HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA SERVIÇO DE CIRURGIA VASCULAR ESTENOSE CAROTÍDEA: EPIDEMIOLOGIA E TRATAMENTO CIRÚRGICO DE PACIENTES NO HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA RÔMULO CAVALCANTI LIMA JÚNIOR FORTALEZA 2016 1 RÔMULO CAVALCANTI LIMA JÚNIOR ESTENOSE CAROTÍDEA: EPIDEMIOLOGIA E TRATAMENTO CIRÚRGICO DE PACIENTES NO HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA Trabalho de conclusão de curso apresentado ao serviço de Cirurgia Vascular do Hospital Geral de Fortaleza como um dos prérequisitos para a conclusão da residência médica em cirurgia vascular. Orientador: Dr. Antônio Nogueira Vieira FORTALEZA 2016 2 3 AGRADECIMENTOS Agradeço aos meus pais que não hesitaram em me proporcionar conforto e carinho, que foram essenciais para enfrentar a rotina desgastante e insalubre da residência médica. À minha esposa, companheira do dia-a-dia e meu alicerce, Tatiana, que esteve presente comemorando as vitórias e sempre me reergueu nas angústias durante toda essa árdua caminhada. Ao Dr Antônio Nogueira Vieira, preceptor e supervisor do programa de residência em Cirurgia Vascular que, à frente da residência médica, proporcionou um treinamento exemplar com qualidade inquestionável. Aos funcionários do HGF, que em todos os momentos foram solícitos e sempre compreenderam que o maior objetivo da profissão médica é cuidar dos pacientes, atenuando seus sofrimentos. 4 RESUMO Introdução: A doença cerebrovascular extracraniana engloba várias desordens que afetam as artérias que irrigam o cérebro, sendo uma importante causa de AVC e AIT. A principal condição patológica responsável pela doença carotídea extracraniana é a aterosclerose, responsável por cerca de 90% dessas lesões nos países ocidentais. O tratamento cirúrgico da estenose de carótidas pode ser realizado através da endarterectomia de carótida ou angioplastia com stent. Trabalhos demonstram que a abordagem cirúrgica agressiva à doença vascular encefálica pode estar justificada quando a intervenção puder ser realizada com taxas de mortalidade e morbidade aceitavelmente baixas para a longevidade e a qualidade de sobrevida desses pacientes sejam alteradas expressivamente. Objetivo: Realizar análise epidemiológica dos casos de pacientes submetidos a tratamento cirúrgico para estenose carotídea extra-craniana no Hospital Geral de Fortaleza (HGF) durante o período de janeiro de 2013 a dezembro de 2015. Materiais e métodos: Estudo descritivo, documental e retrospectivo a partir de levantamento de prontuários de pacientes internados no serviço de cirurgia vascular do HGF com estenose de carótida acima de 70%, submetidos a procedimento cirúrgico eletivo de endarterectomia de carótida ou angioplastia com stent de carótida. Resultados: O procedimento foi realizado em 44 pacientes, sendo 35 homens. Com relação as comorbidades relacionou-se, 36 pacientes hipertensos, 18 diabéticos e 26 tabagistas. Nessa série foram incluídos 11 pacientes sem sintomas isquêmicos cerebrais ipsilaterais à doença carotídea e 33 com sintomas. Todos os pacientes realizaram ecodoppler colorido como exame de triagem. Os pacientes sintomáticos apresentavam estenose superior a 70%, enquanto os assintomáticos, superior a 80%. O tempo médio de internação hospitalar foi de 32 dias. Conclusão: O serviço de cirurgia vascular do HGF está em 5 concordância com a literatura no que diz respeito à indicação cirúrgica, sendo considerados elegíveis para o tratamento cirúrgico pacientes sintomáticos com estenose carotídea acima de 70% ou assintomáticos com estenose maior que 80%. As recomendações clássicas para angioplastia e implante de stent, sempre com proteção cerebral, incluem: radioterapia cervical prévia, reestenose crítica após endarterectomia, estenoses altas e pacientes de alto risco. Após mais de seis décadas de experiência, o procedimento cirúrgico (endarterectomia de carótida) resiste bravamente ao teste do tempo. Palavras chave: Acidente vascular cerebral, endarterectomia de carótida, angioplastia de carótida. 6 Sumário 1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 8 2. OBJETIVO GERAL.......................................................................................................................13 2.1. OBJETIVOS ESPECÍFICOS.......................................................................................................13 3. METODOLOGIA...........................................................................................................................14 4. RESULTADOS..............................................................................................................................18 5. DISCUSSÃO..................................................................................................................................24 6. CONCLUSÃO.................................................................................................................................38 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................... 41 APÊNDICE 1: .................................................................................................................................. 44 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ........................................................................... 