UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GRAMÁTICA E USO DISCIPLINA: REGÊNCIA VERBAL, REGÊNCIA NOMINAL, CRASE E ACENTUAÇÃO. DOCENTE: PROFESSORA MS. MARCILENE R. PEREIRA BUENO 1. PROGRAMA 1. Dia 14/03: a) Apresentação do Curso – motivações e intenções; b) O Fenômeno da Regência: reflexões sobre norma e uso c) Regência Verbal, Regência Nominal: ideias iniciais. 2. Dia 21/03: a) Estudo das preposições. b) Regência Verbal: estudos gramaticais e didáticos. Análise de textos e exercícios. c) Regência Nominal: estudos gramaticais e didáticos. Análise de textos e exercícios 3. Dia 28/03: a) O Fenômeno da Crase: reflexões sobre norma e uso. b) Crase: estudos gramaticais e didáticos. Análise de textos e exercícios. 4. Dia 11/04: a) O fenômeno da acentuação: histórico, normas e mudanças. b) Acento fonético, acento gráfico. c) Acentuação e reformas ortográficas. 2. AVALIAÇÃO Análises de textos jornalísticos, didáticos e científicos sobre os fenômenos da regência verbal, regência nominal, crase e acentuação na Língua Portuguesa. 3. BIBLIOGRAFIA BÁSICA ALMEIDA, Napoleão Mendes (1999): Gramática Metódica da Língua Portuguesa. 44ª ed., São Paulo, Saraiva, BAGNO, Marcos (2000): Dramática da Língua Portuguesa. São Paulo, Loyola. BARBADINHO NETO, Raimundo (1977). Sobre a norma literária do modernismo. Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico. BECHARA, Evanildo (2001): Moderna Gramática Portuguesa. 37ª ed., Rio de Janeiro, Lucerna. BEZERRA, Antonio Ponciano (1984): Norma e Linguagem. Um estudo sobre a representação da norma em Gramáticas de Língua Portuguesa. Tese de Doutorado, Área de Filologia e Língua Portuguesa do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas, Universidade Estadual de São Paulo. CUNHA, Celso & CINTRA, Lindley (1985): Nova Gramática do Português Contemporâneo. Rio de Janeiro, Nova Fronteira. CIPRO NETO, Pasquale & INFANTE, Ulisses (1998): Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo, Scipione. GONÇALVES, Liney de Mello (2001): Tradição e Mudança na Regência Verbal do Português Contemporâneo. In Revista de Letras, PUC Campinas, 20(1/2), 61-80, dezembro de 2001. LESSA, Luiz Carlos (1976). O modernismo brasileiro e a língua portuguesa. Rio de Janeiro, Grifo. LUFT, Celso Pedro(2001). Dicionário Prático de Regência Verbal. São Paulo, Editora Ática. _______________ (2002) Dicionário Prático de Regência Nominal. São Paulo, Editora Ática. MARTINS, Eduardo (1998): Manual de redação e estilo. 3ª ed., São Paulo, Moderna. SACCONI, Luiz Antonio (1998): Não erre mais! 23ª ed., São Paulo, Atual. Bibliografia ______________________________ PARTE I – DISCUSSÕES SOBRE O FENÔMENO DA REGÊNCIA 1. Introdução Em nossa opinião, assim como na de muitos outros professores de Língua Portuguesa, a sintaxe da regência é um dos grandes problemas dos usuários da língua. É grande a dificuldade para saber se os verbos que são utilizados nos textos orais ou escritos pedem ou não complemento. E mais: quando há complemento, serão ou não introduzidos por preposição? Podemos dizer que, de modo geral, no momento da comunicação, os usuários utilizam os modelos, julgados confiáveis, realizados por pessoas que ocupam posições sociais, econômicas e culturais ascendentes. Tais modelos de regência são adquiridos por meio da observação da língua oral. Raros são os usuários que consultam gramáticas ou dicionários antes do uso da regência. Assim também, pesquisas indicam que a língua escrita não costuma ser modelo para o usuário comum: seu universo de observação e imitação restringe-se ao cenário da língua oral. Tais situações apontam para a necessidade de conscientizar o usuário da língua a respeito das diferenças existentes entre língua oral e língua escrita, especialmente, em relação às regras da sintaxe de regência. Isto é, é preciso analisar as situações, o contexto e escolher o uso. Mas, para que exista a escolha, é preciso existir o conhecimento. Segundo Gonçalves (2001) o usuário da língua precisa ser advertido – ou por que não dizer ensinado – a respeito de “em que contextos se podem e em quais não se podem aceitar algumas formas, por que e quais as consequências comunicativas do emprego de cada uma delas.” Assim, fica claro – mesmo num primeiro olhar – o “problema” que temos diante de nós, professores e pesquisadores de Língua Portuguesa: a tensão entre a norma e o uso na sintaxe da regência. Além disso, as mudanças ocorridas mesmo no uso. Enfim, estamos diante de um “interessantíssimo” assunto, tanto na perspectiva da pesquisa quanto na perspectiva do ensino-aprendizagem. Portanto, numa tentativa de elucidar alguns dos fatos que compõem o tema Regência, Regência Verbal e Regência Nominal, apresentamos um roteiro de estudos: - A noção gramatical de regência em Napoleão Mendes de Almeida, Evanildo Bechara, Celso Cunha e Lindley Cintra e Celso Pedro Luft. - A Regência Verbal; - Um Estudo Complementar: as preposições e seus significados. 2. A noção gramatical de regência em Napoleão Mendes de Almeida, Evanildo Bechara, Celso Cunha e Lindley Cintra e Celso Pedro Luft. 2.1 - Napoleão Mendes de Almeida O gramático Napoleão Mendes de Almeida trata a Regência como um fenômeno amplo e restrito. Por isso, em sua obra podemos encontrar títulos como: - Regência; - Regência Verbal; - Regência Irregular. De modo amplo, a regência é por ele tratada como relação de subordinação, ou seja, de dependência entre dois termos. É por isso que as relações de regência podem ser na frase indicadas pela posição, pela preposição ou pela conjunção subordinativa. Uma das observações que faz é sobre o sentido amplo de regência, e a função sintática de certos termos da oração, só revelada pela posição em que esses termos se encontram na frase: Exemplos: 1. O soldado feriu o ladrão. 2. O ladrão feriu o soldado. Também o advérbio em muitos casos se manifesta pela posição, ou seja, conforme o lugar em que vem na frase, sabe-se qual o termo por ele modificado. Exemplos: 1. Minha residência aqui é conhecida. 2. Minha residência é conhecida aqui. 3. Relatou, ainda, que não encontrou o filho. 