DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO À TEORIA DO CAPITAL

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DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO À TEORIA DO CAPITAL SOCIAL:
REBATIMENTOS DAS POLÍTICAS NEOLIBERAIS SOBRE A EDUCAÇÃO NO
ATUAL MOMENTO HISTÓRICO
Helena de Araújo Freres – UFC/IMO-UECE
[email protected]
Susana Vasconcelos Jimenez – IMO-UECE/UFC
[email protected]
Maria das Dores Mendes Segundo – IMO-UECE/UFC
[email protected]
Palavras-chaves: neoliberalismo, política educacional brasileira, capital social
Este artigo tem como objetivo apresentar considerações críticas acerca das
políticas neoliberais sobre a educação nos países periféricos, particularmente sobre a
política educacional brasileira, buscando desvelar o papel que a educação assume no
contexto histórico de crise do capital no que se refere ao rejuvenescimento da Teoria do
Capital Humano e à denominada Teoria do Capital Social. Asseveramos que, no plano
ideológico, os termos capital humano e capital social representam os processos de
legitimação da exploração do homem pelo homem, passando a fazer parte, inclusive,
das políticas sócio-educacionais elaboradas em âmbito mundial, correspondendo ao
chamamento dos indivíduos para a construção de um mundo melhor, conforme o jargão
comum, no interior do próprio capital. Pressupomos, outrossim, que o termo capital
social é operativamente mais funcional no atual contexto histórico, uma vez que este se
encontra envolto em uma capa ideológica que esconde de forma mais eficaz o
atrelamento da educação à lógica do mercado. Sob tal lógica atuam os organismos
internacionais, particularmente o Banco Mundial, representante por excelência do
sistema do capital no que tange ao receituário para a educação nos países periféricos.
Assim sendo, referido termo – que conclama a todos para que mudem o mundo,
bastando que cada um faça sua parte – é utilizado como mecanismo ideológico de
cooptação das subjetividades para que os indivíduos considerem-se imediatamente
responsáveis pela solução dos problemas que afligem a humanidade, tais como a
pobreza e a destruição ambiental, que expõem as chagas abertas pelo sistema
metabólico do capital sobre o conjunto da humanidade. É nesse sentido que a educação
é posta como a categoria central no desenvolvimento histórico dos homens. Em outras
palavras, através da educação, forma-se o capital social, que, supostamente, promoverá
a paz e a harmonia entre os povos, dispensando, desse modo, a superação das bases
sociais que geram esses mesmos problemas. Por esse motivo, o termo em estudo está
carregado de significados que desembocam numa visão subjetivista de coesão social.
Para iniciar nossa exposição, é necessário explicitar que o modo de produção
capitalista, instituído pela sociedade burguesa, pauta-se na produção de mercadorias. A
teoria marxiana nos ensina que a teoria do valor-trabalho é a pedra de toque da
funcionalidade da sociedade burguesa, visto que as mercadorias são trocadas em
proporção ao tempo de trabalho socialmente necessário para a sua produção.
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Com base nas leituras das obras de Marx, compreendemos que a produção
capitalista necessita da força de trabalho para possibilitar a acumulação de capital,
através da realização do que o pensador alemão chamou de “mais-valia”. Para ampliar
sua acumulação, o capital produz a divisão do trabalho e utiliza processos de alienação e
de expropriação da classe trabalhadora. Desse modo, no processo de acumulação
capitalista, a força de trabalho humana se converte em mercadoria, que possui valor-deuso e valor de troca. Para Marx (2004), a força de trabalho constitui-se em uma
mercadoria especial por tratar-se de uma mercadoria fundamental para o funcionamento
desta forma de organização societal, pois é produtora de outras mercadorias, valendo
menos do que produz. Portanto, força de trabalho e produto do trabalho são
propriedades do capitalista. O processo de trabalho é, pois, de acordo com Marx (2004,
p. 219), “[...] um processo que ocorre entre coisas que o capitalista comprou, entre
coisas que lhe pertencem”.