44 7 1. INTRODUÇÃO O acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico representa a 3ª principal causa de morte e a 2ª causa de óbito relacionado a patologias cardiovasculares nos EUA, sendo a causa mais comum relacionada a distúrbios neurológicos. Portanto, representa um grande problema de saúde pública e é uma importante causa de incapacidade em longo prazo, onerando o sistema previdenciário de países desenvolvidos (LIAPS et al., 2009). No Brasil, a doença vascular extracraniana representa a terceira causa de mortalidade relacionada às doenças cardiovasculares (MAFFEI et al., 2008). As limitações físicas que se desenvolvem depois de infartos encefálicos devem ser consideradas sob a perspectiva do efeito incapacitante do paciente e do ônus socioeconômico imposto ao paciente e aos seus familiares. As revisões sobre o impacto financeiro do AVC no ano de 1999 foram estimadas, somando-se os custos diretos e indiretos, em mais de 45 bilhões de dólares (RUTHERFORD et al., 2007). O primeiro relato de AVC como consequência de doença vascular extracraniana foi atribuído a Gowers em 1875. Em 1914, Hunt enfatizou que a doença obstrutiva das artérias carótidas extracranianas era uma 8 causa possível de AVC (RUTHERFORD et al., 2007). Apesar desses relatos iniciais, não houve avanço nos estudos até o ano de 1937, quando Moiz demonstrou que a arteriografia poderia ser usada para diagnosticar obstrução das artérias carótidas. Apesar da tentativa de endarterectomia realizada por Strully não ter sido bem sucedida, em 1954 foi publicado um relato de um procedimento bem sucedido nas artérias carótidas por Eastcott e colaboradores. Eles demonstraram que a paciente possuía uma lesão aterosclerótica na bifurcação das carótidas interna e externa, que foi tratada com ressecção desse segmento e anastomose primária. DeBakey foi quem realizou a primeira endarterectomia carotídea (ECA) com sucesso, em 1953. Seu trabalho, todavia, só foi publicado tardiamente, em 1975. Nas décadas de 50 e 60, houve uma ampla difusão desse procedimento, a ponto de se chegar à década de 70 com mais de 100.000 procedimentos anuais nos EUA (RUTHERFORD et al., 2007). Em 1977 e 1980, Mathias et al. e Kerber et al. descreveram resultados satisfatórios de angioplastia percutânea para estenose de artéria carótida. Em 1989, desenvolveram stents expansíveis por balão que tinham uma alta taxa de eventos adversos. Logo em seguida, surgiram os stents auto expansíveis e os dispositivos de proteção cerebral, que reduziram esses efeitos. 9 A principal condição patológica responsável pela doença carotídea extracraniana é a aterosclerose, responsável por cerca de 90% dessas lesões nos países ocidentais. Pode-se incluir também como condição fisiopatológica para a doença carotídea a displasia fibromuscular, torções arteriais causadas por alongamento, compressão extrínseca, obstrução traumática, dissecção da íntima, angiopatias inflamatórias, estenose pósradiação, enxaqueca (RUTHERFORD et al., 2007). Há evidencias de que o principal mecanismo responsável pelos eventos isquêmicos está relacionado à embolia decorrente da ruptura de placas de ateroma ocasionando deslocamento de conteúdo ateromatoso na luz do vaso, o que predispõe a agregação plaquetária e formação de trombos dentro da irregularidade ou da úlcera existente na superfície da placa (RUTHERFORD et al., 2007). A abordagem cirúrgica da doença vascular encefálica objetiva atenuar os sintomas da disfunção cerebral e diminuir a incidência de infartos cerebrais, realizando uma excisão da placa ateromatosa na artéria carótida extracraniana (MAFFEI et al., 2008). Durante muito tempo, houve um intenso debate quanto à eficácia da cirurgia como profilaxia dos acidentes vasculares encefálicos, quando se comparava o risco perioperatório (RUTHERFORD et al., 2007). com os resultados tardios 10 Estudos mostraram que a severidade da estenose carotídea aumenta o risco de AVC ipsilateral, representando um risco anual de 0,5% com estenoses inferiores a 50% e 1% quando a estenose situa-se entre 50 e 99% (JIANN et al., 1998). Dessa forma, os trabalhos demonstram que a abordagem cirúrgica agressiva à doença vascular encefálica pode estar justificada apenas quando a intervenção puder ser realizada com taxas de mortalidade e morbidade aceitavelmente baixas para a longevidade e a qualidade de sobrevida desses pacientes sejam alteradas expressivamente, em comparação com resultados conseguidos apenas com tratamento clinico (RUTHERFORD et al., 2007). O padrão de progressão da estenose da carótida é imprevisível. A doença pode progredir rapidamente, lentamente ou permanecer estável durante muitos anos. O moderno tratamento médico visa diminuir a progressão da doença e proteger contra AVC. O uso de antiagregantes plaquetários leva à redução na incidência dos insultos encefálicos, e as estatinas têm mostrado um efeito estabilizador sobre as placas de ateroma (LIAPS et al., 2009). A angioplastia da carótida (AC), apesar de tratar-se de procedimento relativamente recente, vem sendo realizada com crescente frequência em nosso meio, entretanto há uma preocupação quanto a sua indicação como uma opção terapêutica equivalente à endarterectomia em 11 consequência do aumento dos riscos de acidente vascular cerebral perioperatório e dos custos (RUTHERFORD et al., 2007). A eficácia da ECA na prevenção de AVC em pacientes com estenose de causa aterosclerótica da bifurcação carotídea está bem estabelecida (BARNETT et al., 1998). Cabe ao profissional e é de extrema importância a seleção da melhor estratégia de tratamento tanto para pacientes sintomáticos quanto os assintomáticos. Considerando os aspectos citados acima e sua relevância, surgiu o interesse em realizar análise dos pacientes submetidos a endarterectomia ou angioplastia com stent de carótidas no serviço de cirurgia vascular do Hospital Geral de Fortaleza. Foram avaliados aspectos epidemiológicos, clínicos e cirúrgicos, associados a amplo levantamento bibliográfico. 