4. Relatou que não encontrou o filho ainda. Napoleão Mendes de Almeida conclui suas explanações sobre o sentido amplo de Regência afirmando que, em geral, os complementos na frase revelam a sua regência pela posição junto aos termos completados ou regentes. A colocação de termos foi um dos recursos neolatinos para suprir a perda dos casos latinos. Para substituir os casos, as línguas neolatinas usam as preposições e o artigo. Por essa razão se diz que o latim é língua sintética, e as neolatinas, analíticas. Nota: Havia no latim mais um tipo de flexão, a flexão causal. De acordo com a função sintática (sujeito, objeto direto, objeto indireto etc.) que a palavra exercia na oração, tinha ela uma terminação, uma desinência, um caso especial; assim, se Pedro era o sujeito de uma oração, este nome terminava em us – caso nominativo: Petrus est bônus (Pedro é bom); se era adjunto adnominal restritivo, terminava em i – caso genitivo: líber Petri (livro de Pedro); se objeto indireto, em o – caso dativo: Librum dedi Petro ( Dei o livro a Pedro); se objeto direto , em um – caso acusativo: Vidi Petrum ( Vi Pedro) ; se empregado em orações imperativas, exclamativas ou de apelo, em e – caso vocativo: Hoc vide, Petre. (Veja isto, Pedro); se adjunto adverbial, também em o – caso ablativo: Cum Petro ambulavimus. (Passeamos com Pedro). Parágrafo 180 2.2 - Evanildo Bechara O gramático Evanildo Bechara localiza e define o assunto regência em decorrência de seus estudos sobre Complemento Verbal, Complemento Nominal e Emprego da Preposição. 2.3 - Celso Cunha e Lindley Cintra Na obra Nova Gramática do Português Contemporâneo, os autores tratam o assunto regência dentro dos estudos do verbo, adotando o critério sintático para explicar o fenômeno. Definem a regência como uma exigência entre os termos que estabelecem relação de dependência. Assim, a regência pode ser indicada pela ordem em que aparecem os termos na oração, pelo nexo de dependência estabelecido por algumas preposições e também conjunções subordinativas no período composto. 2.4 - Celso Pedro Luft Segundo Luft (2002), a palavra regência deriva de reger que, por sua vez, significa governar, comandar, dirigir. Assim, é natural que regência signifique também governo, comando, direção. Para este autor, nos estudos gramaticais, o termo regência é empregado tanto em sentido amplo quanto restrito. Em sentido amplo, regência equivale a subordinação em geral; por exemplo, na expressão trabalha muito, o verbo trabalha subordina o advérbio muito. Em sentido restrito, regência é a subordinação especial de complementos às palavras que os prevêem na sua significação. Em outras palavras, para Celso Pedro Luft ( ), a regência - em sentido restrito – implica na necessidade ou não de complementação implicada pela significação de nomes (substantivos, adjetivos, advérbios) e verbos. Assim, “o termo regência serve para designar a subordinação peculiar de certas estruturas a palavras que as requerem ou prevêem na sua significação ou em seus traços semânticos. Essas estruturas compõem, com as palavras que as requerem (i.e., ‘regem’), um complexo significativo – estruturas regidas ‘completam’ com os núcleos regentes um todo semântico, motivo por que se denominam ‘complementos’.” Ao pensarmos no sentido restrito de regência, portanto, concluímos que a mesma é uma exigência ou previsão de complementação para palavras que não são semanticamente auto-suficientes. Exemplos: (1) - O rapaz coloca. - O rapaz colocou os livros na estante Verbo colocar rege dois complementos obrigatórios porque pressupões na sua significação, além do agente, objeto(s) a movimentar e um lugar-meta. (2) - Foi provado o conluio. - Foi provado o conluio do diretor com funcionários nos desfalques do banco. A palavra conluio, na sua significação ou em seus traços semânticos, implica ‘combinação ou companhia’ e ‘ato negativo’. Para concluir, quando o verbo necessitar de elementos nominais para completar uma estrutura significativa é o que se chama “regência verbal” e outros casos de palavras que regem complementos constituem o que se denomina “regência nominal.” EM RESUMO: Regência, de modo geral, significa a interdependência entre palavras para formar um todo significativo. A necessária relação de complementação entre algumas palavras produz uma palavra dependente, chamada de regida, e uma palavra que subordina, ou seja, a regente. Para Gonçalves (2001) “Regência é, portanto, o mecanismo que regula as ligações entre o verbo ou o nome e os seus complementos e/ou adjuntos.” Além disso, é preciso salientar que tal ligação entre as palavras pode se manifestar de modo direto ou indireto: a) Direto: quando a relação de dependência é imediata. Exemplos: a menina bonita; Maria ama Pedro. b) Indireto: quando a relação de dependência é intermediada por outros elementos da língua, como as preposições. Exemplos: A filha de Maria; Maria gosta de Pedro. VISUALIZAÇÃO o predicado é subordinado em relação ao sujeito, que é subordinante: os complementos verbais são subordinados ao verbo, que é subordinante: os complementos nominais são subordinados em relação ao nome, que é subordinante: os adjuntos são subordinados ao nome ou ao verbo: Regência, em sentido amplo, é sinônimo de subordinação. PARTE II – REGÊNCIA VERBAL 1. Napoleão Mendes de Almeida O gramático Napoleão Mendes de Almeida dedica uma parte de sua obra para o título Regência Verbal, ou seja, está considerando o sentido restrito de regência. Assim, para ele, quando indagamos se tal verbo exige objeto direto ou indireto, ou quando, exigindo objeto indireto, procuramos saber se a preposição que o liga ao objeto deve ser de ou por ou com ou a ou para ou em etc., estamos procurando saber a regência do verbo. Disso ele conclui que a regência verbal só diz respeito a verbos de predicação incompleta, pois os intransitivos, sendo completos, não regem palavra alguma. Percebemos aí um aceno em relação a conceitos semânticos que serão, posteriormente, retomados em Celso Pedro Luft e seu “Dicionário Prático de Regência Verbal”. Para a consulta das específicas regências de cada verbo, Napoleão Mendes de Almeida aconselha