Topical microbicides: a new technology for preventing sexual transmission of HIV Resumo A AIDS já vitimou milhares de pessoas desde a sua descoberta e a epidemia do HIV continua a propagarse, atingindo especialmente as mulheres. Características do trato genital feminino, presença de DSTs e o pouco uso do condom tornam a mulher mais susceptível ao vírus. Neste contexto, existe a necessidade de desenvolver novos métodos preventivos, que possam ser controlados pela mulher. Os microbicidas são agentes de uso tópico que, auto-administrados, poderão diminuir o risco de transmissão sexual do HIV do homem para a mulher. Podem ser introduzidos na vagina ou no reto, antes do ato sexual. Ainda não foi encontrado um microbicida seguro e eficaz, porém, vários produtos estão em fase 3 de estudo nos países africanos. Os microbicidas possuem mecanismos de ação diversos: destruição do envelope viral; inibição da ligação do vírus à célula hospedeira; melhoria das defesas naturais vaginais; inibição dos receptores celulares de superfície para o HIV; inibição da transcriptase reversa. O primeiro microbicida testado, o Nonoxynol-9, causou danos à integridade da mucosa vaginal, aumentando o risco de infecção pelo HIV. No momento, existem pelo menos cinco produtos sendo testados na sua eficácia microbicida. Se algum produto ultrapassar a fase 3 sem produzir efeitos colaterais importantes, sua distribuição poderá modificar radicalmente o cenário atual da epidemia pelo HIV. AT U A L I Z A Ç Ã O Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Victor Hugo Melo1 Nara Chartuni Pereira Teixeira2 Palavras-chave Antiinfecciosos Locais Infecções por HIV Prevenção de Doenças Transmissíveis Abstract Keywords Anti-Infective Agents Local HIV Infections Communicable Disease Prevention AIDS has killed thousands of people since its discovery and HIV epidemics have continued to spread, affecting above all women. Female genital tract characteristics, STDs presence, and low condom using, convert women more susceptible to the virus. In this context, it does exist the need to develop new protective methods that could be controlled by woman. Microbicides are topic use agents that could reduce the risk of sexual transmission of HIV from man to woman, when they are self administered. They could be introduced in vagina or rectum before the sexual intercourse. A safe and an efficacious microbicide have not been found yet, however, several products are in phase 3, in African countries. Microbicides have different mechanisms of action: viral envelope destruction; inhibiting of viral binding to the host cell; improvement of vagina self defenses; inhibiting of HIV surface cells receptors; inhibiting of reverse transcriptase. The first microbicide that was tested, the Nonoxynol-9, damaged vaginal mucosa integrity, increasing HIV-infection risk. At this moment, it does exist at least five products that are being tested in their microbicidal efficacy. If some product exceeds phase 3, without producing important adverse events, his distribution could extremely change the current scenery of HIV epidemics. 1 2 Professor Associado da Faculdade de Medicina da UFMG. Editor Associado de Femina. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Saúde da Mulher da Faculdade de Medicina da UFMG FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 573 573 03.10.08 16:03:06 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Introdução A síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids) já vitimou mais de 25 milhões de pessoas desde que foi descoberta em 1981, tornando-se uma das epidemias mais destrutivas da história. O crescente acesso à terapia anti-retroviral em várias regiões do mundo não impediu a perda de 3,1 milhões (2,8 - 3,6 milhões) de 1 vidas só em 2006, incluindo mais de meio milhão de crianças. O vírus da imunodeficiência humana (HIV) continua a propagar-se em várias partes do mundo e, provavelmente, 14.000 novas infecções ocorrem a cada dia, metade das quais em pessoas jovens, entre 15 e 24 anos. Dados do ano de 2006 estimam que 40 milhões de pessoas viviam com o HIV e cerca de cinco milhões foram contaminadas somente naquele ano. Na América Latina, 1,7 milhão de pessoas (1,3 – 2,2 milhões) portava o HIV em 2006, sendo 240.000 casos novos. A população de baixa renda e baixo nível sociocultural é a de mais alto risco para adquirir a infecção. Sabe-se que 95% das novas infecções têm ocorrido nos países em desenvolvimento, em decorrência da transmissão heterossexual do vírus. Esta é, atualmente, a principal forma de transmissão do HIV: entre 75 e 90% dos indivíduos portadores do vírus foram 1 infectados através de relações heterossexuais. A infecção pelo HIV vem aumentando gradualmente nas mulheres. Hoje, em todo o mundo, existem 17,5 milhões de mulheres infectadas. Na África subsaariana, 57% das pessoas vivendo com o HIV são mulheres. Entre as que têm idade entre 15 e 24 anos, a infecção é três vezes mais comum do que entre 1 os homens da mesma idade. Deve-se enfatizar que as mulheres têm susceptibilidade duas a quatro vezes maior que os homens para adquirir o HIV. A maior vulnerabilidade da mulher está relacionada às características anatômicas e fisiológicas próprias da região genital feminina, à desigualdade social e econômica entre os sexos e à dificuldade em garantir que o parceiro masculino utilize o preservativo nas relações sexuais, tornando-a mais susceptível às doenças sexualmente transmissíveis, incluindo o HIV . A “feminização” da epidemia é um aspecto importante do ponto de vista da saúde pública porque as mulheres têm sido contaminadas por parceiros que não usam o preservativo nas relações sexuais. Abstinência sexual, monogamia e uso do condom em todas as relações sexuais (ABC: abstinence, be faithful, condom use) são opções seguras para evitar a transmissão sexual e o aumento da infecção pelo HIV, porém, grande parte da população sexualmente ativa não está disposta a seguir