12 2. OBJETIVO GERAL Realizar analise epidemiológica dos casos de pacientes submetidos a endarterectomia ou angioplastia com stent de carótida no Hospital Geral de Fortaleza durante o período de janeiro de 2013 e dezembro de 2015. 2.1. OBJETIVOS ESPECÍFICOS 1. Avaliar dados clínicos, levando em consideração a presença ou não de sintomas isquêmicos encefálicos relacionados à estenose carotídea ipsilateral. 2. Avaliar resultados pós-operatórios relacionados à endarterectomia de carótida em comparação com a angioplastia com stent de carótida. 3. Propor uma rotina para abordagem de pacientes com isquemia cerebral de origem extracraniana. 4. Realizar revisão bibliográfica a respeito do tema. 13 3. METODOLOGIA Realizou-se estudo descritivo, documental e retrospectivo a partir de levantamento de prontuários de 44 pacientes internados no serviço de cirurgia vascular do Hospital Geral de Fortaleza, com estenose carotídea documentada por exames de imagem e que foram submetidos a endarterectomia ou angioplastia com stent de carótida no período de janeiro de 2013 a dezembro de 2015. O Apêndice 1 foi o formulário de dados brutos da pesquisa. No formulário foram abordados aspectos epidemiológicos e clínico-cirúrgicos mais relevantes, a saber: idade, sexo, co-morbidades, acidentes isquêmicos prévios, exames complementares realizados para o diagnóstico, cirurgia realizada, bem como o tempo transcorrido entre o evento isquêmico e a cirurgia. Também foram levadas em consideração a quantidade de dias de internamento hospitalar e em unidade de tratamento intensivo (UTI), além das complicações pós-operatórias. Os resultados foram analisados respeitando-se os aspectos éticos e legais, a fim de promover o aperfeiçoamento no diagnóstico e tratamento precoce desta enfermidade. 14 Todos os pacientes incluídos nesse estudo foram avaliados com ecodoppler colorido bilateral de carótidas e vertebrais como exame de triagem. Os exames adotados para confirmação do diagnóstico e avaliação de fatores relacionados ao procedimento cirúrgico, tais como grau de estenose, características da placa, nível da bifurcação carotídea, foram angiografia por subtração digital ou angiotomografia Utilizamos como critério de inclusão pacientes com estenose carotídea superior a 70% com sintomas isquêmicos cerebrais ipsilaterais ao comprometimento carotídeo há menos de seis meses do ictus, ou pacientes assintomáticos com mais de 80% de estenose. A endarterectomia carotídea foi realizada sob bloqueio loco-regional ou sob anestesia geral. A angioplastia com stent foi realizada com anestesia local e sedação. Quando optou-se pela primeira técnica, realizou-se anestesia do plexo cervical do segundo ao quarto dermátomos (C2-C4), infiltrando-se ropivacaína sem vasoconstrictor a 0,5%, na emergência dos nervos nos forames cervicais, associado a sedação endovenosa. As medidas de proteção cerebral seguiram o protocolo da equipe de anestesia e iniciavam com a orientação do paciente quanto ao método a ser empregado, os sinais de comunicação durante o ato cirúrgico 15 (movimentação de membros, fala, alteração do nível de consciência) e manutenção de PAM > 60. O controle da pressão arterial sistêmica (PA) foi feito através de pressão arterial média (PAM) monitorada de modo invasivo. Em alguns casos, foi necessário uso de drogas vasoativas para controle adequado da PAM, objetivando mantê-la entre 80-120 mmHg. Administrou-se heparina na dose de 5000 unidades internacionais (UI), por via endovenosa, cinco minutos antes da interrupção do fluxo sanguíneo. A monitoração cerebral intra-operatória consistiu no exame neurológico e na observação dos sinais e sintomas de isquemia cerebral, tais como alteração do nível de consciência, convulsões, alterações da fala ou déficit motor nos membros. Ao final do ato operatório, foi implantado dreno de sucção que foi retirado com 24-48 horas, a depender do débito. Quando se optou pela anestesia geral, foi sob a técnica balanceada. Como medida de proteção cerebral, utilizou-se índice BI-SPECTRAL entre 40-60, com taxa de supressão zero e a manutenção da PAM entre 80 e 120 mmHg. A técnica cirúrgica empregada na endarterectomia foi a eversão parcial com uso seletivo do shunt de PRUITT-INHARA, que foi empregado nos casos de alteração neurológica, ou em alguns procedimentos com 16 anestesia geral. Em casos selecionados, quando nos deparamos com artérias de calibre bastante reduzido, utilizamos PATCH de PTFE para reconstrução da parede arterial. Sempre foi infiltrado o bulbo carotídeo com lidocaína 1% a fim de prevenir bradicardia e hipotensão com a manipulação dos barorreceptores. Nos procedimentos de angioplastia com stent auto-expansível, utilizamos a via de acesso femoral em todos os casos. O filtro de proteção cerebral utilizado em todos os casos foi o EZ®. Em algumas situações, foi necessário realizar uma pré-dilatação com balão de angioplastia no local da estenose, para transposição da lesão pelo sistema de entrega do stent. Antes da liberação do stent administrou-se 1 mg de atropina endovenosa. Em todos os pacientes submetidos a angioplastia ou endarterectomia foi administrado AAS 100mg/dia anteriormente ao procedimento. Após a angioplastia, foi prescrito o uso de AAS 100mg/dia ad aeternum e clopidogrel 75mg/dia durante 6 meses. Para os pacientes que foram submetidos a endarterectomia foi prescrito somente AAS 100mg/dia continuamente. 