Nesse processo de produção da riqueza para outrem, o trabalhador, conforme,
Marx (1964), “desce até ao nível de mercadoria, e de miserabilíssima mercadoria”, cuja
miséria aumenta à medida que produz mercadorias. Em outras palavras, quanto mais
riqueza produz, mais miserável se torna porque riqueza e pobreza coexistem numa
relação antagônica na sociedade produtora de mercadorias. Conforme o próprio Marx
(1964, p. 159),
O trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz,
quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O
trabalhador torna-se uma mercadoria tanto mais barata, quanto maior
número de bens produz. Com a valorização do mundo das coisas
aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens.
O trabalho não produz apenas mercadorias; produz-se também a si
mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria, e justamente na
mesma proporção com que produz bens.
No contexto do pós-segunda guerra, a produtividade do trabalho possibilitou a
existência de um acentuado desenvolvimento econômico. Nesse contexto, surgiu a
Teoria do Capital Humano (TCH) para dar um impulso ao desenvolvimento econômico
e social. Em sua clássica formulação elaborada por Schultz, na Escola de Chicago, na
década de 1950, a TCH representa o mecanismo teórico-prático de formação de
indivíduos aptos para impulsionar o desenvolvimento econômico e seu próprio
desenvolvimento pessoal. De acordo com a literatura produzida sobre essa temática
(FURTADO, 2003), a Teoria do Capital Humano (TCH) surgiu no momento da história
em que o capitalismo desenvolvia-se vertiginosamente, fazendo surgir a necessidade de
constituição de uma nova área do conhecimento denominada Economia da Educação.
Nesse contexto, a educação foi considerada como fator de desenvolvimento econômico
das nações e dos próprios indivíduos, visto que esta propiciava a aprendizagem de
conhecimentos, valores e habilidades necessários ao processo de produção. É
importante acrescentar que a TCH assumiu a função ideológica de garantir a hegemonia
dos Estados Unidos após a Segunda Guerra sobre todos os cantos do globo, a pretexto
de defender os países da periferia do capital, frente à ameaça do avanço do comunismo
no mundo.
A TCH parte do pressuposto de que um investimento mínimo na instrução para
a classe trabalhadora aumentaria, em igual proporção, a capacidade de produção. Assim,
para Schultz e sua equipe no Centro de Estudos de Desenvolvimento, após longos anos
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de pesquisa, a resposta ao enigma referente aos diferentes ritmos de acumulação da
riqueza entre as diferentes nações repousaria no fator H (capital humano), responsável
por mais de 50% das diferenças entre nações e indivíduos. Por esse prisma, esperava-se
que as nações subdesenvolvidas que investissem pesadamente em capital humano
entrariam em processo de desenvolvimento tanto da sociedade como um todo como dos
próprios indivíduos. Estes, a propósito, ao investirem neles mesmos, sairiam de um
patamar inferior, ascendendo socialmente. Assim, a TCH diz respeito a uma perspectiva
de modernização em cujo horizonte se delineia o projeto desenvolvimentista do próprio
capital. Em outras palavras, desenvolver o capital humano é possibilitar o acesso à
educação para que sejam adquiridos os conhecimentos mínimos necessários para
aumentar a capacidade produtiva. Esse complexo é o lócus privilegiado para a aquisição
dos conhecimentos, das habilidades e das atitudes adequadas à produção e é ela que
pode transformar o trabalhador em capitalista, visto que o próprio Schultz teve a
oportunidade de acentuar que “[...] os trabalhadores vêm-se tornando capitalistas, no
sentido de que têm adquirido muito conhecimento e diversas habilidades que
representam valor econômico” (SCHULTZ apud FURTADO, 2003, p. 106).
Todavia, é inerente à lógica do sistema do capital a existência de uma
tendência geral à queda da taxa de lucros. Após esse período de grande crescimento,
esse sistema, conforme entende Mészáros (2006), começou a expor os sinais de
desaceleração do crescimento, evidenciado por uma exacerbada queda das taxas de
lucro, configurando um quadro de crise1 distinto das crises cíclicas que, ao longo da
história do capital, marcaram os anos de prosperidades e de debilidades na sua lógica de
reprodução. De acordo com o mesmo autor, essa crise, de natureza estrutural, inédita na
história do capital, de feição rastejante e global, intensificou a barbárie humana. Como
as taxas de lucros estavam decrescentes, fez com que o sistema reorganizasse um
processo de reestruturação apoiado em um aparato ideológico e político de
sustentabilidade da própria lógica, envolvendo, dentre outros fatores, amplas políticas
de quebra de monopólios e privatização de empresas estatais; cortes nas despesas
públicas, essencialmente, nos serviços sociais de saúde e de educação; consolidação do
neoliberalismo como ideário político-ideológico de manutenção do capital nos países
periféricos.
