Revista Eletrônica Novo Enfoque, ano 2013, v. 17, n. 17, p. 106 –110 ANÁLISE DA FAUNA DE ORTHOPTERA ASSOCIADA À DECOMPOSIÇÃO DE CARCAÇA DE SUÍNO GONÇALVES-OLIVEIRA, Rodrigo1 OLIVEIRA-COSTA, Janyra2 Palavras-chave: Entomologia Forense, Papel ecológico, Onívoro. Problemática e enquadramento teórico A aplicação do estudo dos insetos e de outros artrópodes associados ao processo de decomposição cadavérica, a entomologia forense, tem por finalidade fornecer informações necessárias para auxiliar na elucidação de litígios (SMITH, 1986; BYRD & CASTNER, 2003; OLIVEIRA-COSTA, 2008). Para que se possibilite a aplicação da entomologia forense é necessário o conhecimento da entomofauna cadavérica (SMITH, 1986). Um cadáver constitui um recurso dinâmico que suporta uma vasta comunidade cadavérica que desencadeará um processo de sucessão entomológica. A cada fase do processo de decomposição, ocorrerá a frequência de um grupo de insetos, de forma sequencial, onde o grau de deterioração e colonização implicará nas condições para o desenvolvimento desses táxons (CATTS & HASKELL, 1991). Durante todos os estágios da decomposição do cadáver, os insetos são sempre muito abundantes, estando estes submetidos aos diversos fatores locais, como temperatura, umidade, tipo de vegetação e barreiras físico-químicas (MORENO, 2001). A taxa de insetos necrófagos durante este processo de deterioração pode constituir uma valiosa ferramenta para a estimativa do intervalo pós-morte (IPM) (MEGNIN, 1894). Além do IPM, essa ciência pode ser aplicada em indicativos para deslocamento do corpo, evidenciar a causa do crime e o tipo de morte (OLIVEIRA-COSTA, 2011). A ordem Orthoptera, que agrupa os gafanhotos, grilos e esperanças, possui mais de 20 mil espécies em distribuição mundial, com maior diversidade nos trópicos (CAPINERA, 2004). Os ortópteros apresentam tamanho do corpo variado dentro dos grupos, podendo apresentar membros de menos de 5 mm e outros de 11,5 cm, são comuns na fauna terrestre e ambas as 1 Acadêmico Bolsista PIBIC&T/UCB (Vigência: Out./2012 a Out./2013). Grupo de Pesquisa Entomologia Forense da Universidade Castelo Branco. Curso de Ciências Biológicas da Universidade Castelo Branco (UCB), Campus Realengo, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 2 Orientadora. Grupo de Pesquisa Entomologia Forense. Curso de Ciências Biológicas da Universidade Castelo Branco (UCB), Campus Realengo, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Perito Criminal. Laboratório de Entomologia Forense. Polícia Técnica e Científica do Rio de Janeiro. Subordens (Ensifera e Caelifera) apresentam indivíduos geralmente fitófagos, porém muitas espécies são onívoras (CHOPARD, 1938; HEWITT, 1979). Tendo em vista a vasta ocorrência de ortópteros em experimentos anteriormente realizados, o objetivo deste trabalho foi listar os gêneros mais abundantes no processo de decomposição cadavérica e associar possíveis fatores que acarretaram na manifestação destes insetos na carcaça, possivelmente relacionado à sua posição ecológica. Procedimentos Metodológicos As coletas foram realizadas no 26º Batalhão de Infantaria Paraquedista (BIPQDT), no município do Rio de Janeiro, bairro Realengo, em um fragmento de mata ciliar ao redor do córrego Lambari, onde foi colocado como modelo animal, uma carcaça de porco doméstico – Linneaus Sus scrofa, 1758, de aproximadamente 15 kg, durante o outono. O animal foi sacrificado pelo método de abate comercial, que é comumente usado em matadouros, através de pancada na região craniana e facada na região do coração. O projeto foi previamente aprovado pelo comitê de ética em pesquisa em seres humanos e animais da Universidade Castelo Branco (UCB 044/11). Após o abate, a carcaça foi disposta em contato direto com o solo e dentro de uma armadilha tipo Shannon modificada (OLIVEIRA-COSTA, 2011). Quatro armadilhas do tipo pitfall foram colocadas ao redor da Shannon (SCHOENLY, et al., 2006). Estas armadilhas de queda foram construídas com baldes de plástico de 2,5 litros, enterrado com os seus bordos paralelos ao chão e colocados 1,0 m de distância da gaiola e 1,0 m entre elas. Um quarto da capacidade do balde foi cheio com água com sabão detergente, visando a quebrar a tensão