Consenso – tratamento empírico da infecção em pacientes graves

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VOLUME 1
•
NÚMERO 1
•
JULHO DE 2006
Emespañol
português
En
Critérios para o tratamento empírico da infecção em pacientes graves
hospitalizados na unidade de terapia intensiva
Mensagens
dos editores
■
Introdução
Dr. Pedro Cahn
■
Resistência bacteriana na unidade de terapia intensiva
Prof. José María Casellas
■
Dr. Edgar Jiménez
Manejo empírico das infecções na unidade de terapia intensiva: a perspectiva
do intensivista
Dr. Edgar Jiménez
■
Controvérsias sobre o tratamento empírico das infecções em unidades
de terapia intensiva
Prof. Juan José Picazo
Dr. Mitchell Levy
■
Infecções graves na unidade de terapia intensiva pediátrica
Dr. Javier María Casellas
■
Resistência a antibacterianos na América Latina
Prof. José María Casellas
■
Conclusões e recomendações
Grupos de especialistas
Em português
4 Mensagens dos editores
Dr. Edgar Jiménez
Dr. Mitchell Levy
Critérios para o tratamento empírico da infecção em pacientes graves
hospitalizados na unidade de terapia intensiva
5 Introdução
Dr. Pedro Cahn
6 Resistência bacteriana na unidade de terapia intensiva
Prof. José María Casellas
9 Manejo empírico das infecções na unidade de terapia intensiva:
a perspectiva do intensivista
Dr. Edgar Jiménez
13 Controvérsias sobre o tratamento empírico das infecções em unidades
de terapia intensiva
Prof. Juan José Picazo
16 Infecções graves na unidade de terapia intensiva pediátrica
Dr. Javier María Casellas
20 Resistência a antibacterianos na América Latina
Prof. José María Casellas
22 Conclusões e recomendações
Grupos de especialistas
Editor
Mitchell Levy, MD, FCCM
Secretario, SCCM
Director, Medical ICU Rhode Island Hospital.
Profesor de Medicina, Brown University School of Medicine.
EDITOR
SCCM Secretary
Mitchell Levy, MD, FCCM
Director, Medical ICU
Rhode Island Hospital
Professor of Medicine
Brown University School of Medicine
Editor da edição em espanhol e português
Edgar Jimenez, MD, FCCM
Guest Editor
SCCM President-elect
Frederick P. Ognibene, MD, FCCM
Director, Office of Clinical Research
Training and Medical Education, CC
Director, Clinical Research Training
Program, OIR
Attending, Critical Care Medicine
Department, CC
National Institutes of Health
Tesoureiro, World Federation of Societies of Intensive and Critical Care Medicine
Diretor, Unidade Médica de Terapia Intensiva e Professor Associado de Medicina,
Universidade da Florida. Orlando Regional Medical Center.
Comitê Editor Convidado
Associate Editor for Podcasting
Richard Savel, MD
Associate Director,
Surgical Intensive Care Unit
Maimonides Medical Center
Assistant Professor of Medicine
Mt. Sinai School of Medicine
Editorial Advisory Board
SCCM President
Charles G. Durbin Jr., MD, FCCM
Professor of Anesthesiology and Surgery
Medical Director, Respiratory Care
University of Virginia Health System
COSTA RICA
Pedro Cahn
Javier María Casellas
José María Casellas
Bernardo Maskin
Néstor Raimondi
Juan J. Videla
Jaime Fernández Alpizar
ESPANHA
Juan J. Picazo
MÉXICO
Federico Javier Ortiz Ibarra
Luis Antonio Sánchez López
BRASIL
PANAMÁ
José Maria da Costa Orlando
Thais Guimarães
Néstor Sosa
CHILE
Luis Cuellar Ponce de León
PERU
SCCM Immediate Past President
Peter B. Angood, MD, FCCM
Vice President and Chief Patient Safety
Officer, Joint Commission on Accreditation of
Healthcare Organizations
SCCM President-elect
Frederick P. Ognibene, MD, FCCM
Director, Office of Clinical Research Training and
Medical Education, CC
Director, Clinical Research Training
Program, OIR
Attending, Critical Care Medicine
Department, CC
National Institutes of Health
ARGENTINA
Ricardo Espinoza
Patricia González
URUGUAI
Maria Cristina Rizzi
COLÔMBIA
VENEZUELA
Francisco Molina
Carlos Humberto Saavedra Trujillo
Alfredo López Strauss
Antonio Martinelli
Critical connections
Em português
SCCM Treasurer
Phillip S. Barie, MD, MBA, FCCM
Professor of Surgery and Public Health
Chief, Division of Trauma and Critical Care
Weill Medical College of Cornell University
Critical Connections Staff
Melissa Nielsen
Managing Editor
Dave Zwierz
Graphic Designer
Deborah L. McBride
Director of Publications
David Julian Martin, CAE
Chief Executive Officer and
Executive Vice President
Contributing Authors
Pat Langford
Eric Chandler
Volume 1, Número 1, Julho 2006
PRODUÇÃO EDITORIAL:
Editorial Médica A.W.W.E. S.A.
(Alliance for World Wide Editing)
Padre Vanini 380 (B1602EEF) Buenos Aires, Argentina
Tel: (5411) 4761-3339 / Fax: (5411) 4761-0763
e-mail: [email protected]
http://www.emawwe.com
© 2006 ACINDES
Associação Civil de Pesquisa e
Desenvolvimento en Saúde
Pesquisa e Ensino Médico Continuado para
os Profissionais da Saúde e da Comunidade
EDIÇÃO: Equipe ACINDES
DESENHO E COMPOSIÇÃO: I & M S.A.
[email protected]
DIRETOR:
Jacobo A. Tieffenberg, MD-MPH-MS
Impresso em São Paulo, Brasil, em setembro de 2006.
Esta reunião foi realizada mediante um aporte educacional irrestrito do laboratório AstraZeneca.
Esta publicação é oferecida como um serviço educacional do laboratório AstraZeneca para os médicos. Os pontos de
vista aqui expressados refletem a experiência e as opiniões dos autores.
Antes de prescrever qualquer medicamento eventualmente citado nesta publicação, deve-se consultar a informação
para prescrever emitida pelo fabricante.
Participantes
ARGENTINA
E.U.A.
Pedro Cahn
Edgar Jiménez
CHEFE, SERVIÇO DE INFECTOLOGIA, HOSPITAL FERNÁNDEZ,
BUENOS AIRES. PRESIDENTE, INTERNATIONAL AIDS SOCIETY
DIRETOR, UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA, ORLANDO REGIONAL
MEDICAL CENTER. PROFESSOR ASSOCIADO DE MEDICINA CRÍTICA
E MEDICINA INTERNA, UNIVERSIDADE DA FLÓRIDA. SOCIETY OF
CRITICAL CARE MEDICINE (SCCM), ORLANDO
Bernardo Maskin
DIRETOR, DEPARTAMENTO DE CUIDADOS INTENSIVOS, HOSPITAL POSADAS,
BUENOS AIRES
ESPANHA
Javier María Casellas
Juan J. Picazo
INFECTOLOGISTA. PEDIATRA, DIVISÃO DE INFECTOLOGIA PEDIÁTRICA,
HOSPITAL MATERNO INFANTIL DE SAN ISIDRO, BUENOS AIRES
PRESIDENTE, FUNDAÇÃO PARA O ESTUDO DA INFECÇÃO,
FACULDADE DE MEDICINA, UNIVERSIDADE COMPLUTENSE DE
MADRI. CATEDRÁTICO DE MICROBIOLOGÍA CLÍNICA,
UNIVERSIDADE COMPLUTENSE DE MADRI, MADRI
José María Casellas
MICROBIOLOGISTA. PROFESSOR, UNIVERSIDADE NACIONAL DE
ROSARIO, SANTA FÉ
MÉXICO
Néstor Raimondi
Federico Javier Ortíz Ibarra
UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA, HOSPITAL FERNÁNDEZ, BUENOS AIRES.
PRÓ-SECRETÁRIO, SOCIEDADE ARGENTINA DE TERAPIA INTENSIVA (SATI)
CHEFE DE INFECTOLOGIA, INSTITUTO NACIONAL DE
PERINATOLOGIA, MÉXICO DF
Juan J. Videla
Luis Antonio Sánchez López
SECRETÁRIO, COMITÊ DE INFECÇÕES CRÍTICAS, SOCIEDADE
ARGENTINA DE TERAPIA INTENSIVA (SATI)
José Maria da Costa Orlando
MEDICO INTERNISTA INFECTOLOGISTA. PRESIDENTE, ASOCIACIÓN DE
INFECTOLOGÍA DEL NORTE DE MÉXICO. PROFESSOR DE
INFECTOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE MONTERREY.
COORDENADOR, CLÍNICA DE ATENCIÓN INTEGRAL DE LA
SECRETARÍA DE SALUD DE NUEVO LEÓN
MÉDICO INTENSIVISTA. PRESIDENTE, ASSOCIAÇÃO DE MEDICINA
INTENSIVA BRASILEIRA, SÃO PAULO
PANAMÁ
Thais Guimarães
Néstor Sosa
MÉDICA INFECTOLOGISTA, HOSPITAL DO SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL
DE SÃO PAULO E HOSPITAL SANTA CRUZ. REPRESENTANTE,
SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA, SÃO PAULO
CHEFE DE INFECTOLOGIA, CAIXA DE SEGURO SOCIAL, PANAMÁ
CHILE
Luis Cuellar Ponce de León
BRASIL
PERU
MÉDICO INFECTOLOGISTA. CHEFE, DEPARTAMENTO DE
ESPECIALIDADES MÉDICAS, INSTITUTO ESPECIALIZADO DE
ENFERMIDADES NEOPLÁSICAS. PROFESSOR DE MEDICINA,
UNIVERSIDADE NACIONAL “FEDERICO VILLARREAL”, LIMA
Patricia González
MICROBIOLOGISTA. COMITÊ DE INFECÇÕES HOSPITALARES,
CLÍNICA ALEMANA, SANTIAGO DE CHILE
Ricardo Espinoza
URUGUAI
INFECTOLOGISTA, CLÍNICA LAS CONDES, SANTIAGO DE CHILE
Maria Cristina Rizzi
COLÔMBIA
Francisco Molina
ESPECIALISTA EM MEDICINA CRÍTICA E CUIDADOS INTENSIVOS E EM MEDICINA
INTERNA. UNIVERSIDADE PONTIFÍCIA BOLIVARIANA DE MEDELLÍN. COORDENADOR,
UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA, CLÍNICA UNIVERSITÁRIA BOLIVARIANA.
INTENSIVISTA, HOSPITAL GERAL DE MEDELLÍN, MEDELLÍN
Carlos Humberto Saavedra Trujillo
INTERNISTA INFECTOLOGISTA. CHEFE, SERVIÇO DE INFECTOLOGIA,
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO CLÍNICA SAN RAFAEL, ORDEN
HOSPITALARIA DE SAN JUAN DE DIOS, BOGOTÁ
COSTA RICA
INTENSIVISTA E INFECTOLOGISTA. CHEFE, UNIDADE DE CUIDADOS
INTENSIVOS, HOSPITAL MILITAR. INFECTOLOGISTA, HOSPITAL DEL
CÍRCULO CATÓLICO DE OBREROS DE MONTEVIDEO,
MONTEVIDÉU
VENEZUELA
Alfredo Lopez Strauss
MÉDICO INTERNISTA E INFECTOLOGISTA. CHEFE, UNIDADE DE
INFECTOLOGIA, HOSPITAL DOMINGO LUCIANI DE CARACAS.
COORDENADOR, COMITÊ DE INFECÇÕES INTRA-HOSPITALARES,
HOSPITAL DOMINGO LUCIANI. COORDENADOR E ASSESSOR,
PROGRAMA DE INFECÇÕES EM UTI PARA A SOCIEDADE
VENEZUELANA DE MEDICINA CRÍTICA, CARACAS
Jaime Fernández Alpizar
INFECTOLOGISTA. CHEFE, SERVIÇO DE INFECTOLOGIA, HOSPITAL
CALDERÓN GUARDIA, SAN JOSÉ
Antonio Martinelli
CIRURGIÃO INTENSIVISTA. CENTRO MÉDICO CARACAS, CARACAS
AMMCTI
Asociación Mexicana de Medicina
Crítica y Terapia Intensiva
Sociedad Argentina
de Terapia Intensiva
Mensagem dos editores
B
em-vindos. É uma verdadeira
honra e motivo de grande orgulho
dirigir-me a todos vocês e, ao
mesmo tempo, oferecer-lhes este valioso
recurso, que iniciamos hoje com a primeira
edição em espanhol e português da Critical
Connections.
Dr. Edgar Jiménez
Em janeiro passado, a Society of
Critical Care Medicine (SCCM) me propôs que assumisse a
posição de co-editor desta revista, com o desejo de publicar
artigos pertinentes para a grande comunidade de colegas de
fala hispana e portuguesa.
Tenho o prazer de trabalhar junto com o Dr. Mitchell Levy,
editor da versão em inglês desta revista, que, com sua ampla e
renomada trajetória na área de terapia intensiva e com nossa
Sociedade, nos ajudará a fazer desta publicação uma valiosa
fonte de informação. Obviamente, para poder levar a cabo
uma tarefa dessa magnitude, dependemos do valoroso apoio
nos Estados Unidos de Debbie McBride, diretora de publicações da SCCM e de seu grupo, através da coordenadora
Melissa Nielsen. No âmbito latino-americano, a publicação
em espanhol e em português é coordenada pelo Dr. Jacobo A.
Tieffenberg, presidente da Associação Civil de Pesquisa e
Desenvolvimento na Saúde (ACINDES), e Carolina
Berduque, coordenadora da Editora Médica Alliance for
World Wide Editing (AWWE), com sedes em Buenos Aires,
São Paulo, México e Madri.
A pluralidade de nossa comunidade torna necessário que,
através de meios como este, possamos manter o intercambio
de dados, conceitos e idéias. Nesta edição, apresentamos os
resultados de uma reunião de consenso com recomendações
para o uso empírico de antibióticos em infecções graves nas
unidades de terapia intensiva, celebrada em Buenos Aires em
junho de 2005. Espero que lhes seja de grande utilidade.
Nossa edição vai se nutrir de uma grande variedade de artigos do contexto norte-americano e europeu que serão traduzidos ao espanhol e ao português, assim como de artigos próprios da área hispano-americana que sejam propostos por
todos vocês. Além disso, serão publicadas notícias e informação sobre atividades específicas de nossa área. Contamos
com todos vocês para fazer desta revista uma verdadeira ferramenta na área de terapia intensiva.
Agradeço a confiança depositada em nós pela SCCM, ao
dar-nos a responsabilidade de seguir adiante com este projeto.
Assim, cumpriremos com a missão de oferecer os últimos
avanços clínicos, enquanto brindamos o melhor cuidado possível a nossos pacientes graves.
Muito obrigado por seu apoio e seguiremos em contato...
Dr. Edgar Jiménez
Tesoureiro, World Federation of Societies
of Intensive Critical Care Medicine
Diretor, Unidade de Terapia Intensiva,
Orlando Regional Medical Center.
Professor Associado de Medicina Crítica
e Medicina Interna, Universidade da Flórida.
Society of Critical Care Medicine (SCCM),
Orlando, Flórida, EUA.
4
Julho 2006
C
omecei como editor de Critical
Connections em janeiro e já conheço a importância que tem esta
publicação como ferramenta para unir os
membros da comunidade que atende
pacientes graves em todo o mundo. O
lançamento da edição latino-americana da
Dr. Mitchell Levy
Critical Connections é uma iniciativa da
Associação Civil de Pesquisa e Desenvolvimento na Saúde
(ACINDES) e prova do contínuo crescimento internacional da
Society of Critical Care Medicine (SCCM). A Sociedade espera fortalecer sua relação com os médicos de atendimento de
pacientes graves nessa região e, ao mesmo tempo, proporcionar um recurso valioso.
A editora – Editorial Médica A.W.W.E. – também publica
a edição em espanhol dos manuais Fundamental Critical Care
Support (FCCS) e Fundamentals of Disaster Management
(FDM) e a edição em português do FCCS.
O Dr. Edgar Jiménez é um dos muitos profissionais dedicados que tornam possível esta publicação. Este médico tem
uma grande visão para aumentar a consciência sobre a atendimento de pacientes graves em toda a região e, assim, oferecerlhes as últimas novidades clínicas e proporcionar a melhor
atenção possível. Os redatores dos Estados Unidos e da
América Latina trabalharão juntos para lograr esses objetivos
enquanto nos esforçamos em conservar a missão global da
Sociedade.
A Sociedade já tem fortes laços com a comunidade de atendimento de pacientes graves na América Latina. A região é o
mercado de maior crescimento para os cursos de FCCS da
SCCM, com Brasil e Argentina liderando essa tendência. A
Sociedade também participou do World Congress on Critical
Care em Buenos Aires, Argentina, em agosto de 2005. Foi o
maior congresso mundial até esta data, o que reflete a
importância crescente da comunidade de atenção a doentes
graves na América Latina. A comunidade latino-americana
está claramente ávida por conhecimentos sobre o tratamento
de seus pacientes gravemente enfermos e lesionados, e
Critical Connections atuará como outro recurso excelente.
