Termodinâmica química: exercícios propostos em sala de aula Prof. Fabrício R. Sensato Gases e 1ª Lei da Termodinâmica (1) Numa experiência para determinar um valor exato da constante dos gases perfeitos, R, um estudante aqueceu um vaso de 20,000 L, cheio com 0,25132 g de hélio gasoso, a 500 oC, e mediu a pressão em um manômetro de água, a 25oC, encontrando 206,402 cm de água. A densidade da água, a 25oC, é 0,99707 gcm-3. Calcule o valor de R a partir destes dados. Resolução: A constante dos gases ideais, R, pode ser calculada pela equação de estado dos gases ideais: pV=nRT ⇒ R= pV/nT Dentre estas variáveis, T (773,15 K) e V (20,000 L) são prontamente fornecidas. A quantidade de matéria, n, deve ser determinada empregando-se a massa molar do gás hélio, M(He)=4,003 g/mol. A pressão, p, deve ser determinada através da altura da coluna de água (substância de trabalho) do manômetro (pois a pressão exercida pela coluna de água e a pressão do gás é a mesma). A relação entre a pressão exercida por uma coluna de líquido e sua altura, h, é dada por: p = ρgh, em que ρ é a densidade da substância de trabalho do manômetro (água, neste caso) e g é a aceleração da gravidade (9,81 ms-2). Substituindo-se na expressão para R, tem-se: R= 100cm 100cm 1kg 1Pa × 0,99707gcm −3 × 206,402cm × 9,81ms − 2 × 20,000L × × × 1m 1m 1000g 1kgm -1s -2 1 mol de He × 773,15K 0,25132g × 4,003 g R = 0,0821 atmLmol-1K-1 Em que as seguintes igualdades foram consideradas: 1m = 100cm; 1kg = 1000g; 1Pa = 1kgm-1s-2; 1atm = 101325Pa 1atm × 101325 Pa (2) Deduza a equação entre pressão e a densidade, ρ, de um gás perfeito de massa molar M. Verifique graficamente o resultado com os seguintes dados referentes ao éter dimetílico, a 25oC, mostrando que o comportamento de gás perfeito ocorre nas pressões baixas. Estime a massa molar molar do gás. p/torr ρ /gL-1 91,74 0,225 188,98 0,456 227,3 0,664 452,8 1,062 639,3 1,468 760,0 1,734 Resolução: A expressão entre pressão, densidade e a massa molar de um gás perfeito pode ser deduzida como segue: p= nRT mRT ρRT ρ ⇒p= ⇒p= ⇒ M = RT V MV M p p (torr) em que as relações n=m/M e ρ=m/V foram utilizadas. Segundo a expressão supracitada, a massa molar do gás poderia ser calculada a partir de qualquer razão ρ/p encontrada no enunciado do problema (tabela). Deve-se reconhecer, entretanto, que o comportamento de um gás real é melhor descrito pela equação dos gases ideais (perfeito) em condições de baixas pressões, em particular, quando p→0. Assim, torna-se necessário conhecer o valor de ρ/p quando p→0. Para este propósito, os dados da tabela contida no enunciado do problema são usados para se obter uma representação gráfica de p em função da razão ρ/p. O gráfico obtido (ver gráfico ao lado) é, então, 800 explorado para se estimar o valor de ρ/p 700 p = -3,853×106(ρ/ p) quando p→0 mediante identificação do 600 + 9510 2 intercepto p = 0. Algebricamente, isto pode R = 0,99 500 ser feito a partir da equação da reta obtida 400 pelo método dos mínimos quadrados (p =300 3,853×106 (ρ/p) + 9510), determinando-se o 200 valor da razão ρ/p quando p = 0. Assim, 100 0 = -3,853×106 (ρ/p) + 9510 0 (ρ/p) = 0,00247gL-1torr-1 0,00225 0,00230 0,00235 0,00240 0,00245 0,00250 -1 -1 ρ /p (gL torr ) Substituindo-se o valor de (ρ/p) na expressão acima, tem-se M= ρ 760torr RT ⇒ M = 0,00247gL-1 torr -1 × 0,0820574atmLmol −1K −1 × 298,15K × ⇒ M = 45,9g/mol p 1atm Prof. Fabrício R. Sensato (3) Calcule o trabalho de expansão que é feito durante a eletrólise de 50g de água, a pressão constante e a 25oC. Resolução: A reação química correspondente à eletrólise da água é dada pela seguinte equação química: H2O(l) → H2(g) + ½O2(g) O trabalho de expansão é dado por: dw = −p ex dV ⇒ w = ∫ - p ex dV (1) Como a pressão externa, pex, é