essas recomendações. O uso consistente e correto do preservativo masculino é altamente eficiente na prevenção primária da infecção pelo HIV, mas o aumento nas taxas de transmissão sexual da epidemia demonstra 574 que é um recurso pouco utilizado. Sabe-se que o uso regular do condom em relacionamentos estáveis é muito baixo (30%), mesmo em situações de intenso aconselhamento individual e social. O preservativo feminino também é eficiente para a prevenção do HIV, mas seu uso é dificultado pela recusa do parceiro e pela 2 necessidade de habilidade da mulher para utilizá-lo. Grande parte das mulheres que adquirem o HIV tem relacionamento monogâmico e estável. São também as mulheres as maiores vítimas de violência sexual, seja em relações com parceiros fixos ou no trabalho, caso sejam profissionais do sexo. Em algumas culturas preza-se a fecundidade em detrimento das práticas sexuais seguras. A prevenção da infecção pelo HIV é teoricamente simples: estimular a monogamia e o uso consistente do condom. No entanto, com estas responsabilidades sob o domínio do sexo masculino, tais intervenções estão trazendo poucos benefícios na luta contra a pandemia. Isso significa que é urgente o desenvolvimento de tecnologias preventivas que possam ser controladas pelo sexo feminino e que tornem o seu relacionamento sexual seguro. Os microbicidas são agentes de uso tópico e, auto-administrados profilaticamente, são uma das tecnologias mais promissoras para diminuir o risco de aquisição sexual do HIV, na ausência de intervenção profilática mais efetiva, como as vacinas. Métodos atuais para prevenir a infecção pelo HIV O condom masculino é um método muito seguro de prevenção da transmissão do HIV, desde que usado de forma correta e em todas as relações sexuais. Sabe-se das dificuldades que as mulheres enfrentam com seus parceiros para que eles façam uso rotineiramente do preservativo. Abordam-se, a seguir, as mais recentes propostas para prevenir a transmissão sexual do HIV. Vacinas Na atualidade, ainda não existe vacina capaz de induzir imunidade para a prevenção da transmissão do HIV. O desenvolvimento de uma nova vacina é processo longo e complicado, que pode demorar até 15 anos, necessitando de altos investimentos financeiros. A descoberta de uma vacina contra o HIV é um grande desafio, tendo em vista que este é o vírus mais complexo já descoberto pela ciência: o HIV tem como alvo o sistema imunológico do hospedeiro, no qual as vacinas tradicionais agem, além de ter instabilidade genética freqüente; como conseqüência, milhões de novos vírus são constantemente produzidos e as taxas de mutações são espantosas. FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 574 03.10.08 16:03:06 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV No momento, estão sendo desenvolvidos mais de 30 ensaios clínicos de substâncias candidatas a vacinas em diferentes países. Duas vacinas estão em ensaios clínicos avançados e os dados sobre a efetividade estarão disponíveis a partir de 2009. Apesar da busca incessante por uma vacina eficaz, todas as expectativas foram frustradas e diversas pesquisas têm como alvo apenas a atenuação da replicação viral em indivíduos previamente infectados, enquanto não se encontra a vacina ideal para prevenção 3 da infecção. Circuncisão masculina Resultados recentes de ensaios clínicos randomizados evidenciaram que a circuncisão masculina, procedimento cirúrgico antigo e muito comumente praticado por motivos culturais, religiosos e sociais − ou por indicação médica −, reduz a transmissão sexual do HIV. Os resultados recentes de três ensaios clínicos randomizados e controlados realizados na África do Sul, Uganda e Quênia indicaram que a circuncisão realizada por médicos bem treinados é segura e diminui as chances de adquirir o HIV em aproximadamente 60% dos casos. A retirada do prepúcio diminui as chances de infecção pelo HIV porque reduz a área da pele que contém grandes concentrações de células de Langerhans, macrófagos e células T CD4+, as células-alvo da infecção pelo vírus. Assim, a circuncisão teria o efeito de diminuir a área de contato disponível para a transmissão do HIV. Outro possível mecanismo de proteção relacionado à circuncisão seria a diminuição de secreções acumuladas no prepúcio e a menor incidência 4 de doenças ulcerativas e lacerações no pênis. Apesar das evidências científicas apontarem benefícios com a realização da circuncisão, trata-se de procedimento que envolve questões éticas, religiosas, étnicas, raciais e de direitos humanos e deve ser abordada com cautela quando se for proposta a realização em larga escala como medida preventiva para a saúde pública. Outro aspecto a ser considerado é a possibilidade de que seja disseminada na população a sensação de segurança com a realização da circuncisão, abandonando-se o uso do condom nas relações sexuais. Microbicidas Desde a década de 80 discute-se a necessidade de se encontrar um método controlado pelas mulheres para prevenção de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). O uso de microbicidas vaginais surgiu como a provável resposta a essa demanda, permitindo às mulheres assumirem diretamente o controle da prevenção da transmissão sexual do HIV e de outras DSTs, sem a participação 5 direta do seu parceiro. Microbicidas são produtos que, aplicados topicamente, têm a capacidade de prevenir a infecção de várias doenças de transmissão sexual, incluindo o HIV. São apresentados na forma de gel, supositórios ou creme, para uso tópico, podendo ser utilizados pela via vaginal ou retal, antes do ato sexual. No caso das mulheres, os microbicidas oferecem a grande vantagem de poderem ser utilizados sem o consentimento prévio dos parceiros. Os primeiros microbicidas conhecidos foram os espermicidas, produtos de baixo custo, fácil acesso e com atividade bactericida. O Nonoxynol-9 (N-9) foi lançado no mercado americano na década de 1960, com o objetivo inicial de contracepção. Posteriormente, estudos