Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Propaganda
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Programa de Pós-Graduação em Zoologia de Vertebrados
IMPORTÂNCIA DA QUÍMICA DE ALARME NO
COMPORTAMENTO ANTIPREDATÓRIO DO LAMBARI,
Astyanax bimaculatus, Linnaeus, 1758 - (Pisces: Characidae)
Vinícius Donisete Lima Rodrigues Goulart
Belo Horizonte
2010
Vinícius Donisete Lima Rodrigues Goulart
IMPORTÂNCIA DA QUÍMICA DE ALARME NO
COMPORTAMENTO ANTIPREDATÓRIO DO LAMBARI,
Astyanax bimaculatus, Linnaeus, 1758 - (Pisces: Characidae)
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Zoologia de
Vertebrados da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais, como
requisito para a obtenção do título de
Mestre em Zoologia de Vertebrados
Orientador: Robert John Young
Belo Horizonte
2010
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
G694i
Goulart, Vinícius Donisete Lima Rodrigues
Importância da química de alarme no comportamento antipredatório do
lambari, Astyanax bimaculatus, Linnaeus, 1758 - (Pisces: Characidae) / Vinícius
Donisete Lima Rodrigues Goulart. Belo Horizonte, 2010.
50f. : il.
Orientador: Robert John Young
Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Pós Graduação em Zoologia de Vertebrados.
1. Lambari (Peixe). 2. Peixe - Comportamento. I. Young, Robert John. II.
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pós Graduação em Zoologia
de Vertebrados. III. Título.
CDU:597.5
Para Victória
AGRADECIMENTOS
Agradeço a toda minha família pelo apoio durante toda esta jornada.
A Camilla – Companheira para toda vida.
Ao Robert pelos ensinamentos valiosos e pela ótima orientação.
Aos professores do Mestrado por serem decisivos na minha formação
Ao Adriano pela confecção das réplicas
Ao Rogério pela confecção das difíceis lâminas e à Clédma pela ajuda e todo
suporte.
Aos Colegas de turma que me auxiliaram desde a preparação para o processo
seletivo do mestrado até hoje.
À FAPEMIG e ao CNPQ, pelo financiamento da pesquisa e do curso.
RESUMO
A superordem Ostariophysi é composta por um diverso grupo de peixes
representando cerca de 65% das espécies de peixes de água doce. Um caráter
comum a maioria dos peixes Ostariophysi é a presença de células epidérmicas que
produzem e armazenam substâncias químicas de alarme. Danos à pele liberam esta
substância que causa o aumento dos comportamentos antipredatórios. O presente
estudo tem como objetivos: analisar o comportamento antipredatório de Astyanax
bimaculatus
(Lambari)
em
cativeiro;
determinar
os
padrões
de
resposta
comportamental aos diferentes tipos de modelos de predadores aquáticos e aéreos;
verificar a resposta antipredação sob a influência da química de alarme. Os peixes
foram divididos em oito grupos de oito indivíduos. Cada grupo foi submetido a três
tipos de estímulos de predação, além do estímulo controle. Cada estímulo foi
analisado na presença e na ausência da química de alarme. Para cada teste foram
realizadas três réplicas. Através da histologia da epiderme verificamos que A.
bimaculatus produz a substância química de alarme como os demais Ostariophysi. O
estímulo controle sem a química de alarme não provocou alterações no
comportamento dos lambaris. A química de alarme junto ao controle provocou uma
diminuição na movimentação dos peixes. Os modelos de predador, quando
apresentados sem a substância química de alarme, provocaram uma maior
diversidade de comportamentos do que quando comparados às respostas com a
química de alarme. Concluímos que a química de alarme é um importante fator de
alerta e os lambaris conseguem reconhecê-la como o indicativo de uma situação de
risco. Sua detecção causa uma reação de ansiedade nos peixes que, quando aliada
a um modelo de predador, gera imediatamente uma reação de fuga que possibilita a
sobrevivência
do
cardume.
Percebe-se
ainda
que
os
comportamentos
antipredatórios variam expressivamente quando comparamos respostas para
predadores aéreos e aquáticos sem a química de alarme.
Palavras-chave: Química de alarme; Comportamento antipredação; Astyanax
bimaculatus.
ABSTRACT
The superorder Ostariophysi is composed of a diverse group of fish representing
approximately 65% of species of freshwater fish. A common character to most
Ostariophysi fish is the presence of epidermal cells that produce and store chemical
alarm cues. Damage to the skin release this substance that causes an increase in
antipredatory behaviors. This study aimed to: analyze the antipredatory behavior of
Astyanax bimaculatus (Lambari) in captivity; determine the patterns of behavioral
responses to different kinds of aquatic and aerial predators models; verify the
antipredatory response under the influence of alarm cues. The fishes were divided
into eight groups of eight individuals. Each group was subjected to three types of
predation stimuli and the control. Each treatment was examined in the presence and
absence of alarm cue. For each test we made three replicates. The histology of the
epidermis reveled that A. bimaculatus produces alarm cues as the other
Ostariophysi. The control without alarm cue did not promoted behavioral changes,
but the alarm cue allied to the control caused a decrease in the fish movements. The
predator model presented without the alarm cue triggered a greater diversity of
behaviors when compared to the responses with alarm cue. We conclude that alarm
cue is an important alert factor and the lambari can recognize it as indicative of a risk.
Its detection causes an anxiety response in fish that, when combined with a model
predator, immediately generates a flight reaction that allows the survival of the shoal.
We can also observe that the antipredatory behaviors vary significantly when
comparing responses to aerial and aquatic predators without alarm cues.
Key-words: Alarm cue; Antipredatory behavior; Astyanax bimaculatus
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Réplica em resina de um peixe predador, Hoplias malabaricus,
utilizada para representar o estimulo de predação de procura
ativa.
18
Figura 2: Esquema demonstrando o funcionamento do aparato utilizado
para apresentação do estímulo de um predador de emboscada
19
Figura 3: Representação do modelo de predador aéreo
20
Figura 4: Objeto utilizado para os testes de Controle
20
Figura 5: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus
evidenciando a presença de glândulas; Coloração em
Hematoxilina-eosina aumento 100x
26
Figura 6: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus
mostrando a presença de células PAS positivas e negativas
evidenciando a presença de células produtoras da química de
alarme. Coloração em PAS; aumento 100x
26
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Descrição dos comportamentos de Astyanax bimaculatus, Lambari
17
Tabela 2: Ordem de apresentação dos estímulos de predação e da química de 22
alarme para cada grupo
Tabela 3: Valores de p para o teste de Friedman na comparação entre as
27
réplicas realizadas para cada tipo de estímulo de predação
Tabela 4: Ranks com diferenças significativas para os resultados do teste de
27
Friedman e teste post-hoc Tukey comparando as réplicas realizadas
para cada tipo de estímulo apresentado
Tabela 5: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do
28
estímulo controle. Resultados significativos do teste de Friedman e
post-hoc de Tukey
Tabela 6: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do
29
estímulo de predador aéreo. Resultados significativos do teste de
Friedman e post-hoc de Tukey
Tabela 7: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do
30
estímulo de predador de procura ativa.. Resultados significativos do
teste de Friedman e post-hoc de Tukey.
Tabela 8: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do
31
estímulo de predador de emboscada. Resultados significativos do
teste de Friedman e post-hoc de Tukey
Tabela 9: Resultados para a comparação dos comportamentos entre os
33
estímulos apresentados (Controle, Predador aéreo, procura ativa e
de emboscada). Resultados significativos do teste de Friedman e
post-hoc de Tukey
Tabela 10: Resultados para a comparação das áreas utilizadas no aquário
entre os estímulos apresentados. Resultados significativos do teste
de Friedman e post-hoc de Tukey.
34
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
°C
grau Celsius
µm
Micrometros
A
Agredindo
Cm2
Centímeto quadrado
FF
Forrageando o fundo
Fr
Teste estatístico de Friedman
GL
Graus de liberdade
N
Nadando
NR
Nadando rápido
ns
Não significativo
P
Perseguindo
PA
Parado ativo
PAS
ácido periódico de Schiff
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
10
2 METODOLOGIA
15
2.1 Peixes
15
2.2 Desenho experimental
16
2.3 Preparação do extrato bruto de pele
23
2.4 Histologia
23
2.5 Análises Estatísticas
23
3 RESULTADOS
25
3.1 Histologia
25
3.2 Análise Comportamental
27
4 DISCUSSÃO
35
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
40
10
1 INTRODUÇÃO
A superordem Ostariophysi é composta por um diverso grupo de peixes,
sendo 6500 espécies descritas (MOYLE; CECH, 2004) o que representa cerca de
65% das espécies de peixes de água doce (NELSON, 2006). Esta superordem
consiste
de
cinco
ordens
existentes:
Gonorynchiformes,
Cyprinidformes,
Characiformes, Siluriformes e Gymnotiformes. Um caráter comum a maioria dos
peixes Ostariophysi é a presença de células epidérmicas em forma de clava
(PFEIFFER, 1977), que produzem e armazenam substâncias químicas de alarme
(SMITH, 1992; SMITH 1997). Danos à pele liberam esta substância de alarme que é
detectada pelo olfato e causa uma reação de medo em indivíduos espacialmente
próximos (SPEEDIE; GERLAI, 2008). Estas substâncias químicas liberadas na água
causam o aumento dos comportamentos antipredatórios (WISENDEN et al., 2004;
SZULKIN et al., 2006). Em meados de 1940, Karl Von Frisch descreveu a reação em
Phoxinus phoxinus, o vairão, resultante da elementos químicos liberados por
indivíduos feridos (CHIVERS et al., 1999). Ele criou o termo "Schreckreaktion"
(reação de medo) para descrever esta resposta. Desde então vários estudos foram
realizados para descrever a reação à substância de alarme em P. phoxinus e outros
Ostariophisi (CHIVERS, et al., 1999). Entretanto, existem poucos estudos referentes
à química de alarme de espécies endêmicas do Brasil.