que sejam pesquisados bons dicionários, pois eles mostram, com exemplos, a verdadeira regência de um verbo. Os verbos de dupla regência são por ele tratados em dois momentos de sua obra. Num primeiro momento (parágrafo 305) o gramático afirma que muitos verbos possuem duas ou mais regências e devem conservar, em qualquer delas, o mesmo sentido e correção. Exemplos: - Puxar a espada. - Puxar da espada. - Puxar pela espada. Também há os verbos que possuem, conforme a regência, significado especial. Exemplos: Assistir – OD – prestar socorro, cuidar, tratar. “O médico assiste o enfermo.” Assistir – OI – estar presente. “Assisti ao desfecho da questão.” Já no parágrafo 684 de sua gramática, Napoleão Mendes de Almeida, explana sobre o desejo de muitos autores de que os verbos de dupla regência que podem, indiferentemente, vir com objeto direto ou indireto, sejam sempre transitivos diretos e o objeto sempre direto. Segundo esta opinião, tanto é objeto direto “puxar a espada”, como “puxar da espada”. No entanto, outros autores, segundo o gramático, querem que a desigualdade de regência só passe a existir quando trouxer desigualdade de sentido. Para estes, o verbo esperar, na frase “esperar alguém” é transitivo direto, passando a ser transitivo indireto na frase “esperar em alguém”, visto haver diversidade de sentido. Mendes de Almeida discorda dos dois grupos de autores citados. Para ele o verbo, quer conserve ou não o mesmo sentido, deixará de ser transitivo direto para ser transitivo indireto. Finalmente, em uma outra nota, a terceira do parágrafo 776, o gramático aborda o caso de que duas ou mais palavras podem ter um mesmo complemento, caso tenham essas palavras a mesma regência. Exemplos: 1. A obediência e o amor à pátria. (Correto, pois obediência e amor têm a mesma regência). 2. O conhecimento é o amor à pátria. (Incorreto, pois conhecimento e amor exigem preposições diferentes – o conhecimento de alguma coisa e o amor à alguma coisa. O correto seria: O conhecimento da pátria e o amor a ela. 3. Conheço este livro e gosto dele (Correto; e não “Conheço e gosto deste livro”) Também sobre este fenômeno faz o autor uma observação interessante. O aluno não deve dizer “Conheço este livro e gosto do mesmo.” (parágrafo 342, nota 4) Tal uso é considerado condenável e acontece em virtude de terem criado, a custa de ensinamentos de origem duvidosa, incompreensível aversão às formas a ela, dela , para ela etc. Daí é que freqüentemente vemos passagens como estas: “Vou à casa de minha mãe; falarei com a mesma sobre o assunto.” “Realizou-se ontem a esperada festa; à mesma compareceram...” Para o gramático, é o caso de perguntar se o interlocutor tem outra mãe ou se o cronista compareceu a outra festa. O correto, então, seria: “Vou à casa de minha mãe, com quem falarei sobre o assunto” ou “Vou à casa de minha mãe e com ela falarei sobre o assunto.” Imagine-se Camões a escrever: “Mas não servia ao pai, servia à mesma Que à mesma só por prêmio pretendia.” Há também o que Napoleão Mendes de Almeida nomeia como Regência Irregular. Para ele existem quatro espécies de figuras ou de casos irregulares de regência dos termos denominadas: elipse, pleonasmo, anacoluto, idiotismo. a) Elipse: Assim se denomina o caso em que um dos temos da frase não vem expresso, sendo, ao mesmo tempo, facilmente subentendido Exemplos: - Não posso sair (Eu não posso sair). Casa de ferreiro, espeto de pau (Em casa ou Na casa de ferreiro, o espeto é de pau). b) Pleonasmo: A palavra pleonasmo indica a figura de regência que consiste na redundância de expressão, ou seja, na repetição de uma mesma idéia, mediante palavras diferentes: Exemplo: - Vi com meus próprios olhos. c) Anacoluto: Especifica a figura de regência em que um termo da oração vem solto, sozinho, sem nenhuma relação sintática com os outros termos. Exemplos: - Os três reis orientais, que vieram adorar o Filho de Deus recém-nascido em Belém, é tradição da Igreja que um era preto. Eu me parece que... d) Idiotismo: É o termo ou dicção existente em uma língua, em correspondente em outros idiomas. São frases ou modismos que se afastam dos princípios gerais de sintaxe. Exemplos: - Eu é que fiz isso. Nós é que quisemos assim. Pobre do homem. Coitado do velhinho. O meu livro, os teus caprichos, as nossas relações. 2. Evanildo Bechara Em seu capítulo sobre regência dedica-se ao estudo de alguns casos que merecem destaque, como: Isto é para eu fazer. Para o gramático, se a preposição seguida de pronome não serve de introduzir este pronome (que funciona como sujeito), mas um infinitivo, usam-se as formas retas eu e tu, e não mim e ti. Complementos de termos de regências diferentes. Segundo Bechara, o rigor gramatical exige que não se dê complemento comum a termos de regência de natureza diferente. Assim não podemos dizer: Entrei e saí de casa – mas – Entrei em casa e dela saí, porque entrar pede a preposição em e sair a preposição de. Porém o gramático observa que, nossa língua não recusa tais fórmulas abreviadas de dizer, principalmente, quando vêm dar à expressão uma agradável concisão. Exemplos: Tenho-o visto entrar e sair do Colégio de São Paulo. O autor ainda revela que, certos autores postulam a proibição aos dizeres em que duas ou mais preposições de sentido diferente, e até contrário, se referem a um só termo: “Com ou sem vantagens sairei.” “Antes e depois da luta”. Para tais autores devemos dizer: com vantagens ou em elas, antes da luta e depois dela, ou repetindo-se o substantivo com fez Machado de Assim: “Os gritos da vítima, antes da luta e durante a luta, continuavam a repercutir dentro de mim”. No entanto, Bechara conclui que a língua dá preferência às construções abreviadas que a gramática insiste em condenar, sem, contudo, obter grandes vitórias. E, neste particular, discorda da afirmação que estudamos na primeira parte destes relatos, feita por Napoleão Mendes de Almeida sobre o mesmo fenômeno. Emprego de relativos precedidos de preposição. Para Evanildo Bechara, o pronome relativo exerce função sintática na oração a que pertence e, portanto, dispensa ou exige preposição. a) b) c) d) e) f) g) Sujeito: O livro que está em cima da mesa é meu. OD: O livro que eu li encerra uma bonita história. Predicativo: Dividimos o pão como bons amigos que éramos. Complemento: O livro de que precisamos esgotou-se. OI: Este é o aluno a que dei o livro. Adj. Adv.: A casa em que moro é espaçosa. Agente da Passiva: Este é o autor por que a novela foi escrita. Relativo Universal Freqüentes vezes a linguagem coloquial e a popular despem o relativo de qualquer função sintática, tomando-o por simples elemento transpositor oracional. A função que deveria ser exercida pelo relativo vem mais adiante expressa por substantivo ou pronome. A este relativo chamamos universal. Exemplos: - O homem que eu falei com ele. (O homem com quem eu falei.) A amizade é coisa que nem sempre sabemos seu significado. (A amizade é coisa cujo significado nem sempre sabemos) Para Bechara, embora a língua padrão recomende o correto emprego dos relativos, o relativo universal se torna, no falar despreocupado, um elemento lingüístico extremamente prático. 4. Celso Pedro Luft As primeiras considerações de Luft (2001) sobre a regência verbal referem-se ao papel do verbo na concepção de regência como um fenômeno amplo – o verbo rege todos os termos da oração - e restrito – o verbo rege os complementos. Tal consideração exige um retorno à noção de padrões oracionais. Para o autor, a língua prevê padrões sintáticos segundo os quais se constrói qualquer frase. Nesses padrões há quatro posições básicas: 1.Sujeito (S) 2.Verbo (V) 3.Complementos verbais (C) ou Predicativo (Pvo) 4.Adjuntos Adverbiais (A) O motorista consertou o carro na garagem [ S V C A] A criança estava muito alegre ontem [S V Pvo A] As posições 1, 2 e 3 determinam os padrões da oração, já que os adjuntos adverbiais são facultativos. Adotando o critério da natureza verbal, pode-se relacionar dois grupos particulares de padrões: verbais e nominais, com dois subgrupos – pessoais e impessoais, pelo critério da presença ou ausência do sujeitos. Padrões Verbais Pessoais A criança dorme. [S V] A verdade tem asas. [S V OD] Os filhos obedecem ao pai. [S V OI ] O professor falou aos alunos sobre educação. [S V OI OI] João entregou os recibos ao gerente.[S V OD OI] O bedel transportou as malas da portaria para o carro [S V OD OI OI] Padrões Verbais Impessoais Chove [V] Houve problemas [V OD] Chega de improvisações [V OI] Padrões Nominais Pessoais Aquele menino é um gênio [S V Pdo] – sintagma nominal substantivo A vida é bela [S V Pdo] – sintagma nominal adjetivo A praia é longe [S V Pdo] – sintagma nominal adverbial O saco era de plástico [S V Pdo] – sintagma nominal preposicional Padrões Nominais Impessoais É primavera. [V Pdo] Está nublado [V Pdo] Foi ficando tarde [V Pdo] Foi em janeiro [V Pdo] Ressalte-se que há também estruturas mistas, com dois núcleos no predicado, um verbal e outro nominal. E, enfim, que são os padrões oracionais que levam à classificação dos verbos, tendo por dados classificatórios a relação entre as posições oracionais 1, 2 e 3: Posição 1 - ter ou não sujeito = pessoal e impessoal; Posição 2 – ser ou não de significação plena, lexical = nocional e predicativo Posição 3 – ter ou não complemento = transitivo ou intransitivo, com ou preposição. Intransitivação e transitivação Para Luft é a noção de semântica que dita a regência. São os traços semânticos dos verbos que prevêem a presença ou ausência de complementos. Assim, fica possível compreender as mudanças e variações de regência verbal. Verbos que sempre se constroem com complemento podem aparecer sem ele, e os que normalmente prescindem de complemento, às vezes passam a recebê-lo. Exemplos: 1. Alguns alunos quase não lêem. 2. O moço riu uma gargalhada cínica. Na primeira oração temos o verbo “ler”. Sua significação básica prevê objeto da ação e, opcionalmente, um destinatário: alguém lê algo (para outrem). Mas no exemplo dado, apenas a ação foi focalizada, não os destinatários. É um caso de verbo transitivo que aparece como intransitivo. Na oração 2 temos o verbo “rir”, basicamente intransitivo. Porém, para efeito expressivo, temos o fenômeno da transitivação, pois aparece um complemento do mesmo campo semântico, passando do significado de “contrair os músculos da face em reação de alegria” para o de “emitir”. É comum ocorrer a transitivação quando se dá a pronominalização de verbos intransitivos: rir-se, sorrir-se, ir-se, partir-se. Também freqüente é a intransitivação de transitivos pronominais, com a omissão do reflexivo: ajoelhar, apagar, casar, esquecer de e outros. A respeito dos verbos pronominais, o autor destaca que são assim chamados, por critério morfológico, os verbos que ocorrem acompanhados de pronome oblíquo da mesma pessoa do sujeito. Segundo a classificação tradicional, temos: 1. reflexiva simples – O caçador feriu-se – [S V OD] 2. reflexiva recíproca – Os amigos se cumprimentaram – [S V OD] 3. reflexiva dinâmica – Eu me levanto cedo – [ S V OD] 4. reflexiva enfática – O corretor se riu – [S V OD] 5. reflexiva obrigatória – Ninguém se queixou – [ S V OD] Regência de Preposições O autor insiste na questão semântica propondo que são os traços semânticos dos verbos que prevêem ou selecionam esta ou aquela preposição. Tal afirmativa nos leva a rever a tendência de considerar as preposições vazias de sentido; é certo que em alguns casos o significado das preposições não é tão claro, seja porque o campo semântico é muito abstrato, seja por esvaimento histórico. Exemplo: - Em assistir a, a preposição exprimia presença, proximidade (à porta) Porém, os casos como o citado não anulam a regra de que a preposição possui traços semânticos que se relacionam com os traços das palavras que regem. Verbos direcionais, por exemplo, traduzem movimento de partida e chegada e, portanto, selecionam as preposições, respectivamente, de e a, para ou até (a). A preposição por exprime também idéia de percurso (andar, passar, correr por diversos lugares), o que explica a diferença semântica e classificatória entre: - procurar alguém (TD) - procurar por alguém (TI) Nos verbos que possuem prefixos ocorre um interessante