comprovaram sua ação anti-HIV in vitro. Devido a esta ação do Nonoxynol-9 contra o vírus, na década de 1990 foram realizadas diversas pesquisas para avaliar se os espermicidas disponíveis comercialmente poderiam ser utilizados em larga escala para prevenir a transmissão do HIV. Um dos estudos iniciais, que avaliou os efeitos do uso do Nonoxynol–9 na mucosa vaginal antes do ato sexual, detectou o aumento de lesões erosivas vaginais relacionadas ao uso da substância, o que contra-indicava seu uso 6 com o objetivo de prevenir a transmissão do HIV. Metanálise sobre a eficiência do Nonoxynol-9 versus placebo na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis envolvendo mais de 5.000 profissionais do sexo não apresentou evidências de proteção contra DSTs – incluindo o HIV – e outras infecções cérvico-vaginais. Os riscos relativos referentes a essas doenças, apesar de indicarem proteção, não apresentaram intervalos de confiança significantes: Neisseria gonorrhoeae (RR-0,91; IC a 95%:0,67-1,24); Chlamydia trachomatis (RR-0,88; IC a 95%:0,771,01); Trichomonas vaginalis (RR-0.84; IC a 95%:0,69-1,02); vaginose bacteriana (RR-0,88; IC a 95%:0,74-1,04) e candidíase (RR-0,97; IC a 95%:0,84-1,12). O grupo de mulheres que utilizaram o N-9 apresentou significativamente mais alto risco de lesões genitais (verrugas, úlceras e outras): RR-1,18; IC a 95%:1,02-1,36. O resultado da metanálise para o HIV demonstrou risco de soroconversão mais alto para o grupo que utilizou o Nonoxynol-9: RR-1,12; IC a 95%:0,88-1,42. Apesar do risco relativo não ter apresentado significância estatística, os autores concluíram que o produto não deve ser recomendado para a prevenção da infecção pelo HIV e outras DSTs.7 Ensaio clínico randomizado, com o objetivo de comparar nova formulação do Nonoxynol-9 (COL-1492) com placebo, confirmou alta incidência de disrupção do epitélio da mucosa vaginal quando o produto foi utilizado mais de três vezes ao dia, lesando a integridade do tecido e, com isso, aumentando 8 o risco de infecção pelo HIV (HR-1,8; IC a 95%:1,0 – 3,2). O Nonoxynol-9 causa liberação de citocinas com ação inflamatória, FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 575 575 03.10.08 16:03:07 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV o que explica o dano ao epitélio da mucosa vaginal evidenciado pelos estudos anteriores. A experiência com os diversos estudos utilizando o Nonoxynol-9 ensinou que a ausência de efeitos inflamatórios na mucosa vaginal é a chave para atestar a segurança do microbicida testado. Atualmente, discute-se qual seria o melhor método para detectar a inflamação da mucosa vaginal em estudos envolvendo os microbicidas, para ser utilizado nos diversos ensaios clínicos randomizados que estão sendo conduzidos. O objetivo primordial é encontrar um produto que seja inócuo para a mucosa vaginal 6 e eficiente na prevenção da transmissão do HIV. Patogênese do HIV Ainda existem muitas dúvidas sobre o mecanismo de transmissão sexual do HIV. Grande parte do conhecimento sobre a biologia da infecção pelo vírus advém de estudos in vitro, em tecidos humanos (ex-vivo) e a partir de experimentos com animais. Entender como o HIV penetra no epitélio vaginal ou cervical é fundamental para 9 buscar alternativas seguras para evitar a infecção. O HIV inicia a infecção a partir da ligação da glicoproteína gp120 viral à superfície CD4 do linfócito T helper, mediada pelos receptores de citocinas CXCR4 ou CCR5. Isto explica por que pessoas com deficiência de função dos receptores CCR5 são resistentes à transmissão sexual do HIV. A ligação do vírus com a molécula de CD4 é essencial para que o processo da infecção ocorra. Esse acoplamento entre a gp120 viral e a molécula de CD4 da superfície celular permitirá que ocorram as mudanças no envelope viral necessárias para o processo de fusão à membrana e a entrada do vírus na célula. As mucosas vaginal e ectocervical íntegras constituem barreira natural para impedir que microrganismos atinjam as células-alvo da infecção pelo HIV: linfócitos T CD4+, macrófagos e células dendríticas, incluindo as de Langerhans. O epitélio escamoso estratificado vaginal oferece extensa superfície de contato e, quando está intacto, possui alta resistência à penetração do vírus na camada submucosa. É importante lembrar que o epitélio vaginal e cervical se espessa, por influência estrogênica, mas essa espessura se reduz sob o efeito da progesterona na segunda metade do ciclo, tornando as mucosas da vagina e do colo uterino mais suscetíveis à ação de grande parte dos agentes patogênicos, incluindo o HIV. Por outro lado, o tecido colunar endocervical é bastante fino, por ser de monocamada, e se mostra frágil diante dos microrganismos infectantes. Entretanto, no seu sítio natural, é bem protegido pelo 576 muco cervical, que atua como barreira física contra as agressões externas. Contudo, a presença de ectopia cervical – que é mais freqüentemente encontrada em mulheres jovens – está associada a mais alto risco de transmissão do HIV porque a exposição do epitélio colunar, sem a devida proteção do muco, não oferece a 9 resistência aos agentes do meio externo. Desta forma, alterações na integridade da mucosa vaginal causadas pelo ato sexual, úlceras ou inflamações podem aumentar o risco da infecção pelo HIV. Estados fisiológicos como as ectopias no colo uterino e outros fatores – incluindo o uso de contraceptivos hormonais, gravidez e o período menstrual –, pelos motivos expostos anteriormente, podem estar associados a risco mais alto de aquisição do vírus. A acidez vaginal natural tem atividade protetora contra os patógenos causadores das infecções vaginais, incluindo Haemophilus ducrey, Herpes vírus e Chlamydia trachomatis. A presença dos lactobacilos e do ambiente ácido vaginal também está associada à diminuição da transmissão do HIV. A vaginose bacteriana, principal causadora do corrimento vaginal anormal, está associada a níveis