FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO UL CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS CURSO DE ARTES VISUAIS Professor Dr. Isaac A. Camargo Apoio Pedagógico: AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM: www.artevisualensino.com.br História da Arte IV Apresentação HISTÓRIA DA ARTE IV Estudo da teoria e da produção em artes visuais na primeira metade do século XX, no mundo ocidental e oriental, em consonância com os aspectos técnicos, tecnológicos, políticos, sócio-econômicos e culturais. Abordagem da influência da arte africana na arte moderna européia. Bibliografia Básica: ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. GOMBRICH, E.H. A História da Arte. Rio de Janeiro: Zahar, 1993. STANGOS, Nikos. Conceitos da Arte Moderna. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 1995. Bibliografia Complementar: BAUMGART, Fritz. Breve História Da Arte. São Paulo: Martins Fontes, 2001. FER, BRIONY et al. Realismo, Racionalismo, Surrealismo: a arte no entre Cavernas. São Paulo: Cosac e Naify, 1998. KRAUS, R. Caminhos da Arte Moderna . São Paulo: Martins Fontes, 1998. Na primeira metade do século XX, de 1900 a 1950, ocorreram muitas transformações de caráter social, político, econômico e cultural que definiram o perfil de todo o século XX. Pode-se dizer que as duas Guerras Mundiais, a primeira de 1914 a 1918 e a segunda de 1939 a 1945, redefiniram as fronteiras das nações, bem como, a distribuição do poder político e econômico no mundo. Entre as guerras enfrentamos ainda a Revolução Russa, a ascensão do Nazismo e o Fascismo. A reordenação econômica foi o principal fator de transformação social, a partir daí a riqueza das nações foram propulsoras das invenções, da industrialização, do desenvolvimento das mídias de comunicação e do mercado de bens e serviços consolidando o Capitalismo. A Arte, como não podia deixar de ser, também foi vítima e beneficiária destas transformações. O advento do Modernismo marcado pelas ocorrências entre fins do século XIX, início e meados do século XX, definiu as novas tendências da expressão artística tanto para a primeira quanto para a segunda metade do século XX, influenciando a Arte na contemporaneidade. A partir das análises sociais e econômicas que caracterizaram a primeira metade do século XX é que será ordenada a disciplina, tendo como referencial as transformações estéticas que se manifestaram na expressão artística deste período. A Arte no final do século XIX revela a transição do modelo tradicional para o Modernismo. Pode-se dizer que a Arte do século XIX era amparada num projeto que havia sido recuperado da antiguidade clássica e reordenado nas Academias do Renascimento e reciclada pelo Neoclássico da Academia de Belas Artes francesa expandida para o mundo todo. O esgotamento dos “serviços” de arte, ou seja, a redução dos fazeres destinados aos artistas como retratos, pinturas de paisagem destinadas à decoração ambiental, dos serviços gráficos, como produção de gravuras e mesmo a modelagem de esculturas públicas, medalhas e moedas entre outras atividades, recrudesceram limitando as atividades artísticas. A transformação do modelo econômico de base artesanal para o industrial também reduz o potencial de trabalho artístico no qual as habilidades manuais eram requeridas com maestria. O surgimento da fotografia como meio de reprodução de imagens também intimida os artistas e instaura um novo modo de conceber o imaginário coletivo. Todas estas modificações estimulam o surgimento de novas proposições artísticas nas quais as poéticas de vanguarda passam a ditar as novas tendências, os “ismos”, que nos habituamos a estudar a partir da transição do século XIX para o XX. O Conceito de Moderno está relacionado ao de novidade, algo novo, inovador, atual ou contemporâneo. No contexto da Arte Visual, define as transformações que ocorreram no final do século XIX para o século XX em oposição à Arte tradicional de caráter acadêmico. O Modernismo não é uma Escola Estilística, um Manifesto ou Movimento Artístico, ele caracteriza um período no qual ocorreram várias transformações estéticas inovadoras e experimentais que determinaram as características da arte do século XX até a atualidade. O principal aspecto destas manifestações é o afastamento radical da arte tradicional de caráter clássico, chamada de acadêmica, e a aproximação e valorização de novos valores plásticos, visuais e, principalmente, conceituais. Estes novos valores decorrem da ruptura com o modelo tradicional de arte e da vontade de inovar, explorar novos materiais, meios e processos expressivos, bem como da pesquisa de materiais e soluções plásticas. O Modernismo instaura o que podemos chamar de Pesquisa em Arte, as investigações e explorações de caráter estético, matéricos e conceituais ampliam a relação dos artistas com suas poéticas, procedimentos e possibilidades. É isto que caracterizará a arte do século XX. Desde o Realismo, as temáticas já demonstravam uma transformação razoável migrando dos temas tradicionais como os mitológicos, sacros ou profanos de caráter sensual típicos da tradição artística, para os temas sociais nos quais