Nesse contexto, o capital, no esforço de recomposição de suas taxas de lucro,
confere à produção um caráter crescentemente destrutivo, fundado, por excelência, na
ampliação da taxa de exploração da força de trabalho. Ainda mais, essa crise não se
caracteriza somente pela destruição e/ou precarização da força de trabalho em sua
totalidade, mas também pelo esgotamento dos recursos naturais, que vêm dando sinais
de extenuação jamais vistos, como demonstra a degradação de vastas áreas do planeta,
colocando sob risco, a própria existência humana. Os rebatimentos da crise mundial
alcançam todas as dimensões da existência humana, acirrando os comportamentos e
impedindo, ainda com maior força, que as pessoas tomem consciência das raízes mais
profundas dessa problemática. Considerando que os problemas humanos agudizam-se
exponencialmente nos tempos hodiernos, a crise estrutural do capital joga a humanidade
às margens de sua própria destruição.
Com efeito, como aponta Mészáros (2006), no processo de subordinação do
trabalho ao capital no contexto da crise estrutural, o complexo industrial-militar atua
como agente onipotente e efetivo no deslocamento das contradições internas do capital,
destruindo as forças produtivas e exercendo decisivo controle, direta e indiretamente,
sobre a classe trabalhadora.
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Não restando, como aponta o mesmo autor, qualquer possibilidade de amenizar
a barbárie social, sob o império do capital, resta ao sistema criar renovadas estratégias
para equilibrar os efeitos desastrosos proporcionados por sua crise econômica com
reflexos nos demais setores da sociedade, mascarando a realidade da luta de classes e,
ao mesmo tempo, buscando manipular as consciências dos trabalhadores de modo que
esteja garantida a reprodução da sociabilidade burguesa. Nesse processo, na própria
crise econômica, são adotadas medidas para contribuir com a lógica da reprodução do
capital.
Dentre essas medidas, elegeu-se o complexo da educação como a viga mestra
de sustentação do sistema vigente, uma vez que, por sua própria natureza, esta consegue
fornecer os conhecimentos instrumentais necessários ao processo de produção de
mercadorias, promovendo, ao mesmo tempo, o envolvimento manipulatório das
consciências. Dito de outro modo, em vista da presente crise, o capital exige uma nova
redefinição do papel da educação como a atividade humana, por excelência, capaz de
resolver todos os problemas da humanidade agudizados a partir das três últimas
décadas: redução da pobreza, desenvolvimento econômico, viabilização da chamada
ecossustentabilidade e efetivação da paz no mundo.
Na década de 1990, acentua-se o processo de mercantilização da educação para
o atendimento das reais necessidades do mercado. Para tanto, reformas educacionais
ocorreram no Brasil nesse período, conforme sabemos, para atrelar escancaradamente a
educação à lógica do capital. Referidas reformas foram resultado da influência dos
organismos internacionais, sobretudo o Banco Mundial, representantes por excelência
do capital, sobre a educação nos países periféricos, conforme dissemos anteriormente.
Em outras palavras, a função social da educação é posta pelos organismos
internacionais, representantes cabais do sistema do capital, como a panacéia para a
resolução das mazelas sociais provenientes do capitalismo, camuflando, sob a “varinha
mágica da globalização” (MÉSZÁROS, 2000), as procedências e os desdobramentos da
crise estrutural do sistema.
Nesse sentido, o trabalhador deve ser formado de acordo com as necessidades
do capital em crise. Para promover as esperadas mudanças no mundo, o produtor da
riqueza deve receber uma formação propícia que o torne tanto capital humano como
capital social, formando-se para a “escravidão moderna” (TONET, 2007), possuindo
“qualidades” que o tornem apto e adaptado à execução de tarefas no mercado de
trabalho. Destarte, o trabalhador deve ser flexível, empreendedor, empregável, líder,
capaz de tomar decisões, dentre tantas outras habilidades a serem desenvolvidas para
lutar pelas parcas vagas no mercado de trabalho e para se manter em uma delas. Desse
modo, a manipulação ideológica é utilizada veementemente para a continuidade do
sistema vigente, para que o capital incuta nos indivíduos a falsa noção de que existiriam
alternativas para a resolução dos problemas humanos por dentro do próprio capitalismo,
certificando a igualdade de oportunidades para todos diante das severas condições do
mercado.
