Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 ANÁLISE ESPECTRAL DAS TENSÕES E CORRENTES DURANTE A OCORRÊNCIA DE FALTAS EM UMA LINHA HVDC RUI B. JUNIOR*, RENATO M. MONARO†, DANIEL BARBOSA‡, JOSÉ C. M. V. JÚNIOR*, RICARDO C. SANTOS§, DENIS V. COURY* * Laboratório de Sistemas de Energia Elétrica, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo Av. Trabalhador São-carlense, 400, São Carlos, SP, Brasil † Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétrica, Escola Politécnica, Universidade de São Paulo Av. Professor Luciano Gualberto, Travessa 3, 158, São Paulo, SP, Brasil ‡ Laboratório de Qualidade de Energia e Conversão Eletromecânica da Energia, Universidade Salvador Alameda das Espatódeas, 915, Caminho das Árvores, Salvador, BA, Brasil § Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do ABC Rua Santa Adélia, 166, Santo Andre, SP, Brasil E-mails: [email protected], [email protected], [email protected], [email protected], [email protected], [email protected] Abstract With the growing usage of direct current transmission systems, there is a need to adapt the protection systems to work properly both in the direct current and alternating current portion of the system. This work aims a spectral analysis of voltages and currents during the occurrence of faults in a given transmission system in direct current, in order to identify frequency components able to assist protection systems in the identification and/or classification of faults. Keywords HVDC, FFT, Protection, Transmission, Protection, Frequency. Resumo Com o crescimento da utilização de sistemas de transmissão em corrente contínua, existe a necessidade de se adequar os sistemas de proteção para atuarem corretamente tanto na porção em corrente contínua quanto na porção em corrente alternada do sistema. Este trabalho visa uma análise espectral das tensões e correntes durante a ocorrência de faltas em um dado sistema de transmissão em corrente contínua, de modo a identificar componentes de frequência capazes de auxiliar sistemas de proteção na identificação e/ou classificação das faltas. Palavras-chave HVDC, FFT, VSC, Transmissão, Proteção, Frequência. 1 Alternativamente ao sistema CA, o sistema em HVDC pode operar interligando sistemas não sincronizados, devido à utilização de conversores CC/CA, onde não é necessário que emissor e receptor operem na mesma frequência. Em cabos submarinos, a alta capacitância observada no sistema CA torna a transmissão por distâncias acima de 30 km impraticável, além de requerer a utilização de estações compensadoras (Kundur, 1994), tornando a utilização da corrente contínua neste caso ainda mais vantajosa. Em (Mossadegh & Aggarwal, 2010) foi realizado um estudo de viabilidade econômica da utilização de linhas de transmissão em HVDC interligando fazendas eólicas de geração de energia em alto mar. Os autores avaliaram a utilização de redes HVDC com múltiplos terminais e cabos submarinos e, comparativamente ao sistema em CA, o sistema HVDC torna-se financeiramente mais atrativo com o aumento da potência transmitida. Uma vez que a distância entre os terminais a serem conectados é fixa, o alto custo de implantação do sistema CC justifica-se em potências elevadas devido à redução nas perdas durante a transmissão da energia. Introdução Considerando o crescente aumento da demanda de energia pelos grandes centros consumidores e a dificuldade para a instalação de fontes energéticas próximas a tais centros, torna-se cada vez mais importante a ampliação do sistema de transmissão em longas distâncias. Desta forma, o desenvolvimento de novas tecnologias de transmissão que permitam uma redução nos custos e nas perdas durante o transporte tem se tornado um desafio para engenheiros e pesquisadores. Dentre as novas propostas, a transmissão de energia elétrica em altas tensões e corrente contínua, da sigla em inglês HVDC (High Voltage Direct Current), apresenta-se como uma alternativa atrativa em relação aos sistemas de transmissão de energia convencionais, em corrente alternada. Segundo o Comitê de Transmissão e Distribuição de energia do IEEE (IEEE/PES Transmission and Distribution Committee, 2012), é possível observar que existem aproximadamente 60 projetos para implementação de linhas de transmissão HVDC planejados para os próximos anos em todo o mundo, e pelo menos 170 linhas de transmissão HVDC em operação. 