caso de regência preposicional: o prefixo da palavra regente volta sob forma de preposição: conviver com, derivar de, embarcar em. Regência e evolução “A regência, como tudo na língua, a pronúncia, a acentuação, a significação, etc., não é imutável. Cada época tem sua regência, de acordo com o sentimento do povo, o qual varia, conforme as condições novas da vida. Não podem seguir hoje exatamente a mesma regência que seguiam os clássicos; em muitos casos teremos mudado.” (Nascentes, 1960, p. 18) Quando trata de regência e evolução, o autor reitera seu ponto de vista: a regência verbal é um fenômeno governado pelos traços semânticos dos verbos. Se os traços são alterados, também se altera a regência. Acontece com o verbo agradar, aproximado dos sinônimos contentar, satisfazer, alegrar: agradar a alguém, agradar-lhe tornar-se agradar alguém, agradá-lo. Atingir, como o significado de alcançar ou tocar com a mão é TD: atingir algo o alguém, atingi-lo. O traço semântico chegar, aproximar-se a explica a mudança para TI: atingir a algo o a alguém. Em algo custa a alguém, custa-lhe, a regência do verbo deve-se ao traço ser difícil. Com o traço demorar ou tardar muda-se a regência: ele custou a acreditar. A regência indireta originária – assistir a algo – está ligada ao traço ‘estar presente, junto’. O apagamento deste traço, porém, fez aparecer os traços de presenciar, ver, o que refletiu na troca de regência: assistir algo,assisti-lo (TD) Em namorar, namorá-lo, tradicionalmente TD pelos traços de amar, cortejar, passou a implicar traços de companhia, encontro: namorar com. Em obedecer, TI, obedecer a, obedecer-lhe, o acréscimo dos traços ouvir, acatar, respeitar, observar, seguir, leva-nos a mudar a regência para obedecer alguém ou algo, obedece-lo. Complemento/Adjunto Para um problema freqüente – distinção entre o complemento e o adjunto -, Celso Pedro Luft propõe o critério semântico. Segundo ele, “é preciso ter em conta que o verbo prevê na sua significação, o que está implícito em seus traços semânticos”. Para os casos abaixo, como classificar a expressão “na garagem”: - 1. O motorista consertou o carro na garagem. - 2. O motorista pôs o carro na garagem. Na garagem é adjunto adverbial na frase 1, mas é complemento na 2, apesar de exprimir lugar e ser substituível por lá. O verbo consertar só prevê um complemento, o objeto da ação, ao passo que pôr prevê, além do objeto, o lugar-meta. Uma seqüência como trabalhar num prédio pode ter duas interpretações. Se considerarmos o prédio como objeto da ação, teremos um complemento. Porém, se o considerarmos apenas lugar da ação, é adjunto. Outra interessante consideração feita pelo autor é a respeito de verbos com proceder e conduzir-se. Segundo Luft, tais verbos prevêem advérbios ou locuções adverbiais de modo, já que são inviáveis frases como – Ela procede ou Ela se conduziu? Os elementos adverbiais necessários (bem, mal, com dignidade, etc), previstos pela significação de tais verbos, são complementos e não adjuntos. EM RESUMO De modo geral, os gramáticos deixam transparecer que a regência – em sentido estrito ou restrito – deve considerar o aspecto semântico das palavras, especialmente dos verbos. Ocorre porém que a significação é fenômeno difícil de determinar ou, até mesmo, de controlar. Muitas vezes é a pragmática, ou seja, o contexto que determinará a acepção com que a palavra – verbo ou nome – foi utilizada. Deste modo, é interessante considerar o fator sistematizador da gramática normatiza que, ao pressupor a variação semântica, propõe a regra como limitadora do dinamismo das palavras. Assim, a prescrição normativa tem, acima de tudo, caráter uniformizador num cenário de tantas possíveis mudanças. No entanto, não é possível descartar, nem seria um comportamento científico sério, o fenômeno de evolução da regência, acompanhando as transformações de significado das palavras. VISUALIZAÇÃO Regência em sentido estrito Trata das relações de dependência entre: O verbo e seus complementos. Neste caso, diz-se que a regência é verbal. Exemplo: Nos dois primeiros exemplos, a relação de dependência entre os verbos e os complementos é feita diretamente, isto é, sem auxílio de preposições. Nos dois outros exemplos, com o auxílio de preposições. O nome e seus complementos. Neste caso, diz-se que a regência é nominal. As preposições desempenham papel relevante no capítulo da regência. O uso correto das preposições é um indicador seguro do conhecimento da língua. CASOS DE REGÊNCIA Casos de Regência São apresentados a seguir casos de regência em que se verifica divergência entre o que preceitua o ensino tradicional e a realidade lingüística atual. A abordagem que se faz desses casos diverge consideravelmente da realizada pela maioria dos manuais de cultura idiomática, que privilegiam apenas as regências primárias, originárias, não registrando, por isso, as fortes tendências evolutivas nesta área. Dá-se atenção, nesta apresentação, às inovações sintáticas observadas na realidade lingüística atual, tendo como base as pesquisas de Luiz Carlos Lessa e Raimundo Barbadinho Neto, amplamente aproveitadas por Celso Pedro Luft em seu "Dicionário Prático de Regência Verbal". Na apresentação dos aspectos normativos da língua, como em qualquer apreciação de fatos lingüísticos, há que se observar o que é preferível, o que é tolerável, o que é admissível, o que é aceitável, o que é grosseiro, o que é inadmissível, deixando de lado a dicotomia elementar, o primitivismo lingüístico que observa a língua sob o prisma estreito de "certo" x "errado". 1 - Agradar (desagradar) Sentido: Causar agrado; ser agradável. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: O professor agradou aos alunos. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como transitivo direto. Exemplo: O filho agradou a mãe. Observação: - Este uso já era encontrado entre os clássicos. - Esta regência explica-se por analogia com "contentar", transitivo direto. 2 - Aspirar Sentido: Desejar; anelar. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: Aspirar ao cargo. Observação: Esta é a sintaxe originária. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como transitivo direto. Exemplo: Aspiro o cargo. Observação: - É uma inovação regencial sob a pressão semântica de "desejar", "querer", "pretender" todos verbos transitivos diretos. - Em nível culto formal, Luft recomenda a sintaxe originária. 3 - Assistir Sentido: Ajudar; auxiliar. De acordo com o ensino tradicional Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: O médico assiste ao doente. Observação: Esta é a regência primitiva. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como transitivo direto. Exemplo: O médico assiste o doente. Observação: É uma evolução regencial sob a pressão de "ajudar", "auxiliar" - verbos transitivos diretos. 4 - Assistir Sentido: Presenciar. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: Assisti ao filme. Observação: Esta é a regência primária, original. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como transitivo direto. Exemplo: Assisti o filme. Observações: - É uma evolução regencial sob a pressão de semântica de "ver" - verbo transitivo direto. - A forma passiva "o filme foi assistido" comprova a transitivação do verbo. - De acordo com luft, o mais que se pode é aconselhar a sintaxe original, tradicional. 5 - Chegar Sentido: Atingir o término do movimento de ida ou vinda. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: Chegou cedo à escola. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Transitivo indireto Preposição: em Exemplo: Chegou cedo na escola. Observações: - A preposição "em" é exclusiva diante da palavra "casa". Exemplo: Chegou em casa. - No Brasil, usa-se muito a construção com a preposição "em". É, portanto, um brasileirismo. Exemplo: Quando ele chegou na porta da cozinha. - "Já se tolera o "chegou em" na linguagem escrita". (Sílvio Elia). - Luiz Carlos Lessa e R. Barbadinho Neto confirmam amplamente essa regência entre os modernistas. - Mesmo assim, Luft entende que, em texto escrito culto formal, melhor se ajusta o "Chegar a". 6 - Ir Sentido: Deslocar-se de um lugar para outro. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: para, a Exemplos: - Para: Quando há intenção de permanecer, de fixar residência. "Ir para Porto Alegre". - A: Quando há intenção de não se demorar, de não fixar residência. "Ir a Porto Alegre". De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Transitivo indireto Preposição: em Exemplo: Ir no colégio. Observações: - A regência"ir em" é típica da fala brasileira, podendo até ser sobrevivência da língua arcaica. - "Os portugueses dizem ir à cidade. Os brasileiros, na cidade. Eu sou brasileiro". (Mário de Andrade). - Na fala brasileira, prevalece o emprego de "para", sobre o "a". Apesar disso, Luft recomenda o "ir a" / "ir para" na linguagem culta formal, sobretudo escrita. 7 - Morar Sentido: Ter habitação ou residência; habitar. De acordo com o ensino tradicional: Preposição: "em", em todos os contextos Exemplos: - Moro em Porto Alegre. - Moro na Rua da Saudade. De acordo com a realidade lingüística atual: Preposição: Emprega-se também com a preposição "a" com o substantivo "rua", e menos freqüentemente, com outros femininos, como "avenida", "praça", "travessa", na linguagem escrita de jornal, tabelionato, etc. 8 - Namorar Sentido: Cortejar. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo direto Exemplos: - Namorar alguém. - Namorá-lo. Observação: Esta é a regência primitiva. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Transitivo indireto Preposição: com Exemplo: Namorar com alguém. 9 - Obedecer (desobedecer) Sentido: Submeter-se à vontade de alguém. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: Obedeço aos pais. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como transitivo direto. Exemplo: Obedeço os pais. Observações: - Entre os clássicos antigos, aparece como transitivo direto. - Os modernistas também empregam esta construção. - A passiva é vista como normal. - Luft recomenda na linguagem culta formal a construção com objeto indireto. - A mesma descrição vale para o verbo "desobedecer". 10 - Pagar Sentido: Satisfazer dívida, encargo, etc. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo direto e indireto; objeto direto do que se paga e objeto indireto de pessoa (a quem se paga) Exemplos: - Paguei a consulta. - Paguei ao médico. - Paguei a consulta ao médico. Observação: Esta é a sintaxe originária. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como objeto direto de pessoa. Preposição: com Exemplo: Paguei o médico. Observação: - Os puristas condenam esta construção. - Segundo Luft, quando muito, pode-se dizer que, na língua escrita formal, a sintaxe "pagar a alguém", "pagar-lhe" é preferível a "pagar alguém". 11 - Pisar Sentido: Pôr os pés sobre. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo direto Exemplo: Não pise a grama. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Transitivo indireto Preposição: em Exemplo: - Não pise na grama. - Pisar em ovos. - Pisar nos calos. 12 - Preferir Sentido: Dar primazia a. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo direto e indireto Preposição: a Exemplo: Prefiro o azul ao vermelho. Observação: Esta é a sintaxe primária. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Também ocorrem as construções "preferir antes ou mais ((do) que)". Exemplos: - Prefiro mais a música do que a pintura. - Prefiro antes a música que a pintura. Observações: - Há abonações literárias dessa regência. - Segunto Nascentes, "não há erro nenhum nas expressões "preferir antes ou preferir do que"". - De acordo com Luft, "Mesmo assim, em lingua culta formal, cabe a sintaxe primária". 13 - Querer Sentido: Ter afeto; amar; estimar. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: - Quer a alguém. - Querer-lhe. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como verbo transitivo direto. Exemplo: - Quer alguém. - Querê-lo. Observação: - É inovação regencial por influência de "amar" - verbo transitivo direto. - Para Luft, pode-se recomendar a variante com objeto indireto (querer a alguém), na modalidade culta formal, sem, no entanto, condenar a outra (querê-la). 