Esta publicação tem servido como a voz da Sociedade, ao
proporcionar aos profissionais da saúde artigos clínicos informativos e atualizações sobre as atividades da Sociedade.
Estamos orgulhosos de oferecer uma edição especialmente
adaptada às necessidades dessa comunidade.
Dr. Mitchell Levy
Secretário da Society
of Critical Care Medicine
Professor de Medicina e Diretor,
Unidade Médica de Terapia Intensiva
Faculdade de Medicina, Universidade Brown,
Hospital de Rhode Island
Critical Connections em português
Introdução
Dr. Pedro Cahn
Chefe, Serviço de Infectologia, Hospital Fernández, Buenos Aires, Argentina.
Presidente, International Aids Society.
A
s diretrizes de tratamento são recomendações baseadas na evidência científica disponível e elaboradas
por meio do consenso de especialistas sobre um
tema determinado. A elaboração de diretrizes tem por objetivo me-lhorar a qualidade dos cuidados médicos em pacientes com determinadas doenças, proporcionar informação
sobre tratamentos com uma relação custo-benefício adequada e servir como material de formação para profissionais
com menos experiência clínica. Quando utilizadas de maneira adequada, as diretrizes são úteis para aperfeiçoar o tratamento dos pacientes. É importante, porém, ressaltar que
esses documentos não substituem o julgamento clínico, e as
recomendações são generalizadas, baseadas em estudos
populacionais randômicos, além da opinião de especialistas.
É o médico que deve avaliar as circunstâncias particulares
do paciente para poder aplicar as diretrizes elaboradas pelos
especialistas. O objetivo desta reunião foi desenhar, a partir
do consenso, um guia clínico baseado nas evidências médicas e na experiência dos países participantes da América
Latina, para fornecer à comunidade uma ferramenta útil para
o manejo das infecções graves em pacientes internados em
unidades de terapia intensiva.
Nestes casos, em particular, existe uma série de questõeschave na hora de elaborar normas de tratamento. As perguntas
mais freqüentes sobre o manejo do paciente grave procuram
saber se há necessidade de se contar com documentação
microbiológica, se é conveniente variar o esquema terapêutico iniciado e se devem ser reservados certos antibióticos
quando o indivíduo necessita de internação prolongada.
Critical Connections em português
Outras questões que geram discussão se relacionam à duração
do tratamento em infecções graves, o manejo da infecção
associada a cateteres e o valor das culturas negativas.
Durante o encontro, um dos pontos especialmente abordados foi a relevância da resistência antimicrobiana na evolução
de pacientes graves. Expôs-se a experiência com infecções
nas unidades de terapia intensiva (UTI) e se comparou a sensibilidade a diferentes antibióticos.
Entre os temas destacados, estavam o manejo empírico das
infecções em UTI na perspectiva do intensivista, as controvérsias na implementação do tratamento inicial de cobertura e a
adequação posterior da terapia. A pneumonia intra-hospitalar
demandou um capítulo especial, por sua alta prevalência entre
as infecções em UTI. Do mesmo modo, foram trazidos dados
importantes sobre o manejo na pediatria. Assim, o painel de
especialistas revisou a informação disponível sobre as realidades locais nas UTIs, os microorganismos prevalentes e o perfil de resistência na região.
Por último, foram analisadas as diferentes opções de tratamento empírico e discutidas as medidas preventivas necessárias para se diminuir o aparecimento de resistências.
Chegou-se a uma série de recomendações que buscam colaborar com o manejo das infecções dos pacientes graves
internados em UTI.
As sessões foram marcadas pelo alto nível das intervenções
e pela absoluta independência de critério dos participantes do
painel, e por isso este documento certamente será uma fonte
de referência importante para o manejo das infecções graves
dos pacientes internados nas UTIs da região.
Julho 2006
5
Resistência bacteriana na unidade de terapia intensiva
Dr. José María Casellas
Microbiólogo. Professor, Universidade Nacional de Rosário, Santa Fé, Argentina.
D
entro do grupo de antibacterianos carbapenêmicos,
existem diferenças significativas. Esta família de
antimicrobianos está representada na Argentina por
ertapenem, imipenem e meropenem. Segundo estudos comparativos, o meropenem demonstrou, em diferentes patologias
infecciosas, atividade superior frente à piperacilina/tazobactam e à cefepima.
No caso do ertapenem, não se recomenda sua utilização na
unidade de terapia intensiva (UTI), por causa da resistência da
Pseudomonas aeruginosa e da Acinetobacter baumannii, e
sim nas infecções adquiridas na comunidade. Estas bactérias
apresentam taxas de resistência ao imipenem e ao meropenem
entre 20% e 40% na América Latina. Além disso, com o ertapenem estão surgindo cepas resistentes a algumas enterobactérias (Klebsiella pneumoniae e Enterobacter cloacae), o que
é raro para o imipenem e o meropenem (Tabela 1).
Um tema de grande relevância é a dosagem dos antimicrobianos. Os parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos
dos carbapenêmicos – antibacterianos betalactâmicos –
dependem do tempo em que se mantêm acima da concentração inibitória mínima (CIM). Para estes agentes, não é
importante o pico sérico.
Para o meropenem, o ponto de corte foi estabelecido em
4 mg/l. Supõe-se que a meta farmacodinâmica (tempo >CIM)
deveria ser de 50% para microorganismos Gram-positivos e
de 80% para Gram-negativos. Nas cepas isoladas na América
Latina, isto é atingido pelo meropenem para Staphylococcus
spp sensíveis à meticilina, Streptococcus pneumoniae,
Haemophilus influenzae, Moraxella catarrhalis, família
Enterobacteriaceae e anaeróbios; 70% para Pseudomonas
aeruginosa, 60% Acinetobacter baumannii e 60% para
Enterococcus spp. Com base nestas considerações, doses de
1 g IV (intravenoso) a cada 8 horas são úteis sempre que a
CIM for menor que 4 mg/l. Para CIM de 8 ou 16 mg/l, recomenda-se o uso de infusões intermitentes de 2 g a cada 8
horas, com duração de três horas (dose total: 6g/dia). Também
é possível fazer uso de infusões contínuas, com dose de ataque de 500 mg, após a qual se introduz gotejamento para
6 g/24 h. Esta forma apresentaria a vantagem de diminuir os
custos de enfermagem.
Com respeito à etiologia das infecções em UTIs, comparou-se a sensibilidade ao meropenem, piperacilina/tazobactam e cefepima – determinada por microdiluição segundo o
Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI, antes
denominado National Committee for Clinical Laboratory
Standards [NCCLS]) – com base em estudos efetuados nos
laboratórios do Centro de Investigaciones Biológicas y
Clínicas (CIBIC) de Rosário e do Centro de Estudios en
Antimicrobianos de San Isidro, Buenos Aires, ambos na
Argentina, sobre amostras clínicas obtidas de UTIs de diversos centros assistenciais daquele país.
Em casos de sepse intra-abdominal – em amostras colhidas por
meio de punção-aspiração – as infecções mistas mostraram taxa
de prevalência de 87%, com 13% de hemoculturas positivas concomitantes. Nas infecções de pele e tecidos moles, a proporção de
infecções mistas foi de 66%. As amostras foram coletadas por
punção através de pele sadia e anaeróbios foram cultivados em
todos os casos. As hemoculturas positivas foram 5%.
Diversamente, na pneumonia associada à ventilação mecânica,
isolou-se predominantemente apenas uma bactéria, com incidência de 95% (não se consideraram as infecções por Chlamydophila
pneumoniae). As amostras foram obtidas pelas técnicas habituais
– lavado broncoalveolar (LBA), mini-LBA, aspirado traqueal – e
26% dos pacientes apresentaram hemoculturas positivas.
Na pneumonia associada à ventilação mecânica, ao comparar a sensibilidade (taxa de êxito baseado na sensibilidade do
isolamento, não na cura do paciente) ao meropenem, piperacilina/tazobactam e cefepima, os microorganismos conflitivos
são os bacilos Gram-negativos não fermentadores (BGNNF),
como P. aeruginosa e A. baumannii. Neste caso, a sensibilidade ao meropenem é de 80%; a sensibilidade a piperacina/tazobactam e cefepima é muito baixa. A atividade do meropenem
é excelente para os patógenos envolvidos na pneumonia, com
exceção dos isolados de Staphylococcus aureus resistentes à
meticilina (MRSA) (Tabela 2).
Na sepse intra-abdominal, a atividade do meropenem é
superior; piperacina/tazobactam é o antimicrobiano seguinte
em eficácia, pois também cobre anaeróbios. A cefepima é
pouco ativa contra anaeróbios, portanto não se recomenda sua
utilização como monoterapia (Tabela 3).
Tabela 1. Carbapenêmicos comercializados na Argentina
Antibacterianos
Indicado em UTI
Indicado ou aprovado
em pediatria
Ertapenem
NÃO
SIM (FDA)
NÃO (ANMAT)
Meropenem
SIM
SIM
Resistência em
Enterobactérias
P. aeruginosa
Acinetobacter
Enterococos
Aparecendo
SIM
SIM
Muito raro
P. aeruginosa ~20%
Acinetobacter ~30%
E. faecium
FDA: Food and Drug Administration (E.U.A.)
ANMAT: Administração Nacional de Medicamentos, Alimentos e Tecnologia Médica (Argentina)
6
Julho 2006
Critical Connections em português
Em infecções de pele e tecidos moles, deve-se destacar a
alta prevalência de microorganismos anaeróbios (especialmente Gram-positivos). Nestas infecções, também são necessários antibacterianos que cubram anaeróbios (Tabela 4).
Ao projetar os resultados com base na possível efetividade clínica em cada paciente frente aos achados nas diferentes patologias, observa-se que o meropenem apresenta uma
eficácia projetada superior a 90% para sepse intra-abdomi-
Tabela 2. Pneumonia associada à ventilação mecânica (pacientes n = 40; cepas isoladas n = 43). (1)
Sensibilidade a
Grupos de espécies (2)
n
S. pneumoniae
BGNNF (3)
Enterobacteriaceae (4)
S. aureus (5)
Haemophilus spp (6)
M. catarrhalis
E. faecalis
Total
Cepas
%
19
10
4
4
3
2
1
43
44
23
9
9
7
5
2
Pacientes
n
%
19
10
4
4
3
2
1
48
40
10
10
8
5
3
Meropenem
n
%
19
8
4
2
3
2
1
39
100
80
100
50
100
100
100
Piperacilina/tazobactam
n
%
19
4
2
2
3
2
1
33
100
40
50
50
100
100
100
n
19
3
1
2
3
2
0
30
Cefepima
%
100
30
25
50
100
100
0
(1) Inclui primeira pneumonia e pneumonias tardias. Não foram incluídas pneumonias aspirativas.
(2) Não foram tabulados 2 casos com PCR positiva para Chlamydiophila pneumoniae.
(3) BGNNF: 3 P. aeruginosa e 1 complexo Acinetobacter baumannii/A. calcoaceticus
(4) K. pneumoniae: 2 betalactamases de espectro estendido (ESBL) e 1 Enterobacter cloacae (ampC desreprimida)
(5) Staphylococcus: 2 MRSA e 2 S. aureus sensíveis à meticilina (MSSA)
(6) Haemophilus spp: 2 H. influenzae e 1 H. parainfluenzae (todas as betalactamases negativas).
Tabela 3. Sepse intra-abdominal (pacientes n = 60; cepas isoladas n = 199).
Sensibilidade a
Grupos de espécies (2)
n
Enterobacteriaceae (1)
Enterococcus spp (2)
Anaerobios Gram-positivos (3)
Anaerobios Gram-negativos (4)
BGNNF (5)
S. aureus (6)
Total
Cepas
%
68
48
36
32
11
4
199
40
27
20
17
6
1
Pacientes
n
%
57
48
30
28
11
4
95
80
50
47
18
7
Meropenem
n
%
68
47
36
32
7
2
192
100
98
100
100
64
50
96
Piperacilina/tazobactam
n
%
59
47
36
32
4
2
180
87
98
100
100
4
50
90
n
62
0
0
0
3
2
67
Cefepima
%
91
–
–
–
3
50
35
(1) Enterobactérias: 48 E. coli; 8 P. mirabilis; 8 Klebsiella spp; 4 outros; 9 ESBL (CTX-M2; SHV5).
(2) 47 E. faecalis; 1 E. faecium.
(3) Anaeróbios Gram-positivos: 10 Clostridium spp; 10 Streptococcus anginosus-constellatus, só cresceram em anaerobiose; 10 Peptostreptococcus spp
(4) Anaeróbios Gram-negativos: 10 Bacteroides fragilis; 8 B. não fragilis; 6 Porphyromonas spp, Prevotella spp; 2 Eubacterium spp
(5) 8 P. aeruginosa (uma cepa VIM-2); 8 Acinetobacter spp; 1 S. maltophilia.
(6) 2 MRSA e 2 MSSA.
Tabela 4. Infecções de pele e tecidos moles (pacientes n = 62; cepas isoladas n = 123).
Sensibilidade a
Grupos de espécies (1)
n
S. aureus (2)
Anaerobios Gram-positivos
S. pyogenes
Enterobacteriaceae (3)
Anaeróbios Gram-negativos
BGNNF
Enterococcus spp (4)
Total
Cepas
%
48
20
18
18
8
8
3
123
39
16
15
13
7
7
2
–
Pacientes
n
%
48
16
18
16
8
8
2
–
80
26
29
26
13
13
3
–
Meropenem
n
%
38
20
18
18
8
5
3
110
95
100
100
100
100
63
100
89
Piperacilina/tazobactam
n
%
38
20
18
13
8
3
3
103
95
100
100
72
100
38
100
84
n
38
0
18
13
0
3
0
72
Cefepima
%
95
–
100
72
–
38
–
59
(1) Não foram incluídos Staphylococcus coagulase negativos nem Streptococcus viridans (prováveis contaminantes da pele).
(2) 38 MSSA e 10 MRSA.
(3) 6 E. coli; 6 P. mirabilis; 4 Klebsiella spp; 2 outros. Produtores de ESBL: 5 (28%).
(4) E. faecalis.
Critical Connections em português
Julho 2006
7
Tabela 5. Efetividade clínica projetada dos achados in vitro por paciente.
Meropenem
Sepse intra-abdominal (SIA)
Pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM)
Infecções de pele e tecidos moles (IPTM)
* Em associação com metronidazol 36/60: 60%
n
%
Piperacilina/tazobactam
n
%
54/60
36/39
47/62
90
92
76
43/60
30/39
44/62
72
77
71
Cefepima
n
8/60
27/39
32/62
%
13*
69
52
Significância:
Meropenem vs. Piperacilina/tazobactam
SIA: P = 0,23*
PAVM: P = 0,129
IPTM: P = 0,669
Meropenem vs. Cefepime
SIA: P = 0,000*
PAVM: P = 0,023*
IPTM: P = 0,009*
Piperacilina/tazobactam vs. Cefepime
SIA: P = 0,000*
PAVM: P = 0,589
IPTM: P = 0,047*
* Existem diferenças significativas entre as proporções comparadas
nal e pneumonia associada à ventilação mecânica. Em
infecções de pele e tecidos moles, a taxa de efetividade é de
76%, devido à presença de MRSA. Piperacilina/tazobactam
e cefepima apresentam taxas de efetividade inferiores a
75% em todos os casos. A baixa atividade da cefepima na
sepse intra-abdominal é devida à não-cobertura de anaeróbios; se combinada a metronidazol, a efetividade sobe a
60% (Tabela 5).
8
Julho 2006
Conclusões
Os carbapenêmicos, em especial o meropenem, apresentam efetividade muito elevada quando empregados como monoterapia
em casos de pneumonia associada à ventilação mecânica, sepse
intra-abdominal e infecções de pele e tecidos moles. O meropenem demonstrou superioridade frente a piperacilina/tazobactam
e cefepima. Porém, deve-se levar em conta a baixa sensibilidade
do MRSA, caso haja suspeitas de sua presença.
Critical Connections em português
Manejo empírico das infecções na unidade de terapia
intensiva: a perspectiva do intensivista
Dr. Edgar Jiménez
Tesoureiro, World Federation of Societies of Intensive Critical Care Medicine
Diretor, Unidade de Terapia Intensiva, Orlando Regional Medical Center.
Professor Associado de Medicina Crítica e Medicina Interna, Universidade da Flórida.
Society of Critical Care Medicine (SCCM), Orlando, Flórida, EUA.
Resumo
O tratamento empírico adequado das infecções na unidade de
terapia intensiva (UTI) requer a avaliação correta dos fatores
de risco distintos do paciente e das realidades locais, que condicionam o tratamento. As diretrizes acordadas em consenso
são fundamentais para se desenvolver tratamentos apoiados
por evidências.
Entre as infecções na UTI, a pneumonia intra-hospitalar e
suas variantes, a pneumonia associada à ventilação mecânica
e a pneumonia associada a cuidados médicos, ocupam lugares
de destaque, por suas freqüências.
Para o tratamento empírico inicial do paciente grave, devese considerar: o início da infecção (inicial ou tardia), os fatores de risco do paciente, os microorganismos locais prevalentes e as possíveis resistências. O tratamento inicial deve ser
uma cobertura ampla contra os possíveis patógenos envolvidos. Entretanto, é necessário assumir o compromisso de reduzir o espectro, de acordo com os resultados microbiológicos e
com a avaliação clínica. Desta forma, passa-se então a um tratamento específico, para se evitar principalmente a superutilização de antibióticos, o que gera o aparecimento de resistências. Na escolha dos antimicrobianos, deve-se optar por aqueles que geram menor seleção de cepas resistentes.