mais baixos de peróxido de hidrogênio, resultando em aumento da flora de anaeróbios gram-negativo – como a Gardnerella vaginalis e os micoplasmas genitais –, alterando o equilíbrio da flora vaginal. Mecanismos de ação dos microbicidas A infecção pelo HIV tem início a partir de uma série de interações não específicas entre o envelope e algumas moléculas da superfície da célula humana. Após a associação inicial da partícula viral − por meio de moléculas carregadas negativamente conhecidas como proteoglicanos − a proteína gp120 do envelope viral se liga à molécula CD4 humana na superfície das células do sistema imunológico. O próximo passo é a penetração do core viral na célula hospedeira e a transcrição do RNA viral em DNA pela transcriptase reversa. Após a entrada e integração do DNA viral no núcleo da célula hospedeira, inicia-se a síntese de proteínas e enzimas virais para se completar o ciclo de infecção do vírus. Existem vários sítios de ação nos quais os microbicidas podem agir, interrompendo a transmissão ou a replicação viral. Assim, podem impedir a infecção pelo HIV por diferentes mecanismos de ação, tais como: auxiliando na manutenção das defesas naturais da vagina, com incremento da microflora vaginal e promoção de um PH ácido local; destruindo o envelope viral, por ação surfactante; impedindo a entrada do vírus na célula; inibindo a ação da transcriptase reversa. FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 576 03.10.08 16:03:07 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV A primeira e a segunda geração de microbicidas que estão sendo testados em estudos clínicos são substâncias com amplo espectro de ação e que inativam o HIV a partir de um dos mecanismos citados anteriormente: ruptura do envelope viral, alteração do pH vaginal ou ligação ao vírus para impedir sua entrada na célula. Os componentes de terceira geração – que podem inibir a replicação viral ou se ligar a receptores específicos do HIV – estão em fase pré-clínica ou em estudos pilotos iniciais 10 em seres humanos. Os microbicidas, idealmente, não devem provocar lacerações ou rupturas da mucosa vaginal e cervical durante o ato sexual, ao mesmo tempo em que deverão ter propriedades específicas para atuarem sobre o HIV, inativando-o ou destruindo-o. Um microbicida eficaz deverá evitar a transmissão do HIV mesmo em situações de contato com secreções com carga viral alta, já que a eficiência da transmissão heterossexual do vírus geralmente se relaciona com a alta concentração viral no trato genital. ® Outro produto com ação surfactante, o C31G (SAVVY ), demonstrou propriedades in vitro contra o HIV, clamídia e herpes 10 tipo 2. Estudo fase 1, para avaliação da segurança e aceitabilidade de produtos para uso vaginal, utilizou formulações com concentrações de 0,5 e 1,0% do C31G e encontrou poucos sinais de irritação genital com o uso do gel antes do intercurso sexual. Ensaio clínico randomizado (fase 3), placebo-controlado, envolvendo mais de 2.000 mulheres HIV-negativo em Gana comparou o C31G (1%) com placebo. As mulheres foram acompanhadas, em média, por 12 meses e não houve diferenças significantes entre os grupos em relação a eventos adversos em geral ou alterações clínicas e laboratoriais. Entretanto, 17 mulheres apresentaram soroconversão ao HIV no final do estudo, das quais oito estavam utilizando o microbicida. Mais participantes desse grupo também apresentaram eventos adversos no trato reprodutivo (RR-1,33; IC a 95%:0,99-1,8), tais como prurido genital, candidíase e/ou corrimento vaginal, vaginose e vulvovaginites. Os autores concluíram que os dados foram insuficientes para avaliar a efetividade do ® 11 SAVVY na prevenção do HIV. Ensaios clínicos Ainda não foi encontrado um microbicida seguro e eficaz, a despeito de já existirem mais de 60 tipos diferentes com atividade in vitro contra o HIV. Vários estudos multicêntricos em fase I/ II de segurança e fase II/III de eficácia estão em andamento em diversos países, envolvendo diferentes grupos populacionais. Serão descritos os estudos mais relevantes entre os que já foram publicados, em diferentes fases clínicas, e segundo as diversas gerações de microbicidas que vêm sendo testados, de acordo com os diferentes produtos e mecanismos de ação. Microbicidas que atuam destruindo o envelope viral A primeira geração de candidatos a microbicidas foram os surfactantes (detergentes). Esses produtos têm a capacidade de lesar membranas celulares, além de apresentarem amplo espectro de ação, atingindo células hospedeiras, microorganismos comensais e patogênicos. Inativam o HIV destruindo o envelope viral e, geralmente, também têm ação espermicida. O protótipo dessa classe é o Nonoxynol-9, um surfactante aniônico, desenvolvido como espermicida contraceptivo em 1960. Sua atividade antiviral in vitro foi descoberta em 1985. Experimento clínico realizado em profissionais do sexo em Camarões sugeriu que o N-9 estaria associado à toxicidade vaginal, incluindo ulcerações, porém, sem evidências claras da transmissão do HIV. Estudos posteriores confirmaram sua ineficácia contra a infecção pelo HIV.7,8 Microbicidas que atuam inibindo a ligação do vírus à célula Vírions podem acumular-se na superfície celular por meio de interações entre cargas positivas do seu envelope e negativas da membrana celular. Substâncias polianiônicas podem mimetizar essas cargas eletrônicas e impedir o acoplamento viral à superfície celular, impedindo a penetração do vírus na célula-alvo. Poliânions sulfatados são agentes carregados negativamente que bloqueiam a entrada viral a partir da interação com a glicoproteína 120 (gp120) do envelope viral, evitando a ativação do co-receptor viral. Os polímeros sulfatados de alto peso molecular − PRO 2000 (Sulfato de Naftaleno), Carrageenan (PC-213, PC-503, PC-515), Sulfato de Celulose e o Sulfato de Dextrina − representam a segunda geração de microbicidas. Agem in vitro impedindo a fusão do vírus com a membrana