ásia e outros países. Deste modo a produção de fogões, geladeiras, arcondicionados, ventiladores e outros se transformaram em grandes produtos nacionais de uma recente indústria leve. A economia chinesa no período 2000-2007: a opção de desenvolver, novamente, indústrias pesadas. A economia chinesa a partir do ano 2000 passou por grandes transformações. Investimentos crescentes foram feitos em setores antes não tão privilegiados, e voltou-se a investir de forma intensa em indústria pesada, como a produção de aço, de não-ferrosos (especialmente alumínio), cresceu enormemente a produção de energia e consequentemente de carvão. Enfim, a indústria pesada, que não tinha sido prioridade no período pós-reformas, voltou a desempenhar papel importante no crescimento chinês. Esta nova realidade fez da China uma grande importadora de recursos minerais como o minério de ferro, o que afetou o desempenho do setor no Brasil e as exportações brasileiras. Nalguns casos, como o do alumínio, o país passou a exportador em anos recentes. Como as indústrias pesadas são intensivas em energia, isto aumentou a demanda de energia no país, o transformando num grande emissor de CO2 do planeta. Estes investimentos chineses em indústria pesada levaram a uma enorme pressão sobre os preços de commodities no mundo, que somado ao crescente consumo e importação de alimentos, gerou uma pressão de aumento de preços destes itens. Por que a China fez esta opção, se o setor de indústria pesada absorve pouca mão-de-obra, é intensivo em energia e capital? Se a China precisa dar emprego à sua farta mão-de-obra, quais as razões desta opção, aparentemente contraditória à sua farta disponibilidade de mãode-obra a custo baixo, de voltar a investir pesadamente em indústrias pesadas que são intensivas em capital, mas que absorvem pouca mão-de-obra, recurso que o país tem em abundancia? Muitas poderiam ser as respostas. Uma delas foram as crescentes importações do país em bens oriundos de indústria pesada, como aço e outros itens, até o desejo de províncias e localidades, onde existem jazidas de alumínio e outros minerais, de utilizar seus recursos para seu desenvolvimento. Mas não há dúvida de que o aceleradíssimo crescimento da indústria pesada chinesa nos anos recentes gerou pressões em todo o mundo, especialmente de preços, e fez a alegria de empresas produtoras como a Vale e BHP. Talvez a razão principal dos investimentos em indústria pesada tenham sido as oportunidades de lucros do setor, que cresceram mais do que a indústria leve chinesa recentemente. Também a necessidade e demanda oriunda do grande esforço de criação de infra-estrutura que o país tem feito. Neste setor a China tem investido muitíssimo, expandindo cidades, construindo ferrovias, aeroportos, expandindo portos, além de desenvolver uma nova indústria automobilística, que em 2007 produziu 8,8 milhões de veículos, sendo a segunda do mundo. Em ferrovias investiu 71 bilhões de dólares entre 2003-2007, e prevê investimentos de 41 bilhões de dólares em 2008. Neste setor o país investe em 7.820km em 2008 e iniciará a construção de trem bala Pequim-Shangai. No total a China colocará em uso mais 15.000km de novas ferrovias em três anos, sendo 7.000 km apenas destinada ao transporte de 30 passageiros de alta velocidade. Em 2020 pretende atingir 120.000km de ferrovias. E em 2008 transportará 1,4 bilhão/dia de passageiros e mais de 3,3 bilhões de toneladas de carga, com receitas de 49,5 bilhões de dólares. Tudo isto mostra que a infra-estrutura em construção é muito elevada, exigindo bens minerais como aço, cobre e gerando elevado montante de negócios e faturamento. Há ainda grandes investimentos em gasodutos, e apenas um deles, o que vem do Cazaquistão, demandará 6 milhões de toneladas de aço. Mas o consumo de aço não é apenas puxado pela construção civil e de ferrovias. Também em setores como a exportação de navios a China passou a ter importância mundial, faturando mais de 80 bilhões de dólares por ano, e como ele utiliza muito aço, acabou por ajudar a puxar o consumo do produto. Enfim, são numerosos os fatores que tem elevado o consumo de bens da indústria pesada chinesa, o que tem incentivado investimentos e aumentado o lucro do setor. Tudo isto tem ajudado a manter altas taxas de crescimento do PIB e levar a China a se tornar a segunda economia em PPP (ou PPC), apesar de ser a quarta em 2006.(Ver figura abaixo) US$ BILHÕES As 15 Maiores Economias Mundiais - PIB Nominal 14 12 10 8 6 4 2 0 2006 2005 2004 2003 Estados Unidos Japão Alemanha China Reino Unido Espanha Índia França Brasil México Itália Rússia Austrália Canadá Coréia do Sul Figura 7: As 15 Maiores Economias Mundiais – PIB Nominal Fonte: Furtado, Marco A. T.; Morales, Denise K. 2007 a partir de dados do World Bank Este crescimento, que em 2007 superou a taxa prevista de 9%, situando-se em 11,9%. O crescimento econômico chinês é o mais longo, mais alto e sustentado da história econômica. E mesmo tendo o governo chinês desejado reduzir este ritmo de crescimento, ele não tem tido sucesso no seu intento de obter taxas menores de expansão da economia. 