Introdução
Em 2005, a Sociedade Americana do Tórax (ATS) e a
Sociedade de Doenças Infecciosas dos Estados Unidos
(IDSA) publicaram um documento sobre o tratamento de
adultos com pneumonias intra-hospitalares (PIH) associadas a
ventilação mecânica ou a tratamento médico.1 Este documento é importante pela alta freqüência de pneumonia entra as
infecções em unidades de terapia intensiva (UTI).
O guia recomenda tratar o pacientes com antibióticos adequados – precocemente e em doses adequadas – , evitar a
superutilização de antimicrobianos, por meio da redução de
espectro – segundo dados microbiológicos e clínicos – e ajustar o tratamento a um mínimo efetivo. Também se destacam
como objetivos a classificação dos pacientes segundo o risco
de infecções por patógenos multirresistentes e a definição de
um novo grupo com pneumonia associada a tratamentos
médicos (PATM) , que inclui a PIH. A PIH é a que ocorre dentro de 48 horas pós-internação, e que não estava em incubação
no início da internação.
Epidemiologia das PIH
A PIH é a segunda infecção hospitalar mais freqüente nos
Estados Unidos: 5 a 10 casos a cada 1.000 internações; seu
aparecimento aumenta o tempo de internação em 7 a 9 dias
por paciente. Além das enfermidades associadas, aumenta significativamente os gastos com saúde em mais de 40.000 dólares por paciente. As PIH representam 25% das infecções em
UTI e 50% do uso de antibióticos. Apresenta altos índices de
mortalidade: 33-59%.
A pneumonia associada a ventilação mecânica (PAVM)
ocorre em 9 a 27% dos pacientes intubados. O risco por dia é
de 3% nos primeiros cinco dias, 2% entre 5 e 10 dias, e de 1%
após o décimo dia. Cinqüenta por cento aparecem nos primeiros quatro dias. São divididas em precoces e tardias. As
PAVM precoces ocorrem nos primeiros quatro dias, têm melhor prognóstico e, muito provavelmente, são causadas por
microorganismos sensíveis aos antibióticos. As tardias ocorrem após cinco dias de intubação, são causadas por microorganismos multirresistentes e têm alta mortalidade.
Existem fatores de risco que predispõem a infecções com
patógenos multirresistentes. Isto é importante ao decidir o tratamento empírico, mais do que a classificação entre precoces
e tardias.
ADRO
Fatores
de risco para patógenos multirresistentes em PIH, PAVM e
PATM:
A PATM pode aparecer quando há exposição a patógenos não habituais, por alguma das seguintes circunstâncias:
• Paciente internado em um hospital de agudos por mais de dois
dias, nos três meses anteriores à infecção.
• Paciente que mora em asilos ou centro de tratamento para doentes
crônicos.
• Pacientes em hemodiálise.
• Paciente que recebeu antibióticos intravenosos (IV), quimioterapia
ou cuidado de ferimentos nos 30 dias anteriores.
Critical Connections em português
decom
risco
para patógenos
na PIH,
• Fatores
Tratamento
antibióticos
durante osmulti-resistentes
três meses anteriores.
PAVM
e
PATM:
• Hospitalização maior que 5 dias.
Tratamento com antibióticos nos três meses anteriores.
• Alta incidência de resistência a antibióticos na comunidade ou na
Internação
maiordoque
5 dias.
unidade específica
hospital.
Alta incidência de resistência a antibióticos na comunida• Enfermedade ou tratamento inmunossupressor.
de ou na unidade específica do hospital.
• Doença
Fatores deourisco
para PATM.imunossupressor.
tratamento
As PIH, PAVM ou as PATM podem ser causadas por muitas bactérias diferentes. Os patógenos mais freqüentes são os
Julho 2006
9
aeróbios
Gram-negativos
(Klebsiella
pneumoniae,
Pseudomonas aeruginosa, Escherichia coli, Acinetobacter sp,
Serratia marcescens) e Gram-positivos (Staphylococcus
aureus, especialmente resistentes a meticilina – MRSA – ,
Streptococcus pneumoniae). A etiologia pode também ser
polimicrobiana.
Segundo dados do Orlando Regional Medical Center
(ORMC), a incidência de microorganismos em infecções em
UTI, em abril de 2005, foi de 19% para MRSA, 18% para
Staphylococcus aureus sensíveis a meticilina (MSSA), 14%
para Pseudomonas, e 11% de resultados negativos.
Devem-se conhecer, em cada comunidade, os microorganismos prevalentes e suas resistências, para se ajustar as diretrizes de tratamento às circunstâncias regionais. Devem-se
também estabelecer estratégias preventivas de acordo com as
realidades locais e particulares a cada paciente. Em geral,
aconselha-se evitar o quanto possível as intubações, elevar a
cabeceira da cama a 30o a 45o, alimentação enteral pós-pilórica e controle rigoroso da glicemia.
Diagnóstico
Deve-se suspeitar do diagnóstico de pneumonia diante da
associação de febre, catarro purulento, leucocitose e piora da
oxigenação, juntamente com infiltrado radiológico novo ou
progressivo. A ausência de um patógeno multirresistente no
trato respiratório inferior nos pacientes intubados – sem troca
de antibiótico nas últimas 72 horas – indica que a etiologia
não é de um microorganismo resistente. Isto se deve ao fato
de que a depuração dos patógenos é muito lenta. Nesses
casos, preconiza-se a redução de espectro do tratamento antibacteriano. Um aspirado traqueal negativo (sem bactérias ou
células inflamatórias) em pacientes sem mudanças de antibióticos recentes, tem um valor preditivo negativo de 94% para
PAVM; é aconselhável investigar outras causas para a febre.2
Vários estudos demonstraram que o atraso no uso de antibióticos adequados na PIH se associa a uma maior mortalidade.3-5 A estratégia clínica é iniciar um tratamento precoce com
antibióticos de amplo espectro, limitar a terapia a 2-3 dias e
Figura 1. Algoritmo de tratamento de PIH, PAVM e PATM.
10
Julho 2006
controlar os resultados com as culturas. Entretanto, estas condutas apresentam a limitação de serem extremamente sensíveis, com maior utilização de antibióticos, e emprego destes
em processos não infecciosos resultantes de achados clínicos
(atelectasias, insuficiência cardíaca, tromboembolismo pulmonar, etc.)6.
A estratégia bacteriológica compreende culturas quantitativas das secreções respiratórias baixas para se definir a presença de pneumonia e sua etiologia. Os benefícios são a
menor utilização de antibióticos e uso de agentes de espectro
limitado. Os problemas são os pacientes tratados previamente
com antibióticos, pelas culturas falso-negativas, e conseqüentes falhas nos tratamentos adequados. Outro inconveniente é o
tempo de obtenção dos resultados microbiológicos, não é bom
atrasar a terapia.
A estratégia terapêutica ideal deve ter por objetivo a utilização empírica, precoce, de antibióticos de amplo espectro
– avaliando todas as circunstâncias do paciente e da região –
com o compromisso de reduzir o espectro, de acordo com os
dados clínicos e microbiológicos. Desta forma, espera-se diminuir o aparecimento de resistências bacterianas (Figura 1).1
Antibioticoterapia das PIH
No tratamento das PIH, deve ser considerado o início precoce
ou tardio da PIH, e os fatores de risco para patógenos multirresistentes.1
Segundo as recomendações da ATS/IDSA, nas PIH ou
PAVM precoces com baixo risco de multirresistência, os patógenos potenciais são S.pneumoniae, H.influenzae, MSSA e
bacilos sensíveis Gram-negativos. Nestes casos, é aconselhada
a terapia empírica com ceftriaxona ou levofloxacina, moxifloxacina ou ciprofloxacina ou ampicilina/sulbactam ou ertapenem.
Nas PIH, PAVM e PATM tardias, com alto risco de multirresistência, os patógenos que devem cobrir a terapia empírica
são, além dos anteriores, P.aeruginosa, K.pneumoniae (betalactamases de espectro expandido [ESBL]+), Acinetobacter
sp. É necessário administrar antibióticos ou combinações ativas contra esses microorganismos (Figura 2).1
No ORMC, os pacientes com PIH precoces e de baixo
risco recebem um tratamento antibacteriano mais completo
pela freqüência de resistência registrada na região. Pelos problemas com ESBL, S.pneumoniae e prevalência de aproximadamente 60% de MRSA na comunidade, o esquema empírico
compreende cefalosporinas antipseudomonas (cefepima, ceftazidima) ou carbapenêmicos antipseudomonas (meropenem,
imipenem) ou betalactâmico/inibidor (piperacilina/tazobactam), mais fluoroquinolona ou aminoglicosídeo + linezolida
ou vancomicina, por causa da resistência à meticilina.
No ORMC, o padrão de sensibilidade para S. pneumoniae
indica boa atividade de levofloxacina; para P. aeruginosa, há
uma resposta muito boa à amicacina e tobramicina, mas problemas graves com ciprofloxacina (resistência ao redor de
40%).
Para pacientes com antibioticoterapia recente, é recomendada terapia empírica com antimicrobianos de classes diferentes. O tratamento recente aumenta a probabilidade de
Critical Connections em português
Patógenos potenciais
Antibiótico recomendado
S. pneumoniae
K. pneumoniae (ESBL+)
Acinetobacter sp.
Cefalosporina antipseudomonas
(cefepima, ceftazidima)
ou
Carbapenem antipseudomonas
(meropenem ou imipenem)
ou
Betalactâmico/Inibidor
(piperacilina/tazobactam)
mais
Serratia marcescens
Fluoroquinolona antipseudomonas
(Ciprofloxacina ou Levofloxacina)
Aminoglicosídeo (amicacina,
gentamicina, tobramicina)
mais
MRSA
Linezolida ou vancomicina
H. Influenzae
MSSA
Bacilos Gram-negativos sensíveis
E. coli
K. pneumoniae
Proteus sp.
Serratia marcescens
Pseudomonas aeruginosa
Figura 2. Antibióticos empíricos em PIH, PAVM e PATM tardias e de alto risco para
multirresistência.
40% de desenvolvimento de resistência. A terapia combinada
diminuiu efetivamente a mortalidade de pacientes com bacteremia.
Acinetobacter: tem resistência natural a muitos antibióticos, sendo eficazes carbapenêmicos, sulbactam e polimixinas.
A susceptibilidade a aminoglicosídeos varia e sua penetração
é controversa.
Patógenos com ESBL: as cefalosporinas de terceira geração
são inúteis e se discutem as de quarta geração. A eficácia da
piperacilina/tazobactam também é incerta. Os carbapenêmicos
têm os melhores resultados. Não há dados sobre combinações.
MRSA: O fracasso supera 40% com a vancomicina. Estudos farmacocinéticos sugerem que isto se deve a dosagem inadequada. A linezolida, por sua vez, que tem grande penetração
no epitélio pulmonar, demonstrou equivalência com a vancomicina na PIH. Além disso, é o tratamento de escolha para
pacientes com função renal alterada ou tratados simultaneamente com drogas nefrotóxicas.
Resposta terapêutica
cobertura inadequada, podendo predispor à resistência ao
mesmo tipo de antibiótico.
A ATS/IDSA recomenda as seguintes doses de antibióticos
para PIH de início tardio ou com fatores de risco para patógenos multirresistentes (Figura 3).1
Os antibióticos em aerossol são utilizados contra patógenos multirresistentes que não respondem à terapia sistêmica;
aumentam a penetração do antimicrobiano nas vias respiratórias inferiores. Há uma maior erradicação microbiológica,
mas não uma melhora no prognóstico. O efeito colateral é o
broncoespasmo.
A terapia combinada é freqüente no tratamento da PIH com
suspeita de microorganismos Gram-negativos, buscando a
sinergia contra P.aeruginosa. Entretanto, a sinergia só é relatada in vitro e em pacientes com neutropenia ou bacteremia. É
difícil demonstrar a importância clínica do sinergismo. Na verdade, a terapia combinada inicial para se tratar de uma possível infecção por Pseudomonas não é pela sinergia, e sim para
ampliar a cobertura. Alguns dados sugerem mudar para monoterapia se houver melhora e comprovação microbiológica.
Em um estudo multicêntrico, randômico e controlado, os
pacientes com PAVM que receberam tratamento adequado por
oito dias tiveram uma evolução semelhante aos tratados
durante 14 dias.7 As terapias prolongadas favorecem a colonização por patógenos multirresistentes. Em situações especiais, como septicemias ou infecções por Pseudomonas ou
Acinetobacter, o tratamento de 14 dias previne recorrências.
Em outros casos, convém limitar a oito dias o tratamento,
sempre levando em consideração a evolução clínica.
Conhecendo os resultados microbiológicos, a redução de
espectro ajuda a prevenir resistências, reduz o uso de antibióticos inadequados, diminui possíveis reações alérgicas e reduz
custos médicos.
Regimes especiais
Pseudomonas: não há dados de que a terapia combinada melhore a evolução, mas com a monoterapia há taxas de 30 a
Critical Connections em português
Habitualmente, há melhora clínica logo após 48-72 horas de
tratamento. Recomenda-se manter o regime empírico por esse
período, a menos que haja deterioração. Em seguida à identificação microbiológica, faz-se a redução de espectro máxima
no tratamento.
A radiografia tem valor limitado para definir a melhora. Os
parâmetros de evolução clínica são recontagem de leucócitos,
curva febril e oxigenação. É importante detectar condições
não infecciosas (atelectasias, insuficiência cardíaca, tromboembolismo pulmonar, contusão pulmonar, pneumonite química) e outros processos infecciosos.
Existem várias causas possíveis de má evolução: diagnóstico errôneo (não se trata de pneumonia), terapia inadequada
para um microorganismo (patógeno resistente à terapia: bactéria multirresistente, micobactéria, vírus, fungo) e outros
Antibiótico
Dose
Cefalosporina antipseudomonas
Cefepima
Ceftazidima
1-2 g a cada 8-12 h
2 g a cada 8 h
Carbapenem
Meropenem
Imipenem
500-1.000 mg a cada 6-8 h
500 mg a cada 6 h ou 1 g a cada 8 h
Betalactâmico/Inibidor
Piperacilina/tazobactam
4,5 g a cada 6 h
Aminoglicosídeo
Gentamicina
Tobramicina
Amicacina
7 mg/kg/dia (<1 mcg/ml)
7 mg/kg/dia (<1 mcg/ml)
20 mg/kg/dia (4-5 mcg/ml)
Fluoroquinolona antipseudomonas
Levofloxacina
Ciprofloxacina
Vancomicina
750 mg/dia
400 mg a cada 8 h
15 mg/kg a cada 12 h (15-20 mcg/ml)
Linezolida
600 mg a cada 12 h
Figura 3. Doses iniciais de antibióticos empíricos na PIH, PAVM e PATM tardias e
com alto risco para multirresistência.
Julho 2006
11
fatores do hóspede (empiema, abscesso pulmonar, infecção
oculta, febre medicamentosa).
Conclusões
Entre as infecções de UTI, a pneumonia se destaca por sua
incidência e por sua alta taxa de mortalidade. O tratamento
empírico inicial deve ser precoce e adequado; isto é fundamental para o prognóstico e a evolução. Para a escolha inicial
do antibiótico, é necessário considerar circunstâncias próprias
do paciente, como o momento de início da infecção, antecedentes, estado clínico e fatores de risco para resistências.
Além do mais, é vital conhecer a prevalência local de microorganismos e possíveis resistências. A avaliação de tudo isso
determina que o tratamento empírico é o adequado.
Logo após a documentação microbiológica, deve-se realizar a redução de espectro: adequação específica do tratamento aos patógenos envolvidos, de acordo com sua sensibilidade. Este manejo otimiza o uso de antimicrobianos, com economia de recursos econômicos e diminuição da seleção de
microorganismos multirresistentes.
De modo geral, a duração da terapia específica deve ser de
oito dias; não há relatos de benefícios clínicos com regimes mais
prolongados, embora seja necessário considerar as situações e
patógenos especiais. Limitar a terapia é um manejo que também
tende a evitar o aparecimento de resistências futuras.
Perspectivas
O aparecimento das glicilciclinas (antibióticos derivados das
tetraciclinas), como a tigeciclina, proporcionará novas opções
de tratamento das infecções. Tigeciclina, recentemente aprovada pelo Food and Drug Admnistration (FDA), parece ter
uma atividade sobre uma ampla gama de patógenos como
MRSA, S. pneumoniae multirresistente e enterococos resistentes a vancomicina.8,9 Será interessante para o tratamento de
infecções complicadas de pele e tecidos moles, e na PIH.
12
Julho 2006
O surgimento de uma nova determinação por imunotransferência, de um marcador confiável de infecções, a forma solúvel do receptor disparador expresso em células mielóides-1
(Soluble form of the Triggering Receptor Expressed on Myeloid
cells-1 - STREM-1), poderá ter um importante valor clínico,
particularmente na sepse e pneumonia. O STREM-1 é um
receptor solúvel expresso sobre as células mielóides, membro da
superfamília de imunoglobulinas. Sua expressão sobre as células fagocíticas é regulada pela presença de bactérias e fungos.10
A determinação deste receptor oferece um valor preditivo muito
alto. É obtido por lavado broncoalveolar, e quando é positivo há
grande probabilidade de que o paciente esteja com PIH. Esta
técnica poderia ser especialmente útil nos pacientes em que é
difícil se estabelecer pela clínica se há infecção, e poderia ajudar
no uso mais discriminado e restrito dos antibióticos.