celular dos linfócitos e macrófagos, bloqueando os receptores CD4+ e os co-receptores CCR5 e CXCR4. Apresentam baixo nível de toxicidade local e altos índices de seletividade. O Sulfato de Naftaleno (PRO 2000) na concentração de 0,01% (100mg/ml), ou menos, bloqueia a infecção pelo HIV de linfócitos T, macrófagos e tecido cervical in vitro, além de ser ativo contra Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae. Ensaio clínico (fase 1) envolvendo mulheres HIV-negativo sexualmente ativas e HIV-positivo abstinentes, para avaliar a tolerância às diferentes concentrações e freqüência de uso do PRO 2000 (2% e 4%), mostrou boa tolerância ao produto e ausência de eventos adversos graves.12 FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 577 577 03.10.08 16:03:07 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV ® O PRO 2000 demonstrou atividade in vitro contra clamídia, gonococo e herpes. Em ensaio clínico randomizado que incluiu mulheres infectadas pelo HIV, a secreção vaginal foi coletada ® antes e após a aplicação do PRO 2000 ou do placebo. A secreção vaginal obtida uma hora após a aplicação do produto, em comparação com o placebo, foi significantemente mais ativa in vitro ® contra o HIV e o HSV. O PRO 2000 está, atualmente, em fase 3 de pesquisa clínica, para avaliar sua efetividade na prevenção da transmissão homem-mulher do HIV. O estudo foi iniciado em outubro de 2005 e deverá recrutar mais de 9.000 mulheres HIV-negativo em vários países africanos. As participantes estão sendo orientadas, conforme a randomização, a utilizarem PRO 2000/5 (gel a 0,5% ou 2%) ou placebo uma hora antes do ato sexual, além de solicitarem ao parceiro o uso do condom. Os resultados finais desse estudo estão sendo aguardados para 13 março de 2009. ® O Carraguard é um polímero sulfatado derivado do Carrageenan que, por sua vez, é um produto extraído de algas marinhas, com atividade inibidora da infecção viral nas células vaginais. Ensaios clínicos randomizados (fase 2) não demonstraram associação do uso do produto a anormalidades clínicas do trato genital, da flora vaginal, queixas de irritação urinária ou outros eventos adversos, tendo havido boa aceitabilidade ao produto por parte das usuárias. Em fevereiro de 2008 foram divulgados os resultados ® do estudo fase 3 do Carraguard (PC 515), que teve o objetivo de avaliar sua efetividade microbicida na prevenção da transmissão homem-mulher do HIV. O estudo foi iniciado em março de 2004 e recrutou 6.202 mulheres HIV-negativo em vários sítios diferentes da África do Sul. As participantes foram orientadas, conforme a randomização, a utilizarem o produto ou placebo, ambos sob a forma de gel, uma hora antes do ato sexual, além de solicitarem ao parceiro o uso do condom. Houve 134 novas infecções pelo HIV no grupo que usou o Carraguard e 151 novas infecções no grupo placebo, mostrando incidência de 3,3 infecções/100 mulheres-ano no primeiro grupo e 3,7 infecções/100 mulheres-ano no grupo placebo. Não houve diferença estatisticamente significante nas taxas de soroconversão do HIV entre as mulheres que usaram o placebo e o microbicida, demonstrando, infelizmente, que o Carraguard não foi efetivo para prevenir a transmissão sexual do HIV. Por outro lado, o estudo mostrou que o produto é seguro 14 e bem tolerado pelas pacientes. O Sulfato de Celulose (CS) é outro poliânion sulfatado que demonstrou atividade in vitro contra o gonococo, a clamídia, o HPV e a Gardnerella vaginalis. Estudo clínico (fase 1) confirmou a segurança e tolerabilidade do sulfato de celulose (gel a 6%) quando comparado ao KY gel e ao Conceptrol, gel contraceptivo 578 contendo Nonoxynol-9. Também foi demonstrada sua segurança e boa aceitação em ensaio clínico randomizado que envolveu 49 mulheres HIV-positivo sexualmente ativas (e seus parceiros 15 sexuais) e inativas. O ensaio clínico randomizado (fase 3) do Sulfato de Celulose, com o objetivo de avaliar sua efetividade contra a transmissão sexual do HIV do homem para a mulher, foi iniciado em novembro de 2002, tendo recrutado mais de 2.000 mulheres HIV-negativo da Nigéria. O estudo foi encerrado em janeiro de 2007, tendo em vista o grande número de mulheres infectadas no grupo que usou o produto, em comparação com o grupo-controle. As últimas análises confirmaram que o sulfato de celulose não é efetivo na 16 prevenção da transmissão sexual do HIV. Microbicidas que atuam preservando as defesas naturais da vagina A acidez vaginal normal tem importante efeito protetor contra a infecção pelo HIV, entretanto, o pH ácido pode ser neutralizado quando o sêmen está presente. Produtos que diminuem o pH vaginal e aumentam a colonização lactobacilar têm sido avaliados em relação à sua segurança, aceitabilidade e eficácia contra as DSTs, em especial o HIV. ® O Buffergel (ReProtect) é um produto que tem a habilidade de preservar o pH vaginal entre 3,8 e 4,0. Dois estudos fase 1 que avaliaram 125 mulheres em cinco países evidenciaram que o produto é seguro e bem tolerado, com diminuição 17 significante na incidência de vaginose bacteriana. Apesar de algumas pacientes relatarem sinais e sintomas geniturinários locais, como eritema, prurido ou disúria, a maioria das voluntárias informou que usaria o produto se ele se mostrasse efetivo. Está em andamento ensaio clínico randomizado (fase ® 2/2b) comparando Buffergel (acidificante) e PRO 2000/5 (gel a 0,5%) (polímero), com o objetivo de avaliar a efetividade dos dois microbicidas em prevenir a infecção pelo HIV. Foram recrutadas 3.220 mulheres HIV-negativo dos USA e de vários países africanos, que deverão ser acompanhadas entre 12 e 30 meses. Os resultados do estudo deverão ser divulgados brevemente.18 Acidform® é outro candidato a microbicida, que vem sendo testado pelas suas propriedades acidificantes e bioadesivas. Ele inibe in vitro o herpes vírus, clamídia, gonococos e tricomonas. Ensaio clínico randomizado (fase 1) realizado no Brasil comparando Acidform e