684 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 níveis resulta em reduções na geração de harmônicos e nas perdas de chaveamento dos semicondutores. Desenvolvimentos recentes apontam para a utilização de Conversores Modulares Multiníveis como uma solução promissora, entre outros aspectos, pela redução de harmônicos gerados, redução da necessidade de filtros CA e característica modular (Gemmell, et al., 2008). A transmissão em corrente contínua para grandes potências apresenta vantagens como a redução do número de cabos: apenas um para o sistema monopolar ou dois para o sistema bipolar, possibilidade de utilização de torres que ocupam uma menor área em relação ao sistema em corrente alternada de mesma potência (Fig. 1), além da redução nas perdas durante a transmissão. Logo, em sistemas com elevada potência e/ou distância entre os pontos de conexão, as vantagens supracitadas podem caracterizar benefícios financeiros na utilização do sistema em corrente contínua em detrimento da utilização da corrente alternada. A redução das perdas de transmissão em relação ao sistema em corrente alternada torna-se ainda mais expressiva em sistemas subterrâneos ou subaquáticos. Ademais, o sistema em corrente contínua apresenta vantagens por possibilitar a conexão de sistemas dessincronizados, podendo inclusive interligar países que operam em frequências distintas, como por exemplo, a conexão entre Brasil (60 Hz) e Paraguai (50 Hz). Com relação aos conversores, dada a capacidade de controlar a potência transmitida por uma linha CC, é possível melhorar a estabilidade dinâmica nas redes CA associadas, além de ser possível limitar a corrente de falta nas linhas CC (Sood, 2004). Esta capacidade de controlar a potência transmitida confere às redes de transmissão HVDC um papel importante no conceito de smart grids, estabelecendo uma conexão totalmente controlável além de aumentar a confiabilidade da rede (Saksvik, 2012). Um estudo semelhante foi realizado em (Reed, et al., 2013), que propõe um método para o cálculo das perdas na transmissão de energia para sistemas HVDC em alto mar, concluindo que o custo da transmissão em corrente contínua é menor que o apresentado pela transmissão em CA para longas distâncias. Com a propagação da utilização das linhas de transmissão em corrente contínua, existe a necessidade da elaboração de métodos cada vez mais eficazes na identificação e eliminação de faltas na rede. Neste sentido, este trabalho visa à realização de um estudo sobre o espectro de frequência da tensão e corrente nas linhas de transmissão HVDC durante a ocorrência de diversos tipos de faltas, tanto na porção CC, quanto na porção CA do sistema. Com isto, espera-se identificar componentes de frequência específicos para diferentes tipos de faltas, capazes de auxiliar tanto na identificação de situações de curto-circuito quanto na melhoria de características funcionais como seletividade, e confiabilidade do sistema de proteção. 2 VSC-HVDC Em termos dos conversores utilizados na transmissão de energia em corrente contínua, a válvula de mercúrio foi a tecnologia utilizada até a década de 70, e então substituída pelo tiristor. Segundo (Sood, 2004), a tendência atual é a substituição da utilização de tiristores por dispositivos auto comutáveis, constituídos por IGBTs (Insulated Gate Bipolar Transistor), por exemplo. A vantagem dos novos dispositivos é a possibilidade de controle do momento de condução e não condução, diferentemente dos tiristores, em que o momento de não condução é definido pela corrente na rede. Neste sentido, das diferentes tecnologias empregadas nos conversores, o conversor de fonte de tensão, da sigla em inglês VSC (Voltage-Sourced Converter) constitui uma opção relativamente nova e promissora com a utilização de dispositivos auto comutáveis na transmissão em HVDC. Em (Flourentzou, et al., 2009) é realizado um resumo das principais tecnologias e configurações utilizadas em sistemas HVDC, enfatizando os VSCs por possibilitarem uma série de aplicações, como a conexão de redes CC em redes CA fracas e a implementação de redes com múltiplos terminais. Ademais, a utilização dos VSCs possibilita o controle independente da transferência das potências ativa e reativa na linha (Arrillaga, et al., 2010). As características operativas de um VSC quanto ao conteúdo harmônico gerado, forma de onda CA sintetizada e perdas na conversão dependem do arranjo dos elementos semicondutores utilizados. Em (Andersen, et al., 2002) é feita uma