VANESSA RODRIGUES “DISCO MUSIC MADE IN BRAZIL”: A REDEMOCRATIZAÇÃO NOS EMBALOS DA DISCOTEQUE Trabalho apresentado como forma parcial de avaliação para a conclusão do curso de História. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes. Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Dr. Marcos Napolitano. CURITIBA 2003 VANESSA RODRIGUES “DISCO MUSIC MADE IN BRAZIL”: A REDEMOCRATIZAÇÃO NOS EMBALOS DA DISCOTEQUE Trabalho apresentado como forma parcial de avaliação para a conclusão do curso de História. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes. Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Dr. Marcos Napolitano. CURITIBA 2003 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 1 2 “DISCO MUSIC MADE IN BRAZIL”: A DISCOTEQUE ............................................ 5 3 DANCIN’ DAYS: A DISCOTECA NA TELA DA GLOBO............................................ 18 4 DANÇAR PRA QUÊ? AS PATRULHAS IDEOLÓGICAS EM DESTAQUE................ 29 5 CONCLUSÃO.............................................................................................................. 44 FONTES........................................................................................................................... 48 REFERÊNCIAS................................................................................................................. 53 ANEXOS............................................................................................................................ 58 ii 1 1 INTRODUÇÃO O objetivo da presente monografia refere-se ao estudo das expressões culturais relacionadas ao gênero musical norte-americano disco presente no Brasil durante os anos 1976 a 1979. A disco ganhou amplitude nas grandes cidades brasileiras através dos espaços de sociabilidades voltadas para a diversão através da dança. Mas as discotecas estavam centralizadas nas grandes cidades no país e somente com a telenovela Dancin’ Days da Rede Globo de televisão a disco projetar-se-ia nacionalmente. A discoteque incentivou as discussões relativas à liberalização do corpo e gerou polêmica ao chocar-se com a engajada MPB no momento da abertura política. O debate acerca da função social da arte atingiu os compositores que dialogavam com o ritmo dançante disco. A polêmica recebeu o nome de Patrulhas Ideológicas e estabeleceu um impasse entre música para dançar e música para pensar. A fim de revelar as características da cultura disco no Brasil, analisarei a produção fonográfica nacional relacionada ao movimento, associando as informações presentes nos periódicos de circulação nacional durante os anos de 1978 e 1979. Em meados na década de 1980 as transformações na historiografia da música brasileira se aprofundaram, “pode-se até mesmo afirmar que já existia uma crítica acumulada em torno desses trabalhos”.1 Mas continuou ignorando os aspectos culturais voltadas para as representações pop. Normalmente a produção acadêmica voltada para a música concentra-se nos movimentos formadores da MPB2. O historiador Marcos NAPOLITANO esclarece que as relações entre cultura pop e MPB se alinham com a chegada dos anos 1970, pois esta passa a “incorporar uma pluralidade de escutas e gêneros musicais [tornando-se] um complexo cultural”.3 Para Marcos NAPOLITANO a junção de diversos estilos musicais aconteceu “sem maiores traumas”4 consolidando a MPB como Instituição, revelando conceitos ambíguos: “uma cultura de consumo no 1 MORAES, J. G. V. História e música: canção popular e conhecimento histórico. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.20, n. 39, 2000. p. 208. 2 Segundo Marcos Napolitano a Instituição MPB foi o ponto de convergência de diversas vertentes: do “rigor técnico” da Bossa Nova, da “utopias” do nacional-popular (canção engajada, samba participante), das vanguardas formalistas (Música Nova, Tropicalismo), da tradição musical marcada pelos gêneros de consumo popular (Samba, Baião, Marcha, etc). NAPOLITANO, M. O conceito de MPB nos anos 60. Revista História, Questões & Debates. Curitiba, n.31, jul/dez. 1999. p.23 3 NAPOLITANO, M. A música popular brasileira (MPB) dos anos 70: resistência política e consumo cultural. Trabalho apresentado no Congresso de la Rama latinoamericana del ISPM, 4. Cidade do México, 2002. p.2 4 NAPOLITANO, M. História e música: história cultural da música popular. Belo Horizonte: Autentica, 2002. p. 3. 2 campo sócio-econômico e no campo político (...) uma ideologia nacionalista integradora, fazendo referencias às idéias de justiça social, liberdade e modernidade”.5 A MPB nos anos 1970 passa a agregar uma diversidade de gêneros musicais ocupando o topo da “hierarquia sócio-cultural brasileira” 6. A pesquisa sobre a presença da disco no país também se pautou nas premissas propostas por Renato ORTIZ relativas a formação da moderna sociedade brasileira a partir da consolidação do mercado de bens materiais na década de 1970. Para ORTIZ o crescimento dos meios de comunicação, especialmente da televisão, denota a idéia da integração nacional. Deve-se atentar que os governos militares haviam investido maciçamente no crescimento dos meios de comunicação visando a integração nacional e a sua própria afirmação no poder. Mas a industria cultural a fim de equacionar uma identidade nacional, unifica os mercados locais através da interligação de mercados consumidores. Segundo ORTIZ pode-se afirmar que o nacional passa a se identifica ao mercado, deslocando a concepção de “cultura nacional-popular para uma cultura mercado-consumo”.7 A despolitização do debate sobre os produtos culturais tem como conseqüência a transformação do consumo como categoria básica sobre a pertinência dos produtos culturais: “o popular reveste-se de outro significado, e se identifica ao que é mais consumido”.8 Renato ORTIZ explica que o crescimento da publicidade no país influiu decisivamente para a formação da moderna sociedade brasileira na medida em que proporciona o sustentáculo base para as redes de televisão, especialmente a Rede Globo que passa a ser administrada por executivos da área de marketing alterando qualitativamente a programação com o advento do Padrão Globo de Qualidade. A partir da concretização da moderna sociedade brasileira nos anos 1970 – proposta por Renato ORTIZ – verifica-se uma maior possibilidade de acomodação de produtos culturais estrangeiros já que o país encontra-se envolvido numa lógica de consumo desprovido de preocupações nacionais. Sendo assim, aponto para a proposta de mundialização da cultura também concebido por ORTIZ. O sociólogo acredita que a formação de uma cultura internacional-popular9 se verifica a partir de uma lógica 5 NAPOLITANO. A música..., p. 12 NAPOLITANO; M. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural. São Paulo: Anna Blume/FAFESP, 2001.p. 13 7 ORTIZ, R. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo: Brasiliense, 1999. p. 165. 8 Ibid. p. 64 9 ORTIZ, Mundialização e cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.p. 111. 6 3 consumista. A partir disso, pode-se pensar num desenraizamento das referencias nacionais pelo fato da publicidade forjar as referencias culturais. No caso brasileiro, devese relembra que a partir da modernização da sociedade “concretiza-se a mundialização da cultura do país”.10No entanto, mesmo com a disseminação de expressões culturais desprovidas de nacionalidade “uma cultura mundializada não implica o aniquilamento das outras manifestações culturais, ele coabita e se alimenta delas”.11 Dessa forma, o autor problematiza a noção de recriação das formas culturais estrangeiras propondo um exame dos valores inseridos nos bens culturais mundializados. A socióloga Márcia DIAS utiliza as mesmas concepções de mundialização da cultura e da formação da moderna sociedade brasileira propostos por Renato ORTIZ para analisar a situação da indústria fonográfica dos anos 1970 a 1990. Para Márcia DIAS a discoteca caracteriza-se como um aspecto da mundialização da cultura12, pois ela surge no Brasil em função da explosão do gênero nos EUA e no mundo. A pesquisadora considera fundamental o papel da Rede Globo de Televisão e da sua subsidiária a gravadora Som Livre no processo de recepção da disco-music brasileira. DIAS considera a Som Livre como um mero artifício da Rede Globo para participar do mercado de discos13. Nessa perspectiva, ela passa a relacionar o papel da televisão com a indústria fonográfica: “a parceria música – TV”.14 Essa associação mostra-se extremamente importante para pensarmos sobre a disseminação de um modismo através das telenovelas. Márcia DIAS explica a importância da Rede Globo de Televisão, como símbolo da cultura nacional, pois ao divulgar “em sua programação centenas de canções e pela audiência das novelas, milhões de lares brasileiros vão ouvir parte considerável delas”.15 Dessa forma, inserir determinadas músicas nas trilhas sonoras das novelas, a Globo conseguia unir um poderoso mecanismo de propaganda: a música passa a ser associada à imagem e ao próprio contexto da telenovela. No primeiro momento da pesquisa acerca da presença da disco music no cenário cultural brasileiro, pretendo caracterizar a disco partindo da sua origem norte-americana. Dessa forma, apontarei para a criação desse sub-gênero do funk demonstrando as suas 10 ORTIZ. Mundialização..., p. 45. ibid. p. 27. 12 DIAS, M. T. Os donos da voz: indústria fonográfica brasileira e mundialização da cultura. São Paulo: Boitempo, 2000. p. 76. 13 Ibid. p. 60. 14 Id. 15 Ibid. p. 61 11 4 principais características. A partir disso, mostrarei as expressões nacionais da discoteque estabelecendo as possíveis relações com a forma de produção norte-americana. Para concretizar a forma de apresentação da disco no Brasil, analisarei os artistas que participaram do movimento. As observações estarão centralizadas no grupo Frenéticas, pois este foi a mais representativa expressão da discoteque no Brasil. Além disso, o grupo encontrava-se socialmente identificado com a MPB mesmo possuindo características rítmicas da disco music. A intenção em explorar outras manifestações da disco brasileira visa nomear uma diferenciação entre elas, estabelecendo uma hierarquia dentro do próprio gênero discoteque. No segundo capítulo proponho uma análise da disseminação do gênero musical discoteque. Deve-se considerar fundamental o papel da Rede Globo de Televisão e da sua subsidiária a gravadora Som Livre no processo de recepção da disco-music brasileira. Ao inserir determinadas músicas nas trilhas sonoras das novelas a Globo conseguia unir um poderoso mecanismo de propaganda. Entre as telenovelas um caso excepcional de merchandising foi Dancing’ Days (1978/79) que amparou o sucesso da homônima canção tema e divulgou um conjunto de características da cultura disco. Deve-se lembrar que a Rede Globo ao longo dos anos 1970 constituiu-se como a síntese da cultura nacional, pois monopoliza a audiência, especialmente após a implementação do Padrão Globo de Qualidade. Dessa forma, a Rede Globo se dispõe com força total no mercado publicitário, acompanhando de perto a aglutinação de investimentos desse setor na televisão. No momento final da minha reflexão sobre a discoteque, buscarei estabelecer as relações entre a disco e a MPB. Nesse debate sobre a função social da arte, as reflexões se baseiam nos assuntos políticos oriundos do momento de redemocratização, onde a intelectualidade de esquerda cobrava dos produtores de cultura atitudes contestatórias. A polêmica das Patrulhas Ideológicas se inicia no cinema, mas se expressa fundamentalmente no campo da música, quando artistas da MPB - oriundos do Tropicalismo - passam a dialogar com o ritmo dançante da disco. Dessa forma, o debate relembra as divergências iniciadas em 1968, quando se inaugura a rixa entre emepebistas e tropicalistas. As Patrulhas Ideológicas condenavam a discoteque porque ela não se manifestava com relação às preocupações políticas. 5 2 “DISCO MUSIC MADE IN BRAZIL”: A DISCOTEQUE A década de 1970 foi musicalmente marcada pelo declínio do rock psicodélico impulsionado pelas sucessivas mortes dos ícones ascendentes como Jimy Hendrix e Janis Joplin1. Após essas perdas, a música pop se enfraqueceu artisticamente e presencia a volta ao conservadorismo das baladas românticas. Dentro dessa perspectiva, vieram as canções com violinos chorosos interpretados por nomes que – advindos ou não do rock – indicavam uma volta ao romantismo perdido pela psicodelia reinante dos anos 1960. Grupos como, os Bee Gees e Mamas And The Papas, faziam sucesso com canções que falavam de amor ou de outros temas amenos. Paralelamente a essa tendência pop a soul music afro-americana, consolidada desde os anos 1960 com o apoio da gravadora Motown2, também sofre transformações. Seu maior expoente, James Brown reestrutura o estilo do precursor Little Richard e cria no final dos anos 1960 o funk. O funk utilizava modernas harmonias com os sons de contrabaixo, metais e bateria. E o arranjo do gênero priorizava o suingue, consolidando sua vocação de música para dançar.3 Aliado à renovação musical do funk, novas temáticas surgem na soul music pela influência do movimento The Sound of Philadelphia ou phillis sound. O movimento liderado pelo músico Barry White trazia o romantismo e a sensualidade como mote poético nas composições. Sendo assim, o funk se constitui ainda no início dos anos 1970 como um sub-gênero da soul music. Em meados da mesma década grupos musicais, como os norte-americanos Earth Wind & Fire, KC & The Sunshine Band, Chic e o inglês Kool & The Gang, passam a utilizar sintetizadores eletrônicos inspirados pelos alemães do Kraftwerk4 concretizando o aparecimento da disco music. A disco music definida como gênero musical oriundo do funk5 e conseqüentemente sub-gênero da soul-music6 foi rapidamente assimilado pelas discotecas. Elas eram a 1 MOTTA, N. apud, HOLLANDA, H. B.; PEREIRA, C. A. M. Patrulhas Ideológicas: arte e engajamento em debate. São Paulo: Brasiliense, 1980. p. 39. 2 A gravadora lançou nomes como Jakson Five, Steve Wonder, Marvin Gaye, Supremes, Temptations. 3 “No inglês coloquial, funk significa forte odor, particularmente sexual, que pode ser associado ao suor de quem dança com entusiasmo”.FUNK. Disponível em: < http://geocities.yahoo.com.br/vinicrashbr/artes/musica/funk.htm > Acessado em: 20 jan. 2003. 4 “Eles são (...) os verdadeiros inventores do som discoteque”. BARROSO, J. O rock para o fim do mundo. Somtrês. São Paulo, n. 11, fev. 1980, p. 71 5 “A disco não passa de um funk amenizado para o consumo da massa”. In: ESSINGER, S. SoulBrasil: o balanço dos blacks se aclimata nos trópicos. Disponível em: <http://www.cliquemusic.com.br> Acessado em: 5 jun. 2001. 