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Cells-1 as a Marker of Microbial Infection. Clin Med Res 2004; 2:181-187.
Critical Connections em português
Controvérsias sobre o tratamento empírico das infecções
em unidades de terapia intensiva
Prof. Juan J. Picazo
Presidente, Fundação para o Estudo da Infecção (FEI), Faculdade de Medicina, Universidade Complutense de Madri.
Catedrático de Microbiologia Clínica, Universidade Complutense de Madri, Madri, Espanha.
Resumo
As infecções em unidades de terapia intensiva (UTIs) são um
problema importante da prática médica. A estada em UTIs,
particularmente pelo uso de antibióticos, é acompanhada de
uma probabilidade crescente de infecção hospitalar, com conseqüente aumento da mortalidade.
O tratamento antimicrobiano adequado requer a avaliação
do paciente e de seus antecedentes (riscos e possibilidade de
resistências). É relevante avaliar o quadro clínico, obter amostras adequadas, conhecer os patógenos potencialmente envolvidos e considerar as resistências locais. Inicialmente, deve-se
introduzir um tratamento empírico de cobertura e com os resultados microbiológicos, iniciar o ajuste, adequando o tratamento para evitar seleção de cepas resistentes e diminuir o custo.
Impacto das resistências
O aumento das resistências cria diversas inconveniências,
incluindo a utilização de antimicrobianos mais tóxicos, que em
muitos casos têm menor eficácia e aumentam os custos.
Nem todos os antibióticos se portam da mesma maneira ao
produzir resistências. As cefalosporinas de segunda e terceira
gerações e o aztreonam induzem a produção de betalactamases de espectro ampliado (ESBL), mais do que outros antibióticos (Figura 1).1
Uma metanálise sobre o impacto do Staphylococcus
aureus resistente à meticilina (MRSA) concluiu que a bacteremia por MRSA está associada a taxas de mortalidade significantemente maiores que a produzida pelo Staphylococcus
aureus sensível à meticilina (MSSA).2 Em um trabalho de
Gonzalez et al., a mortalidade de pacientes com pneumonia
por MSSA foi superior quando tratados com vancomicina do
que quando se indicou cloxacilina (47% vs. 0; P <0,01). O uso
das alternativas terapêuticas em caso de resistências incrementa a mortalidade.3
A repercussão da resistência a antibióticos em microorganismos ESBL+ é importante. Paterson et al. observaram
100% de fracasso terapêutico quando o paciente recebeu cefalosporinas com concentração inibitória mínima (CIM) intermediária (> 8mcg/ml) e 54% quando recebeu cefalosporinas
com CIM sensível (≤ 8mcg/ml). É clinicamente importante
detectar a produção de ESBL+ por Klebsiella pneumoniae ou
Escherichia coli, mesmo CIM de cefalosporina estiver na
faixa de sensibilidade, e lembrar que os microorganismos
ESBL+ são resistentes ao aztreonam e a todas as cefalosporinas (exceto às cefamicinas).4 Na bacteremia por K. pneumoniae ESBL+, quando o antibiótico indicado não for ativo, a
taxa de mortalidade atinge 63,6%. Os carbapenêmicos foram
Critical Connections em português
associados a menor mortalidade em 14 dias de tratamento
quando comparados a outros antibióticos ativos in vitro.
Ademais, a administração de um carbapenêmico durante os
cinco dias posteriores ao início de bacteremia por bactérias
ESBL+ relacionou-se independentemente com menor mortalidade.5
O mecanismo mais relevante de resistência das enterobactérias às cefalosporinas são as ESBL. Porém, a K. pneumoniae produz duas porinas de membrana; quando estas estão
ausentes (cepas P-), aumenta a resistência às cefalosporinas e
a outros antibióticos betalactâmicos; os mecanismos somamse.6 E. coli, Enterococcus aerogenes e outros microorganismos exibem o mesmo fenômeno.
A Pseudomonas aeruginosa também tem altos índices de
resistência antimicrobiana. Na América Latina, seu perfil de
sensibilidade é preocupante. Dados do programa SENTRY
indicam 66% de sensibilidade à ceftazidima e 80% ao meropenem (o antibiótico de melhor atividade no SENTRY).7
A resistência causa pior evolução das infecções, com maior
período de internação e cuidados, e aumento de custos.
Cosgrove et al. observaram que a resistência da Enterobacter
sp. a cefalosporinas de terceira geração foi um fator prognóstico de mortalidade, com aumento dos riscos relativos (RR)
de mortalidade (RR: 5,02; P = 0,01), tempo de hospitalização
(RR:1,47; P < 0,001) e custos (RR:1,51; P < 0,001).8
PRODUÇÃO DE ESBL:
Bacteremia nosocomial:
Infecções em UTI:
30,8%
43,5%
Risco relativo
Penicilinas
0,82
Cefalosporina 1ª geração
0,92
Cefuroxima
2,55
Ceftriaxona
3,31
Ceftazidima
2,26
Cefalosporina 4ª geração
1,63
Aztreonam
3,27
Carbapanêmicos
1,15
Figura 1. Resistências (ESBL) em bacteremia por K. pneumoniae. Relação com o
uso de antimicrobianos (14 dias anteriores).
Julho 2006
13
Tratamento Adequado
Escolha do antimicrobiano
A escolha do antimicrobiano é um ponto-chave que condiciona em grande parte a evolução do paciente. A mortalidade
aumenta significativamente com antibioticoterapia inicial inadequada. Ibrahim et al. observaram que a taxa de mortalidade
hospitalar de pacientes septicêmicos que receberam antibioticoterapia inicial inadequada foi estatisticamente maior que a
verificada em pacientes com terapia adequada (61,9% vs
28,4%, respectivamente). A análise multivariada demonstrou
que a antibioticoterapia inadequada foi o fator de risco mais
importante para mortalidade hospitalar (razão de probabilidade [odds ratio, OR] ajustada: 6,86; IC 95%; P < 0,001).10 Em
pacientes internados em UTI, este também é o fator determinante independente mais importante para mortalidade.
Ademais, há mais probabilidade de tratamento inadequado
quando o paciente tiver recebido antibióticos previamente.11
Vários estudos demonstram que o tempo de internação e
de UTI aumentam quando a terapia empírica é inadequada,
com aumento proporcional de custos. O tempo de hospitalização médio também foi mais prolongado em pacientes tratados com terapia empírica inadequada (55,9 dias), em comparação com pacientes que receberam antibioticoterapia inicial
adequada (40,8 dias).12
Precocidade do tratamento
O tratamento antibiótico deve ser oportuno e muito precoce,
já que a mortalidade por pneumonia adquirida na comunidade é maior se o tratamento é retardado. A administração de
antibióticos nas primeiras quatro horas de entrada no hospital
está relacionada a menor mortalidade e tempo de internação.13
Na pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM), a
mortalidade com tratamento precoce é de 10,8% e de 39,4%
quando retardado.14
Se a antibioticoterapia inicial não é adequada por cobertura insuficiente, a mortalidade aumenta notavelmente, ainda
que se corrija o tratamento. A modificação da terapia inicial
segundo a sensibilidade antimicrobiana gera pior prognóstico
do que quando é apropriada desde o início (Figura 2).15
Com introdução muito precoce de antibioticoterapia adequada (antes do lavado broncoalveolar), a mortalidade se reduz, em
comparação com casos de terapia inadequada ou ausente.
Quando se troca o antibiótico inadequado com base nos resultados do lavado broncoalveolar, a mortalidade é comparável à de
pacientes que continuam com tratamento inadequado.16
Duração do tratamento
Não há diferença na evolução do quadro infeccioso em
relação à duração do tratamento (oito ou 14 dias). Porém, há
14
Julho 2006
40
RR: 3,18%
30
% de mortalidade
Em infecções por MRSA, também aumentam a taxa de
mortalidade e os custos em comparação com MSSA. Segundo
um estudo, a carga econômica média para o hospital em
infecção cirúrgica foi de US$ 29.455 em pacientes controle,
US$ 52.791 em infectados por MSSA e US$ 92.363,00 em
infecções por MRSA.9
RR: 2,46%
20
RR: 1,00%
10
0
Tratamento
empírico inicial
Pós cultura
Pós antibiograma
Figura 2. Bacteremia e fungemia: mortalidade associada à terapia antimicrobiana.
A correção do tratamento após a avaliação de sensibilidade leva a pior prognóstico quando comparada a tratamento inicial apropriado. Mortalidade relacionada:
17,5%.
diferença no surgimento de resistências. Quando a antibioticoterapia é mais prolongada, aumentam as recorrências por
patógenos multirresistentes. Em pacientes com infecções
recorrentes, estes patógenos são menos freqüentes quando a
terapia anterior durou oito dias (42,1%) do que com 15 dias
de tratamento (62%).17 Entre os pacientes que recebem terapia
empírica inicial adequada (exceto em infecções por bacilos
Gram-negativos não fermentadores), a eficácia clínica na
PAVM é semelhante em regimes de oito e 15 dias. Outra vantagem da terapia curta é o menor consumo de antibióticos.
A terapia de oito dias parece suficiente e conveniente para
a maioria das infecções, mas alguns patógenos requerem
maior duração, como P. aeruginosa. Em um trabalho que avalia a eliminação de microorganismos endotraqueais ao longo
do tempo, Haemophilus influenzae e S. pneumoniae são erradicados rapidamente, enquanto S. aureus, enterobactérias e P.
aeruginosa, embora sensíveis aos antibióticos administrados,
persistem por mais tempo.18 Após 15 dias de tratamento com
antibióticos ativos, percebe-se, no aspirado traqueal, diminuição na proporção de enterobactérias, mas não há alterações
na P. aeruginosa. A resposta clínica na PAVM ocorre nos seis
primeiros dias; apesar disto, a colonização endotraqueal com
bactérias Gram-negativas persiste, mesmo sendo estas susceptíveis. A colonização acontece na segunda semana e precede
episódios de recorrência. Portanto, a infecção por P. aeruginosa requer tratamento mais prolongado.
Monoterapia vs. terapia combinada
Segundo uma recente metanálise,19 a mortalidade por todas as
causas e as falhas clínicas não mostram diferença entre monoterapia e combinação (com leve vantagem para a monoterapia). Os fracassos bacteriológicos e o risco relativo de
resistências favorecem a monoterapia; porém, na infecção
fúngica, a terapia combinada apresenta vantagens. Os efeitos
adversos, especialmente a nefrotoxicidade, aumentam significantemente com a terapia combinada. A combinação aminoCritical Connections em português
1. Avaliar o paciente e seus antecedentes
–Risco (resposta imune)
–Resistências
Estada prévia em hospital, residência
Uso prévio de antimicrobianos
2. Avaliar o quadro clínico atual
3. Coleta de amostras
4. Conhecer os possíveis patógenos envolvidos
5. Avaliar as resistências locais
6. Iniciar tratamento empírico de cobertura. Avaliar toxicidade.
–Protocolos gerais/locais
–Monoterapia vs. combinações
7. Corrigir o tratamento conforme os resultados
–Evitar a seleção de resistências
–Diminuir os custos
Figura 3. Manejo adequado do tratamento antimicrobiano.
glicosídeo/beta-lactâmico para tratamento de sepse é desaconselhada. Na septicemia por P. aeruginosa, há maior mortalidade com monoterapia como tratamento empírico.20
Uso prévio de antimicrobianos
A exposição prévia a antimicrobianos condiciona o tratamento posterior porque induz, por exemplo, infecção por E. coli e
K. pneumoniae ESBL+, e aumenta o uso de antibióticos, o
tempo de internação e os custos.21 É um fator a ser considerado ao indicar terapia empírica.
Na PAVM, a proporção de infecções por bactérias multirresistentes aumenta significantemente caso tenha havido exposição prévia a antibióticos. Este fenômeno tem maior relevância que o tempo de ventilação mecânica.22
Em pacientes com antibioticoterapia prévia, aparecem
grandes proporções de microorganismos que são menos freqüentes em indivíduos sem exposição a antimicrobianos, tais
como P. aeruginosa, Acinetobacter baumannii e MRSA. Se,
além disto, a ventilação mecânica durar mais de sete dias,
aumenta a proporção destes patógenos e somam-se outros,
como Stenotrophomonas maltophilia.
A variável independente mais importante relacionada com
bactérias multirresistentes associada à ventilação mecânica é
a exposição prévia a antimicrobianos, em comparação ao
tempo prolongado de ventilação e ao uso de antibióticos de
amplo espectro.22
Conclusões
O tratamento empírico adequado deve considerar fatores
determinantes da evolução da infecção, como a exposição
prévia a antimicrobianos. Este dado é essencial, já que
aumenta a possibilidade de que a infecção seja produzida por
patógenos multirresistentes.
Ao implementar o tratamento empírico, conhecer os
microorganismos prevalentes e as resistências locais colabora
Critical Connections em português
com a escolha da terapia antimicrobiana adequada, que deve
ser muito precoce e de ampla cobertura. Estas medidas reduzem a mortalidade dos pacientes com infecções e geram benefícios adicionais nos custos.
A coleta de amostras é outra das circunstâncias que não se
pode desconsiderar: é fundamental para comprovar a infecção,
e, posteriormente, interromper o tratamento. Desta maneira, a
terapia é focalizada de acordo com a sensibilidade, para otimizar o uso de antibióticos e diminuir os custos (Figura 3).
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Julho 2006
15
Infecções graves na unidade de terapia intensiva pediátrica
Dr. Javier María Casellas
Infectologista. Pediatra, Divisão de Infectologia Pediátrica, Hospital Materno Infantil de San Isidro, Buenos Aires, Argentina.
Introdução
Tratamento empírico inicial
Muitas das considerações no momento de selecionar o tratamento empírico mais apropriado para infecções graves em
adultos e crianças são muito semelhantes, a saber: presença e
tipo do foco de infecção, gravidade, estado imunológico do
paciente, idade, aquisição na comunidade ou hospitalar.1-4
O diagnóstico e o manejo das infecções em pacientes internados na unidade de terapia intensiva (UTI) é um desafio, já
que até um terço dos pacientes que são internados apresentam
febre sem foco em algum momento da internação. Isto geralmente leva a um prolongamento da internação, solicitação de
múltiplos exames laboratoriais e, em certas ocasiões, uso inadequado de antibióticos.5
Por outro lado, aproximadamente 20-30% dos pacientes
com sepse não apresentam foco clínico evidente. Esta
situação é agravada pelo fato de que a possibilidade de documentar as infecções na unidade de terapia intensiva pediátrica (UTIP) nem sempre é uma tarefa fácil, já que apenas cerca
de 30% têm hemocultura positiva quando o foco não é endovascular (bacteremia associada a cateteres venosos centrais).
O início tardio do tratamento antibiótico está relacionado a
um aumento da mortalidade associada a estas infecções,
motivo pelo qual seu tratamento precoce e adequado é fundamental.6-10
O tratamento das infecções graves nas UTIPs deve estar dirigido àqueles pacientes nos quais a gravidade clínica faz com
que a bacteremia seja altamente provável. Porém, devido ao
fato de que nem sempre os microorganismos responsáveis
por estas infecções são isolados nas hemoculturas, ressalta-se
a importância de culturas quantitativas de urina, ferimentos,
trato respiratório baixo e cateteres venosos centrais antes de
iniciar o tratamento empírico inicial (doravante referido
como TEI).5
O TEI deve ter ≥ 90% de atividade frente a patógenos
potenciais e baixa probabilidade de selecionar resistência e
durar no máximo 72 horas (reavaliar conforme a evolução clínica e resultados de culturas) (Tabela 1). Posteriormente, adequar o espectro de acordo com a espécie, sensibilidade, foco
e medicamentos disponíveis (custo, toxicidade, indução de
resistência). Na seleção do TEI em UTIPs, deve-se levar em
conta os seguintes fatores: idade, local e gravidade da
infecção, estado imunológico do paciente, local de aquisição
(padrão de susceptibilidade: previsibilidade da etiologia),
segurança, toxicidade, eficácia e coleta prévia e adequada de
culturas representativas. Lembrar que é necessário procurar
não transformar sistematicamente o TEI em tratamento definitivo.1,19-21
Fatores de risco, morbidade, mortalidade
Experiência em nossa UTIP
As infecções hospitalares são um pouco mais freqüentes em
crianças que em adultos, caso sejam incluídas as infecções
virais.9 Nas UTIPs, as taxas de infecção variam entre 3-25%
(média 11%), fundamentalmente devido à heterogeneidade
das diferentes terapias.8-12 Entre os fatores de risco descritos
nas UTIPs, a freqüência de infecção é maior em menores de
24 meses, enfermidade preexistente grave, exposição prolongada a procedimentos invasivos, antibioticoterapia prévia,
estada anterior em UTIs e imunossupressão.6,13-15
Em nossa UTIP no Hospital de Niños de San Isidro, observamos, em um corte recente, uma incidência de pneumonia
associada à ventilação mecânica (PAVM) de 9% (21/211 ventilados em 12 meses de observação).