17 4. RESULTADOS Foram selecionados 44 pacientes submetidos a tratamento cirúrgico para isquemia cerebral de origem extracraniana, dos quais 32 (72,7%) foram submetidos a endarterectomia e 12 (27,3%) submetidos a angioplastia com stent (Gráfico 1). Desse total, 35 (79%) eram homens e 9 (21%) mulheres (Gráfico 2), com média de idade de 69,7 anos, variando entre 46 e 82 anos. 35 30 Gráfico 1 - Distribuição dos pacientes segundo procedimento realizado 32 25 20 15 12 10 5 0 ENDARTERECTOMIA ANGIOPLASTIA Números absolutos 18 Gráfico 2 - Distribuição dos pacientes segundo sexo 21% 79% Masculino Feminino Dentre as co-morbidades associadas, a mais prevalente foi a hipertensão arterial sistêmica em 81,8% dos pacientes. Outro fator de risco importante relatado foi o tabagismo, representado por 59,1% dos doentes (Tabela 1). Um paciente submetido a AC foi tratado com radioterapia prévia por neoplasia cervical e três possuíam histórico de coronariopatia. Tabela 1 – Relação dos fatores de risco dos pacientes submetidos a procedimento cirúrgico Fator de risco Número absoluto % HAS1 36 81,8 DM2 18 40,9 19 Tabagismo 26 59,1 Dislipidemia 14 31,2 Outros 9 20,4 1. Hipertensão arterial sistêmica 2. Diabetes mellitus A grande maioria dos pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos apresentaram evento isquêmico cerebral há menos de seis meses, sendo classificados, portanto, como sintomáticos, que representam 33 (75%) dos 44 pacientes selecionados (Gráfico 3). Os pacientes selecionados, quando sintomáticos, apresentavam estenose superior a 70%, enquanto os assintomáticos (25%) possuíam estenose superior a 80%. Grafico 3 - Distribuição dos pacientes submetidos a ECA ou AC segundo a sintomatologia 90% 83,3% 75,0% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 9,4% 15,6% 8,3% 10% 0% Endarterectomia AVC AIT 8,4% Angioplastia Assintomático 20 Os pacientes selecionados no estudo realizaram ecodoppler de carótidas e vertebrais como exame de triagem. Como exame complementar para programação cirúrgica, realizou-se angiotomografia em 36 (81,9%) dos pacientes. Restringiu-se a arteriografia com subtração digital (DSA), haja vista ao risco inerente ao procedimento, para oito (18,1%) pacientes, sendo sete em que houve dúvida diagnóstica após realização de angiotomografia, ou que já possuíam indicação ao tratamento endovascular e um em que não estava disponível a angiotomografia no hospital por motivos técnicos. Nenhum dos pacientes selecionados foi submetido a angiorressonância devido a indisponibilidade do exame no serviço. Levando em consideração a imagem tomográfica ou pela arteriografia, diagnosticamos 35 (79,5%) pacientes com estenose acima de 70%, sendo 11 (25%) doentes com suboclusão carotídea. A doença carotídea bilateral grave, com estenose superior a 70%, foi identificada em quatro (9%) dos casos. A maioria dos pacientes sintomáticos foi admitida pela emergência e encaminhados à Unidade de Tratamento de AVC, onde eram triados quanto à indicação cirúrgica. O tempo médio transcorrido do evento isquêmico até o tratamento cirúrgico, que podemos denominar “delta T” foi de 26,7 dias, variando de 7 a 59 dias. 21 Com relação ao procedimento cirúrgico, foram adotadas estratégias como uso do shunt em cinco (11,4%) pacientes e patch com PTFE em seis (13,6%) casos. Não coincidiu o uso das duas técnicas em nenhum paciente. O tempo de permanência hospitalar variou entre 4 e 106 dias, representando uma média de 32,2 dias. O internamento em unidade de terapia intensiva variou de 1 a 100 dias, com uma média de 5,6 dias. A complicação mais prevalente relacionada aos procedimentos foi o hematoma da ferida cervical na endarterectomia (22,7%), seguido por pneumonia que acometeu cinco (11,3%) pacientes. Registrou-se, nesse período, quatro óbitos o que representa um índice de 9,1%, sendo dois (4,5%) relacionados à pneumonia nosocomial, manifestando os primeiros sintomas apenas no pós-operatório. Outro paciente, com desfecho desfavorável, evoluiu no pós-operatório imediato com AVC por dissecção da placa de ateroma no local onde foi posicionada a pinça hemostática vascular na artéria carótida comum. Mesmo sendo operado novamente em caráter de urgência, evoluiu com sequela neurológica importante e complicações infecciosas na UTI. No quarto paciente foi registrado como causa do óbito infarto agudo do miocárdio (IAM). Não se registrou nenhuma lesão iatrogênica de nervos cervicais. 