Conforme afirmamos, o capital, sob a crise inédita em sua história, elaborou
um aparato ideológico de cooptação das subjetividades, cujos desdobramentos são
avassaladores sobre a humanidade e o seu devir-histórico. Faz parte desse aparato o
rejuvenescimento da chamada Teoria do Capital Humano (TCH). Como a educação, no
seio da lógica do capital, configura-se como um fator de produção que amplia o
conceito de capital e supera as diferenças entre capitalista e trabalhador, a TCH
rejuvenescida é fundamental no processo de (de)formação dos indivíduos. Na verdade,
essa teoria ganhou força nas duas últimas décadas do século passado, assumindo nova
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configuração com novos conceitos e novas categorias que mascaram ainda mais o
antagonismo de classes.
Conforme se vê, o rejuvenescimento da Teoria do Capital Humano não alterou
seu significado ao longo de sua curta história que revalorizou, no contexto de crise do
capital, o papel econômico da educação, enfatizando, por essa via, a importância
produtiva dos conhecimentos de ordem instrumental e ajustados ao mundo do mercado.
Vale assinalar que a Teoria do Capital Humano foi rejuvenescida em plena ascensão do
modelo neoliberal, representando a responsabilização de cada indivíduo pelo
desenvolvimento não somente econômico, mas também social e individual.
Mendes Segundo (2005) reafirma que a educação, no contexto histórico em
que o neoliberalismo se consolida, resgata a Teoria do Capital Humano (TCH). Destaca
a autora que, nesse contexto, houve uma redefinição do aparelho estatal e uma
consequente descentralização da gestão da educação pública (municipalização) em que
o Estado passou a propiciar uma qualificação de mão de obra para atender ao mercado
por meio da educação básica. Nesses termos, o Estado assumiu a garantia de uma escola
pública de qualidade (visando à formação dos trabalhadores que funcionavam como o
“capital humano” para abastecer o mercado de trabalho), mas restrita à educação básica.
Esse investimento, como já foi lembrado, visava provocar o crescimento econômico e a
melhoria da vida das pessoas, visto que ela é posta como a base de acesso às atividades
produtivas.
Como o capital está sempre revolucionando seu processo de produção e
reprodução, dentro desse contexto, os discursos que o legitimam ganham,
sistematicamente, novos contornos que empobrecem mais ainda as mentes dos
indivíduos. Assim, a denominação capital humano não mais responde, sozinha, neste
século XXI, às novas exigências postas pelo capital para a formação dos indivíduos de
acordo com as necessidades da produção de mercadorias.
Nesse sentido, a formação do capital humano ganha contornos para além da
alegada condição de fator de desenvolvimento econômico. Agora, os indivíduos devem
ser tanto capital humano, quanto capital social.
O termo capital social representa a hipermistificação do real na sociedade
hodierna no que tange à formação dos indivíduos, pois passa a delinear uma retórica em
nome da solidariedade internacional, da paz, da preocupação com a comunidade e com
a sustentabilidade, representando a miríade de supostas novas relações sociais. Para
garantir a coesão social entre os grupos, faz referência a valores como confiança e
reciprocidade, indicando a cooperação mútua como mecanismo primordial para a
resolução de problemas e conflitos.
Sob esse prisma, o capital social traz como preocupação basilar a harmonia
entre os povos, somando-se, desse modo, à TCH, que restringia sua preocupação ao
crescimento econômico tanto nacional como individual. Todavia, o capital social está
em seu nascedouro enquanto paradigma, não oferecendo, até os dias de hoje, uma
definição clara e precisa (PIRES, 2005). De todo modo, diz respeito a um conceito que
busca, supostamente, aliviar a pobreza e melhorar a qualidade de vida através da
chamada construção comunitária. Assim, destaca como objetivo fazer com que os
indivíduos
[…] superen los sentimientos de dependencia y ganen confianza en sí
mismos. El punto de partida es la creación de un sentido de
comunidad entre los vecinos, que desarrollan confianza mutua
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trabajando juntos en proyectos que hacen uso de los activos
individuales y colectivos del mismo barrio. El nuevo capital humano
y social se convierte en una base para mejoras futuras (DIAZ, 2007,
p. 1 – negritos nossos).