As reações de alarme são especializações adaptativas comportamentais
apresentadas por animais de hábito social, as quais visam a proteção contra
predadores (EDMUNDS, 1974). Para isso, são utilizados os sentidos como o olfato,
paladar, visão e sistema acústico-lateral, bem como substâncias químicas, tais como
os feromônios (GIAQUINTO; VOLPATO, 1997). Esta substância química de alarme
constituí-se de um feromônio, quimicamente similar ou idêntica em todos os peixes
desta superordem. A substância química de alarme é constituída pelo composto
químico hipoxantina-3-N-óxido, mas estudos indicam que qualquer substância
química composta pelo grupo funcional de óxido de nitrogênio parece funcionar
como agente potencial de alarme (BROWN et al., 2000a).
11
Admite-se cerca de 16 hipóteses para que indivíduos se beneficiem da
emissão de um sinal químico de alarme (SMITH, 1992), entretanto, apenas três
destas hipóteses tem sido testadas empiricamente (HALBGEWACHS et al., 2009).
Uma hipótese sustenta que a química de alarme pode evoluir através da seleção de
indivíduos com certo grau de parentesco onde os peixes que a liberam podem
aumentar o inclusive fitness da população, avisando parentes (HALBGEWACHS et
al., 2009). Outra hipótese sugere que a química de alarme atrai predadores
secundários, onde a interação entre estes, pode aumentar a possibilidade da presa
em sobreviver (HALBGEWACHS et al., 2009). Entretanto, a freqüência em que
predadores secundários se aproveitam da liberação da química de alarme é
desconhecida (HALBGEWACHS et al., 2009). Além de funcionar como alerta de
possíveis predadores próximos, tal substância pode ter suas funções relacionadas
como parte integrante do sistema imune (HALBGEWACHS et al., 2009) indicando
até indivíduos com alta carga parasitária, os quais são evitados pelo cardume.
Dentre todos os tipos de indicativos de uma possível predação, os sinais
químicos e visuais são os mais estudados (CHIVERS; SMITH, 1998; HARTMAN;
ABRAHAMS, 2000), contudo, estes sinais representam diferentes tipos de
informações. Sinais visuais de um predador podem ser críticos, pois o predador
deve estar próximo à presa para a sua detecção (BROWN et al., 2000b).
Alguns padrões comportamentais têm sido bem documentados para a
influência da química de alarme como o aumento da coesão do cardume, evasão de
áreas, movimentos erráticos, diminuição no comportamento natatório, redução no
forrageio e acasalamento (CHIVERS; SMITH, 1998). A química de alarme pode
ainda possibilitar o reconhecimento de um novo predador, induzir mudanças na
biologia da espécie e avaliar o risco de predação através da inspeção do predador
(CHIVERS; SMITH, 1998; BROWN; GODIN 1999).
Os animais se mantêm em grupos principalmente para aumentar a
possibilidade de encontrar recursos alimentares e evitar predadores (POLLARD;
BLUMSTEIN, 2008). Para a melhor eficiência do forrageio, os animais podem
compor grupos para caçar e predar presas maiores ou por aumentar as chances de
detecção de uma fonte alimentar (KRAUSE; RUXTON, 2002; MOYLE; CECH, 2004).
Os animais podem diluir as chances de predação por estarem próximos uns aos
12
outros (Dilution effect) (MOYLE; CECH, 2004), por aumentar a chance de detecção
do predador (Many eyes effect) (ROBERTS, 1996) ou por confundir o predador
dificultando a captura de um indivíduo dentro de uma massa coesa, como um
cardume (Confusion effect) (MOYLE; CECH, 2004).
Em peixes, a comunicação pode ser realizada a partir da química de alarme.
Um fator que mantém grupos unidos em cardumes é a presença destas células
epidérmicas especializadas que conferem uma vantagem evolutiva (WISENDEN;
THIEL, 2002). Os grupos de animais podem diminuir a chance de serem capturados
por desenvolver sistemas de comunicação para alertar sobre a presença de
predadores. Uma observação comum é que se um membro de um grupo detecta um
predador, um chamado de alarme é emitido para que todo grupo seja alertado
(ROBERTS, 1996), mesmo que um indivíduo chame a atenção de um predador,
todo o restante do grupo é beneficiado (HOLLEN; RADFORD, 2009). Em animais
que vivem em grupos, indivíduos podem usar sinais referenciais e pistas
transmitidas entre eles para aumentar a eficiência do forrageio (GALEF;
GIRALDEAU, 2001), e ainda, vocalizações de alarme podem fornecer diferentes
tipos de informação, incluindo o tipo de predador (LEAVESLEY; MAGRATH, 2005).
Como exemplo, os macacos Vervet, Chlorocebus aethiops, emitem diferentes tipos
de vocalizações de alarme ao avistarem aves de rapina, cobras ou leopardos.
Assim, os outros membros do grupo respondem a estes chamados de diferentes
formas, como olhando para o alto para o chamado de aves de rapina ou para baixo
para chamados de cobras (SEYFARTH et al., 1980). Contudo, a maioria dos estudos
de comunicação referencial tem sido realizados para aves e mamíferos (HOLLEN;
RADFORD, 2009).
A predação é uma das mais importantes pressões seletivas enfrentadas por
presas e pode modelar o comportamento, a morfologia e a história natural destes
indivíduos (BROWN, 2003). A habilidade de julgar o risco de predação local é um
aspecto crítico para a sobrevivência. Entretanto, as estratégias antipredatórias
podem reduzir o tempo e a energia disponíveis para outros comportamentos, como o
forrageio. Assim, estas, consistem de um trade-off entre a diminuição do risco de
predação
e
a
diminuição
do
comportamentais (BROWN, 2003).
fitness
associados
com
outros
padrões
13
Já se sabe que as respostas antipredação são debilitadas em peixes de
cativeiro em comparação a peixes selvagens (HOWELL, 1994). Diversos estudos
mostram a importância de um encontro prévio com o predador para o
desenvolvimento apropriado de respostas antipredação em peixes (KELLEY;
MAGURRAN, 2003). Isto tem levado a aplicação de diferentes práticas de criação
para aprimorar o desempenho comportamental de peixes de cativeiro através de um
treinamento apropriado (BROWN; DAY, 2002). Determinar como os animais
reconhecem um novo predador e a investigação de como eles aprendem resulta em
novos conceitos sobre os mecanismos de aprendizagem. Os resultados de estudos
experimentais sugerem fortemente que certos tipos de estímulos podem ser efetivos
no gatilho da aprendizagem sobre predadores, como a química de alarme (GRIFFIN
et al., 2000). Portanto, o estudo da influência desta substância sobre o
comportamento dos peixes pode ajudar na concepção de medidas para melhorar a
qualidade das reintroduções e sobre como afastar peixes de áreas de risco.
O uso de modelos de predadores é comum no meio científico para avaliar o
comportamento de peixes. Algumas vezes, diferentes tipos de metodologias são
empregados para fornecer um estimulo de predação aos peixes como é o caso de
um estudo realizado para verificar se o paulistinha (Danio rerio) responde a
exposição de um predador virtual. Para o estudo foi utilizado um monitor de LCD
colocado ao lado do aquário com a apresentação de imagens animadas de um
predador natural da espécie, peixe folha (Nandus nandus) (GERLAI et al., 2009).
Este tipo de estimulação levou os peixes a respostas comportamentais de medo e
estresse significativas. Em alguns estudos, para provocar reações comportamentais,
são expostos predadores vivos em aquários próximos fornecendo um estímulo visual
(SPEEDIE; GERLAI, 2008). Outros apresentam até modelos mais simples como
objetos que simulam predadores como tubos de plástico preenchidos com água e
carvão e com dois olhos postiços (BLASER; GERLAI, 2006). Um fato conhecido por
pescadores é que os peixes conseguem reconhecer o comportamento de modelos
que simulam peixes, como é o caso de iscas artificiais. Uma grande diversidade de
iscas artificiais estão disponíveis e são criadas para estimular o comportamento
predatório dos peixes (MACDONALD et al., 2009). As iscas artificiais mais
comumente utilizadas simulam enguias, lulas e uma grande variedade de iscas de
metais ou plásticas desenhadas para simular pequenas espécies de presas feridas
14
(MACDONALD et al., 2009). Com isso, o uso de modelos que simulam diferentes
comportamentos de predadores em estudos comportamentais, como o trabalho aqui
apresentado, é apropriado.