6 grande novidade de Nova York em meados dos anos 1970. As discotecas eram localizadas nos bairros mais afastados da cidade porque necessitavam de um grande espaço para abrigar a vasta pista de dança. A associação entre esse espaço de sociabilidade e o gênero musical fica bastante evidente, pois o próprio nome disco deriva da abreviação da palavra francesa discothèque: “Invenção francesa de cerca de duas décadas (...) compõe-se de som de todo volume, decoração luxuosa (...) luzes estonteantes e bolhas de sabão que se desprendem do teto”.7 Como se percebe, a batida dançante da disco e a discothèque são indissociáveis por definição. Mas as inovações continuaram e a disco music segmenta-se ao longo dos anos 1970. Além precursores grupos diretamente associados ao funk, como o Earth Wind & Fire, KC & The Sunshine Band, Chic e Kool & The Gang, surgem nomes feitos exclusivamente para as pistas de dança, como o Village People. Nessas composições a criatividade era escassa, predominavam as repetições de frases e de melodias. Havia também as sensuais músicas orquestradas de Barry White, com destaque para You're My First, My Last, My Everything e os mega sucessos de Bee Gees, Donna Summer e Gloria Gaynor. Paralelamente ao surgimento do movimento disco surge na Suécia o ABBA, quarteto que usava as iniciais dos nomes dos seus cantores como um acrônimo8. O grupo consolidou seu sucesso mundial após a vitória no concurso musical Eurovision, na Inglaterra em 1974 com a composição Waterloo9. O ABBA cantava músicas românticas e dançantes com o constante uso de teclados, mas não pode ser considerado como integrante do movimento disco, pois esse tem nos Estados Unidos a sua real origem. A disco music apresenta-se musicalmente limitada, as letras são ingredientes acessórios, frases melódicas e curtas, repetidas indefinidamente justamente para não atrair sobre si a atenção e deixar que ela se concentre na batida. Segundo o DJ Rui TAVEIRA, a base da disco é o groove: “ encontro de sons percussivos em contra-tempo (baixo, atabaques, percussão) com as batidas, os beats”10. O antropólogo Gino STEFANI explica que a finalidade da “discoteque é a de fazer dançar e não a de ser ouvida. (...) independentemente do que ela diz, ela entretém as pessoas sem maiores compromissos, 6 BLACK music. Disponível em: < www.usinadorock.com.br > Acessado em 22 fev. 2003. Vida moderna. Veja. São Paulo, 16 mar. 1977. p. 55. 8 Conjunto formado por Anni-Frid (Frida) Lyngstad e Agnetha Faltskog nos vocais, Bjorn Ulvaeus na guitarra e Benny Andersson nos teclados. 9 ABBA. Disponível em: < http://www.mduartskog.hpg.ig.com.br/biografia.html > Acessado em: 03 jun. 2002. 10 TAVEIRA, R. História da disco music. Disponível em: < http://www.instantreplay.hpg.ig.com.br/entretenimento/17/index_int_6.html > Acessado em: 15. jan. 2003. 7 7 o que importa é dança”.11 A possibilidade de dançar significa um retorno à função social primária da música popular. O historiador Marcos NAPOLITANO explica que no início do século XX a dança representava o “elemento catalisador das reuniões coletivas”12 pois proporcionava “excitação corporal”13. Se considerarmos a dança como a alegoria das relações sexuais de uma época, a década de 1970 deixou essa imagem: a mulher livre embalando o próprio corpo e o homem contorcendo-se em gestos que no passado eram tradicionalmente femininos. Mas o prazer estimulado pela liberação corporal veiculada nas canções disco rendeu-lhe desprezo por parte dos críticos. Essa repulsa foi causada devido à posição assumida pela música popular na década anterior, quando esteve mundialmente preocupada com as questões políticas e sociais14. Sendo assim, a sua função social estava voltada para a conscientização dos ouvintes e não para o entretenimento. A disco music rompe com padrões, gerando um confronto entre head music da década de 1960 e a body-music do final dos anos 197015. Os jovens dessa década preferiram usar o corpo, ao contrário de seus antecessores, que usaram o som e a voz. O movimento corporal foi a mais evidente forma de expressão da juventude dos anos 1970. A recusa ao entretenimento e ao prazer de alguns observadores do período, relembram as críticas Adornianas relativas à “função alienante”16 da música popular proporcionada pela obediência rítmica. No caso da disco, essa característica se mostra bastante acentuada, pois o ritmo é a sua principal característica. No entanto, MARTINBARBERO entende que as críticas de Adorno relativas ao prazer estão aprisionadas a uma aristocracismo cultural que nega “a existência de uma pluralidade de experiências estéticas e uma pluralidade de modos de fazer e usar socialmente a arte”.17 Portanto, deve-se entender que a função social da arte não é única e os seus diversos usos não devem ser colocados sob forma hierárquica, como previa Adorno. O gênero musical disco está intimamente ligado à dança não só por definição, mas pelo ritmo que estimula o prazer físico fazendo “a música penetrar no corpo”.18 Nesse ambientes a presença de uma atração era desnecessária, pois os próprios freqüentadores 11 STEFANI, G. Para entender a música. Rio de Janeiro: Globo, 1989. p.27. NAPOLITANO, M. História e música: historia cultural da música popular. Belo Horizonte: Autentica, 2002. p. 13. 13 NAPOLITANO, História..., p. 11 14 No Brasil a MPB, na América Latina a Nueva Cancion e nos Estados Unidos o Folk. 15 SOUZA, T. Brasil: um penetra na festa da discoteca. Somtrês. São Paulo, n. 6, jun. 1979. p.63. 16 ADORNO, T. apud NAPOLITANO, História..., p. 28 17 BARBERO, J. M. Dos meios às mediações. Rio de Janeiro: UFRJ, 1997.p. 70 18 STEFANI, op. cit., p.27. 12 8 eram as “estrelas”, denotando a característica “narcisista da disco”.19A década de 1970 foi chamada, meio ironicamente, de “década do eu”.20 As pessoas procuraram fazer tudo sozinhas, reuniam-se aos milhares nas discotecas para se contorcerem na dança, mas cada um por si. O filósofo Walter BENJAMIN foi pioneiro em detectar “o prazer de estar na multidão”21, justamente como acontecia nesses espaços de sociabilidade típicos da década de 1970. Como complemento do exibicionismo coletivo, as pessoas se apresentavam com vestimentas coloridas e brilhantes. O vestuário pautava-se na noção de luxo, o brilho fazia parte da essência da disco.22 Nas discotecas evidenciava-se a volta do chic, “a possibilidade do brilho da maquiagem e das roupas reluzentes”.23 Mas a alegria coletiva poderia ser proporcionada não apenas pelo ritmo da música, mas também com o auxílio de drogas estimulantes. A droga funcionava como o que GILBERT e PEARSON chamaram de "tecnologias química de prazer".24 Segundo Tárik de SOUZA “a discoteque também corresponde (...) a uma troca de vícios: o descenso da contemplativa maconha pela cocaína, que concita à atividade e agitação”.25 A cinematografia norteamericana recentemente retratou essa característica do movimento disco na produção de 1998, Studio 5426. Mesmo considerado superficial, o filme conseguiu o clima, o visual e o estilo da década. Beth FERREIRA considera que “o filme mostra tudo o que se passava na discoteca, do sexo explícito nas arquibancadas, à indiscriminação das drogas, em particular a cocaína”27. Em oposição ao movimento disco, a Inglaterra ofereceu uma resposta à música alienada de origem norte-americana28. O punk, movimento de atitude contestatória surgiu em 1975 e foi visto como um sintoma da crise econômica vivida nas regiões operárias do 19 SOUZA, T. Brasil..., p. 61 SCHILLING, J. VON. Disco-mmunity, or i’m OK, you’re OK, America’s OK, so let’s dance.In: NACHBAR, J.; WEISER, D.; WRIGHT, J. L.The popular culture reader. Ohio: Bowling Green University Popular Press, 1978. p. 260. 21 BENJAMIN, W. apud BARBERO. op. cit., p. 78. 22 BAHIANA, A. M. Nada será como antes: MPB nos anos 70. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. p. 250 23 SOUZA, T. Brasil..., p. 63. 24 GILBERT, J.; PEARSON, E. apud, DÍAZ, A. L. La creación musical dance. Disponível em: < http://inicia.es/de/mondopop/Amparo.rtf > Acessado em: 30 jun. 2002. p. 8. 25 SOUZA, T. Brasil..., p. 63. 26 CHISTOPHER, M. Studio 54. (54). Estados Unidos, 1998. 27 FERREIRA, B. Studio 54 mostra hedonismo dos anos 70. Disponível em: < http://www.terra.com.br/cinema/drama/studio54.htm > Acessado em: 20 jan. 2003. 28 Nos Estados Unidos, Nova York também assistiu o surgimento de nomes associados ao punk, como os Ramones Mas o punk nova-iorquino era visto apenas como um novo som, um rompimento com o rock nos anos 1960. SEX Pistols. Disponível em: < http://www.projetoseto.hpg.ig.com.br/psex.htm > Acessado em: 20 fev. 2003. 20 9 Reino Unido29. A primeira banda do gênero “não foi uma banda como tantas outras surgidas da vontade de alguns jovens de montar um grupo musical”.30 Em 1975 o empresário londrino Malcom MacLaren reuniu aleatoriamente quatro jovens freqüentadores de sua loja de roupas de couro e criou o Sex Pistols. Mas as canções da banda eram de fato provocativas e contestavam principalmente a forma de governo britânica. Em 1976, com o lançamento do single Anarchy In The Uk, a banda ganhou o grande público. Pela primeira vez alguém tinha coragem de ser tão agressivo ao governo inglês publicamente. Dessa forma, a banda foi adotada como símbolo da insatisfação social e crítica ao regime. Antes do Sex Pistols a palavra punk era somente uma gíria inglesa, que tinha seu significava pessoa desordeira, objeto inútil, obsoleto, sem valor. Após o surgimento do Sex Pistols punk significa “estilo de música muito alta, agressiva e vibrante, originária do final da década de 1970 e associada com protestos contra o status quo e contra o sistema”31. Além disso, o punk foi responsável pela renovação do rock. No fim da década de 1970 vários nomes do rock estavam se relacionando com o fenômeno disco, como os Rolling Stones, Kiss, Pink Floyd e Paul McCartney. Essa ânsia por renovação é bastante visível nas palavras de Joe Strummer, vocalista do The Clash: “Todos procuravam algo diferente, que realmente passasse a realidade [social e política] nas músicas. Aí a música rugiu vinda das ruas da cidade. Os cabelos compridos e a música bonita davam lugar ao culto raivoso do fracasso e do ódio”.32 No final da década de 1970 a cena musical internacional apresenta duas tendências: o punk inglês de atitude anti-estrablisment e a alienada disco norteamericana. A disco music estava limitada às discotecas, mas em 1977 o lançamento do filme Os Embalos de Sábado à Noite33, a disco torna-se o gênero musical predominante mundialmente até o início dos anos 198034. No Brasil, de fato a opção foi pelo ritmo dançante, como asseguram os dados da Associação Brasileira dos Produtores de discos. Em 1978 dos 30 álbuns mais vendidos em São Paulo e Rio de Janeiro, 16 eram de som 29 SOUZA, T. Brasil..., p. 61. SEX Pistols. Disponível em: < http://www.ramonepsycho.hpg.ig.com.br/sexpistols.html > Acessado em: 20 fev. 2003. 31 OXFORD Advanced Learner's Dictionary (1992). Disponível em: < http://www.portaldorock.com.br/especialsexpistols1.htm > Acessado em: 02 fev. 2003 32 STRUMMER, J. Entrevista. Disponível em: < http://www.projetoseto.hpg.ig.com.br/psex.htm > Acessado em: 20 fev. 2003. 33 Ver mais sobre a disseminação da disco no capítulo II. 34 “O rock, coisa sabida acabou. (...). Hoje as discotecas vão tomando com rapidez o lugar dos grandes concertos superproduzidos como forma de emular e entorpecer coletivamente”. BAHIANA, A. M. Rock que arde, queima e fede. Somtrês. São Paulo, n. 1, jan. 1979. p.83. 30 10 discoteca.35 Nessa soma figuravam principalmente as coletâneas, a grande novidade da indústria fonográfica. Essa escolha promove a fúria de alguns críticos, especialmente Tárik de SOUZA que protestava afirmando que a disco “atende a todos os apelos de ascensão social ilusória e escapista”.36 A escolha pelo gênero disco music parece bastante contraditória, já que país passava por um momento político de redemocratização e se esperava um fortalecimento do engajamento político nas artes. Dessa contradição, surge uma grande polêmica sobre a música disco, a oposição entre música para pensar – MPB37 – e a música para dançar. Mas a onda disco passa a influenciar a MPB, especialmente os ex-tropicalistas Caetano Veloso com a canção Odara e Gilberto Gil com o disco Realce gerando a grande polêmica da Patrulhas Ideológicas.38 A discoteque, assim como outros gêneros pop, mostra-se como um segmento musical mundializado, considerado plágio de um modelo internacional. Para a socióloga Márcia DIAS a discoteca caracteriza-se como uma representação da Mundialização da Cultura39, pois ela surge no Brasil em função da explosão do gênero nos EUA e no mundo. Essa efetivação dos gêneros mundializados nos meios de comunicação ocorrida no final da década de 1970 colaborou para a consolidação da cultura pop no cenário musical brasileiro. Uma das razões para a ascensão da música pop foi a ausência de movimentos musicais brasileiros na década de 1970, conforme apontou André MIDANI: “Depois da fermentação crescente dos anos 60, entramos numa década que não há ‘movimentos’”.40 Essa diversificada produção vai permitir à indústria fonográfica atingir, em 1979, número recorde de 64.104 milhões de unidades vendidas, dos quais 23.480 milhões eram de música estrangeira e 40.624 milhões de música nacional41. Num momento de plena situação de recessão econômica causada pelo fim do milagre brasileiro42. Além da moda disco, outros gêneros musicais passavam a dominar uma parte substancial da industria fonográfica. Movimentos locais como o Black Rio que reunia 35 Parada Somtrês: O Blefe das paradas de sucesso. Somtrês. São Paulo, n. 2, fev. 1979. p. 98. SOUZA, T. Brasil..., p. 63. 37 Ao longo dos anos 1970 a MPB continuou exercendo seu papel contestatório em relação ao regime militar, funcionando como uma verdadeira “trilha sonora” da Abertura. NAPOLITANO, M. Cultura brasileira: utopia e massificação. São Paulo: Contexto, 2001. 38 Ver mais sobre Patrulhas Ideológicas no capítulo III. 39 DIAS, M. Os donos da voz: indústria fonográfica brasileira e mundialização da cultura. São Paulo: Boitempo, 2000. p. 76. 40 MIDANI, A. apud BAHIANA, Nada..., p. 260. 41 DIAS. op.cit., p. 77 42 “Nunca se ouviu tanta música como agora”. SOUZA, O. A fértil babel da cultura pop. Somtrês.São Paulo, n. 9, set. 1979. p. 91. 36 11 adeptos do funk e da soul-music norte-americana, passavam a ganhar repercussão nacional43. Essa crescente segmentação do mercado fonográfico brasileiro fica bastante evidente no periódico mensal especializado em música intitulado Somtrês. Lançada em janeiro de 1979. A revista apresenta a divisão entre pop e MPB, sendo que as seções dedicadas à música pop ficam restritas as peças internacionais. No Brasil a disco music começou a ser divulgada nas discotecas44, assim como ocorrera anteriormente nos Estados Unidos. A primeira discoteca brasileira foi a New York City Discoteque em Ipanema no Rio de Janeiro. Mas foi Nelson Motta que fez história ao inaugurar a Frenetic Dancin’Days Discothèque na mesma cidade no ano de 1976. No Dancin’ surge a primeira expressão nacional do gênero: as Frenéticas. Ao inventar o sexteto feminino, o jornalista abrasileirou a fórmula americana e transformou disco em discoteque. Além das luzes coloridas, do som ensurdecedor e do disc-jóquei 45, o Dancin’ possuía um importante diferencial, como descreveu Ana Maria BAHIANA: Por volta da meia-noite, depois mais uma vez, às duas, e por espaços cada vez maiores, a discoteca enlouquecia: as seis garçonetes que, minutos antes, se espremiam entre as mesas com imensas bandejas de vodca, caipirinha e sanduíches, estavam de repente no palquinho tipo 46 tablado, pernas pra lá e pra cá, mais fingindo que cantando uma seleção infernal de rocks. O show das Frenéticas, aliado à notoriedade de Motta no meio artístico fez o Frenetic Dancin’ Days Discothèque atrair um imenso público e se transformar em febre no Rio de Janeiro: “Misturando ao jovem público da Zona Sul que enchia a casa, estrelas e personagens das noites cariocas, músicos, intelectuais e esportistas”.47 Apesar do sucesso, o Dancin’ Days durou apenas uma temporada. Situada num bairro residencial do Rio de Janeiro os constantes problemas com vizinhos contribuíram para o fechamento da casa. A decepção foi geral da capital carioca, como descreve a matéria da revista Veja de 1977: 43 “O Movimento Black Rio se dissemina pelo país através de suas filiais Black São Paulo e Black Porto Alegre. Mas o gênero ganha projeção nacional quando as gravadoras WEA, CBS e Phonogram passam a investir nesse segmento musical”.In: DIAS. op. cit., p. 76 44 Entre as discotecas mais conhecidas do Brasil estavam: Banana Power (São Paulo e Santos), Papagaios Disco Club (São Paulo) e Hippopotamus (Rio de janeiro). 