22 Houve um paciente que, após nove meses de ECA, foi admitido pela emergência por AVC agudo. O ecodoppler de carótidas evidenciou oclusão da carótida previamente operada. Tabela 2 – Relação das complicações dos pacientes submetidos a procedimento cirúrgico Complicação Total(n)/(%) ECA(%) AS(%) Hematoma 10/22,7% 22,7% - AVC 2/4,5% 4,5% - IAM 1/2,3% 2,3% - Lesão neurológica - - - Pneumonia 5/11,4% 11,4% - Reestenose 1/2,3% 2,3% - Óbito† 4 /9,1% 9,1% - Outros 3/6,8% 6,8% 23 5. DISCUSSÃO Quando consideradas separadamente as doenças cardiovasculares, acidente vascular cerebral (AVC) é a terceira causa de morte em países industrializados, atrás de doenças cardíacas e câncer e uma das principais causas de incapacidade por longo tempo (ROSAMOND et al., 2008). Estima-se uma incidência anual de aproximadamente 700.000 casos de AVC, dos quais 500.000 são novos e 200.000 são recorrentes (Broderick et al., 1998). Quanto à etiologia, 88% são isquêmicos, 9% são hemorrágicos intracerebrais e 3% são por hemorragia subaracnóide (ROSAMOND et al., 2008). A prevalência de infarto cerebral silencioso entre 55 e 64 anos é de aproximadamente 11%, duplicando essa porcentagem quando atingem pacientes entre 65 e 69 anos, e podendo atingir mais de 40% além de 85 anos (ROSAMOND et al., 2008). Aproximadamente 7% de todos os AVC isquêmicos foram associados a estenose carotídea extracraniana superior a 60% (WHITE et al., 2005). Na população do estudo de Fine-Edelstein et al. (1994), a prevalência de estenose carotídea superior a 50% em pacientes entre 66 e 93 anos foi de 7% em mulheres e 9% em homens. No estudo de O´Leary et al. (1992), 7% dos homens e 5% das mulheres acima de 65 anos tinham estenose 24 moderada (50-74%). Nesse mesmo estudo, em 2,3% dos homens e em 1,1% das mulheres foram detectados estenose grave (75-99%). Fatores de risco associados com doença da artéria carótida extracraniana são os mesmos para aterosclerose (tabagismo, hipercolesterolemia, diabetes, hipertensão), corroborando os resultados encontrados nessa pesquisa, haja vista que, dos pacientes incluídos no estudo, 81% eram hipertensos, 40% diabéticos e 59% tabagistas. Os mecanismos envolvidos na ruptura de placas nas artérias carótidas extracranianas e vertebral são semelhantes aos propostos para artérias coronárias. Estes incluem a ruptura da capa fibrosa, erosão superficial, e erosão de nódulo de cálcio. O contato dos elementos do sangue, incluindo plaquetas e proteínas da coagulação, e os constituintes da placa aterosclerótica, tais como colágeno e fator tecidual, promovem trombose. Além disso, a hemorragia intraplaca, causada por microvasos friáveis na sua base, pode contribuir para a expansão da placa (BROTT et al., 2011). A relação entre o crescimento das placas e o aumento da estenose com o risco de AIT ou AVC é complexa. Já foi evidenciada uma clara relação entre o grau de estenose e o risco de AVC no estudo de Fergunson et al. (1999). Após 18 meses de terapia clínica sem revascularização, taxas de AVC foram de 19% naqueles com estenose 25 de 70% a 79%, 28% naqueles com 80% a 89% de estenose, 33% no grupo com 90% a 99% de estenose (Fergunson et al., 1999). No estudo Halliday et al. (2004), o risco de AVC ispilateral ou morte durante um período de 5 anos em pacientes com estenose maior ou igual a 70%, randomizados para terapia medicamentosa inicial foi de 4,7%. A diferença nas taxas sugere que a terapia medicamentosa tem sido associada com diminuição de taxas de eventos ao longo do tempo e que a doença assintomática pode apresentar uma evolução relativamente benigna em muitos indivíduos. Vários outros estudos randomizados também documentaram baixa taxa de eventos neurológicos em pacientes assintomáticos com estenose de carótida interna moderada a grave (HOBSON et al., 1993). Investigações sobre a relação entre os sintomas cerebrais e características morfológicas da placa definida por ecografia encontraram uma associação clínica de eventos de AVC isquêmico com ecolucência, ulceração, hemorragia intraplaca e alto conteúdo de lipídios (FISHER et al., 2005). O benefício da intervenção cirúrgica na prevenção do acidente vascular cerebral é comprovadamente maior nas duas primeiras semanas após o início dos sintomas, uma vez que a maioria dos eventos isquêmicos recorrentes ocorre nesse período inicial. Decorridos quatro semanas em mulheres e doze semanas em homens, o benefício da 26 cirurgia nestes pacientes sintomáticos não é maior do que a observada com a cirurgia para pacientes assintomáticos (NAYLOR, 2008). No presente estudo, evidenciamos que no HGF o tempo médio decorrido entre o evento isquêmico cerebral foi 26,7 dias, portanto quase o dobro do ideal, que seria até 14 dias. Esse dado expõe a grave situação em que se encontra o sistema de saúde pública do estado, retratada na superlotação de hospitais de referência para o tratamento do AVC, como é o HGF, culminando na demora da propedêutica do paciente internado e atrasando o tratamento ideal. Devemos levar em consideração que decisões intervencionistas para um determinado paciente devem basear-se entre o equilíbrio entre os riscos de revascularização e o risco de agravamento dos sintomas e a deficiência com a terapia medicamentosa per si. Portanto, alguns pacientes que eram potenciais candidatos a entrar nesse estudo no início do internamento, foram excluídos devido à demora na realização de exames pré-operatórios ou aguardando materiais específicos para o tratamento cirúrgico e, dessa forma, a intervenção foi contraindicada após certo período, haja vista que o benefício da cirurgia praticamente igualouse ao tratamento clínico, comparando-se também com os riscos do procedimento cirúrgico. 