O presente estudo tem como objetivos: analisar o comportamento
antipredatório de Astyanax bimaculatus (Lambari) em cativeiro; determinar os
padrões de resposta comportamental aos diferentes tipos de modelos de predadores
aquáticos e aéreos; verificar a resposta antipredação sob a influência da química de
alarme. Para isso, formulamos duas hipóteses em que: Os lambaris apresentarão
respostas iguais para todos os predadores constituindo uma resposta eficiente,
única e inespecífica mantida pela evolução; Os lambaris apresentarão respostas
específicas para cada tipo de predador constituindo uma resposta adaptativa e
coordenada que favoreça a sobrevivência do grupo.
15
2 METODOLOGIA
2.1 Peixes
Todos os animais foram sacrificados, manipulados e mantidos de acordo com
as normas exigidas pela comissão de ética da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais. Os peixes foram eutanasiados de acordo com as diretrizes da
American Veterinary Medical Association. Os animais utilizados não precisam de
licença específica para manutenção em cativeiro devido a sua natureza comercial.
Astyanax bimaculatus (Pisces: Characidae), conhecido popularmente como
lambarí-do-rabo-amarelo, são pequenos characiformes, com tamanho máximo
registrado de 17,5 centímetros, que possuem mancha próxima à cauda, de hábito
alimentar generalista (COSTA; BRAGA, 1993; ESTEVES; GALETTI, 1995),
migradores de curta distância (UIEDA, 1984; GARUTTI, 1988), com desova parcial e
ovos adesivos (BAZZOLI et al., 1991) bem adaptados a ambientes lênticos e lóticos
(AGOSTINHO et al., 1997). Esta espécie foi escolhida devido a sua fácil obtenção
em empresas de piscicultura, ao seu pequeno porte, ao fácil manejo, ao seu hábito
de vida em cardumes. Portanto, devido a suas características físicas e
comportamentais, o lambari é ideal para o presente estudo e para a experimentação.
Foram obtidos, em loja especializada em piscicultura, 100 espécimes de A.
bimaculatus os quais foram encaminhados para o laboratório experimental
localizado no Programa de pós-graduação em Zoologia de Vertebrados da Pontifícia
Universidade Católica Minas Gerais. Os peixes foram mantidos em tanque-estoque
de 150 litros com oxigenação permanente, temperatura estável em 28° C e sob a
ação constante de filtros químico, físico e biológico. A iluminação foi mantida através
de timer eletrônico sob um ciclo de 12 horas claro e 12 horas escuro, onde não havia
iluminação natural presente. A alimentação se deu com ração em grânulos (Tetra
Color Tropical Granules), três vezes ao dia (8:00; 12:00; 17:00) e em pequenas
porções sendo os peixes alimentados pelo menos uma hora antes da realização dos
testes e nunca durante o experimento. Todos os aquários foram tratados com
anticloro (Mydor Dechlor-ease) e medicamento para prevenir infecções comuns aos
16
peixes (Mydor Ick-ease), devido ao estresse do transporte. Assim os peixes foram
mantidos durante 45 dias para a aclimatação.
Para
este
estudo
decidimos
não
capturar
peixes
selvagens,
pois
esperávamos verificar o comportamento anti-predatório dos animais que não haviam
tido contato prévio com predadores.
2.2 Desenho experimental
Os experimentos foram realizados em dois aquários experimentais de 63 litros
cada um, com as medidas de 60 centímetros de comprimento, 35 centímetros de
largura e 30 centímetros de altura sendo suas laterais isoladas do meio externo
evitando estímulos visuais. Assim como no tanque estoque, a oxigenação foi
constante, com temperatura de 28°C, sob ação de filtros e iluminação 12:12 horas
claro:escuro. A frente dos aquários experimentais foi demarcada formando uma 3
estratos de igual tamanho, os quais foram utilizados para quantificar o
posicionamento dos peixes durante a experimentação.
Os testes foram filmados usando câmera de vigilância colorida montada sobre
um tripé posicionado frontalmente ao aquário, ligada a televisor e à vídeo cassete
(Samsung modelo time lapse SSC – 1280). As fitas obtidas foram posteriormente
digitalizadas e armazenadas em DVDs. As filmagens foram analisadas com o
método de amostragem de scan instantâneo com registros a cada 30 segundos
quando foram anotados os comportamentos e a posição no aquário. O experimento
foi dividido em cinco fases:

A primeira fase consistiam de 10 minutos iniciais sem apresentação de
estímulos para fornecer uma linha de base estatística dos comportamentos;

a segunda fase consistiam dos cinco minutos após a apresentação do
estímulo;

a terceira de cinco a dez minutos após a apresentação;

a quarta de 10 a 15 minutos após a apresentação;

a quinta fase de 15 a 20 minutos após a apresentação dos estímulos.
Para a análise dos comportamentos, foi elaborado um etograma a partir de um
estudo piloto onde foram identificados seis comportamentos principais: Parado ativo
17
(PA); Nadando (N); Nadando rápido (NR); Agredindo (A); Perseguindo (P);
Forrageando o fundo (FF) (Tab. 1).
Tabela 1: Descrição dos comportamentos de Astyanax bimaculatus, Lambari.
Comportamento
Parado Ativo
Nadando
Nadando Rápido
Agredindo
Perseguindo
Forrageando o Fundo
Sigla
PA
N
NR
A
P
FF
Descrição
Manutenção de posição fixa com movimentos leves das nadadeiras peitorais
Movimentação pelo aquário com velocidade regular
Movimentação rápida com movimentos acentuados das nadadeiras
Ataque ou ser atacado por mordidas ou choques
Perseguição curta dois ou mais peixes no aquário
Forrageio do fundo do aquário
O comportamento ―Parado ativo‖ se deu quando os peixes mantinham uma
posição fixa na coluna d’água com movimentos leves das nadadeiras peitorais. O
comportamento ―Nadando‖ se deu quando os peixes se locomoviam pelo aquário
com uma velocidade regular. O comportamento ―Nadando rápido‖ ocorria quando os
peixes se locomoviam pelo aquário com movimentos acentuados da nadadeira
caudal apresentando uma velocidade maior do que a observada no comportamento
―Nadando‖. O comportamento ―Agredindo‖ ocorria quando um peixe atacava ou era
atacado por outro, aparentemente por mordidas e choques violentos contra os
indivíduos. O comportamento ―Perseguindo‖ se dava quando um ou mais peixes
realizavam um ataque ou eram atacados, seguido de uma curta perseguição. O
comportamento ―Forrageando o fundo‖ se deu quando os peixes se posicionavam
em ângulo, estando com a cabeça voltada para o fundo e a cauda para cima
enquanto mordiscavam o fundo do aquário.
Os peixes foram divididos em oito grupos de oito indivíduos. Cada grupo
constituiu-se de quatro machos e quadro fêmeas, sendo os espécimes de tamanho
semelhante. A identificação do sexo se deu pela análise da nadadeira anal a qual
nos machos a nadadeira se apresentava com pequenas espículas e nas fêmeas,
lisa. A observação da região ventral dos peixes também foi utilizada para a
identificação, onde nas fêmeas poderia se apresentar ligeiramente abaulada. Após
os experimentos os peixes foram sacrificados por decapitação para confirmação do
sexo confirmado a presença de 4 machos e 4 fêmeas em cada grupo.
18
Cada grupo foi submetido a quatro tipos de estímulos: Predador de procura
ativa, predador de emboscada, predador aéreo e controle.
O predador de procura ativa e de uma réplica em resina de um peixe com
olhos e boca grande que, durante a exposição (Fig. 1), perseguia os peixes durante
5 minutos. A perseguição foi feita prendendo a réplica por arames finos
possibilitando a condução do modelo no aquário.
Figura 1: Réplica em resina de um peixe predador, Hoplias malabaricus (Traíra), utilizada para
representar o estimulo de predação de procura ativa.
O predador de emboscada (sit-and-wait) consistia em uma réplica em resina
de traíra, Hoplias malabaricus, que através de um sistema de molas e fios de nylon,
era ejetada de um cano de PVC toda vez em que um peixe inspecionava a entrada
do tubo, durante os cinco minutos de exposição (Fig. 2).
19
Figura 2: Esquema demonstrando o funcionamento do aparato utilizado para apresentação do
estímulo de um predador de emboscada.
O predador aéreo foi feito reproduzindo-se um modelo genérico de uma
cabeça de ave como uma garça, gênero Ardea, seguindo as mesmas características
de um predador de olhos grandes e afastados e um bico longo e pontiagudo (Fig. 3).