45 “No início, eles ficavam num cantinho escuro, apertado entre pilhas de disco. (...). Hoje, ocupam lugar de destaque da casa, bem visíveis para o público, e mudaram até de nome: os antigos discotecários são agora os discjóqueis”. Comportamento: A Travoltecamania. Veja. São Paulo, n. 521, 30 ago. 1978, p. 52. 46 BAHIANA, Nada..., p. 249 MOTTA, N. Noites tropicais: solos, improvisos e memórias musicais. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. p. 297. 47 12 O problema é que esse animado ponto de encontro, verdadeira maravilha noturna, criada pelo crítico musical Nelson Motta, fechou (...) Desde então, os surfistas andam sem o que fazer de suas noites. E por onde andarão as “frenéticas” moças soltas e descabeladas (...). Como se pode viver 48 sem o Dancing´Days de Nelson Motta? Com o fechamento da boate, as “alegres e divertidas”49 garçonetes/cantoras do Dancin’ gravaram um compacto simples pela recém-inaugurada gravadora WEA50. Agora as Frenéticas não seriam mais exclusividade do Rio de Janeiro: “sua energia borbulhante fora domesticada, canalizada, coreografada”.51 Ainda em 1978, as vendas chegaram a 140 mil cópias de seu Lp e 32 mil do avulso A Felicidade Bate à Sua Porta52. Essas cifras conduziram as moças ao estrelato. O primeiro álbum das Frenéticas possuía um repertório de alto nível, com canções de Rita Lee e Luiz Gonzaga Júnior, autores dos primeiros sucessos das Frenéticas: Perigosa e A Felicidade Bate à Sua Porta, respectivamente. A Felicidade... era um samba de Gonzaguinha que ironizava o milagre brasileiro. A música se transformou no primeiro grande sucesso popular das Frenéticas: “O trem da alegria promete/ Mete, mete, mete e garante/ Que o riso será mais barato/ Agora, agora, agora em diante”53. Na versão das Frenéticas, música ganhou uma batida disco, com as características de repetição de frases e sons eletrônicos. Além disso, “tudo que elas cantavam ganhava novo sentido ambíguo e sacana, alegre e libertário”.54 As repetições com a palavra mete fazem referencia ao erótico, ao sexual. O erotismo é uma das fundamentais características do repertório das Frenéticas, como da própria música disco norte-americana.55 Sendo assim, fica evidente a similaridade entre o gênero musical importado e o made in Brazil. No entanto, não podemos considerar as Frenéticas como uma réplica de um modelo americano. O grupo formado por Nelson Motta possuía inspiração num gênero musical disco, mas a forma com que se apresentava era diferente como explica o próprio jornalista: “as Frenéticas não eram uma imitação das estrelas internacionais de disco music, eram uma versão pop das vedetes de teatro de revista, das estrelas de cabaré e de chanchadas da 48 Rio em alta estação. Veja. São Paulo, 19 jan. 1977, p. 64. MOTTA, op. cit., p. 295. 50 André Midani, amigo pessoal de Nelson Motta era o presidente da gravadora. 51 BAHIANA, Nada..., p. 252. 52 Ibid., p. 249. 53 FRENÉTICAS. Frenéticas. Rio de Janeiro: Atlantic/WEA, 1977. 1 Disco. 54 MOTTA, op. cit., p. 249. 55 DYER,R. In defense of disco. In: FRITH, S.; GOODWIN, A. On record: rock, pop and the written word. London: Routledge, 1990. p. 414. 49 13 Atlântica, em ritmo de rock e discoteca”56. Podemos afirmar que embora as Frenéticas seguissem o gênero disco, eram consideradas artistas de MPB.57 Eram valorizadas58, ocupavam o topo da hierarquia sócio-cultural brasileira, porque possuíam músicas de artistas renomados e eram respeitadas pela crítica especializada. Eram associadas, ao que Dwight MACDONALD descreve como midcult, “que remete ao universo dos valores pequeno-burgueses”.59 Nesse sentido, é ilustrativa a crítica de Okki de SOUZA editada na Revista Somtrês: Definitivamente, criando padrões de conduta da juventude brasileira urbana, a explosão dessas seis garotas foi mais importante para a MPB do que elas próprias imaginam!(...) Ironicamente, na lógica porra-louca do show biz, as Frenéticas sempre foram obrigadas a conviver com o fantasma da instabilidade de grupo efêmero, espécie de overnight sensation do mês, modismo de luxo da 60 temporada. Fica evidente que as Frenéticas tiveram uma grande importância para a música brasileira no sentido de liberar a arte da função social política, engajada. Nas letras alegres e divertidas, as cantoras se limitavam a expressar a alegria, o prazer e a liberdade. Dentro dessas temáticas encontravam-se assuntos da nova ordem social. Principalmente questões sobre a sexualidade feminina. Como por exemplo, na canção Perigosa de Rita Lee, Roberto de Carvalho e Nelson Motta: “Eu sei que eu sou/ Bonita e Gostosa/ E sei que você me olha e me quer (...) Eu vou você ficar louco, muito louco, muito louco/Dentro de mim!”61. Perigosa é uma música sensual e provocativa. Seus versos tiveram a ordem alterada para fugir da censura, “dentro de mim” foi colocado como o primeiro verso. Em 1977 a censura ainda existia e perseguia artistas. No caso das Frenéticas, os motivos não eram políticos, mas de ordem cristã – atentado ao pudor e pela moral e dos bons costumes. As Frenéticas eram uma peça importante nas gravadoras, eram artistas de marketing. Na música pop eles aparecem como “moda e trazem consigo um esquema promocional com o objetivo de vender milhares de cópias, mesmo que em tempo 56 MOTTA, op. cit., p. 302. A rigor, quase tudo poderia ser considerado MPB. Todos os gêneros e estilos, todas as tradições musicais, todas as posturas, conservadoras ou radicais, poderiam ter seu lugar no clube, desde que prestigiada pelo gosto da audiência que definia a hierarquia musical. NAPOLITANO, História..., p. 73 58 Literalmente valorizadas, seus shows passaram de “36000 cruzeiros para uma faixa de 81000 e 100000. Música: Bolsa de Valores. Veja. São Paulo, n. 501, 12 abril. 1978, p.103. 59 MACDONALD, D. apud COELHO, T. O que é indústria cultural. São Paulo: Brasiliense, 1983. p. 14 60 SOUZA, O. Crítica: MPB. Somtrês. São Paulo, n. 11, nov. 1979. p. 90. 61 FRENÉTICAS. Frenéticas. Rio de Janeiro: Atlantic/ WEA, 1977. 1 disco. 57 14 reduzido”.62 Sendo assim, os artistas de marketing representam uma ameaça temporária aos consagrados músicos da MPB. Para Márcia DIAS, essa dicotomia entre cast estáveis e artistas de marketing é visto como uma relação interdependente, sendo que em “torno dessas duas vias de ação que a grande indústria brasileira do disco (...) organiza a sua produção”63. “São artistas que só existem porque nós pensamos em formar grupos para um momento do mercado. (...). O projeto de marketing é para um determinado período”.64 Portanto, ainda que as Frenéticas fossem consideradas MPB elas possuíam nítidas características de artistas de marketing já que surgiram a partir do sucesso internacional da disco. Considerado um ritmo alienado e desprovido de conteúdo político, a discoteque das Frenéticas também era considerada plágio de um modelo internacional. Mas ao longo dos anos “esse gênero musical lançou raízes fortes e profundas, se alastrou por culturas”.65 E mesmo que existissem pontos em comum entre a disco norte-americana e a brasileira, “refletir sobre a mundialização da cultura é de alguma maneira se contrapor (...) à idéia de cultura nacional”.66 Nesse sentido, torna-se pertinente a análise do historiador Antonio TOTA, relativa ao imperialismo cultural norte-americano: Um povo só incorpora um conjunto geral da sua cultura. Isso significa que a assimilação cultural não se faz por imitação, mas por um complicado processo de recriação. A assimilação cultural nunca ocorre em bloco. Um povo não aceita todos os elementos culturais do outro, mas apenas em parte, e, mesmo assim, dando a eles novos sentidos. Essa assimilação envolve, portanto, uma 67 escolha e recriação . Historicamente a formação da nossa música popular constituiu-se de uma grande mescla cultural, “a música urbana brasileira nunca foi ‘pura’. (...) ela nasceu como resultado de um entrecruzamento de culturas”.68 No final da década de 1970 as críticas ao fenômeno discoteque se assemelham ao ódio que a juventude engajada sentia pela jovem-guarda. Nos anos 1960 o “público estudantil avesso às formas culturais que pudessem ser relacionadas a uma indesejável ‘invasão cultural imperialista’ (...) o [iê-iê-iê] era uma forma musical tida como nefasta pelos setores nacionalistas, que a identificavam 62 DIAS, op. cit., p. 78. Ibid. p. 79. 64 MARYNARD, M. apud DIAS, op. cit., p. 79. 65 SOUZA, O. A fértil..., p. 91. 66 ORTIZ, R. Mundialização e cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 116. 67 TOTA, A. P. O Imperialismo sedutor: o imperialismo do Brasil na época da segunda guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p.193. 68 NAPOLITANO, História..., p. 48. 63 15 ao domínio cultural imperialista”. 69 Mas alguns críticos acreditam que o repúdio a disco adquiriu proporções inéditas: “nenhum fenômeno musical foi tão contestado. (...) a forte reação ao disco demonstra apenas que o novo movimento mexeu fundo com os padrões existentes. (...). As críticas se repetem sempre as mesmas acusações (...). O termo baticum de hoje, foi o iê-iê-iê de ontem”.70 Em 1978 de 10 músicas tocadas no eixo Rio/SP, seis eram discoteca71. Nem mesmo no carnaval, a escalada dos hits da discoteca vai se tornando tão absoluta, “as rádios cariocas preferiram a música importada”.72 Para muitos, o maior benefício da música discoteque foi abrir o mercado pra as formas musicais de “bom gosto”, especialmente o samba; “1978 não foi apenas o ano da discoteca (...) foi, igualmente o ano dos sambistas” 73 , sendo que nomes como Beth Carvalho, Alcione, Clara Nunes e Cartola elevaram suas vendas como nunca. Assim, em 1979, a discoteque já dava sinais de cansaço, como aponta o jornalista Maurício KUBRUSLY: A moda discoteca (lembra?) acabou beneficiando o músico brasileiro, contrariando todos os que acreditavam o inverso. (...) Porque a má qualidade foi se tornando evidente demais, o tum-tum da discoteca foi ficando unânime demais, e a paciência de todos se esgotou mais depressa. Também por isso, do outro lado, de Roberto Carlos a Chico Buarque, de Maria Bethânia a João Nogueira, 74 todos foram superando seus próprios recordes. Outras expressões musicais relacionadas ao som discoteque surgiram no Brasil após as Frenéticas. Considerados pastiches, “mistura de sentimentos e vulgaridade que a verdadeira arte abomina”,75 como As Harmony Cats que cantavam as músicas do Bee Gees e Gretchen. A rebolativa Maria Odete, ou Gretchen iniciou sua carreira em 1978 e alcançou o sucesso no ano seguinte com Freak lê boom boom. Em 1980 com Conga, Conga, Conga. Gretchen era um símbolo sexual e continuou com os sucessos em 1982 com a Melô do Piripipi chegando a Argentina, Paraguai e Uruguai76. Harmony Cats e 69 HOLLANDA, H. B.; GONÇALVES, M. A. Cultura e participação nos anos 60. São Paulo: Brasiliense, 1985.p. 54. 70 CARVALHO, C. A. Discoteca, a trilha para a nossa liquidação total. Somtrês. São Paulo, n. 4, abril. 1979. p. 62. 71 Parada Somtrês. O Blefe das paradas de sucesso. p. 97. 72 Id. 73 Id. 74 KUBRUSLY, M. Parada Som três: Primeiro balanço de 1979. Somtrês. São Paulo, n. 8, ago. 1979. p. 104. 75 BARBERO, op. cit., p. 70. 76 FRENETICAS. Disponível em:< http://www.geocities.com/Sunset/Strip/Paims/Frene2.html > Acessado em: 11 nov 2000. 16 Gretchen se classificavam também como “Falsos Importados”77. Depois das Frenéticas, Lady Zu (ex-Zuleide) foi quem mais se destacou, com Hora da União e A Noite Vai Chegar. Lady Zu fazia uma ponte entre o funk e a disco. Essa característica é bastante marcante na canção Hora da União (samba/soul): “Agora vem dançar que a banda começou/É o samba soul que o outro brother me ensinou/Vem dançar, vem dançar/Vem dançar irmão/É a vez do samba soul/Samba-soul”. A letra define a origem étnica do funk, fazendo uma ligação com soul norte-americano. O último verso é particularmente significativo. Ele sugere um tipo de ação coletiva entre “irmãos“ para acabar com o preconceito: “Este é o momento certo/Nossa libertação/Se a gente usar a força dessa canção”78. Apesar de receber de Chacrinha o título de “Donna Summer brasileira”79, Lady Zu encerrou a carreira na discoteque em 1979. Com o fim do movimento disco no Brasil e no mundo, vários nomes do gênero foram esquecido. Aqui as Frenéticas conseguiram se manter na cena musical até 1984 fazendo o estilo besteirol. Principalmente a partir do álbum Babando Lamartine de 1980, onde o grupo fazia uma releitura das clássicas marchinhas de carnaval do compositor. Nessa linha, surgem os grupos cariocas Gang 90 e Blitz. As duas bandas possuíam características estéticas do nascente rock nacional, mas pregavam a descontração e a alegria. Deve-se considerar que a Blitz era liderada por Evandro Mesquita, um ex integrante do grupo de teatro Astrubal Trouxe o Trombone. A Gang 90 foi uma invenção do jornalista Júlio Barroso para sintetizar a sua música-pra-pular-brasileira80. Além disso, a revolução musical do punk promovida pelos Sex Pistols e The Clash na Inglaterra em 1976 começa a ecoar no país. O núcleo forte desse estilo se concentrou em São Paulo. Na periferia paulistana, surgiram bandas como Olho Seco, Cólera, Ratos de Porão e os Inocentes. Em meados da década de 1980, o movimento punk paulistano passou a viver seu momento de dispersão e retrocesso. Mas as idéias punk já haviam germinado em outras cidades brasileiras, dando origem a significativas bandas, como Aborto Elétrico (Brasília), Camisa de Vênus (Salvador) e Replicantes (Porto Alegre). Anos mais tarde aparecem nomes como a Legião Urbana e o Capital Inicial (ambas surgidas do Aborto), 77 ANDREATO, E.; SOUZA, T. Rostos e gostos da música popular brasileira.Porto Alegre: L& PM, 1979. p. 193. 78 VÁRIOS. Sem Lenço Sem Documento. Rio de Janeiro: Som Livre, 1976.1 Disco. 79 LADY Zu. Disponível em:< http://www.geocities.com/SunsetStrip/Paims/9855/LadyZu2.html.> Acessado em: 01 de nov. de 2000. 80 BARROSO, J. apud MOTTA. op. cit., p. 301. 