Nesse sentido, como podemos apreender, a educação é o locus privilegiado
para a formação do capital social, embora tal conceito não se relacione apenas a essa
atividade humana. De fato, é a educação quem assume o papel de propagação do ideário
dominante, pois, de acordo com as palavras desse mesmo ideário, ela “agrega” um
número maior de “atores sociais”.
Conforme o entendimento do Banco Mundial,
Las escuelas son más efectivas cuando los padres y los ciudadanos
locales se involucran en sus actividades. Los maestros están más
comprometidos, los estudiantes alcanzan mejores resultados en los
exámenes y se usan mejor las instalaciones de las escuelas en aquellas
comunidades en las cuales los padres y ciudadanos se interesan en el
bienestar educativo de los niños (BANCO MUNDIAL apud PIRES,
2005, p. 89).
Como se pode perceber, a passagem acima é um convite ao voluntariado para
somar esforços visando à solução de problemas que vão além dos muros da escola.
Dessa forma, é evidente, então, que o termo capital social mistifica a realidade atual, na
qual a barbárie humana e a crescente destruição global do planeta são cada vez mais
evidentes. Assim, este “se convierte en un activo para encarar iniciativas aún más
importantes en el futuro”, “con amplia participación de los vecinos, que juegan el rol
central en el planeamiento […] la implementación del capital social de los pobres”
(DIAZ, 2007, p. 12). Além disso,
Si el análisis del capital social considera las dimensiones que
emergen de la interacción de una diversidad tensionada por
relaciones de poder que juegan a favor o en contra de la afirmación
identitaria de los sujetos, los beneficios de un capital social
“saludable” para los pobres se traducen en lazos sociales donde no se
excluyen sus “diferencias”, por el contrario, se buscan los medios
más adecuados para su expresión y diálogo con otras identidades
(idem, ibidem, p. 13 – aspas do autor).
De acordo com Motta (2009), a inserção de novas bases ideológicas para
legitimar a implementação das políticas neoliberais amplia a função da educação e da
escola. A autora registra, por essa via, que
Em meados da década de 1990, os intelectuais orgânicos do capital
chegaram à conclusão de que não basta “educar para o desemprego”,
isto é, não basta atribuir à escola a função de atender as demandas do
capital, qualificando e modernizando as forças produtivas para
aumentar a capacidade competitiva; não basta atribuir à escola a
função de atender a demanda do trabalhador de inserção no mercado
de trabalho – é preciso “educar para sobreviver”; é necessário atribuir
outras funções à escola. E opera-se uma outra etapa de
“rejuvenescimento” da “teoria do capital humano” introduzindo
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elementos da “teoria do capital social” de Robert Putnam. (MOTTA,
2009, p. 555 – aspas da autora).
É importante assinalar que as teorias do capital humano e do capital social são
valorizadas no contexto da propalada economia do conhecimento, em que é apregoada a
tese de que vivemos numa sociedade para além do trabalho. Nessa sociedade, o
conhecimento é posto como o fator de produção e, sob esse axioma, o trabalhador
intelectual converte-se no legítimo produtor da riqueza. Em sua crítica à tese que
propala a vigência da sociedade do conhecimento, Lessa advoga que, ideologicamente,
busca-se legitimar a falsa concepção de que “[...] não é mais o capital que explora o
trabalho abstrato pela extração da mais-valia, mas sim o capital social que se reproduz
pelo trabalho imaterial” (2005, p. 34 – grifos nossos).
Na direção contrária à de Lessa, Drucker, teórico da Administração que faz a
defesa da economia baseada no conhecimento, afirma que, nessa sociedade, a
aprendizagem é “vitalícia” (1993, p. 156 – aspas do autor). Assim sendo, a escola
cumpre papel importante de formação para toda a vida. Por isso, o autor assinalou as
especificações da escola para atender às necessidades do que ele chamou “sociedade
pós-capitalista”:
A escola de que necessitamos deve prover uma educação universal de
ordem superior – muito além do que “educação” significa hoje. Ela
precisa imbuir os estudantes de todos os níveis e todas as idades de
motivação para aprender e da disciplina do aprendizado permanente.