Nonoxynol-9 (2%) em 20 casais, com avaliação colposcópica e microbiológica vaginal, demonstrou potencial ação espermicida do Acidform e segurança para uso clínico.19 FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 578 03.10.08 16:03:07 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Microbicidas que atuam inibindo os receptores CCR5 O receptor CCR5 tem sido estudado como possível alvo para as drogas microbicidas depois que estudos in vitro demonstraram a habilidade da molécula denominada RANTES se ligar a esse receptor, bloqueando a entrada do HIV na célula hospedeira. O sucesso da infecção viral depende da expressão e funcionamento do CCR5 na superfície celular. Portanto, a expressão celular do CCR5 parece ser essencial para a aquisição do HIV e a redução 20 de sua disponibilidade provoca proteção contra o vírus. Vários estudos em pessoas com alto risco para adquirir a infecção pelo HIV e que se mantêm não-infectadas ao longo do tempo encontraram altos níveis de um ou mais tipos de substâncias que são capazes de inibir a fusão viral com a membrana celular, por meio da ocupação do receptor CCR5 na superfície da célula hospedeira. Uma delas, considerada um conector natural produzido pelo sistema imunológico, é o RANTES, que é capaz de bloquear o receptor CCR5. A molécula PSC-RANTES é muito mais potente que a original RANTES, por possuir mais capacidade de seqüestro do receptor CCR5. Estudos em macacas Rhesus demonstraram que a aplicação vaginal do PSC-RANTES foi capaz de bloquear a infecção vaginal pelo SHIVSF162 (vírus da imunodeficiência humana de símios). Os exames colposcópico e histopatológico das macacas não evidenciaram sinais de reação inflamatória após a aplicação do produto. Depois do sucesso do bloqueio do CCR5 em modelos animais, o uso em humanos parece promissor, apesar das especulações sobre a possível seleção de variantes virais que poderiam se ligar com maior afinidade ao CCR5 ou ao CXCR4. Inibidores da transcriptase reversa como potenciais microbicidas tópicos Drogas anti-retrovirais − como os inibidores da transcriptase reversa nucleosídeos (NRTI) e não-nucleosídeos (NNRTI) −, desenvolvidas para tratamento das pessoas infectadas pelo HIV, têm sido testadas como microbicidas tópicos, pela sua capacidade de inibir a replicação viral: são os microbicidas de terceira geração. O tenofovir, um análogo do nucleotídeo adenina, é facilmente ativado e mantém suas propriedades originais quando aplicado nas mucosas vaginal ou retal, em comparação com outras drogas da mesma categoria. Realizou-se estudo de coorte aberta (fase 1), multicêntrico, para avaliar a segurança e a aceitabilidade do tenofovir vaginal (0,3% ou 1%). Foram recrutadas 84 mulheres, acompanhadas em quatro diferentes coortes: 48 HIV-negativo, sexualmente abstinentes; 12 HIV-negativo, sexualmente ativas; 12 HIV-positivo, sexualmente abstinentes; 12 HIV-positivo, sexualmente ativas. Também foram acompanhados 24 parceiros sexuais dessas mulheres. As voluntárias aplicaram continuamente, durante o período intermenstrual, por duas semanas, gel a 0,3%, uma vez ao dia, ou gel a 1%, duas vezes ao dia. Apesar de a avaliação farmacocinética ter confirmado presença sistêmica do tenofovir, não foram observadas novas mutações resistentes ao produto nas mulheres infectadas pelo HIV, em amostras de sangue coletadas nos dias 0, 7 e 14. Foram demonstrados altos níveis de segurança e tolerabilidade: 94% das mulheres e 79% dos homens confirmaram que usariam o produto novamente, sob circunstâncias similares. Os eventos adversos mais freqüentes foram prurido genital (23%) e corrimento vaginal (17%). O achado colposcópico mais freqüente foi eritema. Tendo em vista os relatos da literatura de nefrotoxicidade e desmineralização óssea associados ao tenofovir, os autores sugerem a realização de estudos com aplicação do gel vaginal por tempo mais prolongado, para avaliar se o uso crônico pode apresentar os mesmos resultados 21 encontrados nesse estudo. O TMC 120, um NNRTI, mostrou-se efetivo e seguro em modelo animal, prevenindo a infecção pelo HIV em macacas nas quais foi aplicado gel vaginal do produto. Também demonstrou boa atividade anti-retroviral em modelos celular e cervical e não exibiu toxicidade quando usado em níveis terapêuticos, além de não ter alterado a produção de citocinas e a composição do sêmen ou do muco cervical. Os dados atuais sugerem que o TMC 120 é 22 um candidato promissor como microbicida para uso tópico. O UC 781 é um NRTI e potente inibidor da infecção in vitro das células cervicais. Ele se liga fortemente à transcriptase reversa, interferindo efetivamente na replicação viral. Sua potência antiviral, estabilidade e segurança têm sido testadas. Usando modelo celular e tecidual, foi avaliado o potencial efeito microbicida tópico desse produto. Em modelo cervical, o UC-781 inibiu a infecção da mucosa e preveniu a disseminação do HIV através das células migratórias da submucosa, mesmo após seis dias da aplicação do produto. A grande preocupação com o uso de anti-retrovirais tópicos é o desenvolvimento de cepas virais resistentes aos medicamentos. Assim, foi desenvolvido estudo para avaliar a atividade microbicida in vitro do UC781 contra cepas virais resistentes, comparando-o com outros anti-retrovirais da mesma categoria, efavirenz e nevirapina. Na presença dos anti-retrovirais tópicos foram testadas a inativação do vírus, a inibição da transmissão célula-célula e a habilidade do UC781 na proteção das células de subseqüente infecção, na ausência de droga exógena. Ele foi menos efetivo contra as cepas resistentes, comparadas às cepas selvagens em todos os testes. Essa reduzida atividade do UC781 diante de cepas virais resistentes sugere que outros agentes anti-retrovirais devem ser incluídos em formulações tópicas de microbicidas que utilizem esse produto.23 FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 579 579 03.10.08 16:03:07 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Formulações