17 Plebe Rude, Ira! e Titãs com trabalhos inspirados pela estética punk, negam a herança dançante da disco e consolidam um estilo próprio: o BRock.81 A decadência da disco music aconteceu mundialmente no inicio da década de 1980. A partir, diversas tendências vão dividir a cena musical. Na Inglaterra o punk fundese aos teclados e sintetizadores eletrônicos gerando a moderna música eletrônica: o techno. Os maiores expoentes foram as bandas Talking Heads e Depeche Mode que com o intenso uso de teclados produziam uma a batida não muito dançante relembrando os pioneiros do Kraftwerk. O rock ressurge com os progressivos do Rush. A banda canadense inspira-se nos precursores Pink Floyd e criam um som único, com destaque absoluto para os teclados. Nessa mesma época, o funk criava uma nova onda nas pistas de dança. O break levava os dançarinos a fazer malabarismos com o corpo deitado no chão. Michael Jackson foi o grande responsável pela sua popularização com o álbum Triller de 1981. Em meados na década de 1980, essas tendências se uniformizam num único movimento pop: a New Wave. Grupos como The Police, New Order, Gênesis passam a agregar um ritmo dançante às experimentações techno. A New Wave, basicamente, encontra o equilíbrio entre música pra dançar e música pra ouvir. Ela fortaleça a criatividade e a técnica das composições, mantendo a possibilidade da liberdade do corpo. Portanto, pode-se afirmar que a disco, ao retornar às origens da função social da música popular, deixa seu legado para a música mundial. 81 Sobre a formação do rock brasileiro, ver mais em: DAPIEVE, A. BRock:O rock dos anos 80. São Paulo: 34, 1996. 18 3 DANCIN’ DAYS: A DISCOTECA NA TELA DA GLOBO O gênero musical discoteque foi responsável por unir diversos elementos dos meios de comunicação na disseminação de seu estilo. No Brasil, deve-se considerar fundamental o papel da Rede Globo de Televisão e da sua subsidiária a gravadora Som Livre no processo de recepção da disco music . A Rede Globo, detentora de grande audiência em todo o país consegue ao fim da década de 1970 “padronizar comportamentos de norte a sul”.1 Para a pesquisadora Márcia DIAS, a Som Livre surge como um mero artifício da Rede Globo para participar do mercado de discos2. Ao inserir determinadas músicas nas trilhas sonoras das novelas, a Globo conseguia unir um poderoso mecanismo de propaganda: a música passa a ser associada à imagem e ao próprio contexto da telenovela. Rita MORELLI reconhece que “nenhuma empresa do setor fonográfico teria condições financeiras de bancar essa divulgação”3, explicando assim como a Som Livre se torna líder do mercado fonográfico em apenas seis anos de existência4. Entre as telenovelas5 um caso excepcional de merchandising foi a novela das oito Dancing’ Days. Lançada em 1978, a trama de Gilberto Braga amparou o sucesso da canção homônima e divulgou a boate Frenetic Dancing’ Days Discothèque. Essa telenovela disseminou um conjunto de representações da cultura disco, principalmente a moda. Para muitos, “se for falar dos anos 70 e 80, terá que se falar em Dancin’ Days, até mesmo como uma referência cultural”.6 No dia 10 de julho de 1978 estréia na Rede Globo a novela Dancin’ Days. A trama central - a readaptação da ex-presidiária Júlia à sociedade e seu reencontro com a filha após 11 anos - era costurada com situações corriqueiras do dia-a-dia dos outros personagens, que representavam um povo brasileiro de maneira menos fantasiosa e mais real. Originalmente a novela se chamaria A Prisioneira, mas o escritor Gilberto Braga aceita a sugestão do diretor Daniel Filho para acomoda a trama na discoteca Dancin’ Days a fim de amenizar a história dramática da protagonista. Segundo Décio PIGNATARI 1 ÁVILA, C. R. A. A Teleinvasão. São Paulo: Cortez/UNIMEP, 1982. p. 88. DIAS, op. cit., p. 60. 3 MORELLI, R. apud DIAS, op.cit., p.76. 4 DIAS, op. cit., p. 60. 5 Canções relacionadas ao modismo discoteque já haviam aparecido em 1977, na trilha sonora da novela Sem lenço, sem documento com a canção A hora da união (samba-soul) de Lady Zu. Com o sucesso de Dancin’ Days a novela Feijão Maravilha (1979) continuou explorando esse gênero musical. 6 ALMEIDA, C. J. M.;ARAUJO, M. E. (Org.). As perspectivas da televisão brasileira ao vivo. Rio de Janeiro: Imago/Ed. Centro Cultural Candido Mendes, 1995. p. 129. 2 19 “o índice de audiência começou a aumentar quando a discoteca que dava nome à novela foi inaugurada, chegando aos 80 pontos”.7 A partir disso, a discoteca passou a ser o centro de grandes acontecimentos da novela: “Boa parte da novela das oito, Dancin´Days se passa dentro de uma discoteca”.8 É marcante o retorno de Júlia Mattos após alguns meses de prisão graças a uma infração de sua condicional. Nessa cena a personagem de Sonia Braga dança sensualmente na pista do Dancin’ Days confirmando a influencia do filme norte-americano Os Embalos de Sábado à Noite9. Para o sociólogo Renato ORTIZ essa referencia é explicada pelo fato da A hegemonia norte-americana, não se limita ao plano político – econômico, estando presente na indústria cultural. Dessa forma, “a indústria cultural, ao se desenvolver preferencialmente em solo americano, teria inventado um tipo de cultura irresistível, e pela sua extensão, portadora dos germes da universalidade. Caberia aos outros imitá-la”.10 O filme decretou mundialmente o início da Disco Fever, como propõem a matéria editada da revista Veja de 1978. A reportagem refere-se ao personagem central da produção norte-americana vivido por John Travolta como símbolo da era disco: a Travoltecomania. Para esse jornalista, o filme lançou mundialmente as características da disco e o Brasil seguia essa tendência com a multiplicação das discotecas11. A produção Os Embalos de Sábado à Noite12 chegou às telas em 1977 e contava a história de Tony Manero, um jovem que trabalhava numa loja de tintas e possuíam uma vida sem perspectivas. Mas nas noites de sábado se transformava no rei das pistas. Paulo CARVALHO define o filme como a expressão máxima do cafona, do kitsh.O jornalista critica a falta de consciência política da juventude que prefere usar o corpo como forma de expressão: “tudo é esquecido na noite de carnaval de todos os sábados. (...) Aqui basta saber dançar bem para conseguir respeito e admiração”.13 Jairo FLEXA compreende o filme como uma mera reciclagem de conhecidas situações hollywoodianas 7 PIGNATARI, D. Signagem da televisão. São Paulo: Brasiliense, 1984. p. 46. Comportamento: A Travoltecamania. p. 52 9 Embalos de Sábado à Noite (Saturday Night Fever). Direção de John Badham. Los Angeles, 8 1977. 10 ORTIZ, Mundialização..., São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 30. O poeta Carlos Drummond de Andrade chamou as discotecas de travoltecas numa crônica publicada no jornal O Globo em 1978. 12 Em 1978 é lançado Até que Enfim é Sexta, embora não tenha atingido o grande público, contava com a temática disco. 13 CARVALHO, P. Ilusão e Futuro. Disponível em: < http://www.geocities.com/Hollywood/Location/9137/critica.htm > Acessada em: 20 jan. 2003. Originalmente impressa na revista Visão. 24 jul. 1978. 11 20 baseadas em dramas individuais de jovens infelizes. Para ele, a novidade negativa fica por conta do “registro das manias das discotecas (...) com uma estética pasteurizada de um comercial de TV”.14 O roteiro do filme foi baseado num artigo publicado no jornal New York Post, em junho de 1976. O artigo de Nick Cohn, Tribal Rites of the New Saturday Night 15 falava de jovens do distrito de Bay Ridge, no Brooklyn, que toda semana escapavam de suas rotineiras vidas dançando e se libertando dos problemas numa discoteca local. As críticas negativas referentes ao conteúdo da trama de John Badham não interferiram na ótima receptividade do público. Até o final de 1978 o filme produzido com baixíssimo orçamento já havia faturado 108 milhões de dólares16. O sucesso de Embalos se pautou na atmosfera da discoteca 2001 onde Tony Manero dançava ao som dos clássicos da música disco. Entre as canções apresentadas no filme deve-se enfatizar as composições dos Bee Gees. Na capa do álbum duplo da trilha sonora do filme aparece em destaque a foto do trio juntamente com a figura do dançarino do Blooklyn. Essa ligação é explicada pelo fato de Robert Stigwood, além de produtor executivo do filme, era também produtor musical do grupo inglês. Além disso, o sucesso do filme foi beneficiado por uma hábil campanha de marketing, como destacou o jornalista Jairo FLEXA: “Sessenta dias antes [do lançamento do filme] estava na praça um compacto com parte da trilha sonora e um mês antes da estréia, o LP completo”.17 Dessa forma, após quatro meses de exibição nos cinemas norte-americanos, a trilha sonora do filme já tinha vendido mais de dez milhões de cópias, tornando-se o álbum mais vendido da época. 18 No Brasil, a trilha sonora de Embalos de Sábado à Noite foi o álbum mais vendido de 197819. Mundialmente, o álbum vendeu mais de 30 milhões de cópias. Tornando-se um dos álbuns mais vendidos de todos os tempos. As canções do filme apresentavam-se extremamente associadas à história do personagem central. A composição de Staying Alive faz alusão a influência do periódico nova-iorquino na vida noturna dos jovens suburbanos: “the New York Times' effect on man”. Segundo o autor da composição, Barry 14 FLEXA, J. A. Cinema: Uma zoeira. Veja. São Paulo, n. 513, 5 jul. 1978, p. 110. Ritos tribais da nova noite de sábado. 16 EMBALOS de sábado à noite. Disponível em: < http://www.geocities.com/Hollywood/Location/9137/embalos.htm > Acessado em: 20 jan. 2003 17 FLEXA, op. cit. p. 110. 18 EMBALOS... 19 CARVALHO, C. A. O mercado cresce. A qualidade, nem tanto. Somtrês. São Paulo, n.1, jan. 1979, p. 80. 15 21 GIBB "Nova York estava tendo aquele efeito no mundo todo”.20 As letras das músicas, além da forte batida disco, faziam referencia a sensualidade e ao poder de conquista do dançarino Tony Manero. A canção representa o amor pela dança e o envolvimento com o ritmo da discoteca. A canção Night Fever narra com precisão a dinâmica do personagem na pista de dança: Ouça a pista de dança /Há movimento em toda parte /Há algo acontecendo /E eu posso sentir /Nas ondas do ar /Tem dança lá fora /Se for algo que possamos dividir /Também podemos roubar /E aquela doce mulher da cidade /Ela se more através da luz /Controlando minha mente e minha alma /E quando você me procura /Sim, e o sentimento está brilhando /Então eu tenho os embalos da noite /Embalos da noite /E nós sabemos o que fazer /Me dê aqueles embalos da noite/Embalos da noite /Nós sabemos como mostrar /Aqui estou /Rezando para que este momento não acabe 21 /Vivendo muito bem da música /Que nasce do vento/Tornando-a minha . O reflexo imediato do sucesso da produção Embalos de Sábado à Noite incentivou o diretor Daniel Filho a ambientar a novela das oito Dancin’ Days na atmosfera da onda disco. A inspiração estrangeira pedia uma identidade nacional encontrada na discoteca de Nelson Motta: o Frenetic Dancin’ Days Discothèque. A escolha contribui decisivamente para o sucesso da novela. Apesar da novela se passar num ambiente alegre e descontraído, a trama era pautada na estética do drama, como afirmou a atriz Sonia BRAGA: “Gilberto Braga, não teve o menor pudor em pôr esses elementos de coincidências melodramáticos na trama”.22 Daniel FILHO afirmou que “Dancin’ Days teve um dos finais mais emocionantes de gravar (...). Houve momentos em que tive dificuldade de gravar closes dos atores, pois a emoção tomava conta deles”.23 Dessa forma, confirma-se a permanência das matrizes estéticas das telenovelas brasileiras, oriundas do melodrama. Podemos concluir que, assim como o filme norte-americano, Dancin’ Days não inovou a sua essência estética, mas trouxe uma nova referencia: a cultura disco. Márcia TONDATO considera que “as matrizes dos territórios de ficcionalidade diversificam-se porque com o processo de modernização, as referências simbólicas que 20 GIBB, B. Entrevista. Disponível em: < http://www.geocities.com/Hollywood/Location/9137/embalos.htm > Acessado em: 20 jan. 2003. 21 “Listen to the ground /There is movement all around /There is something goin' down /And I can feel it /On the waves of the air /There is dancin' out there /If it's somethin' we can share /We can steal it/And that sweet city woman /She moves through the light /Controlling my mind and my soul /When you reach out for me/Yeah, and the feelin' is bright/Then I get night fever/Night fever /We know how to do it/Gimme that night fever, /Night fever /We know how to show it /Here I am /Prayin' for this moment to last /Livin' on the music so fine /Borne on the wind /Makin' it mine”. VÁRIOS.Embalos de Sábado à Noite. Rio de Janeiro: Phonogram, 1977. 2 discos. 22 BRAGA, op. cit., p. 3 23 FILHO, D. Entrevista. Disponível em: < http://members.tripod.com/dancin_days/DDbastidores.htm > Acessado em: 08 fev. 2003. 22 afeiçoam com o imaginário coletivo”.24 Sendo assim, Dancin´Days utiliza novos elementos flexibilizando o melodrama com um estilo realista, mas sem recusá-lo completamente. A década de 1970 começa com a Rede Globo de Televisão rompendo com antigas fórmulas de ficção televisiva, “fazendo surgir uma televisão comprometida com o mercado, tanto no sentido comercial, na medida em que tinha uma responsabilidade com os anunciantes, como no sentido artístico, procurando proporcionar a seus telespectadores bons momentos de entretenimento”.25 Com a implementação do Padrão Globo de Qualidade a Rede Globo promove uma intensa modernização na forma de produzir as telenovelas. Para Carlos Alberto PEREIRA e Ricardo MIRANDA, o Padrão está associado ao estilo de vida pregado pela classe média do milagre brasileiro que clamava por modernidade em todos os sentidos.26 A fim de suprir a necessidade desse público, a Globo divide o horário das novelas de acordo com o tema e o público-alvo27. Essa segmentação foi promovida pelo Departamento de Pesquisa e Análise da Rede Globo com o objetivo de aumentar a audiência e monopolizar o mercado. Essa medida, atrelada à inovação tecnológica promovida na época colocou a emissora na liderança dentro do gênero. Segundo Silvia BORELLI, a Globo articulou-se num modelo primetime: “um padrão de programação voltado para a massa, para o público em geral, a partir do Jornal Nacional e do roteiro prescrito para o script da novela das oito”.28 O enlace proposto pela antropóloga deve ao fato do Jornal Nacional simbolizar a unidade nacional o que faria da Rede Globo a síntese da cultura nacional. A diversidade do telespectador da novela das oito ampliava os índices de audiência e criava o hábito de incluir a televisão nas reuniões familiares. Segundo Camila TAVARES “a cena típica de início de noite no Brasil é a de uma família reunida em torno de seu 24 TONDATO, M. P. Telenovelas exportadas. Disponível em: < http://www.eca.usp.br/associa/alaic/chile2000/16%20GT%202000Telenovela/MarciaPerecin.doc > Acessado em 19 fev. 2003. 25 TONDATO, op. cit., p.2. 26 PEREIRA,C. A.; MIRANDA, R. Televisão. As imagens e sons: no ar, o Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1983. p. 39. 27 Ficava destinada às domésticas e donas-de-casa a novela das seis horas, apresentando adaptações da literatura romântica. A faixa das sete horas tinha como alvos os adolescentes e as mulheres que trabalhavam fora. Nesse horário eram transmitidas histórias leves, românticas e temperadas com humor. Às oito horas, as novelas se destinavam a todas as idades e apresentavam histórias que enfocavam o dia-a-dia e os problemas familiares. 28 BORELLI, S. Telenovelas brasileiras. Territórios de ficcionalidade: universalidades e segmentação. Disponível: < http://www.eca.usp.br/associa/alaic/chile2000/16%20GT%202000Telenovela/silviaBorelli.doc > Acessado em: 20 jan. 2003. p. 4. 