Esta réplica de cabeça era ligada a uma mangueira firme que simulava um longo
20
pescoço. Durante a estimulação de cinco minutos, a cada 15 segundos, a réplica da
ave era rapidamente inserida dentro do aquário, visando uma evasão do cardume,
tomando os devidos cuidados para não machucar os animais experimentais.
Figura 3: Representação do modelo de predador aéreo
O objeto controle tratava-se de um vasilhame de 15 centímetros de altura,
com água e pedras em seu interior para fazê-lo afundar e estando hermeticamente
fechado (Fig. 4). O controle foi colocado no centro do aquário durante os cinco
minutos de estimulação.
Figura 4: Objeto utilizado para os testes de Controle
21
Todos os testes foram realizados de forma que o pesquisador exerçesse o
mínimo de influência possível durante a exposição dos modelos. Antes e após a
realização dos testes, todo o ambiente do experimento permaneceu desocupado.
Cada modelo de predador foi apresentado na presença e na ausência do
extrato bruto de pele, possibilitando a análise da influência da comunicação química
no comportamento dos lambaris. Para isso, antes da apresentação do estímulo,
cinco mililitros extrato bruto de pele contendo os sinais químicos foram injetados no
aquário de testes por uma seringa. Após a realização dos testes que envolviam o
extrato bruto da pele, todos os peixes eram transferidos para um aquário provisório
nas mesmas condições do aquário original e toda a água do aquário de teste era
trocada. Logo após, os peixes retornavam para o aquário original, onde voltavam
para uma nova aclimatação.
Cada teste foi repetido três vezes, com intervalos de uma hora e meia, para
atingir um número satisfatório de réplicas. Em cada grupo, os estímulos foram
apresentados de maneira alternada, evitando assim os efeitos relacionados à ordem
de apresentação dos estímulos e da química. A ordem de apresentação dos
estímulos seguiu uma distribuição Latin square (Tab. 2).
22
Tabela 2: Ordem de apresentação dos estímulos de predação e da química de alarme para cada grupo.
Grupo 1
Química de
Alarme
Réplicas Grupo 2
Química de
Alarme
Réplicas
Predador Procura ativa
Sem Química
Predador Procura ativa
3
Controle
Sem Química
3
Com Química 3
Controle
Com Química
3
Predador Emboscada
Sem Química
3
Predador Procura ativa Sem Química
3
Predador Emboscada
Com Química 3
Predador Procura ativa Com Química
3
Predador aéreo
Sem Química
3
Predador Emboscada
Sem Química
3
Predador aéreo
Com Química 3
Predador Emboscada
Com Química
3
Controle
Sem Química
3
Predador aéreo
Sem Química
3
Controle
Com Química 3
Predador aéreo
Com Química
3
Grupo 3
Química de
Alarme
Réplicas Grupo 4
Química de
Alarme
Réplicas
Predador Aéreo
Sem Química
3
Predador Emboscada
Sem Química
3
Predador Aéreo
Com Química 3
Predador Emboscada
Com Química
3
Controle
Sem Química
3
Predador Aéreo
Sem Química
3
Controle
Com Química 3
Predador Aéreo
Com Química
3
Predador Procura ativa
Sem Química
3
Controle
Sem Química
3
Predador Procura ativa
Com Química 3
Controle
Com Química
3
Predador Emboscada
Sem Química
3
Predador Procura ativa Sem Química
3
Predador Emboscada
Com Química 3
Predador Procura ativa Com Química
3
Grupo 5
Química de
Alarme
Predador Procura ativa
Com Química 3
Predador Procura ativa
Sem Química
Predador Emboscada
Predador Emboscada
Predador aéreo
Química de
Alarme
Réplicas
Controle
Com Química
3
Controle
Sem Química
3
Com Química 3
Predador Procura ativa Com Química
3
Sem Química
Predador Procura ativa Sem Química
3
Com Química 3
Predador Emboscada
Com Química
3
Predador aéreo
Sem Química
Predador Emboscada
Sem Química
3
Controle
Com Química 3
Predador aéreo
Com Química
3
Controle
Sem Química
3
Predador aéreo
Sem Química
3
Grupo 7
Química de
Alarme
Réplicas Grupo 8
Química de
Alarme
Réplicas
Predador Aéreo
Com Química 3
Predador Emboscada
Com Química
3
Predador Aéreo
Sem Química
Predador Emboscada
Sem Química
3
Controle
Com Química 3
Predador Aéreo
Com Química
3
Controle
Sem Química
Predador Aéreo
Sem Química
3
Predador Procura ativa
Com Química 3
Controle
Com Química
3
Predador Procura ativa
Sem Química
Controle
Sem Química
3
Predador Emboscada
Com Química 3
Predador Procura ativa Com Química
3
Predador Emboscada
Sem Química
Predador Procura ativa Sem Química
3
Réplicas Grupo 6
3
3
3
3
3
3
3
23
2.3 Preparação do extrato bruto de pele
A química de alarme foi preparada capturando cuidadosamente os lambaris,
evitando estragos a pele e sacrificando-os por decapitação. A pele foi removida
inserindo delicadamente uma tesoura sob a pele, a partir do orifício aberto pela
decapitação, sendo esta removida por inteiro sem maiores danos. A pele retirada foi
macerada com a adição de água destilada, utilizando uma proporção de 10 mililitros
de água destilada para 5cm² de epiderme. A solução obtida foi filtrada por filtro de
papel para a remoção de partes solidas como escamas. A extração do extrato bruto
de pele foi feita antes da realização dos testes e o conteúdo extraído foi mantido
congelado caso não fosse utilizado imediatamente. O restante da solução foi
armazenada em vidros com o conteúdo suficiente para a realização de cada teste,
sendo descongelado apenas o necessário e em temperatura ambiente, ficando
estocadas não mais que 6 horas. Método adaptado de Ide (2003).
2.4 Histologia
Para a histologia, as peles de dois machos e duas fêmeas em estado
reprodutivo (maturação avançada) foram removidas e fixadas em líquido de bouin
por 12 horas para confecção de lâminas, utilizando técnicas histológicas de rotina
com inclusão em parafina, microtomia de 3-5µm, coloração em hematoxilina-eosina
para caracterização morfológica do tecido e ácido periódico de Schiff (PAS) para
identificação de glicoproteinas para confirmação da presença das células clava
(PEARSE, 1985).
2.5 Análises Estatísticas
Os dados obtidos foram compilados em uma tabela onde estavam
organizados por grupo, réplica, tipo de estímulo, presença ou ausência da
substância de alarme e fase do experimento. A porcentagem dos comportamentos e
do posicionamento dos peixes foi calculada para cada uma das cinco fases, antes e
depois da apresentação dos estímulos. Estas porcentagens foram utilizadas para a
realização dos testes estatísticos.
A não normalidade dos dados foi verificada pelo teste de normalidade de
Anderson-Darling (p<0,05). A freqüência de comportamentos e o posicionamento
dos peixes no aquário foram analisados pelo teste de analise de variância de
24
Friedman comparando o tipo de estímulo apresentado, a diferença entre presença e
ausência da substância de alarme, a diferença entre os grupos e entre as fases.
Todos os testes foram seguidos do teste post-hoc de Tukey.
Os testes estatísticos foram feitos utilizando os softwares Minitab 15 e Biostat
5.0, utilizando o nível de significância de 0,05.
25
3 RESULTADOS
3.1 Histologia
Os cortes histológicos da pele dos lambaris corados com Hematoxilina-Eosina
demonstraram a presença na epiderme de células em forma de clava com o núcleo
central na epiderme. O método de coloração de ácido periódico de Schiff (PAS)
permitiu diferenciar as células mucosas das células produtoras da substância de
alarme. As células mucosas apresentavam-se coradas, devido ao seu conteúdo
glicoprotéico, enquanto as células Club eram PAS-negativas estando não coradas e
com o núcleo central (HALBGEWACHS et al., 2009; KUMARI et al., 2009). Assim foi
possível concluir que A. bimaculatus produz a substância química de alarme como
os demais Ostariophysi, mesmo em maturação avançada (Fig. 5 e 6).
26
Figura 5: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus evidenciando a presença de
glândulas; Coloração em Hematoxilina-eosina aumento 100x.
Seta: Glândulas mucosas e células produtoras da química de alarme indiferenciadas pelo método de
coloração
Figura 6: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus mostrando a presença de células
PAS positivas e negativas evidenciando a presença de células produtoras da química de alarme.
Coloração em PAS; aumento 100x.
↓
*
↓
Asterisco: Célula mucosa PAS positiva / Seta: Célula produtora da química de alarme PAS negativa
27
3.2 Análise Comportamental
Foram realizados 192 testes (3 x 8 x 8) totalizando 96 horas de filmagens. Ao
se comparar estas repetições, percebemos que os peixes estudados apresentaram
diferenças significativas para a maioria dos comportamentos. As repetições foram
influenciadas
por
testes
realizados
anteriormente
em
pelo
menos
um
comportamento resaltando algum processo de reconhecimento e influência dos
experimentos precedentes (Tab. 3 e 4).