Na população avaliada, os agentes etiológicos repartiramse de maneira eqüitativa entre infecções virais, bacterianas e
mistas (viral + bacteriana). Em 50% dos casos o diagnóstico
foi feito após o início do tratamento clínico, recorreu-se ao
mini-LBA ou escovado broncoalveolar em 30% dos casos e,
quando não factível a realização de estudos quantitativos
(geralmente por instabilidade do paciente), utilizou-se o aspirado traqueal (20%).
Os microorganismos prevalentes na PAVM de nossa
unidade são os bacilos Gram-negativos (60%). Entre eles,
os mais freqüentes são Pseudomonas aeruginosa, Enterobacter cloacae, Klebsiella pneumoniae, Acinetobacter baumannii (pneumonias tardias) e Haemophylus influenzae
(pneumonias precoces), os mais encontrados nos miniBALs. Entre os cocos Gram-positivos, descrevem-se com
maior freqüência: Streptococcus pneumoniae, Streptococcus
sp. (pneumonia precoce) e Staphylococcus aureus (pneumonia tardia).
Focos de infecção e sua abordagem diagnóstica
Nas UTIPs, os focos mais importantes de infecção por
ordem de freqüência são: bacteremia, infecção do trato urinário (ITU) e pneumonia. As bacteremias representam até
65% dos focos de infecção hospitalar, a pneumonia 5,629% e a ITU 4-25%. Cada um dos focos de infecção se relaciona geralmente com dispositivos invasivos. Os patógenos
mais freqüentes variam segundo o tipo de UTI (geral, cardiovascular, neurocirúrgica, queimados, etc.), mas são descritos: Staphylococcus spp, Klebsiella spp, Pseudomonas
spp, E. coli, Enterobacter spp, Acinetobacter spp e Candida
sp.10,16-18
16
Julho 2006
Critical Connections em português
Tabela 1. Patógenos mais freqüentes e tratamento antibiótico de escolha para diferentes localizações de infecção
Foco
Abdominal
Tipo
Biliar
Íleo terminal, cólon,
fígado.
Agentes etiológicos
Prováveis
Não necessitam de cobertura
Tratamento preferido
E. coli
Klebsiella spp
Enterococcus spp
Coliformes
B. fragilis
S. aureus
B. fragilis
Piperacilina/tazobactam;
BLA/sulbactam; piperacilina + amicacina
S. aureus
Metronidazol + amicacina ou
piperacilina/tazobactam ou
BLA/sulbactam + amicacina ou meropenem
Gênito-urinário
Bexiga
Rim
Coliformes
Enterococo (1)
P. aeruginosa
S. aureus
B. fragilis
Amicacina ou
piperacilina/tazobactam
Cateter venoso central
(CVC); outros sistemas
invasivos; ferida
cirúrgica
CVC
Drenagem LCR
Prótese
Feridas cirúrgicas
S. epidermidis
S. aureus
Klebsiella spp
Enterobacter spp
Outros BGN IH
Coliformes comuns
B. fragilis
Vancomicina + amicacina ou meropenem (2) (Drenagem
de LCR vancomicina + ceftazidima)
Pneumonia intra-hospitalar Precoce
em paciente ventilado
Tardia
Sem foco aparente
H. influenzae
Pseudomonas
S. pneumoniae
MRSA adquiridos na
MSSA
comunidade?
BGN não multirresistentes
Idem +
P. aeruginosa
BGN multirresistente
Acinetobacter
MRSA
Segundo epidemiologia local e dirigida a CGP e BGN.
Cefotaxima c/ ou s/ vancomicina
+ macrolídeo ou azalídeo
Vancomicina + meropenem (2)
ou piperacilina/tazobactam
ambos + amicacina
Vancomicina + amicacina
vancomicina + piperacilina/tazobactam ou meropenem
1. Caso sejam encontrados no exame direto cocos Gram-positivos em cadeia em uma cultura de urina, associar empiricamente ampicilina.
2. Em pediatria, recomenda-se o uso de meropenem (aprovado para meningites, menor toxicidade em pacientes com insuficiência renal ou convulsões, cada 8 h, mais ativo frente a BGN, estável
por 48 h sob refrigeração).
Abreviaturas:
BLA: Betalactâmicos; BGN: Bacilos Gram-negativos; CGP: Cocos Gram-positivos; CVC: Cateter venoso central; LCR: Líquido cefalorraquidiano; MRSA: S. aureus resistentes à meticilina; MSSA: S.
aureus sensíveis à meticilina
Em relação ao perfil de sensibilidade, P. aeruginosa apresenta 100% de susceptibilidade à ceftazidima, amicacina,
piperacilina/tazobactam. Quanto aos carbapenêmicos, detectamos apenas 2 cepas resistentes desde 2001, ambas em
pacientes com fatores de risco para multirresistência antibiótica, devido ao que também apresentaram resistência à ciprofloxacina.
As cepas de Enterobacter spp demonstram 100% de sensibilidade a fluoroquinolonas, carbapenêmicos e amicacina.
Embora não tenham sido registrados casos de cepas desreprimidas, evitamos – por normas escritas – o uso prolongado ou
injustificado de cefalosporinas de terceira geração (ceftazidima, ceftriaxona), a fim de evitar que surjam cepas resistentes
de Enterobacter spp e/ou selecionar K. pneumoniae produtoras de betalactamases de espectro ampliado (ESBL) (apenas 2
casos desde 2001, ambos com fatores de risco).
A Acinetobacter baumannii é relativamente infreqüente em
nossa UTI, e mostra excelente sensibilidade a carbapenêmicos, motivo pelo qual o tratamento dirigido a este microorganismo é feito com este grupo de antibióticos.
Pelo que foi exposto, o TEI para a PAVM tardia (Tabela 1)
em nossa unidade pode iniciar-se com piperazina/tazobactam
associado à vancomicina; para a PAVM precoce, recomendamos cefotaxima ± macrolídeo (menores de 6 e maiores de 60
meses). Recentemente (novembro/2004), tivemos um caso
fatal de pneumonia necrotizante por Staphylococcus aureus
resistente à meticilina adquirido na comunidade. Por esta
razão, a combinação com vancomicina está sendo consideraCritical Connections em português
da para pacientes com suspeita desta forma tão grave de
infecção.
Na UTIP, a adequada relação enfermeira/paciente é determinante para evitar este tipo de infecções. Como medidas preventivas, deve-se evitar a sobrecarga do pessoal, realizar rigorosamente a lavagem de mãos e implementar diretrizes de conduta obtidas por consenso entre formadores de opinião.1,19-21
Utilização de carbapenêmicos na UTIP
Como o tratamento das infecções graves na UTIP requer certeza de que a cobertura antibiótica seja desde o início ampla e
adequada, recentemente foi proposta a política de “desescalada” (redução de espectro).7
Entre os grandes desafios no manejo destas infecções,
estão as produzidas por bacilos Gram-negativos com multirresistência antibiótica (produtores de ESBL, betalactamases
cromossômicas induzíveis tipo AmpC, etc.). Os carbapenêmicos representam uma classe de antibióticos muito úteis para
tratar empiricamente este tipo de infecções, devido a seu
amplo espectro (aeróbicos e anaeróbicos) e estabilidade frente à maioria das betalactamases.23
Os custos do tratamento destas infecções não apenas estão
relacionados ao valor do medicamento em si, mas também
com o tempo de internação de que o paciente necessitou até
sua melhora e/ou cura, a compatibilidade com outros fármacos, sua toxicidade, necessidade de doses múltiplas diárias em
pacientes com muitas outras medicações intravenosas, volume e tempo requeridos para sua infusão. Levando em conta
Julho 2006
17
Superinfecções com suspeita de bacilos Gram-negativos durante o TEI de
amplo espectro.
Infecções por bacilos Gram-negativos ESBL +.
Cepas hospitalares multirresistentes.
Superinfecção em pacientes imunocomprometidos ou falta de resposta a
antibióticos de amplo espectro em infecções hospitalares.
Infecções polimicrobianas (aeróbicos/anaeróbicos) hospitalares.
TEI de sepse grave hospitalar (em associação com vancomicina).
TEI de PAVM de início tardio.
Figura. Motivos mais freqüentes de uso de antibióticos carbapenêmicos em UTIPs
estas variáveis, o uso de monoterapia para TEI é atraente
sempre que se faz a redução de espectro, uma vez obtidos os
resultados microbiológicos e frente a uma boa evolução clínica.7,23,24
A utilização de carbapenêmicos para o manejo de infecções
graves em pediatria deve seguir certas pautas preestabelecidas,
regular-se por normas estritas (uso restringido) dado seu amplo
espectro; já que, ante a aparição de resistência a este grupo de
antibióticos, as alternativas são muito poucas e nem sempre livres de toxicidade (por exemplo, colistina).
Com base em estudos recentes, o meropenem surge como
o carbapenêmico com melhor perfil pediátrico, devido a sua
baixa toxicidade, aprovação para uso em menores de 3 meses
e em meningites, atividade frente a algumas cepas de P. aeruginosa resistentes ao imipenem, melhor tolerabilidade a altas
doses (sistema nervoso central, renal), menor necessidade de
aporte de líquidos (importante no manejo de prematuros),
doses com intervalos de 8 horas (requerendo menor manipulação dos cateteres venosos), curtos períodos de infusão (1-15
minutos), entre outros benefícios (Tabela 2).1,23-24
Tabela 2. Quadro comparativo de doses, cobertura e indicações entre imipenem
e meropenem.
Imipenem
Meropenem
Doses
15-25 mg/kg c/6 h
Experiência limitada em <30 Kg
(FDA 2001)
Não aprovado para meningites
Dose máxima: 2 g
3 meses-12 anos: 20 mg/kg
c/8 h
Meningite: 40 mg/kg c/8 h
Dose máxima: 6 g
Espectro
Cocos Gram-positivos exceto
S. aureus resistente à
meticilina. Enterococcus spp
Bacilos Gram-negativos
incluindo Pseudomonas spp
Anaeróbios
Idem + maior atividade in
vitro frente a cocos
Gram-positivos (CGP) e
Bacilos Gram-negativos (BGN)
Anaeróbios
Diarréia
5,1%
4,1
Erupção
2,2%
2,2%
Convulsões
Com meningite 33%
Sem meningite até 2-3%
Com meningite (similar à
cefotaxima 12%)
Sem meningite 0,08%
Uso em
Não recomendado aumenta
pacientes com neurotoxicidade
insuficiência
renal
18
Julho 2006
Ajustando dose não aumenta
neurotoxicidade
Na população pediátrica, sempre se deve aventar a possibilidade de meningite, mas em muitas ocasiões os pacientes não
podem ser submetidos a uma punção lombar. Por isto, idealmente, o carbapenêmico utilizado em pediatria é o meropenem, já que foi aprovado para meningites. Ademais, é ativo
frente a Pseudomonas, que às vezes mostram-se resistentes ao
imipenem. Tem maior tolerância, mesmo em pacientes com
insuficiência renal, e apresenta a possibilidade de ser administrado em infusões contínuas. Este benefício é de especial
importância nos prematuros, já que permite utilizar volumes
mais reduzidos.
Conclusão
É conveniente ressaltar que se devem implementar medidas
para controlar a resistência a antibióticos na UTI. Em linhas
gerais, são úteis as diretrizes e normas consensuais, a restrição
ao uso de antibióticos, o antibiograma dirigido, a implementação da redução de espectro a partir de 48-72 horas, adesão à
higiene das mãos, diminuição da invasividade, redução do
tempo de internação e apelar à educação continuada.
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Julho 2006
19
Resistência a antibacterianos na América Latina
Prof. José María Casellas
Microbiólogo. Professor, Universidade Nacional de Rosário, Santa Fé, Argentina.
A
América Latina (AL) é um conglomerado de países
com diferentes localizações, mas com problemas
sociais semelhantes, que repercutem na área médica.
Dentro do tema que nos ocupa, existe um incremento de
infecções hospitalares e de resistência a antibacterianos.
Não restam dúvidas de que os projetos pendentes na AL
são:
1) Melhorar as medidas de barreira para frear as infecções.
2) Impedir a venda de antibacterianos sem prescrição
médica, o que determinou a presença de resistência a antibacterianos em pacientes que são internados e que não tiveram
contato prévio com hospital.
Em relação ao primeiro dos problemas, geralmente não
necessitamos de melhor enfermaria e sim de mais enfermarias,
incluindo enfermeiros epidemiológicos em todos os hospitais.
Na AL existem:
• Problemas de resistência a antibacterianos que são compartilhados mundialmente, como a resistência a betalactâmicos, resistência a meticilina em estafilococos e a panresistência em Pseudomonas aeruginosa.
• Problemas acentuados em nosso continente, como: betalactamases de espectro ampliado (ESBL) e, também, a alta incidência de isolamentos do complexo Acinetobacter baumannii-calcoaceticus ou P.aeruginosa sensível somente a polimixinas.
Tabela 1: Dados comparativos de taxas de sensibilidade (2003-2004) em cepas provenientes de infecções intra-hospitalares
SENTRY
K p vs
P a vs
Ac vs
Argentina
Brasil
Chile
Colômbia
Colombia
Costa Rica
Peru
Perú
Uruguai
Venezuela
7
8
9
10
11
12
13
14
15
62
93
75
–
91
59
86
51
40
46
55
62
90
–
100
93
50
93
41
–
42
94
6
62
–
88
–
93
–
96
41
–
72
70
94
10
87
–
70
–
91
95
83
74
–
62
99
100
100
58
100
100
99
100
91
98
99
100
100
91
55
68
94
–
66
95
70
81
95
43
–
68
58
–
96
81
78
97
–
–
80
92
92
97
78
95
83
90
51
CIP
90
81
78
88
8
72
90
95
88
93
94
87
50
78
76
CAZ
88
61
73
85
67
48
75
79
65
76
70
49
56
59
79
FEP
89
62
73
85
3
55
–
79
–
73
69
53
55
–
72
PTZ
92
72
75
95
79
68
–
84
–
92
89
65
80
61
67
CAR
89
68
74
95
50
60
75
80
86
77
84
61
73
80
61
GEN
91
58
61
–
–
48
–
–
55
65
49
–
–
59
–
AMc
98
71
76
95
–
–
92
78
78
93
71
72
53
76
74
CIP
75
57
56
75
35
54
85
68
58
59
71
63
49
60
65
AMS
–
–
37
88
75
-
41
65
–
86
–
–
–
20
49
CAR
84
81
54
88
35
90
92
45
94
92
–
11
94
28
25
E.U.A.
EE.UU.
AL
SIR
CIBIC
HSPE
MYSTIC
1
2
3
4
5
6
CAZ
91
65
79
94
36
CTX
92
54
65
94
FEP
99
67
68
PTZ
93
71
CAR
100
GEN
93
AMc
SE dos EUA México
Panamá
CIP
55
22
6
25
3
31
5
38
–
71
–
7
60
20
21
AMK
81
32
29
25
–
–
39
50
–
87
–
9
59
20
19
1. Programa SENTRY. Dados correspondentes aos EUA 2. Programa SENTRY. Dados correspondentes à AL. 3. Programa SIR da Sociedade Argentina de Bacteriologia Clínica (SADEBAC). Corte outubro-novembro 2004 4. Dados proporcionados por José María Casellas, Laboratório CIBIC, Rosário, Argentina.
5. Dados apresentados por Thais Guimarães, Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, Brasil. 6. Dados proporcionados por Caio Mendes, do Programa MYSTIC do Brasil e por Flávia Rossi (Enterococos resistentes a vancomicina [ERV]). 7. Dados proporcionados por Patricia González, Clínica
Alemana, e Ricardo Espinoza, Clínica Las Condes, Santiago, Chile. 8. Dados proporcionados por Francisco Molina, Universidade Pontifícia Bolivariana de Medellín e Carlos H. Saavedra, Universidade Nacional de Colômbia, Bogotá, Colômbia. 9. Dados proporcionados por Jaime Fernandez Alpizar, Hospital Calderon
Guardiã, San José, Costa Rica. 10. Sudeste dos EUA. Dados proporcionados por Edgar Jiménez. 11. Dados proporcionados por Federico Javier Ortiz, Instituto Nacional de Perinatología, México DF e Luis A. Sánchez, Universidade de Monterrey, México. 12. Dados proporcionados por Nestor Sosa, Panamá. 13.
Dados proporcionados por Luis Cuellar e por William Vicente, Instituto de Enfermedades Neoplásicas, Lima, Perú. 14. Dados proporcionados pelo grupo INBARCI de intensivistas e por Maria Cristina Rizzi, Montevideo, Uruguay. 15. Dados proporcionados por Alfredo López Strauss, Hospital Domingo Luciani, Caracas,
Venezuela. Kp: Klebsiella pneumoniae. Pa: Pseudomonas aeruginosa. Ab: Acinetobacter baumannii AMC: amicacina AMS: ampicilina-sulbactam CAR: meropenem ou imipenem CAZ: ceftazidima CTX: cefotaxima ou ceftriaxona CIP: ciprofloxacina GEN: gentamicina FEP: cefepima PTZ: piperacilina/tazobactam
AL: América Latina CIBIC: Centro de Investigaciones Biológicas y Clínicas, Rosario, Argentina. HSPE: Hospital do Servidor Estadual de São Paulo, São Paulo, Brasil. MYSTIC: Meropenem Yearly Susceptibility Test Information Collection SIR: Sistema informático de Resistencia.