comparação entre custo, formas de onda e conteúdo harmônico para conversores VSC de dois, três e quatro níveis, onde pode ser observado que o aumento no número de Fig. 1: Comparativo entre a faixa de servidão para sistemas CC e CA de mesma potência. Adaptado de (Sood, 2004). Adicionalmente, linhas de transmissão em corrente contínua não necessitam de compensadores para viabilizar a transmissão em longas distâncias, e redes VSC-HVDC podem ser conectadas a sistemas fracos, ou até mesmo que não apresentem geração de energia (Flourentzou, et al., 2009). Estas proprieda- 685 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 ção de redes HVDC de múltiplos terminais as metodologias de proteção devem ser cuidadosamente elaboradas de modo a garantir velocidade e precisão des apresentam vantagens principalmente no tocante à geração de energia em ambientes remotos, como a instalação de fazendas eólicas em alto mar. De modo Fig. 2: Sistema utilizado nos testes. na identificação de faltas, evitando danos aos equipamentos e isolando apenas a porção defeituosa da rede. No trabalho desenvolvido por (Deng, 2013) foi proposta uma metodologia para a identificação de faltas em um sistema HVDC com quatro terminais, sendo que os valores da corrente e de seu respectivo espectro de frequências foram utilizados como entradas no algoritmo de detecção da falta. Cabe ressaltar que no trabalho citado os conversores foram modelados como fontes de corrente contínua, eliminando a influência da operação do controle dos conversores na resposta do sistema. geral, as características intrínsecas de sistemas VSCHVDC configuram um ambiente propício para a conexão de geração de energia por meio de fontes alternativas, tais como parques eólicos ou fotovoltaicos. No tocante à proteção em linhas HVDC, disjuntores específicos para a utilização em corrente contínua ainda estão em fase de desenvolvimento e apenas recentemente, no ano de 2012, foi anunciado o primeiro disjuntor comercial para utilização em linhas HVDC (ABB, 2013). Logo, para que seja feito o isolamento de faltas na porção em corrente contínua do sistema são acionados disjuntores na porção CA. Em sistemas ponto a ponto este procedimento é eficaz, porém com os avanços nas pesquisas acerca de sistemas com múltiplos terminais, este procedimento levaria ao isolamento de porções sãs da rede, sendo então necessários algoritmos específicos na detecção de faltas e disjuntores em corrente contínua para a correta operação do sistema de proteção. 3 Sistema teste Para a realização das simulações computacionais, foi utilizado o modelo de VSC-HVDC ponto a ponto proposto por Silvano Casoria (Casoria, 2007) com algumas modificações. O sistema modelado no software Mathworks Simulink® é mostrado na Fig. 2, e é composto basicamente por dois sistemas CA equivalentes, e seus respectivos conversores, interconectados por uma linha de transmissão VSC-HVDC. Foram utilizados no trabalho conversores de três níveis compostos por IGBTs, e estão conectados à rede CA por meio de um transformador, de modo a compatibilizar os níveis de tensão entre a rede CC e CA (Fig. 3). Além disso, foram utilizados no lado CA um reator série e um filtro em derivação para reduzir a quantidade de harmônicos injetados na rede. No lado CC existe um filtro para terceira harmônica além de capacitores e indutores para a redução das oscilações presentes na retificação. É fundamental salientar que uma parte importante da simulação executada é o controle dos pulsos dos conversores. Para a definição da condição de chaveamentos dos elementos semicondutores são monitoradas as tensões e correntes tanto do lado CC quanto do lado CA, sendo estes valores condiciona- Fig. 3: Estrutura dos conversores utilizados. Um dos principais métodos para a detecção de faltas em linhas HVDC é a utilização do conceito de ondas viajantes (Yixuan, et al., 2013) e adaptações da proteção de distância (Zhang, et al., 2012), largamente utilizada em redes CA. Entretanto, com a introdu- 686 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 Em termos operativos, o controle do sistema simulado foi configurado de modo que a estação retificadora opere controlando as potências ativa e reativa, e a estação inversora controlando o nível da tensão na linha CC e a potência reativa. É relevante destacar que o sistema VSC-HVDC simulado não utiliza comunicação entre as estações conversoras, ou seja, a operação das mesmas é realizada