Ela tem que ser um sistema aberto, acessível tanto a pessoas altamente
educadas como a pessoas que, por qualquer razão, não tiveram acesso
a uma educação avançada anteriormente. Ela precisa comunicar
conhecimento como substância e também como processo [...].
Finalmente, o ensino não pode ser monopólio das escolas. Na
sociedade pós-capitalista, a educação precisa permear toda a
sociedade. As organizações empregadoras de todos os tipos –
empresas, agências governamentais, instituições sem fins lucrativos –
também precisam se transformar em instituições de aprendizado e de
ensino. As escolas devem, cada vez mais, trabalhar em parceria com
os empregadores e suas organizações. (1993, p. 154 – aspas do autor).
No que se refere aos conhecimentos que devem ser aprendidos na escola, Drucker
postula:
[...] a educação universal apresenta tremendos desafios. Os conceitos
tradicionais de educação não são mais suficientes. Ler, escrever e
aritmética continuarão a ser necessários como hoje, mas a educação
precisará ir muito mais além desses itens básicos. Ela irá exigir
familiaridade com números e cálculos; uma compreensão básica de
ciência e da dinâmica da tecnologia; conhecimento de línguas
estrangeiras. Também será necessário aprender a ser eficaz como
membro de uma organização, como empregado. A educação universal
significa um compromisso claro com a prioridade do ensino escolar.
Ela requer que a escola – especialmente aquela das crianças –
subordine tudo o mais à aquisição de aptidões básicas. A menos que a
escola comunique com sucesso essas aptidões, ela fracassará em sua
obrigação crucial: dar aos iniciantes autoconfiança e competência e
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capacitá-los para que, em futuro próximo, possam ter êxito na
sociedade pós-capitalista, a sociedade do conhecimento (1993, p.
155).
Compreendemos que aquilo que o autor chama de conhecimento universal é,
na verdade, o básico, sendo este o nível de ensino que deve ser alcançado pelos
indivíduos, principalmente em se tratando dos países periféricos – conforme defendem
os fóruns e conferências mundiais de Educação Para Todos, a começar por Jomtien, em
1990. A tese do referido autor não anuncia qualquer novidade, a mesma está
recorrentemente posta nos documentos do Banco Mundial voltados à educação. Ao
afirmar que, na dita sociedade do conhecimento, é necessário que as pessoas aprendam
a aprender e demonstrem a devida motivação para fazê-lo, Drucker endossa os termos
inscritos nesses documentos, principalmente no Relatório Delors, de 19932.
Sob a lógica do capital, é negado à classe trabalhadora o conhecimento
acumulado. Em seu lugar, são valorizados conhecimentos superficiais, pragmáticos,
instrumentais, voltados à lógica do mercado, submetidos às necessidades imediatistas da
proclamada economia do conhecimento, base da sociedade do conhecimento. Referida
tese é apregoada, como dissemos, num contexto histórico de negação do trabalho como
a categoria central do mundo dos homens e tal negação rebate-se na anulação da pedra
de toque da teoria marxiana: o trabalho como protoforma originária do ser social.
Considerando que o desenvolvimento do indivíduo pressupõe a condição
ineliminável de apropriação do patrimônio material e também espiritual para que se
construa como membro do gênero humano, sob a lógica da exploração do homem pelo
homem esse desenvolvimento não tem a menor possibilidade de existir para a totalidade
da humanidade, visto que grande parte dela está “[...] confinada a um nível muito
próximo da animalidade” (TONET, 2007, p. 76). De acordo com a ontologia marxiana,
é importante assinalar que é a apropriação do conhecimento, cientificamente
sistematizado, que possibilita a cada indivíduo vir a ser partícipe do gênero humano,
visto que tudo no mundo dos homens é produto histórico dos próprios homens,
inclusive eles mesmos.