27 Quanto à investigação complementar da doença carotídea e vertebral extracraniana, há disposição da ecografia com doppler de carótidas, angiotomografia (ATC) e angiorressonância (ARM) que podem fornecer as informações adequadas para orientar a escolha terapêutica. A ultrassonografia com doppler é um método preciso para medir a severidade da estenose, com a ressalva de que a estenose suboclusiva, às vezes, pode ser confundida com obliteração do vaso. A ARM é um exame não invasivo que pode gerar imagens de alta resolução das artérias cervicais. As características do sinal de radiofrequência do fluxo de sangue são distintas do tecido mole e, dessa forma, permitem imagens do lúmen arterial (DEMARCO, 2004). No entanto, há uma limitação cada vez maior para amplificar a intensidade relativa do sinal de fluxo de sangue em comparação com os tecidos circundantes e permitir uma avaliação mais detalhada das artérias cervicais quando a estenose é relativamente maior (TENG et al., 2004). O fator limitante para o uso da ARM nesse estudo foi o custo operacional e a indisponibilidade do método no centro de imagens do Hospital. A ATC multislice reconstruída pode ser obtida a partir de finos cortes de imagens axiais contíguos obtidos após administração intravenosa de material de contraste radiográfico. A aquisição e processamento rápido 28 da imagem de forma contínua (“TC em espiral”) e a presença de detectores de alta resolução tem feito a ATC clinicamente prática (CLEVERT et al., 2007). Como a ARM, a ATC fornece imagens anatômicas do arco aórtico, vasos cervicais e polígono de Willis. A reconstrução multislice e a análise permitem a avaliação dos vasos mesmo muito tortuosos. Ao contrário da ultrassonografia com doppler e da ARM, a ATC fornece imagem direta do lúmen arterial, sendo adequada para avaliação da estenose. Equipamentos, protocolos de imagem e experiência do radiologista interferem fortemente na precisão da ATC (LELL, 2007), mas em estudos contemporâneos, a ATC foi comparada favoravelmente com a angiografia com catéter na avaliação de pacientes com doença carotídea e vertebral extracraniana com 100% de sensibilidade e especificidade de 63%, sendo utilizada em 82% dos pacientes nesse estudo. A necessidade média de quantidades elevadas de contraste iodado restringe a aplicação da ATC para pacientes com função renal inadequada. Tal como na ultrassonografia, lesões fortemente calcificadas são difíceis de avaliar a gravidade da estenose, assim como diferenciar entre estenose suboclusiva e oclusão (CHEN et al., 2004). Implantes dentários metálicos ou clipes cirúrgicos no pescoço geram artefatos que 29 podem impedir a avaliação das artérias cervicais. Obesos ou pacientes não cooperativos são difíceis de avaliar com precisão. Marcapassos e desfibriladores implantados no tórax não são impedimentos para realização da ATC. A angiografia por subtração digital convencional continua sendo o padrão-ouro com relação aos outros métodos de imagem vascular em pacientes com doença carotídea. Existem vários métodos para medida da estenose da artéria carótida interna que produzem marcadamente diferenças métricas com o mesmo grau de estreitamento anatômico. O método utilizado no estude de Ferguson et al. (1991) é dominante e tem sido utilizado nos mais modernos ensaios clínicos. Entre os impedimentos para a angiografia como um método de triagem estão os custos e os riscos associados. A complicação mais temida é o AVC, cuja incidência deve ser menor que 1% quando realizado por médicos experientes (LEONARDI et al., 2005). A angiografia pode ser o método preferido para pacientes obesos, com disfunção renal, ou impossibilidade ferromagnética por materiais que tornam a ATC ou a ARM tecnicamente inadequadas ou impossíveis. A angiografia também é apropriada quando estudos de imagem não invasivos produzem resultados conflitantes. 30 Na prática, no entanto, a angiografia por cateter é desnecessária para o diagnóstico e avaliação da maioria dos casos, sendo cada vez mais utilizada como manobra terapêutica de revascularização em conjunto com implantação de stent, corroborando os resultados da pesquisa, em que apenas 8 dos 44 pacientes foram submetidos a angiografia, justamente em casos de dúvida diagnóstica após a ATC ou em casos em que já havia a prévia indicação ao tratamento endovascular. Apenas 1 paciente foi submetido a angiografia devido à indisponibilidade da ATC no hospital no momento do internamento. Em resumo, devido a sua ampla disponibilidade e custo relativamente baixo, a ultrassonografia com doppler é preferível para a triagem de pacientes com risco moderado para a doença. Quando esse método sugere estenose significativa em um paciente sintomático, a avaliação anatômica deve ser considerada pelo uso de outra modalidade capaz de detectar a doença, bem como os fatores anatômicos associados, com a finalidade de programar o procedimento cirúrgico. O tratamento cirúrgico para a doença carotídea extracraniana reduz drasticamente a incidência de AVC ispilateral além do período de 30 dias do pós-operatório. Para os pacientes sintomáticos submetidos a endarterectomia (ECA), como evidenciado nos estudos NASCET (North American Symptomatic Carotid Endarterectomy Trial) e ECST (European 31 Carotid Surgery Trial), o risco cirúrgico global de AVC e óbito foi de aproximadamente 5,5% e 7,5%. Nos estudos que envolveram pacientes assintomáticos ACAS (Asymptomatic Carotid Atherosclerosis Study) e ACST (Asymptomatic Carotid Surgery Trial) essa taxa caiu para 2,3% e 3,1%. Tendo em vista os critérios distintos de aferição quanto ao grau de estenose, o estudo CETC – Carotid Endarterectomy Trialists Collaboration – evidenciou um benefício máximo em pacientes sintomáticos com estenose entre 70% e 99%, cujo número de pacientes tratados para evitar um AVC foi de seis (NNT=6). Além disso, verificou-se que certos grupos de pacientes se beneficiam com o tratamento cirúrgico: homens, presença de oclusão