de forma independente. Finalmente, a linha de transmissão CC utilizada foi subdividida em duas partes com 100 km de extensão cada, totalizando uma linha de 200 km. Cada uma das partes foi simulada com a utilização do modelo pi com 20 seções, de modo a garantir uma boa representação dos transitórios na linha, conforme evidenciado por (Khatir, et al., 2006). dos com a utilização de um filtro anti-aliasing com frequência de corte de 2000 Hz. Após o condicionamento, os sinais passam por um bloco do tipo sample and hold, visando simular a aquisição do sinal como em um caso real. De modo geral, o controlador é composto por quatro módulos: o Phase Locked Loop (PLL), o laço externo de potência ativa/reativa e tensão, o laço interno de corrente e o controle de balanço da tensão CC, conforme ilustrado na Fig. 4. O bloco PLL é responsável pela estimação da frequência que será utilizada no sincronismo total do sistema de controle. No laço externo de potência ativa/reativa e tensão é realizado o cálculo da corrente de referência para o bloco subsequente, com base nos valores de tensão e corrente obtidos do sistema. Resumidamente, nesta etapa é realizada a adequação do valor de referência da corrente de modo a manter a tensão tanto do lado CA quanto CC dentro de limites préestabelecidos para segurança operacional do sistema. Em seguida o laço interno de corrente, que possui um modelo do comportamento do controlador, computa qual deve ser a tensão no lado CC, considerando as quedas de tensão existentes no próprio controlador. Esta tensão de referência é então enviada para o módulo de controle de balanço da tensão CC, que atua para a igualar em módulo a tensão apresentada nos polos positivo e negativo, mantendo a tensão balanceada na linha CC (Casoria, 2007). No lado CA, o controle da magnitude e ângulo de fase da onda de tensão sintetizada pelo conversor é realizado de maneira a controlar o fluxo de potência ativa, dada pelo ângulo de fase, e da potência reativa, dada pela magnitude da tensão. O sinal computado nas etapas anteriores é finalmente enviado ao modulador de largura de pulso (PWM) senoidal, que realiza a geração dos pulsos que irão acionar os elementos semicondutores. 3.1 Metodologia Após a modelagem do sistema teste, diversas faltas foram aplicadas com o intuito de analisar o conteúdo do espectro de frequência dos sinais de tensão e de corrente. As faltas foram aplicadas em cinco pontos distintos: no lado CA do retificador, no lado CC do retificador, na metade da linha CC, no lado CC do inversor e finalmente no lado CA do inversor; sendo que estes pontos estão identificados na Fig. 2 por CA1, CC1, CC2, CC3 e CA2, respectivamente. Na linha CA, foram aplicados curto-circuitos monofásicos, bifásicos e trifásicos, com e sem envolvimento do terra, enquanto que na linha CC os curtocircuitos aplicados foram monopolares e bipolares, com e sem envolvimento do terra. Em todos os casos a serem apresentados nesse estudo foram aplicadas faltas francas durante a operação normal do sistema, e os valores de tensão e corrente de cada um dos pontos do sistema foi adquirido para análise, como será apresentado na seção de resultados. Posteriormente, os dados adquiridos foram processados com a utilização da Transformada Rápida de Fourier, da sigla em inglês FFT (Fast Fourier Transform), com a aplicação do janelamento retangular. Cada uma das janelas é composta por 13500 amostras num período de 100 ms, o que representa uma frequência de amostragem de 135 kHz. Vale ressaltar que esta elevada frequência de amostragem foi empregada no trabalho de modo a garantir uma boa representação das formas de onda, visando obter resultados precisos na aplicação da FFT. Destaca-se ainda que a janela de pós-falta considerada no estudo se inicia 100 amostras após a incidência do curto. 4 Resultados A sucessiva aplicação de faltas em diferentes pontos do sistema gerou uma extensa base de dados para análise. Logo, apenas parte dos resultados será apresentada de modo a ilustrar as respostas obtidas. Na Fig. 5 (a) é possível observar o comportamento da tensão na fase ‘a’ durante a aplicação de um curto-circuito monofásico entre a fase ‘a’ e a Fig. 4: Visão geral do controlador. Adaptado de (Casoria, 2007). 