20
Julho 2006
Critical Connections em português
Tabela 2. Taxas de resistência à oxacilina em Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) e à vancomicina em Enterococcus spp (ERV).
SENTRY
E.U.A.
EE.UU.
AL
SIR
1
2
3
50
% SARM
47
50
% EVR
22
6
Argentina
CIBIC
Brasil
HSPE
MYSTIC
4
5
6
22
88
–
0
–
6
Chile
Colômbia
Colombia
Costa Rica
México
Panamá
Peru
Perú
Uruguai
Venezuela
7
8
9
10
11
12
13
14
15
50
60
50
57
48
32
64
40
40
1
3
59
0
6
SE dos EUA
–
SARM: S. aureus resistente à meticilina. EVR: Enterococcus resistente à vancomicina
Carecemos, entretanto, de problemas que são importantes
nos Estados Unidos, mas que não têm grande transcendência
no restante da América, como a resistência dos enterococos à
vancomicina.
A tabela 1 mostra as taxas de sensibilidade a diferentes
antibacterianos, utilizados geralmente nas unidades de terapia
intensiva (UTI), das três espécies de bacilos Gram-negativos
que causam maiores problemas na AL. Estes dados estão
baseados em resultados do programa SENTRY nos EUA
comparados à AL. Foram incluídos resultados do programa
colaborativo “Sistema Informático de Resistência” (SIR), realizado pela Sociedade Argentina de Bacteriologia Clínica, que
inclui 26 hospitais de diferentes províncias argentinas, e também dados do programa “Meropenem Yearly Susceptibility
Test Information Collection” (MYSTIC), realizado no Brasil.
Na tabela 2 estão os valores de resistência à meticilina do
Staphylococcus aureus e à vancomicina do Enteroccocus spp.
De acordo com os resultados, destacamos as seguintes conclusões:
– É relevante a diferença de sensibilidade entre EUA e AL
nos isolamentos de K.pneumoniae. Enquanto nos EUA esta
bactéria se mostra mais de 90% sensível a todos os antibacterianos habitualmente utilizados, a resistência a antibacterianos na AL desta espécie é elevada. Ressaltamos particularmente a taxa de resistência à cefotaxima – indicativa de
alta freqüência de isolamentos de produtores de ESBL – o
que implica que estas enzimas sejam fundamentalmente
cefotaximases. Isto se corresponde ao achado prevalente de
ESBL da família CTX-M nos países da AL.
Critical Connections em português
– A resistência da P.aeruginosa é também superior na AL, em
relação à observada nos EUA. Chama atenção a reduzida
sensibilidade à ciprofloxacina nas cepas isoladas desta espécie, o que pode ser indicativo de superutilização desta fluoroquinolona, e que se relaciona com o aumento das ESBL,
já que foi demonstrada uma correlação significativa entre o
uso de ciprofloxacina e a ocorrência de ESBL nas UTI.
– Em relação ao complexo A. baumannii-calcoaceticus, aparentemente nem todos os países utilizam aminopenicilinas
com sulbactam. Apesar dele, a atividade desta combinação
não parece ser muito convincente na AL. Não foram incluídos os dados da cefoperazona-sulbactam – utilizado em
vários países da AL – devido à inexistência de pontos de
corte propostos pelo Clinical and Laboratory Standards
Institute (CLSI, antes chamado de National Committee for
Clinical Laboratory Standards [NCCLS]) para esta combinação, e por isso se ignora como determinar a sensibilidade. A resistência do Acinetobacter spp é muito variável nos
diferentes países. Na AL, a faixa de sensibilidade aos carbapenêmicos varia de 11% a 94%. Deve-se ter em conta
que mesmo dentro de um mesmo país podem ser observadas diferenças muito importantes na incidência de isolamentos destas espécies. É característica a existência de clones resistentes endêmicos em determinados hospitais.
– A resistência à meticilina em estafilococos apresenta valores característicos encontrados em outras regiões do
mundo, enquanto que, como já mencionamos, é notável a
reduzida proporção de enterococos resistentes à vancomicina na AL, em comparação aos EUA.
Julho 2006
21
Critérios para o tratamento empírico de infecção em
pacientes internados em unidade de terapia intensiva
CONCLUSÕES
E RECOMENDAÇÕES
Grupo de especialistas
Introdução
Este guia foi elaborado por um comitê de especialistas em
microbiologia, doenças infecciosas e terapia intensiva, da
Espanha, dos Estados Unidos e de diferentes países da
América Latina. Em uma reunião realizada em junho de 2005,
em Buenos Aires, cada participante revisou a epidemiologia e
os padrões de sensibilidade antimicrobiana locais das
infecções ocorridas em unidades de terapia intensiva (UTI).
O objetivo central foi delinear pautas para o tratamento
antimicrobiano empírico (TAE) mais adequado e sua posterior redução de espectro, nas infecções mais freqüentes em
UTI. Entre essas infecções, a pneumonia intra-hospitalar
(PIH) (especialmente associada a ventilação) foi o eixo do
consenso.
Este documento foi confeccionado a partir de recomendações recentes e de trabalhos destacados publicados até o
início de 2005 em revistas reconhecidas.
Há poucos estudos controlados sobre o manejo das infecções
adquiridas em UTI em crianças, visto que a maioria dos dados
disponíveis provêm de estudos realizados em adultos.
As recomendações deste documento não substituem o julgamento clínico, e sim servem para orientar o tratamento de
pacientes graves.1-21
Sistema utilizado para a classificação de
evidência clínica
Nível I (alto): Estudos controlados randomizados
Nível II (moderado): Estudos controlados sem randomização
Nível III (baixo): Estudos de casos e opinião de especialistas
Considerações gerais
• As infecções mais freqüentes na UTI são: infecção urinária
ou bacteriúria associada a cateter vesical (IU-AC ou BAC),
pneumonia associada a ventilação mecânica (PAVM) e bacteremia associada a cateter venoso central (BA-CVC), com
morbimortalidade muito alta. A ordem de freqüência relativa varia segundo o tipo de UTI: neonatal, pediátrica, adulta, queimados, cardiovascular, pós-cirúrgica. As IU-AC são
mais freqüentes em adultos, e as BA-CVC na neonatologia
e pediatria.
• O diagnóstico microbiológico é fundamental, mas a coleta
de amostras não deve adiar o TAE.
• As amostras para definir a etiologia da IU-AC, PAVM ou BACVC devem ser obtidas adequadamente, para diferenciar
infecção de colonização (se possível métodos quantitativos).
22
Julho 2006
• As culturas positivas afetam as modificações do TAE, na
chamada redução de espectro (redução de intensidade ou
amplitude); as culturas negativas (amostras representativas
e técnicas adequadas) e a evolução clínica afetam a decisão
de continuar o TAE.
• O fundamento para selecionar o TAE para infecções mais
freqüentes na UTI são aplicáveis a outros focos neste
mesmo grupo de pacientes. Foge deste guia a análise de
todos os focos possíveis de infecção na UTI e suas particularidades diagnósticas e terapêuticas.
• O TAE deve ser adequado, precoce (antes de 4 horas), de
amplo espectro, com doses e intervalos adequados, e incluir
antimicrobianos de grupos diferentes dos recebidos recentemente pelo paciente.
• A terapia combinada busca cobrir a maioria dos possíveis
agentes etiológicos. Deve-se suspender os antibióticos
(ATB) cuja toxicidade exceda o benefício, uma vez alcançados os resultados microbiológicos, e segundo a evolução
clínica do paciente (aminoglicosídeos < 5 dias).
• Deve-se evitar prolongar desnecessariamente o tratamento
com ATB.
Princípios gerais do tratamento das infecções em UTI
(IU-AC ou BAC, PAVM, BA-CVC)
1. Evitar que os episódios de infecção fiquem sem tratamento ou sejam tratados inadequadamente; o tratamento tardio
ou inadequado se associa a uma maior morbimortalidade.
2. Reconhecer a diversidade bacteriológica entre diferentes
hospitais (e entre cidades, países e ainda continentes), salas
e períodos; utilizar esta informação para definir o TAE
mais adequado à realidade particular.
3. Evitar o uso indiscriminado de ATB; cumprir a redução de
espectro do TAE segundo a evolução clínica e microbiologia,
e encurtar a duração do tratamento ao mínimo efetivo comprovado.
4. Aplicar medidas necessárias para modificar fatores de risco
(tratamento inadequado da doença de base, internação prolongada, antibioticoterapia prolongada, técnicas invasivas).
Pneumonia intra-hospitalar (PIH), pneumonia associada
a tratamento médico (PATM) e pneumonia associada a
ventilação mecânica (PAVM)1
• PIH: Pneumonia que aparece 48 horas após a internação e
que não estava em incubação neste momento.
• PAVM: Pneumonia que aparece 48 a 72 horas após a intubação.
Critical Connections em português
• PATM:
–Qualquer paciente internado em hospital de agudos por
mais de dois dias, nos 90 dias anteriores.
–Pacientes que residem em alojamento ou centro de tratamento de doentes crônicos.
–Pacientes em hemodiálise.
–Pacientes com ATB intravenosos, quimioterapia ou tratamento de feridas nos 30 dias anteriores.
Suspeitar de PATM quando existir três das seguintes condições: febre, radiografia de tórax com infiltrado recente, leucocitose, broncorréia purulenta, aumento da necessidade de
oxigênio.
Métodos diagnósticos e pontos de corte
• Lavado broncoalveolar-broncoscópico (LBA-B) ou escovado broncoalveolar (EBA) com broncoscopia telescópica ou
LBA não broncoscópica (LBA-NB). É significativa a cultura com recontagem >103 UFC/ml (EBA) ou >104 UFC/ml
(LBA-B e LBA-NB); monomicrobiano e com <1% de células epiteliais, com células bronquiais e bactérias intra-polimorfonucleares (PMN) >2%.
• Se não houver LBA ou EBA, pode-se valorizar a cultura de
aspirado traqueal (difícil diferenciar agente colonizador de
patógeno), quando se cumpre o seguinte: amostra representativa com menos de 10 células epiteliais no exame com
coloração de Gram, fibras de elastina em preparado com
hidróxido de potássio, crescimento monomicrobiano ou
predomínio de um microorganismo, bactérias intra-PMN e
recontagem ≥ 106 UFC/ml. Enviar amostras para cultura de
patógenos comuns (virais na pediatria; de acordo com a epidemiologia em adultos). O valor preditivo negativo (VPN)
de aspirados traqueais negativos (ausência de bactérias ou
células inflamatórias) para PAVM em pacientes sem troca
recente de ATB é de aproximadamente 94%.
• Em pacientes com antibioticoterapia prévia, sugere-se reduzir um logaritmo no corte de UFC/ml.
Recomendações para antibioticoterapia empírica
na PIH1
Aspectos epidemiológicos em destaque
• Muitos pacientes com PIH, PAVM e PATM têm um risco
maior de colonização e infecção por microorganismos multirresistentes (MMR) (Nível II).
• É difícil estimar com precisão a incidência de PATM e
PAVM, por causa da superposição diagnóstica com a traqueobronquite, especialmente em pacientes sob assistência
respiratória (Nível III).
• A incidência de PAVM é de 6 a 20 vezes maior em pacientes com assistência respiratória (Nível II).
• A PIH e a PAVM têm maior mortalidade que outras
infecções hospitalares (Nível II).
• Os pacientes com PIH ou PAVM de início tardio têm risco
aumentado de infecção por MMR e maior taxa de mortalidade que os pacientes com doença precoce (Nível II).
• A maioria das PIH, PATM e PAVM é causada por bacilos
Gram-negativos aeróbios e cocos Gram-positivos (especialmente Staphylococcus aureus resistente a meticilina
Critical Connections em português
[MRSA]); os anaeróbios são pouco freqüentes (Nível II).
• A incidência de Legionella pneumophila varia nos diferentes centros (Nível II).
• As PIH, PATM e PAVM virais e micóticas são pouco freqüentes como causa (na pediatria até 20% podem ser virais)
(Nível I).
• A prevalência de MMR varia entre os centros, ressaltando a
vigilância da resistência local (Nível II).
• Os patógenos multirresistentes são mais freqüentes em pacientes com doenças crônicas de base, doenças graves, fatores de
risco para PATM e PIH ou PAVM de início tardio (Nível II).
• Os agentes responsáveis pela PAVM variam de acordo com
a UTI, mas os mais freqüentes são:
–Aeróbios Gram-negativos: Klebsiella spp, E.coli,
Pseudomonas spp, Acinetobacter spp, Stenotropho-monas
maltophilia, Burkholderia cepacia, Serratia spp, Ente- robacter spp.
–Aeróbios Gram-positivos: Streptococcus pneumoniae,
MRSA, S.aureus sensíveis a meticilina (MSSA).
–Polimicrobiana
Aspectos em destaque e recomendações para fatores de risco
modificáveis: patógenos multirresistentes
• Profilaxia geral mediante medidas de controle de infecção
efetivas (Nível I); vigilância das infecções nas UTIs para
identificar e quantificar patógenos endêmicos e multiresistências novas, para definir pautas epidemiológicas e
terapêuticas (Nível II).
• Evitar o quanto possível a intubação e reintubação, utilizar
ventilação não invasiva (Nível I).
• Elevar a cabeceira 30o a 45o (Nível I).
• Alimentação enteral com sondas pós-pilóricas (Nível I).
• Descontaminação digestiva seletiva aguda de cepas multirresistentes (não como rotina) (Nível I).
• Profilaxia de úlceras de estresse; sucralfato (Nível I).
• Controle rigoroso de glicemia (Nível I).
Aspectos em destaque e recomendações para o diagnóstico
• Infiltrado radiológico novo ou progressivo, mais correspondente clínico. O infiltrado e dois critérios clínicos (febre,
leucocitose, escarro purulento) têm sensibilidade de 69% e
especificidade de 75% em relação à histologia (culturas
positivas) (Nível II).
• O diagnóstico de pneumonia em pacientes com síndrome de
desconforto respiratório agudo (SDRA) requer um critério
clínico. Existe alta suspeita em pacientes sob assistência
respiratória por SDRA com deterioração hemodinâmica
abrupta ou nos gases sanguíneos (Nível II).
• A colonização traqueal precede a PAVM; o uso do aspirado
traqueal geralmente não diferencia claramente entre colonização e infecção sem os critérios descritos na seção de
métodos diagnósticos e pontos de corte (Nível II).
• A ausência de patógenos multirresistentes no trato respiratório inferior de pacientes intubados, sem mudança de ATB
nas 72 horas anteriores, indica fortemente que o agente etiológico não é multirresistente (a depuração dos microorganismos multirresistentes geralmente é lenta) (Nível II).
Julho 2006
23
• Nos pacientes com suposta PAVM, deve-se realizar hemoculturas; as culturas positivas indicam pneumonia ou um
foco extrapulmonar (Nível II).
• Todo paciente com derrame pleural requer toracocentese:
empiema ou derrame parapneumônico (Nível III).
Estratégia clínica
O início precoce do TAE (dentro de 4 horas) em pacientes
com PAVM ou PATM presumidas, demonstrou reduzir a
morbimortalidade a elas associada. A antibioticoterapia
deve ser reavaliada em 48 a 72 horas após a resposta clínica
e os dados de cultura semiquantitativos do trato respiratório
inferior (o exame com coloração de Gram e a cultura de
aspirado traqueal têm alto valor prognóstico negativo). Esta
estratégia não requer estudos microbiológicos sofisticados.
Assim, todos os pacientes com suposta pneumonia são tratados, com possível inclusão de pacientes com diagnóstico
não infeccioso (SDRA, tromboembolismo pulmonar, hemorragia pulmonar, etc.).
Acreditamos que é necessário basear as decisões terapêuticas em métodos diagnósticos quantitativos, para evitar o supertratamento de pacientes não infectados.
Aspectos em destaque e recomendações para a estratégia
clínica
• O exame direto (Gram) e a cultura do aspirado traqueal servem para guiar o TAE, junto com os critérios clínicos de
diagnóstico (Nível II).
• Diante da possibilidade de se realizar culturas quantitativas
de LBA ou EBA, o aspirado traqueal negativo (ausência de
bactérias ou reação inflamatória) em um paciente sem
mudança recente de ATB (últimas 72 horas) possui alto
VPN (94%) para PAVM; devem ser investigados outros
focos responsáveis por febre (Nível II).
• Um infiltrado radiográfico novo e progressivo, e dois ou
mais dados clínicos (febre > 38oC, leucocitose ou leucopenia, secreções purulentas) é o critério clínico mais acertado
para o TAE. Entre o 2o e 3o dia, o TAE deverá ser reavaliado e modificado, de acordo com as culturas semiquantitativas e a resposta clínica.
• A seleção de pacientes para suspender o ATB, de acordo
com critérios de baixo risco, requer ainda validação quando
há presença de PAVM grave (Nível I).
Aspectos em destaque e recomendações para a estratégia
bacteriológica
• Quando se suspeita de PAVM, deve-se obter amostras de
ARB para cultura quantitativa e descartar infecção extrapulmonar, antes do TAE (Nível II).
• Se houver alta probabilidade de pneumonia e/ou evidência
de sepse, é necessário iniciar rapidamente o TAE ainda sem
a presença comprovada de bactérias no ARB (Nível II).