contralateral, idade superior a 75 anos, sintomas hemisféricos, placa irregular e doença intracraniana associada. O estudo CREST (Carotid Revascularization Endarterectomy vs. Stenting Trial) recrutou de forma randomizada, controlada e multicêntrica pacientes com estenose de carótida sintomáticos e assintomáticos. Foram incluídos aqueles com estenose superior a 50% na angiografia, 70% na ultrassonografia, tomografia ou ressonância. Os médicos responsáveis pelos procedimentos foram certificados previamente. Foram excluídos pacientes com incapacidade pós-AVC e que apresentavam angina instável, IAM recente ou fibrilação atrial crônica. Os 32 pacientes receberam após a intervenção dois antiagregantes plaquetários: AAS e clopidogrel. Foram avaliados 2522 pacientes com tempo médio de seguimento de 2,5 anos (1.271 tratados com stent e 1251 com endarterectomia). A idade média dos pacientes foi de 69 anos. Não houve diferença significativa nos desfechos primários entre os dois grupos de tratamento, inclusive na comparação entre pacientes sintomáticos e assintomáticos. Já a mortalidade e a taxa de AVC estimadas para 4 anos após os procedimentos foi maior no grupo tratado com stent (6,4% X 4,7%, p=0,03). Na avaliação restrita ao período de 30 dias após a intervenção, a taxa de mortalidade foi semelhante entre os grupos (0,7% X 0,3%, p=0,18), mas a incidência de AVC foi maior no grupo tratado com stent (4,1% X 2,3%, p=0,01), enquanto a incidência de IAM foi superior no grupo submetido à endarterectomia (1,1% X 2,3%, p=0,03). A análise de qualidade de vida após 1 ano da ocorrência de complicações revelou que o AVC provocou mais impacto no estado de saúde que o IAM. No período após 30 dias, a incidência de AVC foi semelhante nos dois grupos (2,0% X 2,4%, p=0,85). Apesar das taxas equivalentes de complicações entre os dois grupos de tratamento, a análise de cada efeito adverso isoladamente sugere um maior benefício do tratamento com endarterectomia. Isto é reforçado pela 33 observação de que, enquanto pacientes mais jovens obtiveram menos complicações com stent, os idosos com mais de 70 anos apresentaram melhores desfechos após a endarterectomia. Esse fenômeno pode ser atribuído a complicações decorrentes de dificuldades técnicas naturais presentes no tratamento com stent, como a abordagem de artérias muito tortuosas e com maior grau de calcificação vascular. A aplicabilidade do estudo para a população em geral é comprometida apenas pelos critérios de exclusão empregados e pela necessidade de cirurgiões vasculares habilitados, visto que a experiência cirúrgica influencia o prognóstico operatório. Já a inclusão de pacientes assintomáticos fez perceber que a indicação cirúrgica precoce parece ser desnecessária, já que não reduz o risco de qualquer uma das intervenções. Um lapso maior de tempo entre o início dos sintomas e o procedimento se associa à perda considerável do benefício em termos de recorrência do AVE. Boa parte da nossa população depende de seguros privados de saúde que, em vários centros, insistem em dificultar e postergar a autorização para o uso de dispositivos de alto custo. Além disso, os pacientes encaminhados para tratamento endovascular são submetidos a um maior número de exames de imagem. Estes são riscos adicionais que devem ser considerados, quando indicamos o procedimento endovascular em pacientes assintomáticos. O risco certamente é maior 34 ainda para os pacientes que dependem do nosso Sistema Único de Saúde. Uma meta-análise recente dos cinco estudos randomizados que comparam as duas técnicas em paciente de risco moderado ou baixo, chegou a conclusões bem definidas. Não é recomendável a utilização da angioplastia como substituição à cirurgia em larga escala (Qureshi et al., 2005). Os estudos europeus que comparam as duas técnicas parecem apresentar desenho mais adequado, já que incluem apenas pacientes sintomáticos. Os trabalhos que têm procurado dar suporte à indicação do tratamento endovascular são estudos comparativos, patrocinados pela indústria com o intuito de aprovação pela Food and Drug Administration (FDA) para a comercialização de dispositivos nos EUA. Como a FDA exige, no mínimo, a não inferioridade aos resultados obtidos com a técnica convencional, fica fácil entender como o estudo é desenhado e como é feita a seleção dos participantes do ramo cirúrgico. A identificação dos critérios de seleção dos pacientes para a ECA ou para a AC, proposta por Becquemin, cirurgião francês com experiência em ambas as técnicas que identificou 11 indicações para a ECA e apenas três para a AC, mostra que o aspecto anatômico também é um fator limitador do uso da AC. Se esse detalhe não for considerado de forma 35 crítica, é quase certo que muitos procedimentos endovasculares não serão concluídos e, se forem realizados, o serão com alto percentual de complicações após o procedimento. Becquemin concluiu: “Não há evidência nem consenso a respeito da seleção dos pacientes para a angioplastia carotídea. Antes de se escolher entre cirurgia ou angioplastia com stent, deve-se examinar, cuidadosamente, os riscos do procedimento, incluindo riscos gerais, locais e neurológicos. Além disso, o risco de falha técnica devido a peculiaridades anatômicas deve também ser levado em conta” (BECQUEMIN, 2004). Muito cuidado deve ser dado aos indivíduos assintomáticos com múltiplos fatores de risco, em que um benefício previsível a longo prazo pela ECA pode ser reduzido de forma marcada pela sobrevida de somente 5 anos. Os pacientes que são realmente de alto risco têm curta expectativa de vida e são melhor tratados sem intervenção. Os autores também estudaram o risco da embolização cerebral pelas duas técnicas em uso e concluíram que o risco de embolização cerebral com a técnica endovascular é oito vezes mais freqüente do que com a endarterectomia carotídea (BIASI et al., 2006). Analisando os resultados do nosso estudo, observamos que o número de procedimentos cirúrgicos abertos foi bem maior que a quantidade de AC realizadas, seguindo as recomendações da metanálise supracitada. 