EDITORIAL O Anatomista Leonardo Da Vinci Dr. Mauri José Piazza1 Escrever sobre Leonardo seguramente é difícil atualmente e já o foi antes. Pintor, escultor, arquiteto, cientista e músico foram algumas de suas qualificações. Este homem parecia saber de tudo. Contudo, filho bastardo de um notário de Da Vinci, foi um grande autodidata. Nasceu na pequena localidade de Da Vinci em 15 de abril de 1452 e morreu em Amboise, na França, em 2 de maio de 1519. Interessado por anatomia, efetuou dissecções em diversos animais (ovelhas, macacos, sapos, pássaros e cavalos) e, posteriormente, tendo obtido licença para tal realizou a atividade no Hospital Santa Maria Nuova, em Florença, na sequência no Hospital Maggiore, em Milão, e, finalmente, no Hospital do Santo Espírito, em Roma. Desde os anos 1490 até 1515 dissecou mais de 30 corpos entre homens e mulheres e simultaneamente elaborou mais de 200 gravuras anatômicas. O primeiro desenho foi do Homem Vitruviano (Figura 1), realizado em torno de 1490 – para Leonardo o homem era o centro do microcosmo. Seus estudos seguintes foram procedidos em um crânio. Ele passou a estudar os sentidos, principalmente o da visão e das suas conexões com o cérebro (1487–1493). Figura 1 - O Homem Vitruviano. 1 CRM PR-2445; Professor Titular de Ginecologia do Departamento de Toco-Ginecologia da Universidade Federal do Paraná – Curitiba (PR), Brasil. Na sequência, em período já mais maduro de sua vida, passou a estudar os ossos e o esqueleto, entre 1508 e 1510, e, simultaneamente, seu interesse passou a ser os músculos e grupos musculares, com um aprofundamento da fisiologia e da mobilidade anatômica (Figuras 2 e 3). Figura 2 - O estudo da espádua. Figura 3 - Anatomia da perna. Em torno de 1513, deu início aos seus estudos sobre o coração, os vasos e aparelho circulatório. Notáveis foram seus trabalhos sobre o mecanismo de abertura e fechamento das válvulas cardíacas, principalmente a aórtica. Os conhecimentos em hidráulica o fizeram idealizar um modelo em vidro, inclusive da aorta, permitindo o estudo do fluxo do sangue (Figura 4). Figura 4 - O coração e os seus vasos. 60 FEMINA | Março/Abril 2012 | vol 40 | nº 2 Nesta mesma fase, passou a estudar e analisar todo o aparelho genital masculino e feminino. No homem, verificou e representou a via de acesso da urina, a bexiga e o conduto ejaculador, e tentou representar dentro do pênis a existência de dois canais, sendo um para a urina e outro como duto ejaculatório. Representou também, após dissecções de um cadáver feminino, os seus genitais externo e internos, contendo os ovários e o útero, bem como com feto intraútero (sétimo mês) em diversas situações, inclusive em apresentação pélvica (Figuras 5 e 6). Finalmente merece destaque um de seus primeiros estudos anatômicos, sobre a cópula, realizado quando morava em Milão, em torno de 1490, que mostra um casal copulando. O aspecto mais interessante deste desenho diz respeito à crença existente desde Platão de que o esperma seria originário da medula e, passando pela espinha dorsal, atingiria o pênis por canal específico aí originado (Figuras 7 e 8). Figura 5 - O feto no útero. Figura 6 - A anatomia fetal. Figura 7 - Estudo sobre a cópula. Figura 8 - Estudo anatômico da mulher. As imagens de Leonardo da Vinci mostram a sua grande capacidade e competência. Seu cérebro foi privilegiado e bastante curioso, inclusive da anatomia. FEMINA | Março/Abril 2012 | vol 40 | nº 2 61