23 aparelho de televisão acompanhando as aventuras de seus personagens preferidos”.29 Como a novela possui uma apresentação diária e longa, acontece uma intensa aproximação entre espectadores e personagens da trama. Ser transmitida diariamente dá a esse gênero uma proximidade com relação ao receptor. O telespectador desenvolve uma relação de intimidade com os personagens e com a história. Nesse sentido, ocorre um processo de identificação entre o fruidor da telenovela e os personagens, que se tornam parte da sua família, seus amigos íntimos.O autor de Dancin’ Days confirma a relação: “Essa gente que tem poucas opções de vida que precisa conviver durante seis meses com personagens que eles amam ou odeiam, mas que fazem parte da vida deles”.30 A identificação torna-se visível quando os telespectadores passam a consumir – literalmente – a novela. Para Silvia BORELLI, os gêneros ficcionais são fundamentais no processo de produção e formatação de padrões nas variadas indústrias culturais. Nessa mesma perspectiva, a antropóloga Heloísa Buarque de HOLLANDA confirma: “ao assistir as novelas as pessoas se familiarizam com os estilos de vidas, formas de agir e sentir dos personagens, e as atitudes desses mesmos personagens têm relação com os produtos que eles utilizam’’.31 Entretanto, reduzir a função das telenovelas ao consumismo puro e simples é bastante simplista32. As novelas têm uma dupla função na sociedade, influenciando modas e comportamentos, mas também obedecendo às regras dadas pela audiência. Maria Aparecida BACCEGA, afirma “a sua importância no país pode ser medida pela influência que exerce no comportamento da sociedade e vice-versa”.33 Podemos concluir que a novela refletem momentos da história, dita modas e mexe com o comportamento da sociedade. Ao contrário da trilha sonora do filme Os Embalos de Sábado è Noite, a trilha sonora da telenovela Dancin´Days não era composta exclusivamente de canções disco, contava uma variedade de gêneros musicais. Ao mesmo tempo em que o álbum trazia 29 TAVARES, C. Telenovela. Disponível em: < http://sites.uol.com.br/zgm/camilatavaresg2.htm > Acessado em: 02 mai. 2002. p.4 30 BRAGA, G. Uma conversa franca sobre sexo, censura, dinheiro, sucesso, os bastidores da TV e o fantástico mundo da novela das oito, com o autor de Água Viva. CASTRO, R. Disponível em: < http://members.tripod.com/dancin_days/playboy.htm > Acessado em: 02 maio. 2002. Originalmente editado na Revista Playboy jun. 1978. 31 HOLLANDA, H. Entrevista. Disponível em: < http://www2.correioweb.com.br/cw/EDICAO_20020530/vid_mat_300502_1.htm > Acessado em: 15 ago. 2002. 32 O documentário Muito além do cidadão Kane produzido pela rede britânica BBC em 1992 discute o poder da rede Globo como formador de opinião especulando sobre os interesses particulares de rede de telecomunicação privada. 33 BACCEGA. apud TAVARES, op. cit., p. 3. 24 novos artistas, nomes consagrados estavam presentes. Essa diversidade deve-se a forma que a Som Livre negociava com as demais gravadoras: promovia uma canção de um artista novo e em troca de um nome consagrado. No caso específico de Dancin´Days observamos a presença do modismo dançante representado pelas Frenéticas e Lady Zu, juntamente com artistas de peso no mercado fonográfico, como Chico Buarque, Gal Costa e Nara Leão. Para Renato ORTIZ “a Som Livre descobriu uma forma de penetrar nas camadas mais baixas, através de seus álbuns compilados”.34 A diversidade de estilos musicais presentes num álbum de trilha sonora fazia dela um produto bastante atrativo, principalmente num momento de retração no consumo causado pelo fim do milagre. Mas devemos lembrar que mercado de aparelhos de reprodução sonora apresentava-se em crescimento, ampliando-se em 813% até o início dos anos 198035. De fato as coletâneas colaboraram decisivamente para a ampliação do mercado fonográfico36, especialmente pelo baixo custo. Nessa categoria estavam presentes os álbuns compilados que recebiam o nome das discotecas, especialmente as de São Paulo e Rio de Janeiro. A telenovela Dancin’Days trazia composições impregnadas em sua trama. A canção tema de abertura, feita sob encomenda do diretor Daniel Filho ao produtor musical Nelson Motta. Márcia DIAS comenta que essa não era uma prática comum, “normalmente as gravadoras ofereciam canções que pudessem se relacionar a um personagem da trama”.37 Isso ocorreu porque Motta desejava ampliar o sucesso das Frenéticas e negociou a canção como forma de pagamento para o uso da marca Dancin’ Days. A música possuía uma batida discoteque e versos fáceis, era um convide a dança: Abra suas asas/Solte suas feras/Caia na gandaia/Entre nessa festa/Me leve com você/Seu sonho mais louco/Eu quero ver seu corpo/Lindo, leve e solto/A gente às vezes/Sente sofre dança/Sem querer dançar/Na nossa festa vale tudo/Vale ser alguém como eu como você/Dance bem dance mal, dance sem parar/Dance bem, dance até sem saber dançar/Na nossa festa vale tudo/Vale ser 38 alguém como eu como você. As pessoas ouviam a canção dentro do ambiente da novela e passavam a querer dançar no novo Frenetic Dancin’ Days Discothèque no morro da Urca. Nelson MOTTA 34 ORTIZ,R. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo: Brasiliense, 1999. p. 120. 35 Ibid., p. 127. 36 De 1978 para 1979 o Brasil chega a quinta posição no mercado mundial de discos. DIAS, op. cit., p. 54. 37 DIAS, op. cit., p. 61 38 VÁRIOS. Dancin’ Days. Rio de Janeiro: Som Livre, 1978. 1 disco. 25 narrou o fenômeno da disco music no país: “com a novela, a febre mundial da discoteca se espalhou por todo o Brasil, o segundo LP das Frenéticas, puxado por Dancin’ Days, estourou nas paradas de sucesso”.39 Essa constatação evidencia o poder de Globo em disseminar costumes no país. A socióloga Márcia DIAS também analisou esse fenômeno, e explica que o sucesso da trilha sonora de Dancin’ Days40 contou com a fundamental ajuda da própria novela, destacando que o mecanismo de recepção da música é facilitado pela própria trama dos personagens41. Sendo assim, o telespectador vive as emoções dos atores com a presença de uma canção tema. Essa associação entre imagem e música deve também ao poder de penetração da Rede Globo nos lares brasileiros. Devemos recordar que na década de 1970 a indústria de bens culturais no país se consolida. Até o início da década de 1980, 73% do total de domicílios brasileiros possuem televisão. Nesse momento, o mercado já conta com a presença de um público vasto, que compra aparelhos de televisão e passa cada vez mais tempo assistindo à sua programação, ávido por novidade e qualidade. Sendo assim, se faz pertinente a tese de Renato ORTIZ sobre a consolidação da moderna sociedade brasileira: A consolidação da televisão no Brasil se associava à idéia de integração nacional; vinculava-se, desta forma a proposta de construção da moderna sociedade ao crescimento e à unificação dos bens locais. A indústria cultural adquire, portanto, a possibilidade de equacionar uma identidade nacional, mas reinterpretando em termos mercadológicos; a idéia de ‘nação integrada’ passa a 42 representar a interligação de consumidores potenciais espalhados pelo território nacional. Podemos entender a telenovela como um produto cultural que revela aspectos da sociedade, mas também obedece a interesses mercadológicos. Décio PIGNATARI sugere que a televisão não apenas registra fatos, como também os projeta43. Na novela Dancin´Days a protagonista Julia Mattos, vivida pela atriz Sônia Braga ditou moda. Recentemente o jornalista Edney SILVESTRE sintetizou a intensidade da influencia exercida pela protagonista da novela Dancin’ Days: “o que Júlia Mattos vestia, dizia ou falava na tela da Rede Globo, na noite anterior, no dia seguinte, estava sendo copiado e repetido de Norte a Sul do Brasil”.44 Júlia Mattos virou exemplo e meta para milhões de 39 MOTTA, op. cit., p. 309. Essa trilha vendeu 1,4 milhões de cópias até 1996. 41 DIAS, op. cit., p. 61 42 ORTIZ, A moderna..., p. 165. 43 PIGNATARI, op. cit., p. 45 44 BRAGA, S. Entrevista. SILVESTRE, E. Disponível em: < http://geocities.yahoo.com.br/novela_dancindays/entrevista_sonia.html > Acessado em: 25 jun. 2002. Originalmente editada no jornal O Globo em 25 jul. 1993. 40 26 mulheres no país inteiro - apesar de seu passado controvertido. As suas roupas de cetim e meias soquetes de lurex se transformaram em guarda-roupa obrigatório nas dezenas de discotecas espalhadas pelo país. Para os pesquisadores é natural a tendência do indivíduo em tentar imitar um ídolo: ‘‘Faz parte do ser humano a capacidade de imitar o outro que não vive dentro da mesma realidade, assim como a vaidade. A Globo tem muita credibilidade na classe média por isso lança um comportamento e ele passa a ser socializado’’45, explica Tânia MONTORO. Além disso, Sonia Braga era considerada um sex simbol do fim da década de 1970. A atriz ganhou uma homenagem de Caetano Veloso na composição Tigresa e recebeu a capa da Revista Veja em 1978. De acordo com a reportagem “Sônia Braga é (...) o sonho do brasileiro comum e, aos 27 anos, transformou-se em nossa Brigitte Bardot, em nossa Marilyn Monroe e talvez só em Martha Rocha e Leila Diniz encontre rival entre as mulheres que o Brasil amou”.46 A novela Dancin´Days ditou a moda não apenas pela sensualidade de Sonia Braga. O jornalista Paulo LEITE detectou a intensidade do merchandising presente na novela: “Dancin’Days serviu como uma vitrina – onde se reserva espaço para os luminosos jeans e vodka durante os tavolteios numa discoteca”.47 Nessa novela o merchandising atingiu seu auge conforme explica Carlos ÁVILA: Quando Sonia Braga, estrela principal da novela Dancin’ Days, dançou numa boate com um enorme letreiro luminoso da marca Staroup às suas costas, o merchandising perdeu o complexo de culpa. (...) Daí a Globo, empresa de comunicação que mais explora o potencial desse serviço no 48 país, passou a faturar ostensivamente com as novelas. As propagandas de produto feitas durante a trama de uma novela aconteciam na televisão brasileira desde 1969. A novela da rede Tupy, Beto Rockfeller foi a primeira novela a apresentar merchandising no Brasil “sempre que o personagem se encontrava de ‘ressaca’, tomava um Engov”.49 Mas como a Globo domina plenamente a audiência se “dispõe com força total no mercado publicitário, acompanhando de perto a aglutinação de 45 MONTORO, T. Entrevista. Disponível em: < http://www2.correioweb.com.br/cw/EDICAO_20020530/vid_mat_300502_1.htm > Acessado em 12 fev. 2002. 46 Sônia Braga: uma mulher para o Brasil. Veja. São Paulo, n. 505, 10 maio 1978, p. 44. 47 LEITE, P. M. Televisão: a grande vitrina. Veja. São Paulo, n. 536, 13 dez. 1978. p. 122. 48 AVILA, op. cit., p. 89 49 TAVARES, op. cit., p.6 27 investimentos desse setor na televisão”.50 Sendo assim, Dancin’ Days pode explorar o merchandising com maior eficiência pois possuía um grande índice de audiência num momento onde o mercado de bens materiais havia crescido substancialmente devido ao milagre brasileiro. Nesse sentido, aponto para as premissas de Renato ORTIZ, pois para ele “o avanço publicitário num país serve como um importante parâmetro do crescimento dos meios de comunicação”. 51 E no caso brasileiro, “o que melhor caracteriza o advento e a consolidação da industria cultural no Brasil é o desenvolvimento da televisão”.52 Márcia DIAS complementa, dizendo que “o apelo trazido pela imagem (...) fez da televisão o meio preferencial dos anunciantes”.53 Sendo assim, o anunciante ao colocar seu produto numa novela de grande audiência garantia um retorno praticamente imediato. Antes de ter a marca exposta na novela, calças Staroup vendiam 40 mil peças por mês. Durante a novela a produção de 300 mil calças passou a ser insuficiente54. Ao ver um personagem vestindo certa roupa, as pessoas correm às lojas para adquirir uma igual e ficar mais próxima e parecida com seus ídolos. Assim, têm a ilusão de que podem alcançar o status de celebridade, ou ainda, vivenciar a história do personagem da novela. A telenovela Dancin´Days marcou o imaginário coletivo brasileiro, considerada um marco entre as telenovelas. Baseado no ambiente das discotecas norte-americanas explorado no filme Os Embalos de Sábado à Noite, a mania dançante se disseminou de norte a sul do país permitida pela consolidação do mercado de bens materiais. Isso ocorreu graças a grande audiência da Rede Globo – pautado no Padrão Globo de Qualidade – e o apoio da gravadora Som Livre. Dessa forma, a trama estimulou o consumo da onda disco, tanto nos itens fonográficos, quanto nos de vestuário consagrado na novela pela protagonista Sonia Braga. A partir dessa produção, Gilberto Braga se firmou entre os grandes nomes da teledramaturgia. Mantendo o estilo consagrado do drama, trouxe novos temas: as pessoas que se desdobravam para aumentar a renda familiar, jovens que lutavam para sobreviver desde cedo, casamentos sem perspectiva, mulheres que defendiam seu espaço e se destacavam na sociedade, relacionamentos imaturos da adolescência, dilemas sobre o divórcio, enfim, um retrato da classe média brasileira, de pessoas comuns mesmo. Braga injetou esperança em sua trama, numa 50 Em 1970, 39,5% dos investimentos em publicidade se dirigiam a TV. No fim da mesma década, a televisão incorpora 55% das verbas publicitárias. 51 ORTIZ, A moderna..., p. 130. 52 Ibid., p. 128. 53 DIAS, op. cit., p. 159 54 AVILA, op. cit., p. 89. 28 época em que todos estavam vivendo o milagre brasileiro, acreditando num futuro melhor com o desenvolvimento do Brasil. 29 4 DANÇAR PRA QUÊ? AS PATRULHAS IDEOLÓGICAS EM DESTAQUE A relação entre a MPB e a discoteque atinge o centro dos questionamentos sobre a função social da arte durante o período de abertura política. Os debates se iniciaram no cinema com a criação da expressão Patrulhas Ideológicas enunciada pelo cineasta Carlos Diegues em resposta às críticas direcionadas ao filme Xica da Silva de 1976. Em setembro de 1978 a expressão Patrulhas Ideológicas ganha destaque nos meios de comunicação de cadeia nacional quando a entrevista ao Jornal Folha de São Paulo é reeditada no Jornal do Brasil sob o título Uma denúncia das Patrulhas Ideológicas1. O termo passa a ser utilizado por outros artistas que acreditavam no compromisso da arte como expressão da condição humana sem aprisionamento em qualquer linha político partidária. Cacá DIEGUES pregava uma “liberdade de criação frente aos cerceamentos impostos pelos compromissos ideológicos de toda a espécie”2, mas foi duramente censurado pela esquerda ao se aproximar do regime militar com o propósito de realizar sua obra com o apoio da Embrafilme. No campo da música a polêmica tem início quando Gilberto Gil lança o álbum Refavela em 1977. Chamado de “ignorante político”3, Gil é crucificado por pregar a abstenção política com base no uso de uma proposta dançante em suas composições. No mesmo ano Caetano Veloso lança canção Odara, no álbum Bicho. A canção possuía um ritmo disco e com uma temática de apelo ao prazer e a dança, “atitudes consideradas alienantes pela esquerda”.4 O debate acerca da discoteca acontece nesse impasse entre música para ouvir e música para dançar. Segundo o antropólogo Gino STEFANI, a finalidade da “discoteca é a de fazer dançar e não de ser ouvida. (...) independentemente do que ela diz, ela entretém as pessoas sem maiores compromissos, o que importa é dança”.5 Considerando uma realidade de Ditadura Militar ouvir MPB caracterizava-se como um gesto político6 e as Patrulhas Ideológicas reprovavam o som discoteca desprovido de conteúdo engajado. 1 HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 12. DIEGUES, C. Cacá Diegues: por um cinema popular sem ideologia. VARTUCK, P. O Estado de São Paulo, 31 ago. 1978. 