• A estratégia bacteriológica reduziu a mortalidade no dia 14,
em comparação à estratégia clínica (Nível I).
• O retardo do TAE adequado aumenta a mortalidade na
PAVM: não se deve postergar o tratamento em pacientes
instáveis para a realização de estudos (Nível II).
Antibioticoterapia para a pneumonia intra-hospitalar
Enfoque geral
Os ATB devem ser selecionados de acordo com os fatores de
risco para patógenos multirresistentes (Tabela 1). A figura 1
mostra os algoritmos para a seleção adequada do TAE para a
PIH, de acordo com os patógenos freqüentes (tabelas 2 e 3)23-26.
O TAE com ATB de amplo espectro deve incluir o compromisso de reduzir o espectro, de acordo com dados clínicos e
microbiológicos, para diminuir o aparecimento de cepas
Figura 1. Algoritmo para o início de TAE na PIH, PATM, PAVM.
MRA: microorganismo com resistência antibiótica.
Tabela 1. Fatores de risco para patógenos com MRA causadores de PIH
Estratégia bacteriológica
• Tratamento com ATB nos 90 dias anteriores
A base desta estratégia são as culturas quantitativas do aparelho respiratório baixo (ARB) (LBA, EBA, broncoscópico ou
não), que permitem conhecer a epidemiologia local das PIH,
orientar a antibioticoterapia e formular o TAE mais adequado
para cada centro e período.
Idealmente, estas amostras devem ser colhidas antes do
TAE; deve-se lembrar que o atraso no TAE é negativo para a
evolução clínica da PAVM.
A utilização da estratégia bacteriológica, mais um TAE
amplo com posterior redução de espectro reduz significativamente a mortalidade no dia 14.22
• Internação atual de mais de 5 dias
24
Julho 2006
• Alta freqüência de resistência a ATB na comunidade ou na unidade específica do
hospital
• Presença de fatores de risco para PATM:
– Hospitalização de 2 ou mais dias nos últimos 90 dias
– Residência em comunidade fechada (ex., geriátrico)
– Antecedentes de infusão de ATB ou cuidado de feridas
– Diálise crônica durante os últimos 30 dias
– Familiar com antecedente de infecção por patógeno MRA
• Doença ou tratamento imunossupressor
MRA: microorganismo com resistência antibiótica; PIH: pneumonia intra-hospitalar; ATB:
antibiótico; PATM: pneumonia associada a tratamentos médicos.
Critical Connections em português
Tabela 2. TAE para PATM, PIH, ou PAVM precoce sem fatores de risco para MRA.
PATÓGENO POTENCIAL
ANTIBIÓTICO RECOMENDADO
Streptococcus pneumoniae
Haemophilus influenzae
SASM
Bacilos Gram-negativos entéricos sensíveis a ATB
Escherichia coli
Proteus spp
Serratia marcescens
Bactérias responsáveis por pneumonía atípica
Cefotaxima
ou
Aminopenicilina/sulbactam
ou
Ertapenem (1)
novo macrolídeo ou azolídeo intravenosos
Levofloxacina, moxifloxacina (1)
TAE: tratamento antimicrobiano empírico; PATM: pneumonia associada a tratamentos médicos; PIH: pneumonia intra-hospitalar; PAVM:
pneumonia associada a ventilação mecânica; MSSA: Staphylococcus aureus sensível a meticilina
1. Avaliar o beneficio de sua utilização vs. risco de resistência e custos. Fluoroquinolonas não estão aprovadas para este uso na pediatria, por isso sua indicação tem que ser justificada.24-27
Tabela 3. TAE para o manejo de PIH, PATM, PAVM. tardia ou risco de infecção por patógenos MRA
(inclui todo tipo de gravidade)
PATÓGENO POTENCIAL
TAE DE COMBINAÇÃO
Patógenos descritos na tabela 1 e
patógenos MRA
Bacilos Gram-negativos:
Pseudomonas aeruginosa
Klebsiella pneumoniae (ESBL)
Acinetobacter spp
Carbapenêmico
antipseudomonas
(meropenem)
+
ou
piperacilina/tazobactam
mais
vancomicina
Staphilococcus aereus
antipseudomonas
resistente à meticilina
Fluoroquinolonas
antipseudomônicas
Ciprofloxacina ou
levofloxacina
ou
aminoglicosídeo
(amicacina)
TAE: tratamento antimicrobiano empírico; PIH: pneumonia intra-hospitalar; PATM: pneumonia associada a tratamentos médicos;
PAVM: pneumonia associada a ventilação mecânica; MRA: microorganismo com resistência antibiótica; ESBL: betalactamases de
espectro expandido; MRSA: Staphylococcus aureus resistente a meticilina.
Tabela 4. Doses e intervalos sugeridos dos ATB recomendados para PIH, PATM, e PAVM.
Antibiótico
Dose adultos*
Dose pediátrica*
Carbapenêmicos
Meropenem
Imipenem
500 mg a 1 g a cada 6-8 h
500 mg a cada 6-8 h
20-40 mg/kg a cada 8 h
15-25 mg/kg a cada 6 h (1)
Betalactâmico/inibidor de betalactamases
Piperacilina/tazobactam
4,5 g a cada 6 h
75 mg/kg a cada 8 h
Aminoglicosídeos
Gentamicina
Amicacina
5-7 mg/kg/dia (2)
15-20 mg/kg/dia (2)
Fluoroquinolonas antipseudomonas
Levofloxacina
Ciprofloxacina
Vancomicina
750 mg a cada 24 h
400 mg a cada 8 h
15 mg/kg a cada 12 h (4)
10 mg/kg a cada 12 h (3)
20-30 mg/kg a cada 12 h (3)
20 mg/kg a cada 8 h
Oxazolidinona
Linezolida
600 mg a cada 12 h
10 mg/kg a cada 8-12 h (5)
ATB: antibióticos; PIH: pneumonia intra-hospitalar; PATM: pneumonia associada a tratamentos médicos; PAVM: pneumonia associada
a ventilação mecânica.
* Doses baseadas em funcões renal e hepática normais.
(1) Imipenem não está autorizado em crianças com peso <30 kg, insuficiência renal, ou com meningite. Meropenem está aprovado a
partir dos 3 meses de vida, embora exista experiência documentada em recém-nascidos prematuros. Doses: infecções gravesmeningites: 40 mg/kg/dose a cada 8 horas.27
(2) Os níveis de concentração em vale devem ser menores que 1 µg/ml e menor que 4–5 µg/ml para amicacina.
(3) Fluoroquinolonas não aprovadas para este uso na pediatria; a indicação tem que estar justificada em situação de necessidade.23-26
(4) Alguns recomendam vales altos (15–20 µg/ml) para alcançar concentrações adequadas nos pulmões.
(5) Ainda não aprovada na pediatria. Doses obtidas de estudos clínicos em pacientes de 3 meses a 16 anos.28-30
Critical Connections em português
multirresistentes. A dose dos ATB está resumida
na tabela 4.
Tratamento antimicrobiano empírico inicial
Para definir o TAE, deve-se saber se o paciente
tem risco de patógenos multirresistentes (tabela
1); a classificação em PIH precoce ou tardia é
insuficiente para identificar todos estes pacientes.
A PATM se define como cultura de ARB positiva, obtida nas 48 horas de internação, em um
paciente com fatores de risco para multirresistência.
A resistência crescente pode ser devida a TAE
inadequados. A mortalidade por PATM é significativamente menor com TAE inicial adequado e
precoce. Mudar de ATB de acordo com a microbiologia não diminui a mortalidade. Desta forma,
a seleção do TAE adequado é muito importante
para pacientes internados com infecções graves.
Os patógenos associados ao TAE inadequado
são P. aeruginosa, Acinetobacter spp, K. pneumoniae, Enterobacter spp, e MRSA. O TAE para
possível infecção por microorganismos multirresistentes deve combinar ATB de diversos grupos
(diferentes dos recebidos recentemente pelo
paciente), ou com espectro suficiente para evitar
TAE inadequado.
O TAE inicial deverá se ajustar à epidemiologia local, as mudanças nos padrões de resistência
e aos patógenos historicamente predominantes.
A combinação com maior cobertura contra
microorganismos multirresistentes na UTI é:
carbapenêmico, amicacina e vancomicina.
O TAE deve se adequar aos resultados bacteriológicos; suspende-se a vancomicina e amicacina se microorganismos que justifiquem seu uso
prolongado não forem isolados (MRSA e bacilos
Gram-negativos que requerem sinergia). Com
evolução clínica favorável, pode-se mudar o carbapenêmico por ATB alternativos com atividade
adequada ou espectro semelhante (por ex., piperacilina/tazobactam).
Cada UTI deve estabelecer e adequar o TAE
de acordo com dados epidemiológicos próprios.
Se durante a antibioticoterapia por outra
infecção ocorrer uma PATM, o TAE requer ATBs
de um grupo diferente.
Aspectos em destaque e recomendações para a
estratégia de TAE inicial
• Selecionar o TAE de acordo com fatores de risco
para patógenos multirresistentes (Nível II).
• Selecionar os ATB específicos, de acordo com
a microbiologia local, custo-efetividade, disponibilidade do fármaco e restrições do vademecum local (Nível II).
• Os pacientes com PATM e risco de multirresistência devem receber ATB que contemplem
Julho 2006
25
•
•
•
•
esta situação, independente do tempo entre a internação e o
início da pneumonia (Nível II).
O tratamento inadequado aumenta o risco de permanência
prolongada no hospital e mortalidade. Geralmente, esta
situação se associa a patógenos multirresistentes (Nível II).
A antibioticoterapia recente favorece a probabilidade de
patógenos resistentes. Para evitar erros, a seleção do ATB
deve levar em conta os antecedentes de tratamentos prévios
(Nível III).
O TAE deve ser precoce (Nível II).
O TAE é mais adequado quando se ajusta a recomendações
das tabelas 2-4, e se adapta aos padrões locais de resistência (Nível II).
Seleção adequada do ATB e dose
Para instituir TAEs adequados é necessário o ATB correto,
mas também a melhor via de administração, dose e intervalos,
assegurando a penetração adequada no foco infeccioso.
Utilizar o tratamento combinado quando a situação
clínica/epidemiológica indicar (P. aeruginosa, provável patógeno multirresistente). As doses e intervalos recomendados
para a PAVM são mostrados na tabela 4.31-38
A farmacodinâmica e a farmacocinética devem ser levadas
em conta na seleção do ATB para a PAVM.
A efetividade dos betalactâmicos depende do tempo em
que seus níveis séricos estão acima da concentração inibitória
mínima (CIM); isto requer intervalos curtos entre as doses,
inclusive infusão contínua. Esta última parece de maior utilidade para P. aeruginosa (meropenem em infusão contínua por
3 horas).37,39 As doses altas uma vez ao dia são úteis para ATB
dependentes da concentração, tornando assim prolongadas
(fluoroquinolonas, aminoglicosídeos).40
O TAE inicial para PAVM deve ser intravenoso. Em certos
pacientes (com boa resposta clínica, tolerância à via oral, estabilidade hemodinâmica e com ATB com boa biodisponibilidade oral), é possível mudar de via (fluoroquinolonas ou
linezolida).41,42
Modalidades terapêuticas
Antibióticos em aerossol
A erradicação microbiológica é significativamente maior com
ATB em aerossol, mas os resultados clínicos são semelhantes. São
úteis para microorganismos multirresistentes sem resposta à terapia sistêmica (Acinetobacter spp Multirresistente e colistina).43-45
Combinação vs. monoterapia
P. aeruginosa é o único microorganismo causador de PAVM
em que a terapia combinada reduz a mortalidade, principalmente na bacteremia ou neutropenia.46,47
Alguns apóiam a terapia combinada para evitar a seleção
de resistência. Isto não foi comprovado; surgiram resistências
mesmo com tratamento combinado. Além disso, esta terapia
pode aumentar a toxicidade renal.31,48
A combinação se justifica fundamentalmente por ampliar o
espectro e diminuir a possibilidade de se deixar sem cobertura
microorganismos resistentes a algum componente do
esquema, sendo susceptíveis a ATBs de grupos diferentes
26
Julho 2006
(glicopeptídeo + carbapenêmico + aminoglicosídeo). Para
diminuir a toxicidade, não utilizar aminoglicosídeos por mais
de 5 dias em pacientes com melhoria clínica ou sem justificativa microbiológica.49,50
Utilizar monoterapia se a epidemiologia local e os antecedentes do paciente permitirem, o que reduz custos e
toxicidade.31-51 Ciprofloxacina, levofloxacina, imipenem,
meropenem, cefepima e piperacilina/tazobactam têm boa
segurança e eficácia.31,33-38
Duração do tratamento
Haempophilus influenzae e S. pneumoniae são mais difíceis
de erradicar do ARB que as enterobactérias, S. aureus e P.
aeruginosa, e a duração do tratamento deve assegurar a cura
da PAVM.43 Se com o TAE adequado houver melhora clínica
nos primeiros 5 dias, pode-se tratar por 8 dias (exceto
Pseudomonas), com sucesso comparável aos tratamentos prolongados (14 a 21 dias), sem aumentar a toxicidade, resistência ou custos.50-53
Resposta terapêutica - redução de espectro do TAE
A falha terapêutica se define por parâmetros clínicos (a
oxigenação parece ser a mais adequada), já que não se
estudou prospectivamente a utilidade da microbiologia para
definir a resposta terapêutica.
Vários motivos explicam a falta de melhoria: foco de
infecção distinto da pneumonia, fatores do ATB ou
microbiológicos não considerados, ou processo não infeccioso
com comprometimento radiológico e da oxigenação (SDRA).
Algumas infecções podem ter uma evolução mais lenta ou
desfavorável: PAVM por bacilos Gram-negativos, infecção
polimicrobiana, microorganismo multirresistente ou resistência adquirida durante o tratamento.
A etiologia da pneumonia pode ser não habitual (vírus
respiratórios, MRSA, gripe aviária, hantavírus) ou não
tratável com antimicrobianos comuns (M. tuberculosis,
fungos), ou favorecido por condições desconhecidas (AIDS e
pneumonia por Pneumocystis jirovecii – antes P. carinii).
A presença de outros focos infecciosos simultâneos ou posteriores ao TAE para PAVM podem simular falha terapêutica
e merecem atenção especial (sinusite, BA-CVC, IU-AC,
enterocolite pseudomembranosa).
No paciente que não melhora, pode ser necessário readequar a antibioticoterapia enquanto se esperam os resultados de
cultura e outros procedimentos diagnósticos. A reavaliação
deve ser integral e completa, para não se perder nenhum diagnóstico diferencial. Devem-se repetir as hemoculturas,
uroculturas e culturas de ARB e de cateteres venosos centrais,
ainda durante a antibioticoterapia. Podem ser necessários
outros estudos por imagem (TC de tórax, ecografia pleural).
Raramente se justificam procedimentos invasivos (biópsia
pulmonar) em pacientes imunocomprometidos com PAVM,
PIH ou PATM, sendo aconselhável antes tentar uma
broncoscopia.
O TAE deve ser reavaliado e modificado, se possível, de
acordo com as culturas e resposta clínica. Esta modificação
pode ser para adequar o tratamento à descoberta de patógenos
Critical Connections em português
dos quais não se suspeitava e multirresistentes, ou diante da
falta de melhora clínica.
Se não se recuperar microorganismos habitualmente
multirresistentes (P. aeruginosa ou Acinetobacter spp),
reduzir o espectro do TAE para ATB ativos contra o microorganismo, com espectro menor.
A linezolida foi equivalente à vancomicina na PIH; tem
alta penetração tecidual, pode ser preferível em pacientes com
função renal flutuante ou que recebem fármacos nefrotóxicos
(aminoglicosídeos).57-59
PSEUDOMONAS AERUGINOSA
Os dados acerca do benefício do tratamento combinado para
infecções não bacterêmicas é controverso, mas sugere-se fortemente o tratamento combinado nas infecções comprovadas por
este microorganismo. Com monoterapia, aparece resistência em
30 a 50% dos pacientes, sendo a mortalidade maior em pacientes com bacteremia e/ou imunodeprimidos. São necessários
estudos prospectivos para mostrar este benefício na PAVM.
• O TAE se modificará de acordo com parâmetros clínicos correlacionados à melhora e dados microbiológicos
(Nível II).
• A melhora clínica aparece habitualmente em 48-72 horas;
não modificar o TAE até esse momento, exceto frente a uma
rápida deterioração clínica (Nível III).
• Reduzir o espectro do TAE em pacientes que respondem;
ajustá-lo segundo a microbiologia (Nível II).
• Reavaliar os não-respondedores para identificar situações
que simulem pneumonia, microorganismos resistentes ou
não suspeitados, focos infecciosos extrapulmonares ou
complicações da pneumonia (Nível III).
• O TAE para PAVM requer ATB em doses e intervalos adequados, para assegurar máxima eficácia (Nível I). Deve ser
inicialmente intravenoso; mudar para via oral em determinados pacientes (Nível II).
• Os ATB em aerossol não têm utilidade na PAVM. Podem ser
considerados terapia adjuvante na PAVM por patógenos
multirresistentes, sem resposta à terapia sistêmica ou com
opções terapêuticas escassas (Nível III). Se não houver
risco de multirresistência, pode-se utilizar a monoterapia
para determinados pacientes com PATM ou PAVM (Nível
I). Se houver risco de multirresistência, iniciar sempre com
combinação, até se confirmar (com as culturas) se é possível utilizar apenas um ATB (Nível II).