14 - Sentar Sentido: Tomar assento. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: Sentar-se à mesa. Observação: Esta é a sintaxe originária. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Verbo transitivo indireto Preposição: Emprega-se também com a preposição "em" Exemplo: Sentar-se na mesa. Observação: - "Sentar em" é um brasileirismo. - De acordo com Luft, "Em linguagem culta formal, mantenha-se a sintaxe primitiva". 15 - Visar Sentido: Ter em mira; ter em vista; objetivar. De acordo com o ensino tradicional: Verbo: Transitivo indireto Preposição: a Exemplo: Eles visam a fins nobres. Observação: Esta é a regência primária, originária. De acordo com a realidade lingüística atual: Verbo: Emprega-se também como verbo transitivo direto. Exemplo: Eles visam fins nobres. Observação: - É uma inovação regencial sob a pressão semântica de "pretender", "buscar" - verbos transitivos diretos. - Vários gramáticos e dicionaristas registram esta sintaxe. 16 - De + o/a + substantivo + infinitivo ou De + pronome + infinitivo De acordo com o ensino tradicional: - Não se contrai a preposição e o artigo neste tipo de construção. Exemplos: - Há possibilidade de o chefe se atrasar. - Está na hora de o trem partir. - Apesar de ele se mostrar indiferente, é muito solidário. - Isso se deve ao fato de o português ser assim. De acordo com a realidade lingüística atual: - É natural a contração da preposição com o artigo ou com o pronome. Exemplo: Está na hora do trem partir. 17 - Entregar a domicílio/Em domicílio De acordo com o ensino tradicional (regra purista): • A Domicílio: Com verbos que indicam movimento. - Exemplo: Ir a domicílio. Enviar encomendas a domicílio. • Em Domicílio: Com verbos que não indicam movimento. - Exemplo: Dar aulas em domicílio. Fazer as unhas em domicílio. De acordo com a realidade lingüística atual: - Usa-se "a domicílio" em ambos os casos. Exemplo: Entrega a domicílio. 18 - Complemento comum a verbos de regência diferente De acordo com o ensino tradicional (regra purista): • Verbos com regência diferente não podem reger um mesmo complemento. Estariam, pois, erradas as frases: - Entraram e saíram da sala (entrar em/sair de). - Compreendeu e participou da alegria do marido (Compreender algo/participar de algo). - Fui e voltei a Porto Alegre (ir a/voltar de). • O correto seria: - Entraram na sala e saíram dela. - Compreendeu a alegria do marido e participou dela. - Fui a Porto Alegre e voltei (de Porto Alegre). De acordo com a realidade lingüística atual: - Prefere-se a construção simplificada. Exemplo: Entraram e saíram da sala. ANEXO I ATIVIDADES Regência, Regência Verbal, Regência Nominal: 1. Faça a leitura do texto Perdas Inúteis e, levando em consideração o fenômeno de regência, analise sua estrutura, seus significados, enfim, sua coerência: Perdas Inúteis Os dados de um estudo do Instituto de Engenharia de São Paulo sobre desperdício na produção de bens e serviços no país são alarmantes. Segundo a investigação, seriam perdidos sob as formas mais diversas, da produção de peças e componentes defeituosos a gargalos no sistema de transporte, cerca de US$ 50,78 bilhões anuais, ou 14,5% do PIB. Ainda que estimativas dessa natureza estejam sujeitas a elevada margem de erros, a ordem de magnitude dos números sugere que se trata de um foco importante de problema. A falta de treinamento, a inadequação dos transportes, a utilização de equipamentos obsoletos e a pequena difusão de processos automatizados constituem alguns dos fatores para desempenho tão desfavorável. A superação desses obstáculos, como de tantos outros problemas da economia brasileira, está a exigir a consecução prática, e não apenas retórica, de reformas modernizantes como a da abertura, privatização e concentração dos recursos públicos na formação de capital humano. Jornal Folha de S.Paulo, 24/8/1992 2. Analise e comente a regência verbal e/ou nominal das frases abaixo. Corrija-as, se necessário, considerando a prescrição normativa para o fenômeno da regência: a) As medidas emergenciais consistem de novas regras para as aplicações financeiras e de um novo sistema de controle de divisas. b) Ainda não se determinou o momento exato de ela intervir com seus argumentos contundentes. c) Só aspiro hoje uma vida calma, em um sitiozinho qualquer, onde espere a grande paz da morte, que não deverá demorar. d) Venho avisá-lo, meu bom amigo, que estou na fazenda, onde lhe espero por todo este mês. Dou-te ainda esplêndida notícia: está aqui o Pedrinho, que estivemos no ano passado em casa dele, em Resende. 3. Tendo em vista o fenômeno da regência, explicite o sentido de cada uma das orações abaixo: a) Devemos avisar-nos dos ladrões. b) Eu e tu não comungamos muito bem. c) Não lhe quero – Não a quero. d) Nem por tudo posso responder. e) Tive de socorrer-me dele para esse negócio. 4. Observem os exemplares do jornal que lhe foram entregues. Realizem nele/com ele uma atividade de leitura crítica, em busca de manifestações de regência verbal em acordo ou desacordo com as regras da gramática normativa. Listem os exemplares e comente-os. 5. Faça a leitura do texto O montepio – com o olhar dirigido pelos estudos sobre o fenômeno da regência – e dê sua opinião a respeito da seguinte polêmica: A regência pode atuar como elemento de coesão textual? O Montepio Que herança transmite o pai a seu filho? Não lhe deixa casa ou sombra de apólice nem tampouco o sujo de seu colarinho. Não lhe lega a velha mala de viagens nem os seus amores e as suas bobagens. E as roupas do pai que a chuva encolheu no filho não cabem. Com pau seco e fogo o pai de resina arma o seu legado. Deixa uma fogueira que ele fez sozinho no escuro da mata. (Borboletas em seus ombros pousavam.) E também menino na pele do vento solta para o céu o seu papagaio. E antes de mudar-se de suor em musgo o pai dá ao filho como pé-de-meia algo da paisagem - sobra de pupila, moeda de lágrimas. Deixa-lhe o balaio cheio de apetrechos e o jeito de andar com as mãos às costas. Para o filho passa todo o seu cansaço suas promissórias e seu olhar baço. Da árvore do povo deixa-lhe no sangue