3 ANDREATO, E.; SOUZA, T. op.cit., p. 227. 4 NAPOLITANO, Cultura..., p. 110. 5 STEFANI. op. cit., p.27. 6 Ver mais em: CONTIER. A D. Edu Lobo e Carlos Lyra: o nacional popular na canção de protesto (anos 60). Revista Brasileira de História. São Paulo, n. 35, v. 8, 1998. 2 30 Com a abertura iniciada pelo general Ernesto Geisel em 1976, todo o discurso mais tradicional de esquerda começa a voltar à tona com as discussões do papel social da arte, da arte engajada. Alguns acreditam que não passa de mera manipulação da imprensa, como coloca o patrulhado Caetano VELOSO: “parece uma dessas coisas boladas em agencias de publicidade, que funcionam muito”.7 Mas a discussão sobre arte e engajamento político nos anos 1970 – embora tenha iniciada no cinema – tem suas raízes no campo da música, particularmente quando a MPB nacionalista assiste a chegada da tropicália no cenário musical em 1967, no III Festival da Canção promovido pela Rede Record. Vale lembrar que a corrente emepebista privilegiava, “no plano musical, as velhas formas da canção urbana (sambão, sambinha, marcha-rancho, modinha, cantiga de roda, ciranda, frevo, etc.) e da canção rural (moda de viola, samba de roda, desafio, etc.)”.8 Segundo HOLLANDA a protest song brasileira era muito mais “preocupada com o conteúdo do que com a renovação formal”.9 E os tropicalistas Gilberto Gil e Caetano Veloso colocaram em cheque justamente a forma da canção brasileira pregando o uso de outros estilos musicais que a modernizassem. O que Caetano VELOSO chamou de retomada da linha evolutiva, ou seja, a revitalização sobre “discussão do papel histórico, social e estético da vanguarda“.10 A chegada do tropicalismo musical em 196811 foi visto por alguns como uma “abertura na música popular brasileira”12 e elogiaram a presença do som universal e pop do movimento. Outros eram mais ácidos, como José Ramos TINHORÃO, viu no o tropicalismo a “interrupção do processo de criação das canções de protesto”.13 Essa postura se justifica na medida em que o tropicalismo decreta a crise do nacional-popular como eixo da cultura brasileira. Segundo Marcos NAPOLITANO ao avaliar o tropicalismo deve-se aliar a abertura estética à crise dos projetos da esquerda brasileira, ou seja, associar a explosão colorida14 com a implosão político-cultural.15 7 HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 113. GALVÃO, W. N. MPB: Uma Análise Ideológica. Um saco de gatos. São Paulo, v. 1, n. 1, 1969. p.93. 9 HOLLANDA; GONÇALVES, op. cit., p. 54. 10 NAPOLITANO, M.; VILLAÇA, M.Tropicalismo: as relíquias do Brasil em debate. Revista Brasileira de História. São Paulo, n. 35, v. 18, 1998.p. 68 11 O tropicalismo atingiu os diversos campos das artes – cinema, teatro, música e artes plásticas – mas não deve ser compreendido como um movimento coeso, os valores estéticos e políticos divergiam entre si. NAPOLITANO, Cultura..., p. 64 12 CAMPOS, A. Balanço da bossa. São Paulo: Perspectiva, 1968. p. 176. 13 TINHORÃO, J. R. Pequena história da música popular: da modinha à canção de protesto. Petrópolis: Vozes, 1974. p. 234. 14 FAVARETTO, C. Tropicália: alegoria, alegria. São Paulo: Kairos, 1979. 8 31 Sendo assim, conforme NAPOLITANO e VILLAÇA a tropicália pode ser vista como “a expressão mais coerente para um novo conjunto de tensões políticas, culturais e existenciais que passaram a caracterizar a sociedade brasileira urbana”.16 O impacto do tropicalismo obrigou a “MPB a se abrir esteticamente a outros gêneros e outras influências que não somente os gêneros de raiz”.17 Poucos anos se passaram após o choque estético entre emepebistas e tropicalistas e as divergências entre as turmas da música popular brasileira apreciam sanadas, quando em 1972 Chico Buarque e Caetano Veloso gravam o álbum Chico e Caetano Juntos e Ao Vivo. O jornalista Tárik de Souza descreve o encontro de maneira fria e ressalta os interesses financeiros da gravadora Philips-Phonogram, mas os próprios artistas admitiam a importância do encontro para a música brasileira18. Ficava claro que a guerra entre violões e guitarras elétricas ficara no passado e a MPB consolidava-se como uma Instituição.. Já em meados dos anos 1970 percebe-se um alinhamento das relações entre cultura pop e MPB, pois a ela passa a “incorporar uma pluralidade de escutas e gêneros musicais [tornando-se] um complexo cultural”19, como os Novos Baianos e os mineiros do Clube da Esquina. Para NAPOLITANO a junção de diversos estilos musicais aconteceu “sem maiores traumas”20. Entretanto, a partir de meados dessa mesma década um gênero pop em especial provocará polêmica e sobre a combinação de gêneros musicais na MPB. A discoteca inicia um debate nos âmbitos estéticos e ideológicos da música brasileira, iniciando um patrulhamento sobre a música para dançar. O debate acerca das Patrulhas Ideológicas levantados em 1978 como brincadeira21 por Carlos Diegues não era original, há muito tempo estava se construindo na cena cultural brasileira. Podemos situar na música o início dos debates estéticos-ideológicos no ano de 1968, como analisou o jornalista Nelson MOTTA: HOLLANDA, H. Impressões de viagem: CPC, vanguarda, desbunde. São Paulo: Brasiliense, 1979.p.49. 16 NAPOLITANO; VILLAÇA, op. cit., p. 56. 17 NAPOLITANO, História...., p.67. 18 “’É um encontro importante para a música brasileira (...) do meu coração’, disse Caetano. ‘É bom para acabar com certo tipo de intrigas’, diria Chico pouco antes de entrar”.In: ANDREATO; SOUZA, op.cit. p. 93 19 Id. 20 NAPOLITANO, A música..., p.2 21 “As Patrulhas Ideológicas, na verdade, eram uma piada no meio de uma longa entrevista sobre outros assuntos”. In: HOLLANDA; PEREIRA. op. cit., p. 16. 15 32 O racha, de uma certa forma, começou em 68 naquele festival que tinha ‘É proibido Proibir’. O Caetano e o Gil tinham uma questão de ordem que era uma posição crítica e violenta, muito mais adiantada para as vanguardas, especialmente de estudantes universitários de São Paulo. (...) Foi o festival onde Caetano fez aquele discurso, e disse: ‘se, vocês são em política como são em 22 estética, nós estamos mal’ . Segundo o jornalista, as discussões de 1978 remontam um debate de dez anos atrás, embora adquira novos enfoques, como “a autonomia criativa do artista, os cerceamentos moralizantes e religiosos do dogmatismo ideológico, as perdas e ganhos da relação Intelectual/Estado”.23 Tento como berço o Festival Internacional da Canção de 1968, as Patrulhas Ideológicas se desenvolvem a partir das disputa entre Geraldo Vandré (Caminhando ou Pra não dizer que não falei das flores) e Caetano Veloso (É proibido proibir). A canção de Vandré representava a ação efetiva contra a ditadura militar e não apenas a espera do “dia que virá” 24 enquanto Caetano recebeu contundentes vaias dos “jovens universitários de esquerda que o julgavam hippie e alienado”.25 Sendo assim, O FIC representava culturalmente, as duas opções da esquerda após o anúncio do AI-5 e da cisão dentro do PCB acontecida no ano anterior. As correntes se dividiam entre guerrilheiros urbanos e desbundados. Estes últimos se desligavam da política através do uso de drogas, numa clara referência ao movimento hippie norte-americano. Essa atitude era mal vista pelos radicais guerrilheiros, pois acreditavam que as drogas alienavam o indivíduo. Para o ex-guerrilheiro Fernando GABEIRA as duas saídas da esquerda eram válidas, pois enquanto a luta armada era uma tentativa de transformar a sociedade, as drogas proporcionam uma transformação interior, pessoal26. O crítico musical Luis Carlos MACIEL faz uma precisa síntese desse momento político: O sentimento naquela época é de que todos os esquemas tinham falhado, que a gente tinha se enganado, não era nada daquilo, tinha que se começar do zero, e foi aí que mudou. Mudou, inclusive, a concepção de engajamento que deixou de ser político, coletivo, dentro dos quadros, e passou a ser um engajamento pessoal, individual, existencial, psicológico. (...) O prestígio que o LSD e outras drogas tiveram era exatamente em função dessa perspectiva que ofereciam, de 27 desmanchar a cabeça feita pelo sistema e poder fazer outra cabeça . 22 MOTTA,N. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 36. HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 10. 24 GALVÃO, op. cit., p. 32. 25 NAPOLITANO, Cultura..., p. 71. 26 HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 92. 27 MACIEL, L. C. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit.,p. 101. 23 33 Para alguns intelectuais, as Patrulhas Ideológicas são anteriores ao próprio choque entre tropicalistas e emepebistas no ano de 1968. Elas são parte da doutrina marxista advinda dos Centros Populares de Cultura da UNE. Para o poeta maldito Jorge MAUTNER “as Patrulhas Ideológicas são sempre a tendência totalitarista que emerge. [Elas provem dos] centros mais dogmáticos que começaram a dizer que a arte tinha que ser uma arte revolucionária, uma arte marxista, uma arte engajada, não alienada”.28 Segundo esse controverso artista, os CPCs foram responsáveis pela fórmula castradora da canção engajada brasileira. O cineasta Sérgio SANTEIRO consegue ser ainda mais radical que Mautner e afirma que “na época do CPC, do Centro Popular de Cultura (...) realmente teria havido um patrulhamento ideológico”.29 Percebe-se que tanto para Mautner quanto para Sérgio Santeiro as Patrulhas Ideológicas são um assunto sem sentido no fim da década de 1970, pois suas raízes ficaram num passado distante, onde realmente existia um projeto ideológico acerca das artes. Para eles, a cobrança por engajamento acontecia, de fato, na época dos CPCs. Com relação à posição política do Centros Populares de Cultura, é ilustrativa a fala do jornalista Luis MACIEL: Desde antes de 1964 que o Cacá fala de Patrulheiros Ideológicos. Antes de 64, no CPC, o Cacá já estava em pleno debate com os patrulheiros e naquela época houve uma polêmica sobre isso no Metropolitano, jornal da UNE, entre o Cacá e o Carlos Estevam. O CPC tinha uma estética muito rígida e o Cacá já mostrava uma outra perspectiva mais esteticista, embora naquela época todo mundo quisesse fazer uma arte política, inclusive o próprio Cacá. (...) O que a Patrulha Ideológica, 30 tem de novo é só o nome. Nessa observação de Maciel, detecta-se a posição assumida pelos opositores do regime militar pré-68. Antes do AI-5, a comunidade artística possuía uma postura de frente única contra a ditadura e deixava de lado algumas divergências estéticas ou políticas em prol de um objetivo comum. Com a abertura ou pseudo-abertura, intelectuais e artistas dividem opiniões de maneira mais drástica, especialmente com o fim da censura prévia. Fica bastante evidente que divisões políticas sempre existiram dentro dos produtores de cultura, mas essas posições políticas não eram transparentes. Heloísa Buarque de HOLLANDA acredita que os debates só explodem nesse ano de 1978 porque durante os anos mais difíceis a oposição fechava-se taticamente e ninguém rompia essa 28 MAUTNER, J. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 124. SANTEIRO, S. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 223. grifo meu. 30 MACIEL, L. C. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 97. 29 34 barreira. Com o início da abertura identifica-se o monstro: a ortodoxia do PC31. Fica evidente que com “acontecimento patrulhas ideológicas fecha não só o período triste da repressão como também o período feliz da coesão na esquerda”.32Segundo o crítico literário Silviano SANTIAGO no final da década de 1970 assiste-se a essa mudança comportamental da oposição ao governo: “a luta das esquerdas contra a ditadura militar deixa de ser questão hegemônica no cenário cultural e artístico brasileiro, abrindo espaço para novos problemas e reflexões inspirados pela democratização no país”.33 Com a democratização do país em andamento as novas preocupações deveriam se abrir a novos temas como, por exemplo, o prazer, a diversão, a ecologia, o feminismo, o movimento negro etc. Mas a esquerda atuante na década de 1960 patrulhava exatamente esse tipo de reflexão, como explica Jorge MAUTNER: “os patrulheiros consideram essas contradições secundárias: revolução feminina, os costumes, a telepatia, a revolução sexual, a negritude, enfim... toda essa descentralização”.34 Para uma esquerda mais ortodoxa, essas reflexões seriam uma forma de alienação do indivíduo, assim como foi o uso das drogas por parte dos hippies desbundados do fim da década. Sobre esse assunto, Fernando GABEIRA questiona papel sócio-político das drogas: Até que ponto [a esquerda] compreendeu certos aspectos da droga como afirmação do teu direito individual de dispor de seu corpo como você quer...E quando você fala: drogas – a alienação – a aceitação do sistema – a contra-revolução, você está perdendo as nuances, os problemas que tem que ser discutido nessa questão de drogas. (...) acho que essa trilogia Sexo, Drogas e Rock and 35 Roll precisava ter uma política . A cobrança que GABEIRA faz à esquerda, diz respeito aos novos temas carentes de reflexão política na década de 1970. Para ele as drogas têm um papel maior do que a simples alienação, elas liberam o corpo. O ex-guerrilheiro propõe uma “política do corpo”, questão intimamente ligada ao prazer físico. Na música as questões do prazer e da liberdade fazem referência direta à dança. Mas na canção engajada brasileira –a 31 PATRULHAS Ideológicas: Um livro de muitos autores reabre a discussão sobre o problema da cobrança de posições políticas ao artista. Disponível em: < http://acd.ufrj.br/pacc/literaria/patrideol.html > Acesso em: 23 fev. 2002. Originalmente editado no Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 30 ago. 1980. 32 SANTIAGO, S. Crítica cultural, crítica literária: desafios do fim de século.Comunicação apresentada no Latin American Studies Association, Guadalajara, México, 17-19 abr. 1997. Disponível em:< http://acd.ufrj.br/pacc/lasa.htm1> Acesso em 20 abr. 2001. p.1 33 Ibid., p. 3. 34 MAUTNER, J. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 125. 35 chamada MPB nacionalista – o conteúdo era vital e não o ritmo. A canção era feita para doutrinar e não para entreter o ouvinte. Essa posição engajada da música popular brasileira impedia a intromissão de gêneros dançantes em sua constituição. Deve-se atentar que no fim da década de 1970 a MPB é uma Instituição, detentora de uma grande diversidade de ritmos, inclusive internacionais, como o rock e o jazz36. Mas a multiplicidade de gêneros musicais não permitia o uso da novidade norte-americana disco music, pois se liberar através do ritmo dançante era considerado uma alienação. Nélson MOTTA faz um balanço sobre essa dicotomia entre música para dançar e música para pensar, tomando por base a disco, surgida no fim da década: A discoteca é uma música tão angustiante e vazia quanto à década de 70...