Tabela 3: Valores do teste de Friedman (Fr) na comparação entre as réplicas realizadas para cada
tipo de estímulo de predação. (Graus de liberdade=2)
Controle
Controle
Predador
Aéreo
Predador
Aéreo
Predador
Predador
Predador
Procura Ativa Procura Ativa Emboscada
Predador
Emboscada
Com Química Sem Química Com Química Sem Química Com Química Sem Química Com Química Sem Química
PA
3.8
9.91**
12.48***
9.68**
7.13*
16.73***
8.21**
1.61
N
14.33***
17.13***
8.63**
8.48**
6.91*
25.80***
11.11**
4.38
NR 0.01
3.76
2.11
0.26
12.18**
5.11
0.05
2.03
P
8.41**
12.41**
16.88***
17.71***
1.13
12.76***
7.96**
11.15**
A
2.13
1.38
0.80
1.38
1.16
1.36
0.48
0.38
FF
2.48
0.91
3.63
1.01
1.61
1.38
4.08
1.13
PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF –
Forrageando o Fundo; p<0,05 - *; p<0,01 - **; p<0,001 - ***.
Tabela 4: Ranks com diferenças significativas para os resultados do teste de Friedman e teste posthoc Tukey comparando as réplicas realizadas para cada tipo de estímulo apresentado (graus de
liberdade=2).
Comportamento
Controle
Predador aéreo
PA
N
NR
P
A
FF
Com química ns
1 e 2 / 1 e 3 ns
1 e3
ns
ns
Sem química 1 e 3
1 e 3/ 2 e 3 ns
1 e3
ns
ns
Com química 2 e 3
1 e2
ns
1 e 2 / 1 e 3 ns
ns
Sem química 1 e 3
1 e3
ns
1 e 3 / 2 e 3 ns
ns
Com química 2 e 3
1 e2
1 e 2 / 1 e 3 Ns
Predador procura ativa Sem química 1 e 3 / 2 e 3 1 e 3 / 2 e 3 ns
Com química 1 e 2
Predador emboscada Sem química ns
ns
ns
1 e 3 / 2 e 3 ns
ns
1 e2
ns
1 e2
ns
ns
ns
ns
1 e 2 / 1 e 3 ns
ns
PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF –
Forrageando o Fundo; ns – Não significativo.
O estímulo controle não provocou alterações no comportamento dos lambaris
e também não gerou diferenças significativas no posicionamento dos peixes, antes e
28
depois da apresentação do estímulo, sem a presença da química de alarme. No
entanto, ao se apresentar o estímulo neutro (controle) com a presença da substância
de alarme, o posicionamento dos peixes não foi alterado, mas observa-se um
aumento tardio do comportamento ―Parado Ativo‖ (Fr = 25.85, GL=4, p < 0.0001)
junto a uma diminuição do comportamento ―Nadando‖ (Fr = 24.37, GL=4, p <
0.0001)(Tab. 5).
Tabela 5: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo controle.
Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de liberdade=4).
Estímulo Controle
Comportamento
PA
N
NR
P
A
FF
Posição
Acima
Meio
Fundo
Com química
Aumento – Fases 1 e 4, 1 e 5.
Diminuição – Fases 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5
ns
ns
ns
ns
Sem química
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF –
Forrageando o Fundo; ns – Não significativo.
Com a apresentação do modelo Ave sem a química de substância arme, os
peixes imediatamente diminuíram o comportamento ―Nadando‖ (Fr = 31.49, GL=4, p
< 0.0001) e aumentaram a freqüência do comportamento ―Nadando Rápido‖ (Fr
=22.92, GL=4, p = 0.0001) sendo que a partir de cinco minutos após a apresentação
do estímulo, houve um aumento do comportamento ―Perseguindo‖ (Fr =19.12, GL=4
p = 0.0007). Os lambaris se posicionaram inicialmente no fundo do aquário
(Fr=16.62, GL=4, p=0.0023), mas em seguida utilizam o meio da coluna d’água a
maior parte do tempo do teste (Fr=20.60, GL=4, p=0.0004)(Tab. 6).
A apresentação do modelo de Ave com a substância de alarme faz os peixes
diminuírem
imediatamente
o
comportamento
―Nadando‖
(Fr=23.59,
GL=4,
p<0.0001), aumentam o comportamento ―Nadando Rápido‖(Fr=12.69, GL=4,
p=0.0129) e aumentam imediatamente o comportamento ―Perseguindo‖(Fr=18.45,
29
GL=4, p=0.0010). Além disso, utilizam o fundo do aquário durante maior parte do
tempo subseqüente a apresentação do estímulo aéreo (Fr= 14.76, GL=4, p=
0.0052)(Tab. 6).
Tabela 6: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo de predador aéreo.
Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de liberdade=4).
Estímulo de Predador aéreo
Comportamento Com química
Sem química
PA
ns
ns
N
Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4 Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5
NR
Aumento – Fases 1 e 2
Aumento – Fases 1 e 2
P
Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4
Aumento – Fases 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5
A
ns
ns
FF
ns
ns
Posição
Acima
ns
ns
Meio
ns
Diminuição – Fases 1 e 2
Fundo
Aumento – Fases 1 e 2
ns
PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF –
Forrageando o Fundo; ns – Não significativo.
A exposição do predador de procura ativa sem a substância de química de
alarme produziu uma resposta aumentando imediatamente o comportamento
―Perseguindo‖ (Fr=15.67, GL=4, p=0.0035) e diminuindo o comportamento
―Nadando‖ (Fr=24.85, GL=4 p<0.0001) sendo que no final do teste há um aumento
do comportamento ―Parado Ativo‖ (Fr=28.74, GL=4, p< 0.0001). Ao final do teste, os
peixes passam a utilizar significativamente mais o meio da coluna d’água (Fr=13.96,
GL=4, p=0.0074) e menos o fundo (Fr=15.75, GL=4, p=0.0034)(Tab. 7).
Com a exposição do predador de procura ativa com a presença da química de
alarme, os lambaris aumentam os comportamentos ―Nadando Rápido‖ (Fr= 24.28,
GL=4,
p< 0.0001) e ―Perseguindo‖ (Fr=17.83, GL=4, p=0.0013) e diminuem o
comportamento ―Nadando‖ (Fr=36.25, GL=4, p< 0.0001) imediatamente e então
aumentam
o
comportamento
―Parado
ativo‖(Fr=46.57,
GL=4,
p<
0.0001)
tardiamente. Para este tipo de estimulação, não houve diferença significativa entre o
posicionamento no aquário (Tab. 7).
30
Tabela 7: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo de predador de
procura ativa.. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de
liberdade=4).
Estímulo de Predador procura ativa
Comportamento Com química
Sem química
PA
Aumento – Fases 1 e 4, 1 e 5
Aumento – Fases 1 e 5
N
Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 5
NR
Aumento – Fases 1 e 2
ns
P
Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 4
Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 3
A
ns
ns
FF
ns
ns
Posição
Acima
ns
ns
Meio
ns
Aumento – Fases 1 e 3
Fundo
ns
Diminuição – Fases 1 e 3
PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF –
Forrageando o Fundo; ns – Não significativo.
Para o modelo predador de emboscada sem a substância de alarme, houve
apenas uma diminuição tardia do comportamento ―Nadando‖ (Fr=19.45, GL=4,
p=0.0006) e o posicionamento dos peixes não foi afetado significativamente.
Entretanto, para este tipo de estímulo, com a apresentação da química de alarme,
há uma diminuição imediata do comportamento ―Nadando‖ (Fr=33.96, GL=4, p=<
0.0001) e um aumento do comportamento ―Nadando Rápido‖ (Fr=17.87, GL=4,
p=0.0013) seguido de um aumento tardio do comportamento ―Parado Ativo‖
(Fr=25.51, GL=4, p< 0.0001) e o posicionamento também não foi afetado (Tab. 8).
31
Tabela 8: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo de predador de
emboscada. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de
liberdade=4).
Estímulo de Predador de emboscada
Comportamento Com química
Sem química
PA
Aumento – Fases 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5
ns
N
Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 Diminuição – Fases 1 e 3, 1 e 5
NR
Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 4
ns
P
ns
ns
A
ns
ns
FF
ns
ns
Posição
Acima
ns
ns
Meio
ns
ns
Fundo
ns
ns
PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF –
Forrageando o Fundo; ns – Não significativo.
Comparamos ainda cada comportamento usando os estímulos como
variáveis. Os comportamentos ―Parado Ativo‖, ―Forrageando o Fundo‖ e ―Agredindo‖
não diferiram significativamente entre os estímulos na presença e na ausência da
química de alarme.