o ser humano é representado no seu cotidiano, no trabalho e nas querelas sociais. Na França em 1863, o Imperador Napoleão III, atendendo aos protestos de vários artistas, recusados de participar nos salões oficiais de Paris, realizados anualmente no Louvre, determina a realização de uma exposição paralela que, pejorativamente, passou a ser conhecida como Salão dos Recusados. Esta mostra paralela foi a mola propulsora de outras exposições organizadas por grupos de artistas, entre elas, a da Sociedade Anônima de Pintores, Escultores e Gravadores, realizada em 1874, conhecida, mais tarde como a primeira exposição dos Impressionistas. Boa parte dos historiadores considera esta exposição como o principal marco das transformações Modernistas. O nome Impressionismo decorre da alcunha atribuída pelo escritor Louis Leroy ao comentar a obra de Claude Monet: Impressão - Nascer do Sol,de 1872: Portanto, o Impressionismo é o divisor de águas entre o passado tradicional e clássico e a inovação Modernista. Dai em diante, tudo é possível. É importante não esquecer que os diferentes movimentos, escolas, e todos os “ismos” produzidos pela vertente moderna, não são sucessivos, mas simultâneos. A percepção de uma linha histórica que mantinha uma certa hegemonia na observação do estilos estéticos do passado não corresponde mais aos projetos da modernidade. A liberdade formal instaurada pelo Impressionismo logo se torna uma estratégia discursiva utilizada por vários artistas ao proporem ou participarem de movimentos estéticos. A partir dai diversas escolas e estilos passaram a ser desenvolvidas em busca de novas poéticas, entre elas o Expressionismo, um dos movimentos que faz a passagem entre os séculos XIX e XX. Herwarth Walden, editor da revista “Der Storn”, de Berlin, aplica o termo expressionismo às obras produzidas entre 1910 e 1920 sem distinção. Entretanto, o que caracteriza o Expressionismo é a oposição ao Impressionismo que ocorre entre 1885 e 1900. A dramaticidade expressada por estes artistas, o rompimento com os valores clássicos e o descompromisso com o naturalismo é o que os caracteriza. Dois movimentos alemães foram importantes para a consolidação do Expressionismo o grupo Die Brück e o movimento Der Blaue Reiter, ambos determinam sua configuração estética. Além deles, e além da Alemanha, surgem outros movimentos na Europa que seguem esta tendência estética, entre eles o Fauvismo. Pode-se entender que, desde então, surgem diferentes movimentos, escolas e tendências. Já que não havia a necessidade de buscar a hegemonia das manifestações artísticas, os artistas e movimentos buscam a inovação, a inventividade e a criatividade além de outras qualidades estéticas e discursivas na construção de suas poéticas. Uma listagem superficial das manifestações estéticas desta primeira metade do século XX pode relacionar pelo menos o Expressionismo, o Fauvismo, o Cubismo, o Futurismo, o Orfismo, o Raionismo, o Vorticismo, o Dadaísmo, o Construtivismo, o Suprematismo, De Stjil, a Bauhaus, o Surrealismo e a Nova objetividade, Abstração, Expressionismo Abstrato entre outros. Pode-se dizer que a década de cinquenta do século passado, foi marcada pelas transformações estéticas radicais e contínuas. Não houve um só momento de apatia e conformismo mas de constante inovação. A Arte Visual não é mais um modo de seguir regras ou reproduzir modelos, mas de romper, criar regras e instaurar novas poéticas. Entretanto, há alguns aspectos que merecem nossa atenção em relação à passagem do sistema tradicional para o modernista, podemos destacar dois deles: um é identificar que processo de formação artística sucedeu ao processo acadêmico; outro é entender como o Sistema de Arte se adaptou às novas tendências estéticas. Primeiramente vamos destacar a questão do ensino de Arte. A pedagogia instaurada a partir do século XVI, por meio das Academias se manteve como modelo de ensino predominante até o advento da Modernidade. Grande parte dos artistas da primeira geração moderna se formou ou participou deste processo, filiando-se ou desfiliando-se dele. No entanto, quando a Modernidade se torna a principal referência para as transformações poéticas do século XX, surge também a necessidade de rever a formação artística praticada nessa época, nesse sentido, como não havia um projeto coletivo Modernista, é preciso identificar as propostas que ampararam o pensamento deste novo período artístico. O Modernismo, como tendência propositiva e conceitual dos modos de fazer Arte, mesmo sem uma pedagogia formalizada, possibilitou o surgimento de estratégias técnicas que valorizaram as novas diretrizes criativas. Em grande parte resultantes das experiências proposições estéticas e procedimentos poéticos dos artistas modernistas. Os novos valores estéticos como a criatividade, inventividade, inovação de materiais, procedimentos técnicos e recursos expressivos que destacavam a liberdade poética e as pesquisas estéticas dependiam de uma pedagogia formalizada, mesmo para que os estudos, no campo da Arte, continuem se desenvolvendo. O exercício da livre expressão, uma das características do Modernismo, implica na redução ou eliminação