com medicamentos anti-retrovirais também estão sendo aplicadas em mulheres HIV-positivo, para avaliar se ocorre diminuição da carga viral na secreção vaginal, redução da eficiência da transmissão para parceiros masculinos e desenvolvimento de resistência viral aos medicamentos. A deposição vaginal de medicamentos anti-retrovirais de forma contínua, aplicando anéis vaginais, é a promessa mais recente e plausível. No entanto, em primeiro lugar, os pesquisadores têm de demonstrar que os microbicidas são efetivos na diminuição da transmissão do HIV. O Quadro 1 mostra os principais produtos que estão sendo avaliados como potenciais microbicidas para uso tópico, seus principais mecanismos de ação e respectivas fases clínicas de estudo. Quadro 1 - Produtos em estudo, com potencial ação microbicida para uso tópico Fase do estudo Produto Cyanovirin-N (Proteína 11Kda) Estágio pré-clínico (diversos) Estágio pré-clínico (anti-retrovirais) Ensaios clínicos (fase 1) Ensaios clínicos (fase 2) Ensaios clínicos (fase 3) 580 2G12 (anticorpo monoclonal) b 12 PRO 542 BMS 378806 2F5 C52L Mannan solúvel CMPD-167 PSC- rantes Fuzeon TNX-335 Vicriviroc Maraviroc Aplaviroc PRO 140 CCR5mab004 ® Acidform UC-781 Lime juice (Suco de lima ou limão) Dapivirina (TMC120) Vivagel Cellacefate Prannem Polyherbal Inner Confidence Condom invisível Tenofovir ® Savvy (C31G, gel vaginal a 1%) Ushercell® (Sulfato de celulose) ® Carraguard (Carragenan) Pro 2000® ® BufferGel Mecanismo de ação Proteína derivada da cianobactéria Nostoc ellipsosporum. Inibe a ligação da gp 120 ao complexo CXCR4 celular Anticorpo específico para glicanos da gp120 Anticorpo específico para ligação do gp120 Agente que interage com o sítio de ligação ao CD4 da gp120 Agente que interage com o sítio de ligação ao CD4 da gp120 Anticorpo específico para a região da membrana proximal da gp41 Anticorpo específico para a região da membrana proximal da gp41 Agente que tem como alvo os receptores de glicanos Agente que tem como alvo o CCR5 Agente que tem como alvo o CCR5 Agente que se liga ao gp 41 Agente que se liga ao CD4 Agente que tem como alvo o CCR5 Agente que tem como alvo o CCR5 Agente que tem como alvo o CCR5 Anticorpo específico para o CCR5 Anticorpo específico para o CCR5 Agente que modifica o pH vaginal Inibidor da replicação viral Agente que modifica o pH vaginal Inibidor da replicação viral Inibidor da replicação viral Inibidor da replicação viral Contém folha de ervas: Azadirachta indica, Sapindus mukerossi Contém bacilos para proteção vaginal e cloridrato de benzalcônio Lauril sulfato de sódio Inibe a replicação viral Agente detergente (estudo suspenso) Poliânion (estudo suspenso) Poliânion (estudo suspenso) Poliânion Agente que modifica o pH vaginal FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 580 03.10.08 16:03:08 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Segurança Produtos tópicos para prevenir a infecção pelo HIV devem ter garantias de que sua utilização não comprometerá a segurança das usuárias. Considerações sobre segurança com o uso de microbicidas surgiram especialmente em decorrência dos problemas detectados com o uso do Nonoxynol-9 (N-9), que provocou disrupção da integridade da mucosa vaginal, aumentando o risco 6,8 da infecção pelo HIV. A colposcopia da vagina e cérvix vem sendo utilizada desde a década de 90 para avaliar as alterações epiteliais da mucosa desses tecidos diante de produtos que podem provocar irritações, inflamações ou mesmo úlceras, levando à maior transmissão do HIV e de outras DSTs. Fazendo parte desse esforço contínuo de buscar medicamentos para uso tópico vaginal que pudessem ser utilizados como produtos para impedir a transmissão sexual do HIV, a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Contraceptive Research and Development Program (CONRAD) e o International Working Group on Microbicides (IWGM) organizaram um congresso em Washington, em 1999 (The Use of Colposcopy in Assessing Vaginal Irritation in Research), para estabelecer parâmetros colposcópicos de avaliação das mucosas vaginal e cervical após aplicação de produtos para uso tópico, em pes24 quisa. Esses parâmetros, até o presente momento, ainda estão sendo utilizados pelos pesquisadores em microbicidas tópicos, para avaliar a segurança dos produtos. A inflamação do trato reprodutivo feminino aumenta a suscetibilidade para a infecção pelo HIV e outras DSTs e pode se tornar inconveniente para o uso tópico de microbicidas. A excessiva liberação de citocinas pró-inflamatórias pode alterar o balanço entre a destruição e reparação tecidual, aumentando as chances de penetração e replicação do vírus, após a aplicação dos produtos. Citocinas têm papel preponderante no recrutamento e ativação de células T CD4+ da mucosa, podendo facilitar a penetração do HIV; e algumas podem aumentar a replicação viral nas células infectadas.6,25 Assim, três ou mais aplicações consecutivas vaginais do N-9 foram suficientes para estimular a liberação de citocinas em quantidade considerável para provocar a disrupção epitelial da mucosa vaginal, aumentando a suscetibilidade à infecção pelo HIV.8 A maior concentração de interleucinas (IL-1, IL-6, IL8) nas secreções vaginais, após aplicação de produtos tópicos, pode ser um indicador sensível de toxicidade para as células da mucosa − que pode resultar em dano epitelial − induzida pelo medicamento utilizado.25 Atualmente, a forma predominante de transmissão do HIV em todo o mundo é a heterossexual, tornando a mucosa cérvico- 1 vaginal a principal porta de entrada do vírus nas mulheres . Essa mucosa é colonizada naturalmente por bactérias e lactobacilos comensais. A depleção das colônias de Lactobacillus sp, que pode ser provocada por alguns microbicidas, pode reduzir a produção de peróxido de hidrogênio, que possui intrínseca função na proteção da mucosa contra a infecção pelo HIV e outros patógenos. O microbicida ideal Um produto com atividade