constante, o trabalho, w, torna-se: w = −p ex ∆V (2) Durante a eletrólise os gases formados se expandem e o processo é, portanto, acompanhado de um aumento de volume, ∆V, ou V2-V1. Para calcular ∆V podemos desprezar V1 (que correspondente à fase líquida), uma vez que V2 >> V1. Assim, pode ser aproximado, como segue: ∆V ≈ V2. O volume do gás é função da pressão de oposição e o gás irá expandir até que p2=pex. Assim, V2 pode ser prontamente calculado como V2=nRT/pex. Substituindo-se estas igualdades na Eq. 2, tem-se: w = −p ex V2 ⇒ w = −p ex × nRT ⇒ w = −nRT p ex (3) Faz-se necessário determinar o quantidade, n, de gases gerados. Observando-se a equação química correspondendo à eletrólise da água, verifica-se que a quantidade de gases formados é 1,5 vezes maior que a quantidade de água consumida na eletrólise. A quantidade de água consumida é dada por: 1 mol de água = 2,8 mol de água 50 g de água × 18,02 g de água (4) Portanto, a quantidade de gases gerada é 2,8 mol × 1,5 = 4,2 mol de gases O trabalho de expansão pode ser, então, calculado: w = −nRT ⇒ − 4,2 mol × 8,31451JK -1mol -1 × 298,15K ⇒ w = - 10kJ (5) 4) A capacidade calorífica molar, a pressão constante, de um gás perfeito varia com a temperatura de acordo com a expressão Cp/(JK-1) = 20,17+0.4001(T/K). Calcule q, w, ∆U e ∆H, quando a temperatura é elevada de OoC a 100 oC (a) a pressão constante e (b) a volume constante. Resolução (a): Para um gás ideal, os valores de ∆U e ∆H são funções apenas da temperatura. ∆H se relaciona com a temperatura através da capacidade calorífica do gás a pressão constante, CP (ou CP,m): ∆H = ∫ 373K 273 K nCP , m dT 373K T ) JK -1mol-1dT 273K K 0,4001 ∆H = n [20,17 × (T2 − T1 )JK-1mol-1 + × (T22 − T12 ) JK-1mol-1 ] 2K 0,4001 ∆H = 1 mol × [20,17 × (373K − 273K)JK -1mol-1 + × ((373K) 2 − (273K ) 2 ) JK -1mol-1 ] 2K ∆H = 14,9 kJmol-1 ∆H = n ∫ (1) (20,17 + 0,4001 (2) (3) (4) Como o processo ocorre a pressão constante, q = ∆H = 14,9 kJmol-1 A dependência de ∆U com a temperatura, é dada por: ∆U = ∫ 373K 273K nCV ,m dT A capacidade calorífica a volume constante, CV,m, pode ser calculada, como segue: CP,m - CV,m = R Assim, CV,m = CP,m – R (R = 8,31447JK-1mol-1) Substituindo-se (7) em (5), obtém-se: 373K T ∆U = n (20,17 + 0,4001 - 8,31447 ) JK -1mol-1dT 273K K 0,4001 ∆U = 1 mol × [11,86 × (373K − 273K)JK -1mol-1 + × ((373K) 2 − (273K) 2 ) JK -1mol-1 ] 2K ∆U = 14,1 kJmol-1 O trabalho, w, pode ser calculado diretamente da 1ª Lei da Termodinâmica. ∆U= w + q w = ∆U – q = -0,8 kJ ∫ (5) (6) (7) (8) (9) Resolução (b) Se o processo ocorre a volume constante, w = 0 (não há realização do trabalho de expansão). Os valores de ∆H e ∆U são calculados como em (4) e (9), respectivamente. Assim, ∆H = 14,9 kJmol-1, enquanto ∆U = 14,1 kJmol-1. Como w = 0, 1ª Lei da termodinâmica torna-se ∆U = q e, portanto, q = 14,1 kJmol-1. 5) Uma amostra de dióxido de carbono, com 2,45 g, a 27 oC, se expande reversivelmente e adiabaticamente de 500 mL até 3,00 L. Qual o trabalho feito pelo gás? CP,m= 37,11 JK-1mol-1 Resolução: Para um processo adiabático (q = 0) a 1ª Lei da termodinâmica torna-se: ∆U = wad ∆U = CV∆T wad = CV∆T Assim, pode-se calcular o trabalho realizado se a temperatura final do sistema, T2, for conhecida. Da primeira Lei, tem-se que: dU = dw Como dU = CvdT; dw = -pexdV CVdT = -pexdV Como o processo é reversível, pex ≈ pgás = nRT/V Assim, Integrando-se esta expressão e admitindo que CV seja independente da temperatura, tem- se(n e R são constantes): 8,31447JK −1 mol −1 T2 = 300K ( ) 0,500L 3,00L 28 ,80 JK −1 mol −1 (CV,m é calculado pela relação: CP,m - CV,m = R T2 = 179 K Como w = ∆U; A massa molar do CO2 é 44,0 g/mol tal que n(CO2) = 0,0557 mol w = ∆U = n CV,m ∆T ⇒ w = 0,0557 mol × 28,80 JK-1mol-1 × (179K – 300K) w = - 194 J