Na contraposição à lógica do capital, a educação é uma mediação importante
na luta pela emancipação humana, visto que há em seu interior uma contradição que
permite a utilização de seu espaço para o direcionamento da atividade educativa tendo
em vista o horizonte da superação desse sistema. Segundo Tonet (2005, p. 242-243),
existe a possibilidade de realização de atividades emancipadoras. Afirma o autor que
essas atividades emancipadoras constituem-se no que é possível fazer diante da enorme
tarefa posta pelos homens, que é a construção de um patamar superior de sociabilidade.
Para tanto, o autor afirma que “[...] uma atividade educativa emancipadora hoje
implicaria alguns requisitos” básicos. Esses requisitos seriam: [1] o conhecimento
amplo e aprofundado do objetivo último da educação, que é transmitir os
conhecimentos e habilidades produzidos historicamente pela humanidade nos campos
mais variados da atividade humana – visto que é essa a natureza e a função social da
atividade educativa; [2] o conhecimento, também o mais amplo possível, a respeito do
processo social em curso, ou seja, da natureza da sociedade capitalista, cuja lógica
preside na exploração dos homens pelos próprios homens; [3] o conhecimento acerca da
natureza da crise estrutural do capital, que intensifica as dores da humanidade; [4] a
clareza em relação à necessidade de domínio das disciplinas lecionadas pelos
educadores, não bastando um conhecimento superficial acerca delas; por fim, [5] a
articulação da atividade específica da educação com as lutas sociais mais abrangentes.
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O autor acrescenta que
[...] entendemos que tudo isso possibilitará conferir à atividade
educativa, ainda que em formas extremamente limitadas, dada à
natureza e à adversidade do momento presente, um caráter
revolucionário, ou, em outras palavras, colocá-las como uma
mediação para a construção de uma ordem social qualitativamente
superior a esta em que vivemos.
Reiteramos a clássica formulação de Saviani (2003) quanto à função e à
especificidade da educação, à qual caberia “transmitir a cada indivíduo singular a
humanidade que foi produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens”, ou,
em outras palavras, produzir a “humanidade no homem” (2003, p. 13). Uma prática
educativa revolucionária não pode prescindir dessa tarefa, pois o conhecimento cumpre
uma função primordial no processo de enriquecimento dos indivíduos e da própria
sociedade: a articulação entre generidade e individualidade humanas. Portanto, uma
educação efetivamente comprometida com a formação plena dos indivíduos deve
valorizar o conhecimento historicamente acumulado pela humanidade ao longo dos
tempos.
Para finalizar, podemos afirmar, com base na ontologia marxiano-lukacsiana,
que a educação pautada por um referencial revolucionário deve assumir uma postura
crítica de denunciar a sociabilidade burguesa movida pela lógica da reprodução do
capital por meio da exploração do homem pelo homem, que vem se intensificando de
maneira brutal com o processo de crise estrutural do capitalismo. Em outras palavras,
somente uma educação comprometida com a classe trabalhadora e, por conseguinte,
com a própria humanidade, é capaz de se contrapor à lógica perversa do sistema do
capital, visto que tal práxis educativa emancipadora aponta para a superação desse
sistema. A função social da educação é a reprodução social através da mediação das
consciências dos indivíduos. A consciência, de acordo com a ontologia marxianolukacsiana, não tem primazia sobre a prática, mas é de fundamental importância,
possuindo o mesmo estatuto ontológico. Lembremos aqui uma passagem muito
conhecida dos Manuscritos Econômico-Filosóficos, nos quais Marx afirma que a teoria
não tem força material, mas esta se apresenta quando a coletividade dela se apodera.
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É importante destacar que, conforme Marx (2004), as crises são sempre crises de
superprodução, caracterizadas pelo aumento da produtividade do trabalho, uma vez que a
tendência geral da queda da taxa de lucro é inerente à lógica do capital.
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A Conferência Mundial de Educação Para Todos, ocorrida em Jomtien, na Tailândia, em
1990, instituiu a Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, onde o diretorgeral Frederico Mayor convidou Jacques Delors para presidir essa Comissão, a qual reuniu
quatorze personalidades de todas as regiões do mundo, vindas de horizontes culturais e
profissionais diversos. O texto Educação: um tesouro a descobrir é o resultado do trabalho dessa
Comissão indicada pela Unesco com o objetivo de refletir sobre educar e aprender para o século
XXI.
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