É uma música de movimento, sem emoção despida de sentimento, é uma coisa de energia física. Em seu lado saudável também porque na década de 60 a música foi só de cabeça. Nesse ponto, eu acho que é muito bom que as pessoas dancem, que as pessoas cuidem do corpo, se movimentem. Isso tocou no que a música brasileira tem de mais forte que é o impulso ao movimento. Isso é natural em forró, 37 em Trio-Elétrico, em samba carioca, em quase todas as músicas . A relação entre forma, conteúdo e engajamento político atinge em cheio a música brasileira. Esse debate pode soar redundante, haja vista o impacto tropicalista em 1968. Mas essa discussão renovada tem como alvo a canção dançante, oriunda do som discoteque que teve seu grande boom nesse período de abertura política. Num primeiro momento, a relação entre arte e engajamento relativos à forma e ao conteúdo, atinge o cantor e compositor Gilberto Gil, com a canção Refavela: Iaiá, kiriê, kiriê, iaiá/A refavela revela aquela que desce o morro e vem transar/O ambiente efervescente de uma cidade a cintilar/A refavela revela o salto que o preto pobre tenta dar /Quando se arranca do seu barraco prum bloco do BNH/A refavela, a refavela, ó, como é tão bela, como é tão bela, ó/A refavela revela a escola de samba paradoxal/Brasileirinho pelo sotaque mas de língua internacional/A refavela revela o passo com que caminha a geração/Do black jovem, do black-Rio, da nova dança no salão/Iaiá, kiriê, kiriê, iaiá/A refavela revela o choque entre a favela-inferno e o céu/Baby-blue-rock sobre a cabeça de um povo-chocolate-e-mel/A refavela revela o sonho de minha alma, meu coração/De minha gente, minha semente, preta Maria, Zé, João/A refavela, a refavela, ó, como é tão bela, como é tão bela, ó/A refavela, alegoria, elegia, alegria e dor/Rico brinquedo de samba-enredo sobre medo, segredo e amor/A refavela, batuque puro de samba duro 38 de marfim/Marfim da costa de uma Nigéria, mis éria, roupa de cetim/Iaiá, kiriê, kiriê, iáiá. 35 GABEIRA, F. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 193. Vários artistas se utilizavam desses gêneros. Os aclamados mineiros do Clube da Esquina, por exemplo, circulavam entre ambos.BAHIANA, Nada..., p. 30. 37 MOTTA, N.apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 43. 38 GIL, G. Refavela. Manaus: WEA, 1995. 1 CD. 36 36 Para o crítico musical Tárik de SOUZA o disco Refavela é “ritmicamente luminoso, embora de letras confusas, que não chegam a explicar suas declarações e atitudes estapafúrdias”.39 Nas palavras do crítico fica evidente a patrulhagem exercida por conta da ausência de conteúdo político nas composições de Gil. O ex-tropicalista acabara de voltar na Nigéria e trazia muitas idéias sobre negritude e fazia uma associação com o movimento Black Rio: “Gil mamou no oleoduto sonoro África-Brasil, reciclado eletronicamente pelo soul americano”.40 Essa crítica era motivada pela nova caracterização da favela proposta por Gil porque ele rompe com a mitificação do morro – lugar do samba e do verdadeiro folclore urbano brasileiro – propondo uma modernização desse lugar idealizado nas composições emepebistas ligadas ao CPC da década de 1960. A modernização proposta por Gil está justamente na mistura de morro com as influências estrangeiras norte-americanas do Black Rio e da cultura africana. Além da falta de conteúdo comprometido com a redemocratização, a composição de Gil levanta a bandeira de novos assuntos, principalmente o movimento negro. Sobre esse assunto, a socióloga Lélia GONZÁLES faz um balanço do posicionamento do compositor: “No caso do Gil, o que eu percebo nele é exatamente aquela do negro que está com uma visão universal da questão e que evidentemente não pode se encaixar, se enquadrar, dentro dos limites de um discurso de esquerda e nem tão pouco de direita, óbvio”.41 O próprio Gil afirma que a sua preocupação em Refavela era a de mostrar “os novos estilos de participação na questão da negritude no Brasil e no mundo”.42 A polêmica montada em torno da posição política de Gilberto Gil fez Nélson MOTTA defender o amigo baiano: “Eu escrevi um artigo esculhambando os que estavam patrulhando Gil. O disco era Refavela e havia um tom de campanha contra o Gil, cobravam posições políticas de contestação aberta contra o regime, de valorização do folclore, do folclore da negritude. Especialmente o artigo de Tárik. (...) Rebobagem.”43 Dessa forma, inicia-se um movimento de oposição as Patrulhas Ideológicas, a Patrulha Odara.44 Ela foi uma criação do cartunista Henfil que reaqueceu as vendas do semanário 39 ANDREATO; SOUZA, op. cit., p. 228. Id. 41 GONZALES, L. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 209. grifo meu. 42 RENNÓ, C. (Org.) Gilberto Gil: todas as letras. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. p.155. 43 MOTTA, N. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p.39. 44 O PASQUIM. Disponível em: < http://www.tvebrasil.com.br/links/literatura/homenagens/henfil/henfil_pasquim_5e6.htm > Acessado em 19 jan. 2002. 40 37 O Pasquim ao guerrear junto com os baianos Caetano Veloso e Gilberto Gil acusados de alienados pela esquerda. Henfil cunhou a expressão patrulha odara como contraponto às patrulhas ideológicas. Segundo seu criador, os patrulheiros odaras eram aqueles que exigiam dos outros, criações apolíticas e atitudes escapistas. Com um tom de deboche bem humorado típico do jornal, ele decreta o nascimento de uma patrulha combativa. O poeta Wally SALOMÃO explica a essência da palavra Odara: “Odara tem o significado de tudo que é BOM, de tudo que é POSITIVO, de tudo que é bacana (...) é uma palavra do povo negro, Yorubá (...) eu é que ensinei a Caetano, é a minha única ligação com essa discussão”.45 A palavra Odara se transforma na polêmica canção de Caetano Veloso, “irmão siamês de idéias e contradições”46 de Gilberto Gil, Caetano também sofreu com a patrulhagem. A letra da composição Odara é propositadamente bastante curta e simples, com a preocupação voltada exclusivamente para o ritmo, segundo a proposta dançante da discoteque. ”Deixa eu dançar/Pro meu corpo ficar odara/Minha cara/Minha cuca ficar odara/Deixe eu cantar/Que é pro mundo ficar odara/Pra ficar tudo jóia rara/Qualquer coisa que se sonhara/Canto e danço que dará”.47 O auge do patrulhamento aconteceu durante a turnê do álbum Bicho, intitulada Bicho Baile Show, quando Caetano apresentava-se acompanhado pela banda Black Rio. A composição Odara apresenta bastante explícita a inspiração no funk, especialmente a forte presença do contrabaixo. A opção dançante do compositor baiano foi duramente condenada pelas Patrulhas Ideológicas, conforme explicou Luis TATIT: “Em fase de abertura política, (...) quando havia uma grande expectativa com relação ao pronunciamento dos ídolos da década anterior, Caetano não falava, só dançava“.48 Sentindo-se incomodado pelo patrulhamento exercido, pelos críticos Tarik de Souza, José Ramos Tinhorão e Maurício Kublusly, 49 o compositor baiano cede uma entrevista ao Diário de São Paulo e compra a briga pela autonomia ideológica da classe artística. Após as críticas recebidas pelo álbum Refavela, Gilberto Gil volta a criar polêmica. Dessa vez, o alvo foi a utilização da batida dançante na composição Realce do álbum 45 SALOMÃO, W. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 134. ANDREATO; SOUZA. op. cit., p. 228. 47 VELOSO, C. Bicho. Rio de Janeiro: Philips-Phonogran, 1977. 1disco 48 TATIT, L. Dicção de Caetano Veloso. In: ______. O cancionista: composição de canções no Brasil. São Paulo: EDUSP, 1996. p. 264 46 38 homônimo de 1978: “Não se incomode/O que a gente pode, pode/O que a gente não pode, explodirá/A força é bruta/E a fonte da força é neutra/E de repente a gente poderá/Realce, realce/Quanto mais purpurina, melhor (...) /Realce, realce/Quanto mais serpentina, melhor.50” A canção faz alusão a alegria e ao movimento da dança. A jornalista Ana Maria BAHIANA compreendeu que Gilberto Gil conseguiu “dissecar e digerir a era discoteca, utilizando a forma dançante de maneira autônoma, fundindo formas musicais negras, contemporâneas com a realidade tecnológica”.51 O próprio Gilberto Gil admite a inspiração na discoteca nessa composição comentando sobre “esse lado Saturday Night Fever está (...) explicitado nos três pseudo-refrões”. Na letra da canção, as críticas se voltaram para a utilização da palavra brilho, considerado uma alusão a cocaína e a todo o imaginário das discotecas. 52 Mas a essência da composição fica por conta dos versos otimistas, denotando a preocupação com o corpo e com o prazer e até mesmo com “a banalidade”.53 Fica evidente que o grande alvo das Patrulhas Ideológicas foram os ex-tropicalistas Caetano Veloso e Gilberto Gil. Para Tárik de SOUZA ”a discoteque, conformista por natureza, literalmente, vence pelo cansaço”.54 O jornalista se posiciona contrário à invasão de gêneros musicais estrangeiros, isto explicaria a sua nítida oposição aos extropicalistas. De acordo com SOUZA, a abertura musical de 1967 gerou um colapso na música popular brasileira no final dos anos 1970: “Dez anos depois, em pleno processo de reabertura política (ainda que restrita) do país, o quadro sonoro consolida mercadologicamente as pregações pluripartidárias do tropicalismo”.55 Na fala do crítico musical, fica claro que os patrulhamentos efetuados sobre Gil e Caetano são originários de suas participações no tropicalismo.No ano de 1979, ele comenta essa idéia: Foi o tropicalismo quem anistiou ampla geral, e irrestritamente o chamado mau gosto nacional. Depois de um período de contrição estética, onde a linha evolutiva da MPB, empinada 49 ARAÚJO, P. C. No país dos mortos-vivos. In: _____. Eu não sou cachorro não: música popular cafona e ditadura militar.Rio de Janeiro: Record, 2002. p.272. 50 GIL, G. Realce. Manaus: WEA, 1993. 1 CD. 51 BAHIANA, A. M. Crítica: MPB. Somtrês. São Paulo, n. 8, ago. 1979. p. 83. 52 GIL, G. apud RENNÓ, op. cit., p. 223 53 Id. 54 SOUZA, T. Brasil... , p. 63 55 SOUZA, T. Ziguezague na MPB: Neobolerismo. Somtrês. São Paulo, n.9, set. 1979, p. 78. 39 pela BN, (...) de novo era permitido lambuzar-se de cafonice, vestir-se de acrílicos, boleros e lamê56. As Patrulhas Ideológicas foram um debate muito particular de um período da história brasileira, embora seus temas tenham origem na década anterior, a cobrança por uma arte engajada caracteriza a ânsia por redemocratização. Em contrapartida, a busca por autonomia artística soava como alienação nesse momento tão decisório da política brasileira. Nesse sentido, deve-se considerar o papel dos intelectuais pela luta da redemocratização, pois nesse período que estes partem para a participação política efetiva, como descreveu Daniel PECAULT: “Antes da distensão, jamais os intelectuais haviam manifestado (...) o seu engajamento político por meio da adesão a partidos políticos”.57 Parece que se configura uma divergência de interesses, pois enquanto os intelectuais participam da política, os artistas – os ex-tropicalistas – se ausentavam. Nesse sentido, é bastante ilustrativo o refrão da canção Força Estranha de Caetano Veloso: “Por isso uma força me leva a cantar/Por isso essa força estranha/Por isso é que eu canto/não posso parar/ Por isso essa voz tamanha”.58 A canção se remete justamente a reflexão sobre a própria atividade de cantor, sobre a prática específica do interprete ou como Nelson MOTTA definiu: “é uma posição em favor da liberdade do artista (...) tudo é uma discussão que agora o Caetano está retomando (...) Força Estranha é uma música que define muito isso”.59 O debate sobre arte e engajamento político explode no cinema, especificamente, com o lançamento do filme Xica da Silva, no ano de 1976. O filme foi um sucesso de público com três milhões de espectadores em todo o Brasil no período de 1976 a 198460. Xica da Silva caracteriza-se por ser um filme tecnicamente bem-feito com figurinos luxuosos e com uma abordagem leve da História do Brasil. Para Ismail XAVIER o filme é “cercado de lances pitorescos (...) dentro de um projeto de espetáculo popular [que] celebra a personagem numa máscara carnavalesca com cores, adornos e alegria”.61 Cacá Diegues foi acusado de carnavalizar a História brasileira e de banalizar a cultura africana 56 SOUZA, T. Ziguezague..., p. 78. PECAULT. Intelectuais e política no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1980, p. 260. 58 VELOSO, C. Muito. Rio de Janeiro: Philips-Phonogran, 1978. 1 disco. 59 MOTTA, N. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 42. 57 60 RAMOS, F. (Org.). História do cinema brasileiro. São Paulo: Círculo do Livro, 1987. p.420. 40 ao retomar a tradição do humor orientada pelo gênero da chanchada. Embora criticado pelos cinema-novistas por utilizar a chanchada, o diretor de Xica da Silva pretendia comunicar-se com o público, assim como define a historiadora Mariza SOARES: “Xica é popular não porque fala do povo ou em nome do povo, como pregavam os cinemanovistas, mas porquê fala a língua do povo. Por isso faz rir, como faziam as chanchadas, e atrai o público”.62 Essa aproximação ao público feita através de um gênero de cinema comercial contradizia com a proposta original do Cinema Novo que se marginalizava “da indústria porque o compromisso do Cinema Industrial é com a mentira e com a exploração”.63 Mas os diretores cinema-novistas procuraram o público ainda em 1965 com a criação de uma distribuidora coletiva chamada Difilm. Recentemente Carlos DIEGUES comentou sobre a formação da distribuidora e argumentou sobre a suposta intencionalidade do isolamento cinema-novista: O Cinema Novo foi o único movimento na história do cinema que começou com manifestos antes dos filmes existirem e com a fundação de uma distribuidora assim que os primeiros foram feitos. A Difilm era a distribuidora coletiva que tinha como sócios 11 cineastas do Cinema Novo, incluindo eu mesmo, Glauber, Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirzsman, Paulo Cesar Saraceni, etc. E ainda dizem que Glauber e todos nós não nos interessávamos pelo público! 64 A diferença é que queríamos mudar o público e não servir à sua própria alienação . Os diretores do movimento cinema-novista desejavam alcançar o público com a manutenção de seus compromissos estéticos e ideológicos. Mas passados vários anos desde o início do movimento as opiniões divergiam sensivelmente e o Cinema Novo havia se “desintegrado e cada diretor seguia seu próprio rumo”.65 Com o fim do Cinema Novo os cineastas oriundos desse movimento passaram a ter uma maior dificuldade para realizar seus filmes. A saída encontrada foi ligação aos órgãos da cultura do regime militar. Essa postura fica mais evidente principalmente após 1975, quando a Embrafilme passa a ser dirigidos por pessoas ligadas as meio artístico do Cinema Novo. Essa aliança CinemaEstado fez a produção nacional penetrar no mercado interno e até internacional atingindo 61 XAVIER, I. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: BERNADET, J. C.; PEREIRA, M.; XAVIER, I. O Desafio do cinema: a política de Estado e a política de autores. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 1985. p.30. 62 SOARES, M de C. As três faces de Xica. In: FERREIRA, J.; SOARES, M. de C. (Org.). A História vai ao cinema. Rio de Janeiro: Record, 2001. p. 62. 63 ROCHA, G. Uma estética da fome. Arte em Revista. São Paulo, n.1, jan./mar. 1979, p.17. Originalmente escrito em 1965. 64 DIEGUES, C. Entrevista: cinema brasileiro cia. ltda. ADRIANO, C. Disponível em: < http://www.cacadiegues.com.br/atualidades/cinebrascia.htm > Acesso em: 03 de out. 2002. 