31 16 8 6 4,1 3,80 % 10 8,8 12 9,20 11,6 11,3 14 10,9 0 10,0 0 9,30 7,80 7,60 8,40 8,30 9,10 10,0 0 10,1 0 10,4 0 11,6 0 11,9 0 10,3 14,2 0 14,0 0 13,1 0 Crescimento (% ) do PIB Chinês (1986-2008) 4 2 20 08 * 20 06 20 04 20 02 20 00 19 98 19 96 19 94 19 92 19 90 19 86 19 88 0 * 2008 – Previsão Figura 8: Crescimento (%) do PIB Chinês (1986-2008) Fonte: Furtado, Marco A.T.; Morales, Denise K. a partir do China Statistical Yearbook A comparação com o Brasil nos mostra este crescimento chinês e sua grande diferença com o obtido por nosso país. Mas as diferenças com o nosso país não se situam apenas nas taxas de crescimento. Também a composição do PIB é distinta, com a indústria tendo um papel mais importante na China que em nosso país. Apesar da China estar desenvolvendo um grande setor de serviços após as reformas, a indústria continua sendo o grande setor da economia, com mais de 70% do PIB, o que é muito diferente dos países ocidentais e em desenvolvimento. (Ver figura a seguir). Taxa (% ) de Crescimento do PIB (1986-2007) 20 15 % 10 5 0 -5 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 -10 PIB_China PIB_Brasil Figura 9: Taxa (%) de Crescimento do PIB - China e Brasil (1986-2007) Fonte: Furtado, Marco A.T.; Morales, Denise K. a partir do China Statistical Yearbook e Ipeadata 32 CHINA BRASIL 4,82% 11,90% 24,76% 40% 48,10% Agricultura Indústria 70,42% Serviços Agricultura Indústria Serviços Figura 10: Contribuições dos Setores para o PIB (Ano) Fonte: Furtado, Marco A.T.; Morales, Denise K. 2007 Convém observar que em 2007 houve mudanças na metodologia do PIB brasileiro, bem como ao fim de 2007 o mesmo se dá com o cálculo de PPP (Parity Power Purchase) do Banco Mundial. Nestas mudanças o setor de serviços cresceu ainda mais de importância no Brasil, e a China teve reduzido o valor de seu PIB em PPP. A China, que na metodologia anterior ultrapassaria os Estados Unidos em 3-4anos, agora levará bem mais tempo para que isto ocorra. Este elevado crescimento da China se deve, em parte, ao investimento estrangeiro, que fez do país o seu maior destino entre países em desenvolvimento. A figura que se segue mostra o montante de investimento externo anual. INVESTIMENTOS DIRETOS ESTRANGEIROS RECEBIDOS PELA CHINA 80 70 60 50 40 30 20 10 19 89 19 90 19 91 19 92 19 93 19 94 19 95 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 0 EM BILHÕES DE DÓLARES Figura 11: Investimentos Diretos Estrangeiros Recebidos pela China Fonte: Furtado, Marco A.T. Morales, Denise K. 2007, a partir do China Statistical Yearbook. Mas é interessante ver a origem destes recursos externos que investem na China. A figura que se segue mostra a posição de países como origem de recursos externos.Apesar dos Estados Unidos serem o maior investidor na China, os asiáticos como Japão, Taiwan, Singapura, Hong Kong (que é parte da China hoje) e Coréia do Sul formam o grosso dos investimentos externos. Este fato mostra como as economias da região estão se integrando, e formando uma rede de negócios asiáticos de grande porte. Para se ter idéia deste fato, 75% dos containers do mundo transitam hoje entre a China, Japão, Taiwan e Coréia do Sul. Isto tem levado alguns a 33 dizerem que está se formando uma “grande China”, a partir da integração da China à economia mundial, e do elevado crescimento da economia chinesa e sua integração com seus vizinhos. Como vimos, a China hoje, é uma grande economia, cada vez mais pujante, e sua integração no mundo após 1972 acabou por mudar as dimensões de nosso planeta, pois uma população de 1,3 bilhões de pessoas passa a integrar o sistema mundial de produção e consumo. Podemos, sem dúvida afirmar, que o mundo após 1978, com o retorno da China ao sistema econômico e político mundial, adquiriu uma dimensão bem maior, com todas as conseqüências que isto tem, seja em pressão sobre as matérias prima, seja em emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa que um maior nível de produção e consumo exerce sobre o meio ambiente. IDE China por origem - acumulado (1978-2002) US$ bilhões 40,000 30,000 20,000 10,000 0,000 1 E.U.A. Japão Taiwan Ilhas Virgens Singapura Hong Kong Coréia do Sul Reino Unido Alemanha Ilhas Cayman Figura 12: IDE recebidos pela China por origem – acumulado (1978-2002) Fonte: Furtado, Marco A T.; Morales, Denise K. 2007 a partir de Wu, Jinglian 2005 Bibliografia citada Aiguo, Lin. China and the global economy since 1840. New York 2000,The United Nations University- Palgrave. China Statistical Yearbook (vários anos) China: www.chinamap.com China: www.chinatravel.com China: www.images.nationmaster.com/images/motw/midell_east_and_asia/china_precip. Donald, Stephenie Hemlryck; Benewick, Robert. The State of China Atlas. Berkeley, London, Los Angeles 2005, University of California Press Furtado M. A.T.; Morales, Denise K. Introdução à economia chinesa e à China como produtora mineral. Palestra no Ibram 10 de setembro de 2007. Brasília Geologia: www.geology.com/world/china-satellite-image.shtml Wu, Jinglian. Understanding and interpreting chinese economic reform. Thomson, USA, 2005