A apresentação da química de alarme fez com que os comportamentos não
se alterassem com a exposição de estímulos diferentes. Assim, os estímulos de
predador de procura ativa, o predador aéreo e o predador de emboscada não se
diferenciaram significativamente entre todas as fases do experimento, exceto para o
comportamento ―Nadando Rápido‖ onde se verificou uma diferença apenas entre o
predador de procura ativa e o controle nos cinco minutos iniciais após a
apresentação do modelo de predador (Fr=8.71, GL=3, p= 0.0334) (Tab. 9). A
apresentação da química de alarme fez com que os peixes utilizassem mais a área
próxima a superfície quando aliada ao estímulo de predador de emboscada, mas
quando a substância de alarme era apresentada junto ao estímulo de predador
aéreo os peixes utilizavam menos esta área superior no aquário (Fr=8.41, GL=3,
p=0.0382) (Tab. 9).
Os modelos de predador, quando apresentados sem a substância química de
alarme,
provocaram
uma
maior
diversidade
de
comportamentos
quando
32
comparados às respostas com a química de alarme. O comportamento ―Nadando‖
diminuiu significativamente em relação ao controle para os modelos de procura ativa
e predador aéreo na fase imediatamente à apresentação do estímulo (Fr=18.33,
GL=3, p=0.0004). Nas fases seguintes, a diferença para este comportamento se deu
entre o predador aéreo e o controle (fase 3: Fr=12.15, GL=3, p=0.0069; fase 5:
Fr=13.65, GL=3, p=0.0034). Ao passo que o comportamento ―Nadando‖ diminui, há
um aumento do comportamento ―Nadando Rápido‖ para os estímulos de predador
aéreo, nas fases 2 e 3, e predador procura ativa na fase 2 (fase 2: Fr=21.12, GL=3,
p< 0.0001; fase 3: Fr=10.73, GL=3, p=0.0132). O comportamento ―Perseguindo‖
aumenta tardiamente para o modelo de predador aéreo, a partir de cinco minutos
após a apresentação do estímulo até o fim das filmagens (Fr= 13.20, GL=3,
p=0.0042). Entretanto, este comportamento apresenta os menores níveis na fase de
15 a 20 minutos após a estimulação com o modelo de predador de emboscada
(Fr=12.13, GL=3, p=0.0069) (Tab. 9).
O posicionamento dos peixes sem a química de alarme mostrou que os
peixes utilizam mais o fundo do aquário quando o predador aéreo é apresentado e
menos quando o predador de emboscada é exposto (Fr=11.91, GL=3, p=0.0077).
Quando apresentados os modelos de predador de emboscada e de procura ativa o
uso do fundo é menor na fase 2, onde para estes modelos o uso do meio da coluna
d’água é maior (Fr=9.3250, GL=3, p=0.0253). Nas fases finais da realização dos
testes, de 15 a 20 minutos, os peixes voltam a se posicionar normalmente, não
apresentando diferenças significativas entre o controle e os modelos de predador
(Tab. 10).
33
Tabela 9: Resultados para a comparação dos comportamentos entre os estímulos apresentados
(Controle, Predador aéreo, procura ativa e de emboscada). Resultados significativos do teste de
Friedman e post-hoc de Tukey.
Comportamento
Com Química
Sem Química
0 - 5 minutos
ns
ns
5 - 10 minutos
ns
ns
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
0 - 5 minutos
ns
Aéreo e procura ativa > Controle
5 - 10 minutos
ns
Aéreo < Controle
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
Aéreo < Controle
0 - 5 minutos
Procura ativa > Controle
Aéreo e procura ativa > Controle
5 - 10 minutos
ns
Aéreo > Controle
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
0 - 5 minutos
ns
ns
5 - 10 minutos
ns
Aéreo > Controle
10 - 15 minutos
ns
Aéreo > Controle
15 - 20 minutos
ns
Aéreo > Controle
0 - 5 minutos
ns
ns
5 - 10 minutos
ns
ns
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
0 - 5 minutos
ns
ns
5 - 10 minutos
ns
ns
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
Parado atívo
Nadando
Nadando Rápido
Perseguindo
Agredindo
Forrageando o fundo
Aéreo – Estímulo de predador aéreo; Controle – Estímulo controle (objeto neutro); Procura atíva –
Estímulo de predador de procura ativa; ns – Não significativo.
34
Tabela 10: Resultados para a comparação das áreas utilizadas no aquário entre os estímulos
apresentados. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey.
Acima
Meio
Fundo
Com Quimica
Sem Quimica
0 - 5 minutos
ns
ns
5 - 10 minutos
Aéreo < Emboscada
ns
10 - 15 minutos
Aéreo < Emboscada
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
0 - 5 minutos
ns
Aéreo < Procura ativa e Emboscada
5 - 10 minutos
ns
Aéreo < Procura ativa
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
0 - 5 minutos
ns
Aéreo > Procura ativa e Emboscada
5 - 10 minutos
ns
ns
10 - 15 minutos
ns
ns
15 - 20 minutos
ns
ns
Aéreo – Estímulo de predador aéreo; Emboscada – Estímulo de predador de emboscada; Procura
atíva – Estímulo de predador de procura ativa; ns – Não significativo.
35
4 DISCUSSÃO
Para a validação de um estudo envolvendo reação de alarme em uma
espécie em que a presença da química de alarme ainda não foi estudada, fez-se
necessário um estudo histológico qualitativo para a verificação da presença ou
ausência das células produtoras da substância de alarme. Pelo fato de algumas
espécies descritas na literatura, possuírem um dimorfismo sexual envolvendo a
presença destas glândulas (IRVING, 1996), machos e fêmeas em estado reprodutivo
(maturação avançada) foram utilizados para esta análise.
A presença de células produtoras da química de alarme é tida como uma
constante para a superordem Ostariopysi, entretanto,
apenas cerca de 5% dos
peixes desta superordem foram estudados neste aspecto (IRVING, 1996). Alguns
destes peixes não reagem à química de alarme, mas produzem este feromônio
como as piranhas (Família Serrasalminae) ou mesmo não possuem as células
produtoras, nem a reação de alarme como alguns cascudos (e.g., Loricariidae e
Gymnotiformes) (NELSON, 2006). Com os resultados obtidos, podemos observar
que Astyanax bimaculatus apresenta as células secretoras da química de alarme
como os demais membros da superordem Ostariophysi. O gênero Astyanax é o mais
rico em diversidade de espécies da ordem Characiformes (NELSON, 2006). Então,
generalizações sobre a presença das células produtoras da química de alarme e
estudos sobre comportamento destas espécies frente à apresentação desta
substância, não devem ser feitas sem estudos prévios sobre a histologia da
epiderme.
Uma conclusão deste estudo foi que os lambaris conseguem reconhecer a
química de alarme como o indicativo de uma situação de alerta. A falta de resposta
dos lambaris à apresentação do Controle sem a química de alarme demonstrou que
a introdução de um objeto neutro no aquário não foi percebida como risco. Com isso,
ficou demonstrado que a resposta aos modelos de predador representou um
possível estímulo de predação aos peixes durante a realização dos testes. Quando o
Controle foi inserido com a química de alarme criou-se uma situação de alerta onde,
36
mesmo um objeto que não representa risco de predação gerou uma mudança
comportamental. O aumento do comportamento ―Parado Ativo‖ e a diminuição do
comportamento natatório dos peixes constitui uma resposta comum para a presença
da química de alarme (WISENDEN et al., 2010; LAWRENCE; SMITH, 1989). O
paulistinha (Danio rerio) é um comum modelo em pesquisas científicas médicas e
farmacêuticas tendo seus comportamentos muito estudados para medir reações a
drogas. O comportamento descrito como ―freezing‖, que consiste na diminuição da
atividade natatória, é tido como o mais confiável para medir ansiedade em peixes
(BLASER et al., 2010). Com isso, podemos presumir que a química de alarme
provocou ansiedade e medo nos peixes, mesmo sem a apresentação de um
possível risco eminente de predação.
As observações realizadas evidenciaram que a química de alarme aliada a
um modelo de predador gera estratégias antipredação semelhantes. A resposta para
todos os predadores consistiu no aumento imediato da atividade natatória.
Indivíduos têm uma grande chance de evitar predadores se eles fugirem
imediatamente do local, uma vez que detectada uma fonte de predação (MATHIS;
SMITH, 1993). Uma resposta rápida à detecção de um predador está relacionada a
um menor risco de serem predados (LIMA; DILL 1990). A mudança comportamental
resultante da visualização de um predador é maior quando há pré-exposição de
sinais químicos de alarme. A interação entre sinais visuais e químicos intensificam a
resposta, fazendo com que os peixes evitem um modelo de predador (WISENDEN
et al., 2004). O paulistinha apresenta respostas semelhantes. Os indivíduos fazem
movimentos natatórios erráticos em resposta à aparição de um predador (GERLAI
et al. 2000). Assim, os movimentos erráticos são uma reação de fuga exibida pelo
paulistinha (SPEEDIE, N.; GERLAI, R. 2008). O aumento do comportamento
natatório, em resposta a substância química de alarme aliada a um predador,
consiste em um comportamento antipredatório e representa uma situação de medo e
ansiedade (SPEEDIE, N.; GERLAI, R. 2008). Este tipo de reação está relacionado a
características do ambiente em que as espécies vivem. O paulistinha habita
pequenos riachos e lagos com água parada ou onde escoa lentamente. O fundo
destes ambientes geralmente possui sedimentos e vegetação. O aumento do
comportamento natatório e o uso do fundo levanta sedimentos que podem cobrir e
esconder os peixes consistindo de um comportamento antipredatório (SPEEDIE, N.;
37
GERLAI, R. 2008). Para os lambaris o aumento do comportamento natatório pode
estar relacionado com a busca por abrigos, onde os peixes podem se refugiar dos
predadores.