microbicida que possa ser utilizado pela via vaginal ou retal, com o intuito de prevenir a usuária contra a infecção pelo HIV, deve ter as seguintes propriedades: eficiência contra múltiplas DSTs, incluindo o HIV; segurança para ser usado várias vezes ao dia sem provocar alterações inflamatórias, irritação ou ulcerações nas mucosas; ação rápida; fácil aceitação pelas usuárias e seus parceiros; fácil de guardar e usar; fácil acesso; preço acessível. Idealmente, deveria ser apresentado em diferentes formas de uso e incluir um componente contraceptivo. Aspectos éticos dos estudos com microbicidas Independentemente da necessidade atual de se encontrarem produtos com ação microbicida tópica − que sejam seguros, toleráveis e eficientes −, não se pode abandonar os princípios éticos e as boas práticas clínicas quando são desenvolvidos os ensaios clínicos com esses produtos. Assim, somente para as substâncias que, comprovadamente, possuírem ação contra o HIV − testadas in vitro, ex vivo ou em modelos animais −, poderão ser desenvolvidos os estudos nas diferentes fases de segurança e aceitabilidade (fases 1 e 2) e de eficácia (fase 3). A aprovação desses estudos nos comitês regionais e nacionais de ética em pesquisa − assim como a discussão com as agências regulatórias e a comunidade local − é imprescindível para consecução dos objetivos dos experimentos.26 Ensaios clínicos (fase 2b e 3) em andamento Apesar de microbicidas terem menos eficácia na prevenção da transmissão do HIV do que o condom, cálculos matemáticos indicaram que, se um microbicida fosse 60% efetivo contra a infecção pelo vírus − e apenas 20% das pessoas o utilizassem, em três anos –, cinco milhões de pessoas deixariam de ser infectadas, em todo o mundo. FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 581 581 03.10.08 16:03:08 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Comentários finais Apesar de alguns estudos já terem demonstrado a segurança com o uso de diversas outras substâncias, para a maior parte dos microbicidas que estão sendo analisados ainda não há informações concretas sobre a sua tolerabilidade, no que diz respeito aos efeitos colaterais nas mucosas vaginal, retal e peniana e os efeitos irritativos que podem ser provocados no sistema urinário. Os microbicidas poderão, num futuro próximo, ser uma boa resposta para a prevenção da transmissão do HIV. Pelo menos cinco produtos, com diferentes mecanismos de ação, estão sendo testados na sua eficácia microbicida. Alguns também têm ação contraceptiva. O desenho básico desses estudos é o mesmo: são recrutadas milhares de mulheres HIV-negativo, em idade reprodutiva e sob risco de serem infectadas pelo HIV através das relações sexuais; elas são randomizadas (duplo-cego) para aplicarem o produto ou placebo na vagina, antes do coito; todas são orientadas a solicitar ao parceiro o uso do condom; é realizado o seguimento dessas mulheres, que pode variar de dois a três anos, para avaliar a taxa das que fizeram a soroconversão para o HIV nesse período. O Quadro 2 mostra os microbicidas que estão em fase avançada de pesquisa clínica (2b ou 3) para testar sua eficácia. As pesquisas com microbicidas tópicos vêm sendo conduzidas a partir do avanço na compreensão do processo de transmissão sexual do HIV que, gradualmente, tem incorporado novos conhecimentos sobre a complexidade biológica e social da mulher, que a coloca em patamar importante no desenvolvimento de uma nova tecnologia para prevenir a transmissão do vírus. Caso em algum candidato a microbicida tópica ultrapasse a fase 3, confirmando sua eficácia contra o HIV − sem produzir efeitos colaterais importantes −, sua distribuição poderá modificar radicalmente o cenário atual da epidemia do HIV. O que se tem observado até o momento é que os produtos das primeiras gerações de microbicidas não têm conseguido demonstrar sua eficácia na prevenção da transmissão do vírus, por diferentes razões. Possivelmente, a esperança de se encontrar um agente eficaz, e que não cause danos às mucosas vaginal e cervical, vai se concentrar em produtos que não alteram o meio vaginal – e, por conseguinte, não danificam o epitélio estratificado – ou na associação de dois ou mais produtos. Quadro 2 - Microbicidas que atingiram fase avançada de estudos (avaliação de eficácia) Produto (endereço eletrônico) BufferGel® (www.hptn.org) ® PRO 2000 (www.hptn.org) ® Carraguard *** (PC 515) (www.popcouncil.org) Sulfato de celulose (CS) ** (www.fhi.org) Sulfato de celulose (CS) ** (www.conrad.org) Savvy/C31G * (www.global-campaign.org) Tenofovir/PMPA Gel ([email protected]) Fase Número de voluntárias 2b 3.220 3 11.920 Inibidor de fusão 3 Inibidor de fusão Mecanismo de ação Desenho do estudo Países envolvidos Quatro grupos: BufferGel®, PRO 2000, placebo e condom Três grupos: PRO 2000® em duas diluições (0,5% e 2%) e placebo África do Sul, Malawi, Tanzânia, Zâmbia, Zimbabwe e USA África do Sul, Tanzânia, Uganda e Zâmbia 6.639 Dois grupos: Carraguard® e placebo África do Sul 3 2.160 Dois grupos: CS e placebo Nigéria Inibidor de fusão 3 2.574 Dois grupos: CS e placebo Benin, Burkina Faso, Índia, Kenya, África do Sul e Uganda Surfactante 3 2.142 Dois grupos: C31G e placebo Nigéria Inibidor de replicação viral 2b 980 Dois grupos: Tenofovir (1%) e placebo África do Sul Acidificante do meio vaginal; contraceptivo dose-dependente Inibidor de fusão; contraceptivo dose-dependente Os produtos assinalados (*, **, ***) foram suspensos devido a aumento da transmissão do HIV no grupo que utilizou o produto: * Estudo suspenso em 2006. ** Estudos suspensos em 2007. *** Estudo suspenso em 2008. 582 FEMINA | Setembro 2008 | vol 36 | nº 9 Femina_setembro_2008.indb 582 03.10.08 16:03:08 Microbicidas tópicos: uma nova tecnologia para prevenir a transmissão sexual do HIV Leituras suplementares 1. 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Morumbi – São Paulo – SP – CEP 05693-000 Femina_setembro_2008.indb 584 03.10.08 16:03:09