superficial da água, mas nenhum líquido conservante foi utilizado, com o intuito de evitar a interferência de atração ao cadáver (odores exalados pela carcaça). Os insetos foram coletados com auxílio de instrumento de coleta específico, tal como peneira para captura no pitfall. Todos os ortópteros coletados vivos foram sacrificados e armazenados em álcool 70% no local da coleta. Posteriormente, os exemplares foram encaminhados ao laboratório de Entomologia Forense da Universidade Castelo Branco para identificação e preservação. Resultados principais e discussão Foram coletados 75 ortópteros pertencentes às famílias Acrididae, Gryllidae, Raphidophoridae , Tetrigidae e Tettigoniidae. Devido às dificuldades morfológicas, carência de 107 chaves para identificação taxonômica e ausência de um especialista do grupo, apenas alguns gêneros puderam ser identificados. A família Acrididae, apresentou 25 indivíduos, sendo 11 do gênero Orthochtha sp., 10 de um morfótipo da subfamília Acridinae e 4 de outro morfótipo da subfamília Melanoplinae. Gryllidae apresentou 20 indivíduos, sendo sete do gênero Gryllus sp., oito de um morfótipo da subfamília Gryllinae e cinco de uma morfoespécie da subfamília Nemobiinae. Raphidophoridae apresentou apenas um morfótipo Tetrigidae apresentou 13 exemplares de um morfótipo da subfamília Tetriginae. Tettigoniidae apresentou 16 indivíduos, oito do gênero Neoconocephalus sp., três do gênero Phaneroptera sp., qautro de um morfótipo da subfamília Conocephalinae e um da subfamília Tettigoniinae. Todos os indivíduos coletados ocorreram em todas as fases da decomposição, com exceção de Raphidophoridae que ocorreu apenas na fase fresca. Não pôde ser confirmado o comportamento necrófago dos ortópteros coletados, visto que o experimento não foi submetido à constante observação. Todos os exemplares foram coletados na armadilha de queda. Além disso, o ato da coleta pode provocar a fuga dos insetos do local, especialmente os voadores e saltadores. Panigalli et al. (2013) coletaram indivíduos das famílias Acrididae e Gryllidae frequentando carcaça de porco doméstico em um fragmento de Mata Atlântica em Santa Catarina. Estas mesmas famílias foram observadas por Ries (2013), quando três carcaças de porco doméstico foram utilizadas em um experimento no Rio Grande do Sul. Da mesma forma que ocorreu em nosso experimento, estas duas famílias exibiram maior abundância. Cruz et al. (2006) coletaram alguns exemplares de Orthoptera não identificados associados à carcaça de porco em fragmento de Mata Atlântica em Pernambuco. Ferro et al. (2011) observaram indivíduos da família Acrididae frequentando carne bovina em decomposição no Estado de São Paulo. Neste mesmo Estado, em experimento utilizando carcaças de camundongo dispostas em área aberta e mata fechada, Hengles et al. (2011) coletaram exemplares associados à decomposição. Dos estudos analisados, estes insetos foram mais abundantes em área de mata e estes experimentos ratificam a importância de ortópteros associados ao recurso cadavérico. Não foi possível observar se os exemplares coletados estavam predando outros insetos na carcaça ou apresentavam comportamento necrófago. Assim, é necessário que outras pesquisas sejam realizadas, sob observação constante, a fim de elucidar o papel ecológico desse grupo no ambiente cadavérico. 108 Considerações Finais Em comparação aos referidos experimentos, foi verificado que a presença de mata foi fator determinante para ocorrência dos ortópteros nas carcaças. Sendo assim, acredita-se que os ortópteros já se encontravam no local onde as carcaças foram dispostas, salvo que não foram encontrados relatos destes insetos em ambiente urbano ou intradomiciliar, por exemplo. É necessário que mais experimentos sejam realizados a fim de comprovar que os ortópteros podem utilizar a carcaça como recurso alimentar alternativo. Referências BYRD, J. H.; CASTNER, J. L. Forensic Entomology: The utility of arthropods in legal investigations. Florida: Boca Raton, 2003. CAPINERA, J. L.; SCOTT, R. D.; WALKER, T. J. Field Guide To Grasshoppers, Katydids, And Crickets Of The United States. New York: Cornell University Press, 2004. 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