Foi verificado que os lambaris apresentam respostas diferentes para cada
modelo de predador quando apresentados sem a química de alarme. A resposta
para o modelo de Predador Aéreo consistiu no aumento nos comportamentos
natatório e de perseguição entre os lambaris. O aumento da atividade natatória pode
estar relacionado com a facilidade de um predador aéreo na captura dos peixes,
caso fiquem parados, visto que o aquário de testes não possuía abrigos. Os peixes
se posicionaram no fundo do aquário, visto que o estímulo de predação era
proveniente da superfície. Terminada a ameaça, os lambaris voltaram a utilizar
normalmente a região mediana do aquário. O maior uso do fundo e o aumento da
atividade natatória e estão de acordo com a resposta obtida para outras espécies de
peixes que possuem predadores aéreos (LITVAK, 1993).
A apresentação do Predador de Procura Ativa e de Emboscada sem a
química de alarme causou uma diminuição da atividade natatória. A movimentação é
facilmente distinguida pelo predador e espécies de presas podem reduzir sua
atividade quando o risco de predação é alto (LAWRENCE; SMITH, 1989). O
aumento do comportamento ―Parado ativo‖ pode ser considerado uma estratégia
antipredação comum aos peixes onde a probabilidade de sobrevivência da presa é
aumentada por dificultar a visualização pelo predador. Indivíduos mais ativos são
facilmente visualizados por se diferenciarem da cor de fundo tornando fácil sua
detecção pelo predador (KRAUSE; GODIN, 1995). O aumento do comportamento
―Parado ativo‖ também pode ser descrito como uma reação de medo e ansiedade
(BLASER et al., 2010). Outra explicação para o aumento deste comportamento
pode estar relacionado à comunicação entre os lambaris por sinais visuais. Uma
espécie da mesma família do lambari, o Hemigrammus erythrozonus (Characidae),
apresenta um típico comportamento de alerta que consiste de movimentos rápidos
das nadadeiras dorsal, caudal e peitorais, sem resultar na mudança da posição
corporal (BROWN; GODIN, 1999; BROWN et al., 1999). Estes movimentos das
nadadeiras podem alertar outros indivíduos sobre a presença de um predador
(BROWN et al. 1999). Alguma estimulação visual pode ocorrer entre os lambaris,
mas não foram examinados neste estudo. Isto pode explicar o aumento do
38
comportamento ―Parado Ativo‖ estando relacionado ao reconhecimento de um
predador aquático, visto que não houve aumento neste comportamento para o
predador aéreo.
Uma reação inesperada foi observada. O aumento do comportamento
―perseguindo‖ ocorreu para os estímulos de Predador Aéreo e de Procura Ativa,
onde os peixes apresentavam interações agonísticas entre si após a apresentação
do predador. O aumento destas interações constantemente levava alguns indivíduos
debilitados se afastarem do cardume. É esperado que os peixes se reúnam em
cardumes visando a proteção contra predadores (HOARE et al., 2004; HENSOR, et
al., 2005), porém o aumento da agressão entre indivíduos do cardume pode fazer
com que os menos competentes fiquem mais vulneráveis à predação, enquanto o
restante do cardume consiga sobreviver. Os peixes afastados do centro do cardume
têm uma maior chance de serem predados, e assim podemos relacionar o aumento
em comportamentos agonísticos (Perseguindo) como um estabelecimento de uma
posição privilegiada no grupo. Além dos benefícios para se viver em grupos, é
possível que os membros de um cardume se escondam atrás de outros indivíduos
para evitar a predação como conseqüência da hipótese de Selfish herd (FROMMEN,
et al., 2009). Isto pode explicar a presença de escamas identificadas como
integrante da dieta de A. bimaculatus e sua possível ingestão durante a exibição de
comportamentos agressivos (SAZIMA, 1983; ARCIFA et al., 1991).
Uma possível aplicação deste trabalho esta na seleção de indivíduos com
comportamentos adequados para a reintrodução. O repovoamento dos estoques
pesqueiros é uma prática mitigatória comum do impacto ambiental (GODINHO;
GODINHO, 2003, FLAGG et al., 1995). A taxa de mortalidade de peixes de cativeiro
reintroduzidos é alta e uma das grandes preocupações é a viabilidade destes
indivíduos (OLLA et al., 1998, BROWN; LALAND, 2001), Uma das grandes causas
de mortalidade na reintrodução de animais é a predação (TEIXEIRA et al., 2007).
Portanto, novos estudos podem ser realizados visando a seleção indivíduos
adequados para o peixamento ou avaliando o treinamento de peixes para a
reintrodução.
Outros estudos podem ser feitos investigando o mecanismo de
comunicação entre os peixes para coordenar as estratégias antipredatórias.
39
Concluímos que a química de alarme é um importante fator de alerta. Sua
detecção causa uma reação de ansiedade nos peixes que, quando aliada a um
modelo de predador, gera imediatamente uma reação de fuga que possibilita a
sobrevivência
do
cardume.
Percebe-se
ainda
que
os
comportamentos
antipredatórios variam expressivamente quando comparamos respostas para
predadores aéreos e aquáticos. A apresentação de comportamentos agonísticos,
como o aumento da perseguição, demonstra como a evolução atua nesta espécie,
selecionando os indivíduos mais competentes dentro de um grupo.
40
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Agostinho, A. A., Bini, L. M. & Gomes, L. C. 1997. Ecologia de comunidades de
peixes da área de influência do reservatório de Segredo. In: Reservatório de
Segredo, bases ecológicas para manejo (Ed. By Agostinho, A. A. & L. M.
Gomes), pp. 97–111. Maringá: EDUEM
Arcifa, M. S., Northcote, T. G. & Froehlich, O. 1991. Interactive ecology of 2
cohabiting characin fishes (Astyanax-fasciatus and Astyanax-bimaculatus) in an
eutrophic brazilian reservoir. Journal of Tropical Ecology, 7, 257-268.
Bazzoli, N., Rizzo, E., Chiarini-Garcia, H. & Ferreira, R. M. A. 1991. Ichthyofauna
of the Paranaíba river in the area to be flooded by the Bocaina reservoir, Minas
Gerais, Brazil. Ciência e Cultura, 43, 451–454.
Blaser, R. & Gerlai, R. 2006. Behavioral phenotyping in zebrafish: Comparison of
three behavioral quantification methods. Behavior Research Methods, 38, 456469.
Blaser, R. E., Chadwick, L. & McGinnis, G. C. 2010. Behavioral measures of
anxiety in zebrafish (Danio rerio). Behavioural Brain Research, 208, 56-62.
Brown, C. & Day, R. L. 2002. The future of stock enhancements: lessons for
hatchery practice from conservation biology. Fish and Fisheries, 3, 79–94.
41
Brown, C. & Laland, K. 2001. Social learning and life skills training for hatchery
reared fish. Journal of Fish Biology, 59, 471–493.
Brown, G. E. 2003. Learning about danger: chemical alarm cues and local risk
assessment in prey fishes. Fish and Fisheries, 4, 227-234.
Brown, G. E. & Godin J.G.J. 1999. Who dares, learns: chemical inspection
behaviour and acquired predator recognition in a characin fish. Animal
Behaviour, 57, 475-481.
Brown, G. E., Adrian, J. C., Smyth, E., Leet, H. & Brennan, S. 2000a.
Ostariophysan alarm pheromones: Laboratory and field tests of the functional
significance of nitrogen oxides. Journal of Chemical Ecology, 26, 139-154.
Brown, G. E., Paige,J. A. & Godin, J. G. J. 2000b. Chemically mediated predator
inspection behaviour in the absence of predator visual cues by a characin fish.
Animal Behaviour, 60, 315-321.
Brown, G. E., Godin, J.G. J. & Pedersen, J. 1999. Fin-flicking behaviour: a visual
antipredator alarm signal in a characin fish, Hemigrammus erythrozonus.
Animal Behaviour, 58, 469-475.
Chivers, D. P., Mathisb, A., Brown C, G. E., Mirzaa, R. S. & Wisendend, B. D.
1999. Scratching the skin of predator–prey interactions in fishes: a tribute to R.
Jan F. Smith (1940–1998). Environmental Biology of Fishes, 56: 343–350.