687 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 gerar alterações nas leituras realizadas em CA1, como mostrado na Fig. 8. Neste caso, a alteração mais significativa no espectro de frequência ocorreu em 150 Hz, evidenciando a introdução da componente de terceiro harmônico na tensão no ponto CA1. terra no ponto CA1. O bloco destacado na curva da tensão se refere à janela de dados utilizada na determinação do espectro de frequências do sinal, sendo que o módulo da diferença entre os espectros de pré e pós-falta é exibido na Fig. 5 (b). Particularmente para este caso, o espectro de frequência de pós-falta é nulo, uma vez que a janela de dados utilizada apresenta apenas valores nulos. Desta forma, a diferença entre os espectros mostrada na Fig. 5 (b) reflete o espectro de pré-falta falta. Fig. 6: Curto-circuito entre polo positivo e a terra aplicado em CC1, com medição de tensão em CA1. Fig. 5: Curto-circuito entre fase ‘a’ e terra aplicado em CA1 com medição de tensão em CA1. Mantendo-se o ponto de medição da tensão e corrente em AC1 e aplicando-se um curto-circuito entre o polo positivo e a terra na linha CC em CC1, são observados os sinais de tensão e corrente apresentados nas Fig. 6 e Fig. 7, respectivamente. Essas figuras mostram as alterações nos espectros de tensão e corrente no ponto AC1, devido à ocorrência de um curto-circuito no início da linha CC, ou seja, no ponto CC1. É possível observar que houve uma sutil alteração no espectro de frequências na tensão em CA1, uma vez que a magnitude das diferenças apresentada na Fig. 6 é bastante reduzida. Entretanto, destaca-se predominância da componente de 100 Hz, evidenciando presença da segunda harmônica. Na Fig. 7 as principais alterações evidenciadas pelo espectro de frequência são relativas às frequências de 50 e 100 Hz, indicando o aparecimento da componente de segunda harmônica da corrente em CA1 com a aplicação da falta em CC1. Fig. 7: Curto-circuito entre polo positivo e terra aplicado em CC1, com medição de corrente em CA1. Em todos os casos apresentados com a realização da medição de tensão e corrente em CA1 se observa que as variações significativas no espectro de frequência limitam-se a valores abaixo de aproximadamente 500 Hz, o que ocorre basicamente devido à utilização de filtros na porção CA do sistema, absorvendo componentes de alta frequência. Deslocando-se do ponto de medição para o início da linha CC, ou seja, ponto CC1, é possível observar o comportamento da tensão e corrente na linha CC em função da aplicação de faltas ao longo do As variações de tensão e corrente em CA1 com a aplicação de faltas monopolares entre o polo positivo e a terra na linha CC nos pontos CC2 e CC3 leva a resultados similares aos apresentados para aplicação em CC1, salvo pequenas variações de amplitude, logo não serão aqui apresentados. Entretanto, a aplicação de uma falta monofásica na porção CA no extremo oposto da linha, ponto CA2, é capaz de 688 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 sistema. Com a aplicação de uma falta monofásica no ponto CA1 a entrada do retificador é exposta a tensões de entrada fortemente desbalanceadas, afetando diretamente a tensão na linha CC, como mostrado na Fig. 9. Este efeito ocorre basicamente devido à descarga dos capacitores presentes na linha CC. Em termos da variação de frequência, além da abrupta variação na frequência zero, relativa à queda da tensão na linha CC, pode ser observada uma variação em 600 e 1350 Hz. Fig. 8: Curto-circuito entre fase ‘a’ e terra aplicado em CA2, com medição de tensão em CA1 Fig. 9: Curto-circuito entre fase ‘a’ e a terra aplicado em CA1 com medição em CC1. Na Fig. 11 é ilustrado o efeito na linha CC de um curto-circuito trifásico em CA2. A oscilação causada na tensão da linha CC pode ser justificada pela operação do inversor, configurado neste sistema para controlar a potência reativa e a tensão na linha CC. Com o curto-circuito trifásico na saída do inversor a estimação da frequência de operação da rede CA realizada pelo PLL é comprometida, assim como a medição da potência reativa, acarretando na operação irregular do controle devido à perda de referência A análise da diferença entre os espectros de pré e pós-falta da Fig. 9 (b) revela que a alteração abrupta nos sinais de entrada do retificador resulta no aparecimento de diversas componentes de frequência na linha CC, principalmente em 10, 50, 100, 170 e 250 Hz. Ao realizar a aplicação de um curto-circuito entre os polos positivo e negativo no final da linha CC, ou seja, no ponto CC3, a tensão observada em CC1é reduzida gradativamente, como mostrado na Fig. 10. Tabela I: Frequências exclusivas em cada ponto de medição Medição Var Va CA 1 Ia Va CA 2 Ia VdcP CC 1 IdcP VdcP CC 3 IdcP Falta Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Lado CA Lado CC Frequências Exclusivas [Hz] 80 100 260 220 60 40 240 180 130 110 590 190 220 170 230 590 180 240 150 110 270 230 150 100 250 190 140 180 600 200 230 180 240 600 190 260 260 200 270 240 250 240 350 360 200 260 200 330 270 210 210 610 1350 240 190 250 610 1350 270 350 360 370 340 410 300 350 360 370 380 390 330 340 350 360 370 260 620 270 630 280 700 300 710 310 1080 320 1090 330 340 350 360 440 260 200 260 620 270 300 360 370 580 590 600 610 620 700 270 630 290 700 300 710 310 720 320 730 330 1080 340 350 560 1090 1100 570 300 360 370 380 390 590 600 610 700 400 620 630 Onde: Va, Ia = Tensão e corrente na fase ‘a’ / VdcP, IdcP = Tensão e corrente no polo positivo da linha HVDC 689 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 tanto da frequência quanto da potência transmitida. No tocante ao espectro de frequências deste caso, pode-se observar uma significativa variação nos componentes de 160 e 170 Hz, além de uma pequena variação em torno de 1350 Hz. Vale ressaltar que a frequência de 1350 Hz é relativa à frequência da onda portadora existente na modulação dos pulsos dos elementos semicondutores, sendo assim a presença de componentes dessa frequência é esperada na operação do sistema. Para possibilitar a análise dos resultados obtidos de maneira mais direta, de acordo com os objetivos definidos, foram elencadas as frequências que apresentaram maior variação entre o espectro de pré e pós-falta, organizadas de acordo com o local de aplicação da falta e o ponto de medição da tensão e corrente. Fig. 11: Curto-circuito trifásico sem envolvimento do terra em CA2 com medição em CC1. Desta forma, utilizando-se as linhas Lado CA e Lado CC da Tabela I, para uma dada grandeza de interesse e ponto de medição, é possível encontrar as alterações no espectro de frequência capazes de indicar se a falta é interna ou externa à porção selecionada do sistema, auxiliando no critério de seletividade. Por exemplo, se a medição de tensão no ponto CA2 identificar uma situação faltosa no sistema, a observação da variação da componente de frequência de 150 Hz vai indicar se a falta é na porção CA ou na porção CC do sistema. Ou seja, se for evidenciada uma significativa alteração em componentes de frequência de 150 Hz isto indica a ocorrência de uma falta na porção CA do sistema. Caso contrário, a ocorrência da falta está associada à linha HVDC, sendo a proteção localizada em CA2 caracterizada como retaguarda. A Tabela I não apresenta uma linha relativa a medições de tensão e corrente no ponto CC2, uma vez que este se encontra no centro da LT onde não existem medidores. Ressalta-se ainda que o potencial de utilização das frequências encontradas neste trabalho em algoritmos de proteção primária, que com a utilização, por exemplo, da Transformada Discreta de Fourier, podem identificar prontamente alterações significativas em frequências específicas, detectando a existências de uma situação de curto-circuito na linha. Fig. 10: Curto-circuito entre os polos positivo e negativo aplicado em CC2 com medição em CC1. Para tanto, as mais significativas alterações no espectro de frequência para cada combinação possível entre ponto de medição e aplicação de curtocircuito foram listadas e organizadas, como apresentado na Tabela I. Vale destacar que apenas as frequências onde foram observadas variações superiores a dois por cento do valor da grandeza em regime foram consideradas, visando a eliminação da influencia de ruídos no sinal. De acordo com a organização dos dados, a interpretação dos valores na tabela é feita como segue: Fixando-se o ponto de medição em CA1 e medindose a tensão na fase ‘a’ (Va), as frequências listadas em “Lado CA” representam valores de frequências com alterações significativas observadas apenas em faltas aplicadas nos pontos de corrente alternada do sistema, ou seja, CA1 ou CA2. Similarmente, as frequências relativas à “Lado CC” indicam as frequências com alterações significativas observadas apenas em faltas na linha HVDC, ou seja, faltas aplicadas em CC1, CC2 ou CC3. 