36 Entretanto vale a ressalva de que muitos pacientes não foram submetidos à AC por falta de materiais específicos no hospital utilizados no procedimento endovascular, notadamente em 2015, quando foi realizada apenas uma AC. Observando o tempo de internamento e o tempo decorrido até o procedimento cirúrgico nos pacientes do estudo, verificamos que o período pré-operatório foi responsável por cerca de 80% do tempo de permanência hospitalar, com breve permanência na UTI (em média 2 dias) e posterior alta hospitalar também após um período aceitável (em média 4 dias), o que nos leva a concluir que a duração elevada do internamento não foi devido às complicações pós-operatórias, mas sim à demora para realização de exames e posterior realização da cirurgia, às vezes postergada por falta de leitos na UTI para o pós-operatório. Durante a coleta de dados, percebemos uma diminuição na incidência de complicações no ano de 2015, comparando-se aos dois primeiros anos do estudo, que pode traduzir uma melhora no cuidado peri-operatório à medida que o serviço adquire mais experiência. 37 6. CONCLUSÃO A ECA é um procedimento bem consolidado e com bons resultados a curto, médio e longo prazos. Ainda é a indicação preferencial para a grande maioria das situações que envolvem a doença carotídea aterosclerótica, com bons resultados, mesmo em situações consideradas de alto risco. A AC é uma opção no tratamento da doença carotídea, principalmente em casos de pescoço hostil por radioterapia prévia ou reestenose de lesão muito distal, sendo, portanto, a nosso ver, uma técnica que deve ser utilizada com cautela e limitada a um menor número de pacientes. Entretanto, em alguns casos, a AC pode ser utilizada como primeira opção, inclusive em pacientes assintomáticos. O assunto ainda continua polêmico e, obviamente, comporta várias interpretações e críticas. A discussão ampla do tema, envolvendo todos os aspectos relacionados ao mesmo (éticos, médicos e econômicos), pode e deve ser estimulada. O interesse do paciente, ao qual deve ser dado o melhor tratamento, deve prevalecer. O serviço de cirurgia vascular do HGF está em concordância com a literatura no que diz respeito à indicação cirúrgica, sendo considerados elegíveis para o tratamento cirúrgico pacientes sintomáticos com 38 estenose carotídea acima de 70% ou assintomáticos com estenose maior que 80%. A média da duração do internamento elevada dos pacientes estudados no HGF deveu-se principalmente à demora para realização de exames e posterior realização da cirurgia, às vezes postergada por falta de leitos na UTI para o pós-operatório, sendo evidenciado que as complicações pósoperatórias exercem pouca influência nos resultados encontrados. Apesar da literatura mostrar que a incidência de AVC é maior nos pacientes submetidos a AC do que nos submetidos a ECA, encontramos resultado oposto no nosso estudo, visto que os dois pacientes que apresentaram essa complicação haviam sido submetidos a endarterectomia. A alta taxa de mortalidade encontrada no estudo (9%) chama a atenção, entretanto observando a causa do óbito dos 4 pacientes, verificamos que a alta mortalidade está mais relacionada à alta duração da permanência hospitalar, contribuindo para a colonização bacteriana dos pacientes, do que ao procedimento cirúrgico per si. Por fim, o tratamento da estenose carotídea deve ser estimulado no HGF, baseando-se nas conclusões desse estudo, entretanto com a certeza de que devemos maximizar os esforços para eliminar os fatores 39 que foram identificados como responsáveis pela maior taxa de complicações e mortalidade encontradas, comparando-se com os dados encontrados na literatura. 40 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. DEBAKEY ME. Successful carotid endarterectomy for cerebrovascular 2. Brott TG, Hobson RW 2nd, Howard G, Roubin GS, Clark WM, Brooks W, et al; insufficiency. Nineteen-year follow-up. JAMA. 1975;233:1083-5. CREST Investigators. 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Sexo: ( )M ( )F c. Data de admissão: _____/_____/__________ 2. Fatores de risco FATOR SIM NÃO OBSERVAÇÕES Hipertensão arterial sistemica Diabetes Mellitus Tabagismo Dislipidemia ICC Arritmia História familiar AIT prévio AVC prévio IAM prévio Insuficiência renal “Pescoço hostil” 3. Sintomatologia a. Sintomático ( ) 44 AVC ( ) AIT ( b. Assintomático ( 4. Exames complementares a. Doppler ( ) ) ) - LD: - LE: b. Arteriografia ( ) - LD: - LE: c. AngioTC/RNM ( ) - LD: - LE: 5. Data da cirurgia: ___/___/______ a. Endarterectomia ( ) i. Anestesia: ________________ b. Angioplastia com stent ( 6. Período de internamento: ) a. Hospital: _______ dias b. UTI: 7. Complicações: _______ dias Complicações de ferida (hematoma, seroma, infecção de sítio cirúrgico) Trombose aguda Sídrome de hiperperfusão Lesões neurológicas AVC Reestenose Pneumonia Óbito 45 46 47 48