• Para pacientes com risco de multirresistência, recomendase TAE combinado (Nível II). Como único benefício,
aumenta a possibilidade de TAE inicial adequado (Nível I).
Neste caso, os aminoglicosídeos poderiam ser suspensos
após 5-7 dias, em pacientes respondedores (Nível III).
• Com TAEs inicialmente adequados, procurar diminuir o tratamento para 7-8 dias, se o patógeno não for P. aeruginosa,
e houver melhora clínica (Nível I).
• A restrição de ATB, junto com antibiograma dirigido, ajudam a prevenir ataques por microorganismos multirresistentes (Nível II).60
ACINETOBACTER SP.
Por causa da multirresistência freqüente na maioria das UTIs,
é complicado tratar das infecções causadas por este microorganismo. Quando existe sensibilidade confirmada bacteriologicamente, os ATB recomendados são carbapenêmicos, sulbactam/betalactâmicos, fluoroquinolonas e polimixinas (colistina). A emergência de clones resistentes a carbapenêmicos
exige a utilização de doses adequadas desses ATB. Surgiram
novas modalidades (infusão contínua de meropenem) que
podem ser úteis em cepas com sensibilidade limítrofe e
evitam ATB com maior toxicidade (colistina). Na infusão
contínua de meropenem38, administram-se 250 mg ou 500 mg
de dose de ataque, seguidos de 1.500 mg ou 3.000 mg,
respectivamente, em infusão contínua durante 24 horas. Os
níveis projetados permitem tratar microorganismos com 4
mg/l (dose de ataque alta) e 2 mg/l (dose de ataque baixa).
Para bactérias com CIM alta para carbapenêmicos, esta
modalidade pode ser recomendada, embora sejam necessários
estudos prospectivos.
Há estudos com eficácia e tolerabilidade aceitáveis da colistina por via intravenosa; também há experiência com a
forma aerossol.54
BACILOS GRAM-NEGATIVOS ESBL+
As cefalosporinas de terceira geração são contra-indicadas
quando se detectam estes microorganismos. São ATB úteis:
carbapenêmicos (ertapenem, imipenem, meropenem), amicacina.47 Não administrar fluoroquinolonas na América Latina
para tratar de infecções por estes germes ESBL+, já que a
resistência é maior que na Europa e EUA.56
MRSA
Existem falhas com vancomicina na PAVM por MRSA. A freqüência alcança valores maiores que 40%, utilizando doses
padrão de vancomicina (1 g/12 h). A combinação aminoglicosídeos/rifampicina é microbiologicamente racional, faltam
estudos prospectivos que mostrem benefícios na PIH.
Alguns sustentam que para alcançar concentrações adequadas em tecido pulmonar são necessários níveis séricos de
vancomicina maiores que 15 microg/dl. Não há dados
prospectivos para se avaliar isto.
Critical Connections em português
Aspectos em destaque e recomendações para antibioticoterapia adequada
Infecções urinárias ou bacteriúrias associadas a cateteres vesicais na UTI18,61-64
A IU-AC é a infecção intra-hospitalar mais freqüente na UTI
de adultos e a segunda na UTI pediátrica (UTIP).6 A incidência diária de bacteriúria é de 3 a 10% em pacientes com sonda;
25% desenvolvem sintomas de IU e 3% bacteremia. A prevenção destas infecções reduziria significativamente os gastos
hospitalares mundialmente gerados.3 Esses pacientes têm um
risco 7 vezes maior de pielonefrite que aqueles sem sonda,
com um risco maior de mortalidade (1%). NA UTIP mais de
90% dos casos se associam a sonda vesical.
O fator de risco mais importante nas infecções relacionadas
a sonda vesical é a permanência prolongada. A administração
Julho 2006
27
concomitante de ATB de amplo espectro é outro fator importante. Esses ATB diminuem a freqüência de IU nos primeiros 5
dias de sondagem, mas logo aumentam o risco de infecção por
bacilos Gram-negativos multirresistentes. Desta forma, é contra-indicada a profilaxia com ATB em pacientes com sonda.
Muitas vezes o paciente febril com sonda vesical apresenta bacteriúria sem que esta represente IU verdadeira. Todo
paciente sondado deve ser avaliado exaustivamente, para se
identificar o foco infeccioso ou a causa do processo febril.
O risco de IU-AC depende da duração da cateterização, da
inviolabilidade do sistema de drenagem, do cuidado do sistema e da susceptibilidade do hóspede.
Os agentes patogênicos são vários e incluem: Enterococcus
spp, E. coli, Klebsiella spp, Proteus mirabilis, Pseudomonas
spp, Enterobacter spp, Serratia spp e Candida spp Serratia
marcescens e Burkholderia cepacia devem levantar suspeitas
de uma fonte não endógena de infecção e têm grande
importância epidemiológica.
Os cateteres devem ser utilizados somente quando necessários, e pelo menor tempo possível.
A troca de cateteres a intervalos fixos não diminui a
incidência de IU-AC; deve ser feita somente em pacientes
com alta suspeita de infecção ou infecção documentada
microbiologicamente e naqueles com obstrução do sistema
que ainda requerem drenagem vesical.
Métodos diagnósticos e pontos de corte
A diferença de outras categorias de IU (cistite aguda, pielonefrite aguda e IU complicada) é que o ponto de corte para definir IU-AC é mais baixo. Em pacientes sintomáticos – febre
sem foco, sepse, alteração do estado mental, cistite, prostatite, epididimite, pielonefrite – com cultura positiva, está definido por:
• Recontagem ≥102 UFC/ml monomicrobiano, com sedimento patológico (≥10 leucócitos por campo de alto aumento) e
amostra obtida mediante sonda nova-estéril, por punção de
sonda, ou por meio de acesso específico com técnica asséptica e ≤24h de colocação.
• Recontagem ≥102 UFC/ml persistentemente positivo, com
mais de um microorganismo e com sedimento patológico.
• Em pacientes com antibioticoterapia, avaliar e priorizar
individualmente a recontagem de UFC/ml obtida em urocultura; não existe ponto de corte definido.
Uma das considerações mais importantes nestes pacientes
é decidir se tratar bacteriúria assintomática ou somente episódios sintomáticos de IU-AC.
Uma vez escolhido o ATB, determina-se a sua duração.
Quando se suspeita de IU-AC, sempre obter amostras adequadas para urocultura antes do TAE.
Bacteriúria assintomática
Não se deve tratar quando há manipulação cirúrgica prévia ou
antecedentes de uropatia. Recomenda-se administrar este tratamento pelo mínimo período efetivo. A primeira medida é
retirar o cateter e colher uma amostra de urocultura com uma
nova sonda (se o paciente ainda tiver critérios para necessitar
de uma sonda vesical).
28
Julho 2006
Discute-se a importância da candidúria assintomática.
Deve-se erradicar a Candida spp em pacientes portadores de
cateteres por tempo prolongado, com uropatia ou assintomáticos. Administrar fluconazol ou anfotericina B em doses baixas durante 7-14 dias (com uropatias, instrumentação urológica prévia, prematuros, transplante renal e outros tipos de imunodeficiência).
Bacteriúria sintomática
O tratamento das IU-AC sintomáticas é baseado na retirada do
cateter e na escolha do ATB apropriado. O TAE deve se orientar segundo a microscopia (Gram) e cobrir tanto enterococos
como BGN intra-hospitalares, de acordo com a epidemiologia
local. A duração mínima do tratamento com ATB deve ser de
5 a 7 dias, com um máximo de 14 dias em pacientes selecionados.
O TAE se baseia na apresentação clínica da IU, na duração
do cateterismo, na doença de base e uso recente de ATB.
Em pacientes sem co-morbidades, com cateterização breve
e pouco tratamento com outros fármacos tóxicos, pode-se iniciar TAE com monoterapia com aminoglicosídeo (amicacina),
com ou sem ampicilina (de acordo com exame de urina).
Na IU-AC grave, com co-morbidades, o TAE deve incluir
mais de um ATB; os recomendados são piperacilina/tazobactam, ou um carbapenêmico. O TAE deverá ser ajustado de
acordo com a tipificação e sensibilidade ao ATB. O uso de
vancomicina dependerá da descoberta de MRSA, em uma rara
vez em que se indica como TAE para IU.64
Bacteremia associada a cateter venoso central
(CVC)14-17
Provável
Isolamento no sangue de um microorganismo habitual de pele
em uma ou mais hemoculturas, e manifestações de sepse
(febre, calafrios, hipotensão), e sem fonte aparente de
infecção, exceto ao CVC.
Definitivo
Bacteremia primária causada por qualquer microorganismo
com evidência clínica e microbiológica quantitativa que indica o CVC como fonte de infecção, de acordo com os seguintes critérios:
1. Pus no local de inserção, com isolamento do mesmo microorganismo neste local e na hemocultura.
2. Sepsis refratária a ATB, que desaparece ao se retirar o
CVC.
3. Cultura semiquantitativa (técnica de Maki) positiva, da
ponta e/ou segmento subdérmico do CVC, com hemocultura prévia positiva para o mesmo microorganismo.
4. Hemocultura quantitativa diferencial (não “retrocultura
simples” em frasco de hemocultura), com recontagem de
colônias ≥ 10 UFC a favor do extraído por meio do CVC
para o mesmo microorganismo. Este método é útil em
CVC com mais de 10 dias de permanência – de uso exclusivo e de material pouco trombogênico – em paciente febril
sem outros sinais de sepse e bom estado geral, que não
queiram “sacrificar” o CVC.
Critical Connections em português
5. Hemoculturas automatizadas positivas antes de 2 horas, colhido por meio de CVC, em relação à hemocultura periférica.
A patogenia das infecções relacionadas ao CVC (IRCVC)
é variável e depende fundamentalmente de três fontes: pele,
conexões do CVC e, raramente, da colonização hematogênica
a partir de outros focos. Os microorganismos associados a
BA-CVC, em cateteres de curta permanência (menos de 10
dias) provêm da pele do paciente, enquanto nos cateteres de
longa permanência (mais de 10 dias) provêm das conexões e
colonizam a porção intraluminal (Figura 2).
Em todo paciente com bacteremia, investigar IRCVC,
especialmente CVC prolongado e/ou uso múltiplo.
Notavelmente, existem sinais locais de infecção em menos
de 50% das IRCVC, e até 80% dos CVC com supuração local
não estão infectados (reação local ao material do CVC). Por
isto, é praticamente impossível prever IRCVC, mesmo com
clínica local compatível.
Duas situações básicas podem se apresentar:
1. Dados de infecção local (eritema, supuração, celulite no
trajeto ou peri-CVC) e temperatura ≥ 38o C: forte suspeita
de BA-CVC. Retirar e cultivar o CVC, com hemoculturas
periféricas.
2. Sem evidência local de infecção, sem febre (sem fonte
óbvia de febre) e CVC de ≥ 96 h, assumir como provável
origem o CVC. Mudar por um novo (preferencialmente em
outro sítio), com coleta prévia de hemocultura periférica.
Se a cultura semiquantitativa da ponta e segmento subdérmico forem negativos (≤ 15 UFC /segmento), o CVC
recém-colocado por guia pode permanecer. Se a ponta retirada for positiva (>15 UFC /segmento), o novo CVC inserido por guia deve ser retirado.
Bainha de
fibrina, trombo
3. A “retrocultura não quantitativa” tem pouco valor diagnóstico de IRCVC, por sua alta sensibilidade associada a baixa
especificidade; basta que apenas um microorganismo colonize o CVC para que esta seja positiva (não se distingue
colonização de infecção). Se uma cultura periférica e uma
retrocultura forem positivas com o mesmo microorganismo, confirma-se a BA-CVC; com a retrocultura positiva e
hemocultura periférica negativa, ou vice-versa, não se confirma. No CVC com menos de 10 dias de permanência, a
colonização bacteriana ocorre na superfície externa, o que
explica a pouca utilidade da retrocultura nesses casos, e a
necessidade da técnica de Maki.
TAE para BA-CVC
A antibioticoterapia para BA-CVC é habitualmente empírica.
A seleção do TAE depende da gravidade do estado do paciente, dos fatores de risco para infecção e da epidemiologia local
(Figuras 3-5). O TAE deve incluir vancomicina – em UTI com
alta incidência de MRSA e Staphylococcus coagulase negativos – junto com um ATB que cubra BGN e P. aeruginosa,
como a piperacilina/tazobactam, um carbapenêmico ou a ceftazidima (restringir seu uso para evitar a seleção de cepas produtoras de ESBL).
Os cocos Gram-positivos são os microorganismos mais freqüentemente associados a BA-CVC, mas os BGN têm
aumentado. A retirada do CVC e o tratamento empírico adequado são fundamentais para o manejo das infecções
causadas por estes microorganismos (Quadro 1).
Particularmente na candidemia associada a CVC, o tratamento antifúngico se torna mandatório, juntamente com a
retirada precoce do cateter. Fluconazol (400 mg/dia durante
14 dias após a última hemocultura negativa) é tão efetivo e
Pele
Figura 2. Patogenia.
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Figura 5. CVC removível e BA-CVC.
Figura 3. Tratamento de paciente com CVC, permanência curta e episódio febril
grave. HMC: hemocultura; NTF: neutropenia febril.
Quadro 1. BA-CVC não complicada por Staphylococcus aureus
• Remover CVC
• Tratar com ATB por 14 dias
• MSSA (cefalosporina 1a geração) e se for MRSA (vancomicina)
• Ecocardiograma antes de finalizar ATB
• Endocardite: prolongar ATB para 4-6 semanas
Quadro 2. BA-CVC complicada por trombose séptica
• Sempre se deve remover o CVC
• Drenagem e excisão de veia infectada e tributárias comprometidas
• Avaliar anticoagulação
Figura 4. Tratamento de paciente com CVC de curta permanência e episódio febril
agudo.
• Grandes veias: ATB por 4-6 semanas, excisão geralmente
desnecessária
• Não são recomendados trombolíticos
menos tóxico que a anfotericina B (0,5 mg/kg/dia) em pacientes não neutropênicos, sempre que o microorganismo for sensível (Candida albicans, não C. glabrata e nem C.krusei).
Nesses casos, recomenda-se remover o CVC e tratar com ATB
durante 10-14 dias.
A antibioticoterapia inicial deve ser intravenosa. Quando o
paciente estiver estabilizado e se conhecer a sensibilidade a
ATB, pode-se completar o tratamento por via oral, com ciprofloxacina, linezolida ou cotrimoxazol.
A duração específica dependerá se é uma BA-CVC complicada (trombose, endocardite, osteomielite ou focos metastáticos) ou não (Quadros 2 e 3).
Com resposta rápida ao TAE, sem imunossupressão, nem
valvulopatia cardíaca ou prótese intravascular, tratar 10-14
dias para patógenos distintos de estafilococos coagulase-negativos. Considerar uma duração maior (4-6 semanas) se houver
bacteremia ou fungemia persistentes após retirar o CVC; com
endocardite, trombose séptica ou osteomielite: 6-8 semanas. A
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Quadro 3. BA-CVC complicada por endocardite/bacteremia persistente
• Remover o CVC
• Falta de melhora ou HMC (+) após 3 dias de terapia efetiva apesar
da retirada do CVC: ATB ≥4 semanas
• Avaliar cirurgia
• Deve-se sempre cobrir Staphylococcus spp
• Endocardite direita: ATB por 2 semanas
• Endocardite fúngica: anfotericina B (avaliar cirurgia)
maioria das infecções por Staphylococcus coagulase-negativos
podem ser resolvidas apenas com a retirada do CVC (sem antibioticoterapia), os especialistas concordam em tratá-las por
períodos curtos, de 5 a 7 dias. Nestes casos, recomenda-se
remover o CVC e tratar com ATB por 5-7 dias, e avaliar valvulopatia e necessidade de ecocardiografia.
Critical Connections em português
Quando a infecção é por germes e não existe suspeita de
complicações, o CVC pode ser mantido. Considerar isto em
pacientes com dificuldade para encontrar acessos venosos e
ecocardiografia sem vegetações.
Quando somente a ponta do CVC tem resultado de cultura
positivo, com hemoculturas negativas, não há dados bibliográficos para apoiar a antibioticoterapia. Alguns especialistas
recomendam avaliar e tratar com ATB durante 5 a 7 dias
somente pacientes febris com valvulopatia ou neutropênicos,
cujas culturas semiquantitativas da ponta do CVC mostrem
desenvolvimento significativo de S. aureus ou C. albicans, ou
quantitativo maior que 102 UFC. Isto se baseia no fato de que
S. aureus e Candida spp têm maior probabilidade de causar
BA-CVC complicadas que enterococos ou BGN. Nestes
casos, recomenda-se remover o CVC, tratar com antifúngicos
por 14 dias após a hemocultura negativa (fluconazol) ou até
completar 10-15 mg/kg/total (anfotericina B) e avaliar focos a
distância (fundo de olho, ecografia renal e cardíaca).
Em pacientes com S. aureus, a rifampicina se mostrou útil
para tratar de infecções graves associadas a CVC; sugere-se
utilizar uma dose diária para atingir uma área sob a curva
maior do que a alcançada com duas doses/dia.
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