pura e simples de qualquer direcionamento ou sistematização formal, logo, a constituição de uma “Academia” Modernista, estava fora de cogitação, já que o movimento Moderno não é uma proposição formalizada, mas uma ocorrência, em grande parte, espontânea e coletiva. Mas, por outro lado, preparar artistas se mantém como uma necessidade premente destas novas poéticas. Neste sentido, resta perguntar qual seria a escola que poderia substituir a Academia? Embora, nos primeiros anos, não tenha surgido uma escola destinada especificamente à formação de artistas modernos, o primeiro projeto pedagógico que atende boa parte das questões pedagógicas modernistas surge na Alemanha. Esta escola é a Bauhaus. Fundada por Walter Gropius em 1919 na república de Weimar, depois transferida para Dessau e fechada pelo nazismo em 1933. "Criemos uma nova Guilda de artesãos, sem as distinções de classe que erguem uma barreira de arrogância entre o artista e o artesão", declara o arquiteto germânico Walter Adolf Gropius (1883 – 1969). A Bauhaus foi a primeira escola disposta a desenvolver projetos criativos, uma escola que se propõe a formar pessoas habilitada para conceber e criar formas e não reproduzir o que se via, neste sentido atende às necessidades de preparar criadores que concebam as novas proposições estéticas. Embora o surgimento da Bauhaus busque atender aos fins industriais que mobilizavam as necessidades econômicas da Alemanha naquela época, seu ensino inovador é centrado em oficinas de diversos materiais e seminários teóricos, ao contrário dos Ateliers acadêmicos que haviam se especializado em desenvolver habilidades técnicas. Além, disso, a maioria de seus professores participaram de vários experimentos, movimentos ou proposições modernistas. Eram, portanto, conhecedores da causa moderna e da necessidade de transformar processos e procedimentos, bem como, técnicas para o uso de novos materiais, inclusive, no usos das novas tecnologias. Entre aqueles artistas: Johannes Itten (1888 - 1967), Theo van Doesburg (1883 - 1931), Wassily Kandinsky (1866 - 1914), Paul Klee (1879 - 1940), László Moholy-Nagy (1894 - 1946), Breuer, Hannes Meyer (1889 - 1954), Van der Rohe, Oskar Schlemmer (1888 - 1943), Joseph Albers (1888 - 1976) e outros. A proposta de Gropius para a Bauhaus deixa entrever a dimensão estética, social e política de seu projeto. Trata-se de formar novas gerações de criadores de acordo com um ideal de uma sociedade civilizada e democrática, sem hierarquias estéticas, mas somente funções complementares. Criada a partir da estrutura da Escola do Grão-Duque para Artes Plásticas, já em operação na Alemanha, procura alinhar a Arte à tradição artesanal e, ao mesmo tempo, recorrer à inovação industrial. Neste sentido estas três possibilidades: Arte, Artesanato e Indústria puderam conviver pacificamente por alguns anos e produzir bons frutos. A proposta pedagógica da Bauhaus alia a arte e a tecnologia num só ambiente de aprendizagem. Alia diferentes atividades teórico/práticas na formação de seus estudantes. A difusão de sua estrutura pedagógica, de formato circular, é também um novo modo de comunicar informações e relações. Embora fosse uma escola cuja ênfase era voltada para a formação técnica industrial, contribuiu para o desenvolvimento de um projeto pedagógico atraindo a atenção dos artistas que lançaram mão de sua estrutura pedagógica para configurar as escolas de Artes Plásticas e, mais tarde, as de Artes Visuais. A grande conquista da Bauhaus foi ser a precursora da formação do desenhista industrial que se tornou, hoje, o Design. Ao contrário dos Ateliers de pintura, escultura, desenho, gravura que primavam pela criação/reprodução de imagens tomadas da visualidade racionalizada como matriz para a formação dos artistas acadêmicos, a Bauhaus se organiza em oficinas de trabalho, onde a pesquisa, aplicação e processos de construção de formas, formatos e materiais se torna a matriz de formação em artes plásticas. Ainda hoje, quando se fala em objetos modernos, o que vem a mente são os produtos da Bauhaus, mesmo depois de oitenta anos. O que se percebe é que a formação artística também passa por transformações. Primeiro por abolir o uso de modelos pré-definidos obtidos da tradição greco-romana, depois do Renascimento e mais tarde do Neoclássico. Depois o afastamento completo dos estudos dos ornatos, de anatomia artística, modelo vivo, e da construção geométrica e racionalista que amparava o processo de representação do mundo visível. O foco se dá na manipulação e transformação dos materiais sobre os quais os artistas trabalhavam. Ao invés de representar a forma das coisas como eram vistas, criavam as formas para serem vistas. A esteticidade contida e resultante da obra de arte tradicional aos poucos, se afasta de sua materialidade objetual e objetiva e se aproxima do conceito, de uma estética geradora e não representativa. A arte não reside mais nos objetos mas nas proposições, conceitos e intervenções, são as ocorrências e manifestações que interessam na dinâmica interativa com a sociedade contemporânea e não mais obras enquanto repositórios estéticos de valores do passado.