41 um público mais amplo, não mais apenas círculos intelectuais e universitários do Cinema Novo. A aproximação dos cineastas brasileiros com o regime militar permitia uma melhor produção e distribuição de seus filmes66 e essa junção entre artistas e militares visava dar uma maior organicidade a política cultural do regime. Essas premissas ficam evidentes na Política Nacional de Cultura de 1975, documento do Ministério da Educação e da Cultura que visava retratar uma série de valores nacionais através dos filmes. “O PNC se mostrava como o ressurgimento do binômio segurança/desenvolvimento, postulando que todos, igualmente, participassem da cultura nacional”.67. Essa postura baseava-se em demonstrar à população um nacionalismo de fachada, pois o país encontrava-se no auge do internacionalismo econômico68. Apesar da lógica militar de cooptação do artista ao sistema, existia uma certa liberdade de criação, como afirma Cacá DIEGUES: Na relação com o Estado você pode sofrer sempre um cerceamento, mas pode recusar ser financiado. Ou seja: o Estado pode impedir que você faça determinadas obras, mas você pode fazer determinadas obras mesmo que o Estado não queira. Isso eu sempre achei e a prática da Embrafilme mostrou que era verdade. Hoje não existe na Embrafilme uma norma de impedimentos políticos-ideológicos pra você fazer um filme. E quando isso aconteceu na prática a gente lutou e 69 quase sempre ganhou. Embora tenha confirmado que a liberdade artística era proporcionada e respeitada pela Embrafilme, as críticas não perdoavam Diegues pela sua aproximação com a mesma. O fato do cineasta se aliar ao Estado significava uma traição e justificava o conteúdo escapista presente em Xica da Silva que irritava a esquerda. Para a jornalista Heloísa Buarque de HOLLANDA “não é de se estranhar que as questões de patrulhagem tenham explodido num território marcado por definições e compromissos mais abertos frente às instâncias oficiais de poder e de mercado”.70 Com relação ao apoio da Embrafilme e as críticas sobre Xica da Silva, vale a pena remontar a definição de Patrulhas Ideológicas nas palavras do próprio autor da expressão: 65 104. GOMES, P. E. S. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento. São Paulo: Paz e Terra, 1996. p. A união aconteceu através da Embrafilme, criado em 1969. Posteriormente com o Concine, Conselho Superior de Cinema, de 1975.NAPOLITANO, Cultura..., p. 201. 67 HOLLANDA; GONÇALVES, op. cit., p. 98. 68 No fim da década de 1970, a política econômica [brasileira] passou a ser tutelada pelo Fundo Monetário Internacional. MOURA, A. R. Rumo à antropia: a política econômica, de Geisel a Collor. p.49. In: LAMOUNIER, B. (Org.). De Geisel a Collor: o balanço da transição. São Paulo: IDESP/ Sumaré, 1990. 69 DIEGUES, C. apud HOLLANDA; PEREIRA, op cit., p. 20. 70 HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 8. 66 42 O sujeito não fala de Xica da Silva, fala da maneira pela qual eu me visto. Se as pessoas forem analisar o produto cultural que você está me oferecendo, elas vão ter que aceitar que existe um novo ali dentro. Então, o que caracteriza as patrulhas é exatamente que o produto, a maneira pela qual ele se inseriu no mercado cultural...Até o comportamento moral do produtor é mais importante 71 do que o produto . O que Carlos Diegues propõem é justamente a idéia de que um produto inserido na lógica da indústria cultural – representada, neste caso específico, pela Embrafilme – deva ser analisado pelo seu conteúdo. Para o diretor, seus críticos estão fazendo o oposto, pois acreditam que o fato do produto estar vinculado a um órgão repressor e totalitário, faz dele igualmente ruim. Essas considerações estão diretamente envolvidas com os teóricos da Escola de Frankfurt, principalmente por T. Adorno, o primeiro a utilizar o termo indústria cultural na década de 1940. Embora o teórico alemão estivesse concentrado na música popular podemos estabelecer um paralelo com o cinema, considerando o filme Xica da Silva como um produto de massa. Segundo T. ADORNO a “indústria cultural se apresenta como um estágio avançado da barbárie cultural”72, capaz de produzir ou acelerar a degradação do homem e essa função seria a total alienação. Sendo assim, “a cultura deixava de ser a esfera de recriação das consciências sobre o mundo e tornava-se um complemento da ideologia do capitalismo monopolista, reproduzindo o sistema ideológico, independente do conteúdo da obra consumida”.73 Carlos DIEGUES em Xica da Silva pretendia, acima de tudo, entreter o público. Assim o cineasta afirma na polêmica entrevista de 1978: “Como diria Brecht, a função social do espetáculo é divertir. Essas pessoas que ficam falando do passado, no fundo porque tem medo do novo”.74Nessas frases o cineasta justifica a sua posição em relação ao uso do gênero chanchada presente em Xica da Silva, definindo o entretenimento como principal objetivo de sua obra. Ao evocar o cineasta comunista Bertold Brecht, o diretor brasileiro remete-se às idéias de Walter BENJAMIN: “os operários poderiam se conscientizar e edificar o seu espírito na mesma medida em que se divertiam. O marxismo de Benjamim reconhecia certas virtudes, estéticas e políticas, na obra de arte voltada para o entretenimento e assimilada distraidamente”.75 Para a historiadora Mariza SOARES, Carlos Diegues pretendia associar o público das chanchadas ao discurso 71 DIEGUES, C. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 19 COELHO, op. cit., . p. 32. 73 NAPOLITANO, História..., p. 28 74 DIEGUES, C. apud HOLLANDA; PEREIRA, op. cit., p. 16. 75 BENJAMIN, W. apud NAPOLITANO, História..., p. 24. 72 43 “intelectual de esquerda” sobre o caráter popular da cultura brasileira, pois Xica da Silva “atrai um público que ia assistir às chanchadas e que não viu o cinema novo passar”.76 Sobre as Patrulhas Ideológicas, deve-se perceber que a discussão se dissipa em duas correntes: música e cinema. Na música, as questões colocadas em 1978 dizem respeitos as rixas entre tropicalistas e emepebistas impulsionadas na década anterior. Embora o ritmo disco preocupasse os puristas, a renovação estética na MPB já havia incorporado ao longo dos anos 1970 uma multiplicidade de ritmos, transformando-se numa Instituição. Dessa forma, as críticas relativas a forma e conteúdo das canções dos ex-tropicalistas soavam repetitivas no fim da década. No cinema a discussão está ligada a associação entre os artistas oriundos do Cinema Novo com o Estado através da Embrafilme. Essa questão também não se apresentava inédita, pois os próprios cinemanovistas contaram com o apoio do Estado nos anos 1960. Nas duas facções do debate sobre as Patrulhas Ideológicas fica nítido uma repetição de assuntos incentivados pelo momento político vivido no país. O que se confira nesse período de abertura política é também a abertura autonomia estética e ideológica das manifestações artísticas. Em menos de um ano a expressão cunhada por Carlos Diegues desaparece dos meios de comunicação. Mas o legado do debate fica por conta da mudança na concepção artística brasileira, da sua função social. O crítico literário Silvano SANTIAGO denominou esse curto período como o fim de século do Brasil. Um momento que a arte se desloca da preocupação sociológica para a antropológica. 76 SOARES, op. cit., p. 63. 44 5 CONCLUSÃO Após um breve retorno ao passado recente da música brasileira, concluímos que a partir de meados da década de 1970 a música reencontra a sua função original relacionada à dança e ao entretenimento. Acredito ter sido decisiva a Rede Globo de televisão como divulgadora das características da cultura disco maciçamente no país. Para tanto, aponto para a constituição de uma sociedade nacionalmente conectada pelos meios de comunicação, especialmente pela televisão. Devemos pensar que o país vivia um período pós-milagre e sentia suas conseqüências no mercado de bens culturais. Destaco o crescimento significativo do fonográfico, pois o Brasil figurava entre os mais poderosos mercados mundiais e essa condição favorecia uma maior diversificação de artigos. Mas penso que a motivação para o consumo do gênero dançante foi auxiliada pela ausência de movimentos musicais na década de 1970. Devemos lembrar que a MPB havia se consolidado como uma Instituição e agregava tendências antagônicas da década passada. Outro motivo para o sucesso da discoteque foi o momento político vivido no país. Acredito que abertura política representou uma motivação aos produtores de cultura para se desprenderem da função militante da arte. O engajamento político deixa de ser um valor absoluto no cenário cultural brasileiro, abrindo espaço para novos problemas e reflexões inspirados pela democratização no país. A disco ganhou diversas versões nacionais no fim da década de 1970. Entre as produções relacionadas a disco made in Brazil destaco o sexteto feminino as Frenéticas. Enfatizo esse grupo porque a sua produção era respeitada pela crítica musical, contrariando a todo um movimento de repúdio à disco music. Embora fossem ritmicamente idênticas as formas originais norte-americanas, as músicas apresentadas pelas Frenéticas possuíam status de MPB, mesmo não denotando nenhuma preocupação com os acontecimentos da abertura política. Dessa forma, as Frenéticas simbolizavam “qualidade” e “bom-gosto”. Esse fato comprova que a Institucionalizada MPB dos anos 1970 passa a ser catalogada a partir de valores subjetivos – o gosto de alguns setores da sociedade formadores de opinião – e não mais pela forma. Devemos lembrar que as Frenéticas executavam composições produzidas por nomes respeitáveis da MPB. Acredito que essa associação entre MPB e disco sintetizada pelas Frenéticas evidencia a importância do grupo para música brasileira no sentido de liberar a arte da função social 45 política. As letras de suas músicas alegres e divertidas expressavam as novas necessidades de liberação proporcionada pela eminente volta da democracia. Com respeito ao consumo e a disseminação das características da cultura disco, considero crucial a telenovela Dancin´Days da Rede Globo de televisão. A trama de Gilberto Braga retratou a época áurea dos brilhos das discotecas. Observo que a inspiração da novela foi um reflexo direto do filme Os Embalos de Sábado à Noite. A Globo monopolizava a audiência porque executara no inicio dos anos 1970 profundas reformulações administrativas e criativas num momento onde grande parte da população possuía televisão. A partir do domínio da audiência, a novela passou a explorar o merchandising. As propagandas feitas no contexto da novela estimulavam o consumo de itens fonográficos e de vestuário. Dessa forma, as características da mania dançante se disseminaram em todo o país. Acredito que a Rede Globo criara sua própria gravadora, a Som Livre, apenas para participar do mercado de discos, pois possuíam excelentes condições de divulgar suas trilhas sonoras. Acredito que a novela Dancin´Days tenha influenciado de fato a moda e o comportamento de uma geração. Portanto, as trilhas das telenovelas refletem momentos da história, dita modas e mexe com o comportamento da sociedade em função de interesses mercadológicos. Com a abertura iniciada pelo general Ernesto Geisel em 1976 o discurso mais tradicional de esquerda volta-se para a função social da arte, exigindo uma atitude engajada dos artistas brasileiros. O momento político pedia uma conscientização coletiva, mas alguns acreditavam que abertura política era um fato consumado e não viam a necessidade de protestos. Dessa maneira, tem inicio uma divergência interna entre os produtores de cultura. Até o presente momento a classe artística e intelectual se unia numa frente única contra a ditadura. Mas a esquerda se divide e as artes também sofrem o efeito dessa cisão. Enquanto os mais ortodoxos continuavam exigindo posturas comprometidas com o momento político, os mais liberais se aventuravam em novas formas de se expressarem artisticamente. Mas como a arte brasileira esteve comprometida com os assuntos políticos durante um longo período não seria imediata a transformação. Sendo assim, surge uma discussão sobre a liberdade artística: as Patrulhas Ideológicas. Os artistas patrulhados pregavam uma arte comprometida com as relações humanas, desprendidas de qualquer linha política partidária. Acredito que essa nova concepção artística está de acordo não só com o novo momento político brasileiro, mas também com uma demanda coletiva que buscar o prazer e o entretenimento. 46 O debate das Patrulhas Ideológicas tem inicio no cinema, o termo foi cunhado por Carlos Diegues em 1978 quando questionado sobre o teor “escapista” do seu filme Xica da Silva. A partir dessa primeira manifestação, os ex-tropicalistas Gilberto Gil e Caetano Veloso passaram a fazer uso do condenado ritmo dançante disco em algumas de suas composições. A discoteque era extremamente mal visto pelos críticos que desprezavam os gêneros musicais estrangeiros. A disco era considerava “alienada” porque a sua maior preocupação era com o ritmo, e na medida que estimulava o corpo esquecia a mente. A polêmica gerada em torno de um ritmo estrangeiro, relembra as críticas a Jovem Guarda. Mas impacto a disco é maior, na medida em que se insere no universo artístico da MPB. A partir disso desse envolvimento, o questionamento sobre a função social da arte se processa na oposição entre música para dançar e música para ouvir. Deve-se lembrar que ouvir MPB numa realidade de ditadura militar caracterizava-se como um gesto político. No entanto a redemocratização abria espaços para outras preocupações, justamente motivados pelo momento político vivido no país. Nesse sentido, a dança proporcionada pela discoteque representava uma nova forma de expressão. Penso que com a redemocratização do país em andamento, novas reflexões surgem no campo das artes. Acredito que o estudo dos gêneros musicais vinculados a cultura pop abrem novos caminhos para a história cultural brasileira1. A disco foi responsável por retornar às origens da música popular através da dança, proporcionando um novo senso de sociabilidade. No Brasil, as expressões pop se estabelecem no mercado fonográfico num momento extremamente significativo da nossa história política. Penso que a partir da chamada “abertura política” as artes passam a questionar seus valores, prevendo a sua própria renovação. Nesse sentido, mostra-se bastante significativa a polêmica acerca das Patrulhas Ideológicas. O debate inaugura o questionamento sobre o futuro das artes dentro da própria comunidade artística que passa a se perguntar sobre suas posições com o termino dos governos ditatoriais. O tema sobre a transformação da função social da arte ainda carece de estudos mais aprofundados2, pois a ascensão de gênero musical preocupado com a liberdade e a alegria não pode ser vista apenas como uma imposição 1 O tema disco music merece atenção constante de estudos norte-americanos e ingleses. Destaco: GILBERT,J.;PEARSON, E. Discographies: dance music and the politics of sound.Londres: Routledge, 1999. 2 Além do trabalho de Heloísa Buarque de Hollanda e Carlos Alberto Pereira, recentemente o historiador Paulo César Araújo analisou sinteticamente a questão. 47 dos meios de comunicação. De fato acredito ter sido crucial a Rede Globo para a disseminação da cultura disco, mas a sua adesão denota um cansaço coletivo sobre as formas artísticas engajadas, pedindo novas reflexões após o término de um período marcado pelo cerceamento das liberdades individuais. 48 FONTES Álbuns Fonográficos: FRENÉTICAS. Frenéticas. Rio de Janeiro: Atlantic/WEA, 1977. 1 disco. _____ .Caia na gandaia. 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