Chivers, D.P. & Smith, R.J.F. 1998. Chemical alarm signalling in aquatic predatorprey systems: a review na prospectus. Écoscience, 5, 338-352.
42
Costa, F. E. S. & Braga, F. M. S. 1993. Estudo da alimentação natural de Astyanax
bimaculatus, Astyanax schubati e Moenkhausia intermedia (Characidae,
Tetragonopterinae) na represa de Barra Bonita, rio Piracicaba (SP). Revista
UNIMAR, 15, 117–134.
Edmunds, M. 1974. Defense in animals. New York: Longman.
Esteves, K. E. & Galetti, P. M. Jr. 1995. Food partitioning among some characids of
a small Brazilian floodplain lake from the Paraná River basin. Environmental
Biology of Fishes, 42, 375–389.
Flagg, T.A., Mahnken, C.V.W. & Johnson, K.A. 1995. Captive broodstocks for
recovery of Snake River sockeye salmon. American Fisheries Society
Symposium, 15, 81–90.
Frommen, J. G., Hiermes, M. & Bakker, T. C. M. 2009. Disentangling the effects of
group size and density on shoaling decisions of three-spined sticklebacks
(Gasterosteus aculeatus). Behavioral Ecology and Sociobiology, 63, 11411148.
Galef, B. G. & Giraldeau, L.A. 2001. Social influences on foraging in vertebrates:
causal mechanisms and adaptive functions. Animal Behaviour, 61, 3—15.
Garutti, V. 1988. Distribuição longitudinal da ictiofauna em um córrego da região
noroeste do estado de São Paulo, bacia do rio Paraná. Revista Brasileira
Biologia, 48, 747–759.
43
Gerlai, R., Fernandes,Y. & Pereira, T. 2009. Zebrafish (Danio rerio) responds to the
animated image of a predator: Towards the development of an automated
aversive task. Behavioural Brain Research, 201, 318-324.
Gerlai, R., Lahav, M. Guo, S. & Rosenthal, A. 2000. Drinks like a fish: zebra fish
(Danio rerio) as a behavior genetic model to study alcohol effects.
Pharmacology Biochemistry and Behavior, 67, 773-782.
Giaquinto, P. C. & Volpato, G. L. 1997. Chemical cues related to conspecific size in
pintado catfish, Pseudoplatystoma coruscans. Physiology and Behavior, 62,
1333-1338.
Godinho, H. P. & Godinho, A. L. 2003. Águas, peixes e pescadores do São
Francisco das Minas Gerais. Belo Horizonte: PUC Minas.
Griffin, A.S., Blumstein, D.T. & Evans, C.S. 2000. Training captive-bred or
translocated animals to avoid predators. Conservation Biology, 5, 1317–1326.
Halbgewachs, C. F., Marchant, T. A., Kusch, R. C.& Chivers, D. P. 2009.
Epidermal club cells and the innate immune system of minnows. Biological
Journal of the Linnean Society, 98, 891-897.
Hartman, E.J, & Abrahams, M.V. 2000. Sensory compensation and detection of
predator: the interaction between chemical na visual information. Proceedings
of the Royal Society of London, Series B., 267, 571-575
44
Hensor, E., Couzin, I. D. James, R. & Krause, J. 2005. Modelling densitydependent fish shoal distributions in the laboratory and field. Oikos, 110, 344352.
Hoare, D. J., Couzin I. D., Godin, J. G. J.& Krause, J. 2004. Context-dependent
group size choice in fish. Animal Behaviour, 67, 155-164.
Hollen, L. I. & Radford, A. N. 2009. The development of alarm call behaviour in
mammals and birds. Animal Behaviour, 78, 791-800.
Howell, B. R. 1994. Fitness of hatchery-reared fish for survival in the sea.
Aquaculture and Fisheries Management, 25, 3–17.
Ide, L. M., Urbinati, E. C. & Hoffmann, A. 2003. The role of olfaction in the
behavioural and physiological responses to conspecific skin extract in Brycon
cephalus. Journal of Fish Biology, 63, 332-343.
Irving, P. W. 1996. Sexual dimorphism in club cell distribution in the European
minnow and immunocompetence signalling. Journal of Fish Biology, 48, 80-88.
Kelley, J. & Magurran, A. E. 2003. Learned predator recognition and antipredator
responses in fishes. Fish and Fisheries, 4, 216–226.
Krause, J. & Ruxton, G. D. 2002. Living in Groups. Oxford: Oxford University Press.
45
Krause, J. and Godin, J.G. J. 1995. Predator preferences for attacking particular
prey group sizes: consequences for predator hunting success and prey
predation risk. Animal Behaviour, 50, 465-473.
Kumari, U., Yashpal, M., Mittal, S. & Mittal, A. K. 2009. Histochemical analysis of
glycoproteins in the secretory cells in the gill epithelium of a catfish, Rita rita
(Siluriformes, Bagridae). Tissue and Cell, 41, 271-280.
Lawrence, B. J. & Smith, R. J. F. 1989. Behavioral response of solitary fathead
minnows, Pimephales promelas, to alarm substance. Journal of Chemical
Ecology, 15, 209-219.
Leavesley, A. J. & Magrath, R. D. 2005. Communicating about danger: urgency
alarm calling in a bird. Animal Behaviour, 70, 365-373.
Lima, S. L. & Dill, L. M. 1990. Behavioral decisions made under the risk of
predation: a review and prospectus. Canadian Journal of Zoology, 68, 619-640
Litvak, M. K. 1993. Response of shoaling fish to the threat of aerial predation.
Environmental Biology of Fishes, 36, 183-192.
MacDonald, P., Laurenson, C. H., Johnson, A. & Tait, L. 2009. A comparison of
catch rates of artificial lures from an automated handline fishery at Shetland,
UK. Fisheries Research, 95, 379-385.
Mathis, A. & Smith, R. J. F. 1993. Chemical alarm signals increase the survival time
of fathead minnows (Pimephales promelas) during encounters with northern
pike (Esox lucius). Behavioral Ecology, 4, 260–265.
46
Moyle, P. B. & Cech, J. J.J. 2004. Fishes: An Introduction to Ichthyology, 5rd edn.
New Jersey: Prentice- Hall, Saddle River.
Nelson, J. S. 2006. Fishes of the World, 4rd edn. New York: Wiley.
Olla, B.L., Davis, M.W. & Ryer, C.H. 1998. Understanding how the hatchery
environment represses or promotes the development of behavioural survival
skills. Bulletin of Marine Science, 62, 531–550.
Pearse, A.G.E. 1985. Histochemistry: theoretical and applied. 4th edn. Edinburgh:
Churchill Livingstone.
Pfeiffer, W. 1977. The distribution of fright reaction and alarm substance cells in
fishes. Copeia, 4, 653–665.
Pollard, K. A. & Blumstein, D. T. 2008. Time allocation and the evolution of group
size. Animal Behaviour, 76, 1683-1699.
Roberts, G. 1996. Why individual vigilance declines as group size increases. Animal
Behaviour, 51, 1077-1086.
Sazima, I. 1983. Scale-eating in characoids and other fishes. Environmental Biology
of Fishes, 9, 87-101.
47
Seyfarth, R. M., Cheney, D. L. & Marler, P. 1980. Monkey responses to three
different alarm calls: evidence of predator classification and semantic
communication. Science, 210, 801–803.
Smith, R. J. F. 1992. Alarm signals in fishes. Reviews in Fish Biology and Fisheries,
2, 33–63.
Smith, R. J. F. 1997. Does one result trump all others? A response to Magurran,
Irving and Henderson. Proceedings of the Royal Society, Ser. B, 264, 445–450.
Speedie, N. & Gerlai, R. 2008. Alarm substance induced behavioral responses in
zebrafish (Danio rerio). Behavioural Brain Research, 188, 168-177.
Szulkin, M., Dawidowicz, P. & Dodson, S. I. 2006. Behavioural uniformity as a
response to cues of predation risk. Animal Behaviour, 71, 1013-1019.
Teixeira, C. P., Azevedo C. S., Mendl, M., Cipreste, C. F. & Young, R. J. 2007.
Revisiting translocation and reintroduction programmes: the importance of
considering stress. Animal Behaviour, 73, 1-13.
Uieda, V. S. 1984. Ocorrência e distribuição dos peixes em um riacho de água doce.
Brazilian Journal of Biology, 44, 203–213.
Wisenden, B. D. & Thiel, T. A. 2002. Field verification of predator attraction to
minnow alarm substance. Journal of Chemical Ecology 28, 433-438.
48
Wisenden, B. D., Binstock, C. L. Knoll, K. E.,Linke, A. J. & Demuth, B. S. 2010.
Risk-sensitive information gathering by cyprinids following release of chemical
alarm cues. Animal Behaviour, 79, 1101-1107.
Wisenden, B. D., Vollbrecht, K. A. l. & Brown, J. L. 2004. Is there a fish alarm
cue? Affirming evidence from a wild study. Animal Behaviour, 67, 59-67.
49
APÊNDICE A – Ficha de registro dos dados
50
Download