5 Conclusões O desenvolvimento de novas tecnologias e a contínua necessidade de vencer grandes distâncias na transmissão de energia trazem cada vez mais a utilização de linhas de transmissão de alta tensão em corrente contínua como foco de interesse. Logo, existe a necessidade de evolução não somente das tecnologias para transmissão da energia, mas também 690 Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 Deng, Q., 2013. A Novel Protection Scheme for Multi-terminal HVDC. Dissertação de Mestrado: Department of Electronic & Electrical Engineering, University of Bath, UK. Flourentzou, N., Agelidis, V. & Demetriades, G., 2009. VSC-Based HVDC Power Transmission Systems: An Overview. IEEE Transactions on Power Electronics, 24(3), pp. 592-602. Gemmell, B., Dorn, J., Retzmann, D. & Soerangr, D., 2008. Prospects of multilevel VSC technologies for power transmission. Transmission and Distribution Conference and Exposition, 2008. T&D. IEEE/PES. IEEE/PES Transmission and Distribution Committee, 2012. HVDC Projects List, s.l.: IEEE HVDC and FACTS Subcommittee. Khatir, M. et al., 2006. HVDC Transmission Line Models for Steady-State and Transients Analysis in SIMULINK Environment. IEEE Industrial Electronics, IECON 2006 - 32nd Annual Conference on, pp. 436-441. Kundur, P., 1994. Power System Stability and Control. s.l.:McGraw-Hill Professional. Mossadegh, N. & Aggarwal, R., 2010. Management and Viability of Multi-Terminal HVDC for Offshore Renewable Energy Networking. International Universities Power Engineering Conference, UPEC. Reed, G. et al., 2013. Comparison of HVAC and HVDC Solutions for Offshore Wind Farms with a Procedure for System Economic Evaluation. Energytech IEEE, Mai, pp. 1-7. Saksvik, O., 2012. HVDC Technology and Smart Grid. IET International Conference on Frontier Computing. Sood, V. K., 2004. HVDC and FACTS Controllers: Applications of Static Converters in Power Systems. s.l.:Springer. Yixuan, C., Min, X., Zexiang, C. & Lin, Z., 2013. An analytical study on the performance evaluation of HVDC travelling wave protection. Power and Energy Society General Meeting (PES). Zhang, J. et al., 2012. A Fast Full-Line Tripping Distance Protection Method for HVDC Transmission Line. Power and Energy Engineering Conference (APPEEC). dos métodos e equipamentos necessários para a correta proteção das redes em caso de faltas. Neste trabalho foi realizada uma análise dos espectros de frequência dos sinais de tensão e corrente em linhas de transmissão VSC-HVDC, além da rede em corrente alternada a ela conectada. Com isto, pode-se observar que existem componentes de frequências específicas, que sofrem alteração significativa entre a situação de pré e pós-falta. Desta forma, este resultado contribui com as análises relativas à proteção de sistemas HVDC, evidenciando que a análise particular de um modelo pode revelar componentes de frequência capazes de auxiliar na identificação de curto-circuitos no sistema. Destaca-se ainda que o conteúdo espectral da tensão e corrente pode auxiliar no critério de seletividade da proteção, uma vez que o monitoramento de frequências específicas pode indicar se uma situação de falta identificada pelo relé corresponde à sua zona primária de atuação, evitando a operação errônea da proteção isolando porções saudáveis da rede. É importante observar que neste estudo foi utilizado um sistema de testes específico, e que os valores das frequências mencionados no decorrer do mesmo podem mudar completamente para uma configuração alternativa, tanto da linha quanto dos controladores. Entretanto, os resultados obtidos proporcionam um importante indicativo de que com uma metodologia de simulação de sistema e análise espectral das respostas é possível encontrar componentes de frequência de grande valia para algoritmos de proteção. Agradecimentos Os autores agradecem o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo suporte financeiro para a realização desta pesquisa, bem como ao Laboratório de Sistemas de Energia Elétrica (LSEE) da Escola de Engenharia Elétrica de São Carlos (EESC/USP) pela infraestrutura fornecida. Referências Bibliográficas ABB, 2013. ABB no Brasil. [Online] Available at: http://www.abb.com.br/cawp/seitp202/2c71a01b 146363c883257aaf003f0135.aspx [Acesso em 22 11 2013]. Andersen, B., Xu, L., Horton, P. J. & Cartwright, P., 2002. Topologies for VSC transmission. Power Engineering Journal, 16(3), pp. 142-150. Arrillaga, J., Liu, Y., Watson, N. & Murray, N., 2010. Self-Commutating Converters for High Power Applications. s.l.:John Wiley & Sons. Casoria, S., 2007. VSC-Based HVDC Transmission System (Detailed Model), s.l.: Manual de Referência - Simulink®. 691