um ramo orvalhado. Transmite-lhe o grito de espantado amor que gritou na praia. De agrestes gravetos faz o fogo e esquenta na palhoça ao vento a comida fria de sua marmita. O pai dá ao filho o ninho vazio achado no bosque e a raposa morta por sua espingarda. Dá-lhe a sua anônima grandeza do nada. Sua herança é o frio que sentiu rapaz quando impaludado. Dá-lhe a lua imensa na noite azulada. Estende-lhe as mãos sujas de carvão molhadas de orvalho. Fala-lhe da dor que sente nos calos. Dá-lhe a verde e rubra pimenteira em flor. Mostra-lhe o tambor de salitre e brisa que rufa sozinho entre os arquipélagos de sua pobreza. Mostra-lhe o cadarço de espuma no mar cheio de mariscos. Ser pai é ensinar ao filho curioso o nome de tudo: bicho e pé de pau. Que o pai, quando morre, deixa para o filho o seu montepio - tudo o que juntou de manhã à noite no batente, dando duro no trabalho. Deixa-lhe palavras. (IVO, Lêdo. O sinal semafórico. Rio de Janeiro, José Olympio, Brasília, 1974. p. 379-381) ANEXO II UM ESTUDO SOBRE AS PREPOSIÇÕES Preposição Preposição é a palavra que estabelece uma relação entre dois ou mais termos da oração. Essa relação é do tipo subordinativa, ou seja, entre os elementos ligados pela preposição não há sentido dissociado, separado, individualizado; ao contrário, o sentido da expressão é dependente da união de todos os elementos que a preposição vincula. Exemplos: Os amigos de João estranharam o seu modo de vestir. ...[amigos de João / modo de vestir: elementos ligados por preposição] ...[de: preposição] Ela esperou com entusiasmo aquele breve passeio. ...[esperou com entusiasmo: elementos ligados por preposição] ...[com: preposição] Esse tipo de relação é considerada uma conexão, em que os conectivos cumprem a função de ligar elementos. A preposição é um desses conectivos e se presta a ligar palavras entre si num processo de subordinação denominado regência. Diz-se regência devido ao fato de que, na relação estabelecida pelas preposições, o primeiro elemento – chamado antecedente - é o termo que rege, que impõe um regime; o segundo elemento, por sua vez – chamado conseqüente – é o temo regido, aquele que cumpre o regime estabelecido pelo antecedente. Exemplos: A hora das refeições é sagrada. ...[hora das refeições: elementos ligados por preposição] ...[de + as = das: preposição] ...[hora: termo antecedente = rege a construção "das refeições"] ...[refeições: termo conseqüente = é regido pela construção "hora da"] Alguém passou por aqui. ...[passou por aqui: elementos ligados por preposição] ...[por: preposição] ...[passou: termo antecedente = rege a construção "por aqui"] ...[aqui: termo conseqüente = é regido pela construção "passou por"] As preposições são palavras invariáveis, pois não sofrem flexão de gênero, número ou variação em grau como os nomes, nem de pessoa, número, tempo, modo, aspecto e voz como os verbos. No entanto em diversas situações as preposições se combinam a outras palavras da língua (fenômeno da contração) e, assim, estabelecem uma relação de concordância em gênero e número com essas palavras às quais se liga. Mesmo assim, não se trata de uma variação própria da preposição, mas sim da palavra com a qual ela se funde (ex.: de + o = do; por + a = pela; em + um = num, etc.). Preposições Palavras invariáveis que exprimem relações entre duas partes de uma oração que dependem uma da outra. a ante após até com conforme contra consoante de desde durante em exceto entre mediante para perante por salvo sem segundo sob sobre trás Preposições e Traços Semânticos O Emprego da Crase Professora Marcilene Rodrigues Pereira Bueno Chama-se crase a contração de dois sons vogais idênticos. Segundo Olívia (1978), krasis em grego significava mistura. Na língua portuguesa o fenômeno da crase já aconteceu entre outras vogais. Temos por exemplo: door = dor, coor = cor, fee = fé, pee = pé. Atualmente tal contração só se verifica entre os fonemas aa. Mas, que “as” são esses? Um é sempre preposição; o outro varia. Pode ser artigo “a”, pronome demonstrativo “a”, ou o som inicial “a” de outros pronomes: aquele, aqueles, aquela, aquilo, a qual. O fenômeno da crase é indicado, graficamente, pelo acento grave (`). Segundo Almeida (1989), é importante observar que crase não é o nome do acento. Assim, é incorreto dizer: “O a desta frase tem crase”. O acento grave indica que houve a fusão de dois aa. Portanto é melhor dizer: “O a desta frase possui acento grave.” Para tal autor o verbo crasear é um brasileirismo que deve ser evitado. Melhor é substituí-lo por acentuar o a: “Vou acentuar o a desta locução”, e não “ Vou crasear o a desta locução”. Destaca-se também que para a utilização do acento grave é importante considerar as noções de termo regente e termo regido: a) termo regente: é o termo da esquerda, que exige complemento regido da peposição a; b) termo regido: é o termo da direita, que completa o sentido do termo anterior, admitindo a anteposição do artigo a ( ou as). Exemplo: Falei a a mestra – Fales à mestra. Iremos a a cidade – Iremos à cidade. Se o termo regente não exige complemento regido de preposição a, evidentemente não ocorre a crase: Exemplo: Visitamos a cidade. MANUAIS DIDÁTICOS E CRASE Primeiro caso: A crase ocorre obrigatoriamente quando o termo regente deve exigir complemento regido da preposição a , e o termo regido deve admitir artigo feminino a (ou as): Pedi informações à ( = a + a ) secretária. Refiro-me às ( = a + as ) novelas de ontem. Iremos à ( = a + a) Bahia. Neste primeiro caso, podemos usar os seguintes recursos para confirmar a ocorrência ou não da crase: a) Substituir a palavra feminina por uma masculina. Se na substituição ocorrer a combinação ao ( ou aos), então a crase será confirmada: A decisão coube à diretora ( A decisão coube ao diretor – crase confirmada). – Presentearemos a diretora (Presentearemos o diretor. – crase não confirmada). b) Com nomes próprios geográficos, substitui-se o verbo da frase pelo verbo voltar. Se resultar a expressão voltar da, confirmar-se-á a ocorrência da crase: Iremos à Argentina. (Voltaremos da Argentina – crase confirmada) – Viajarei a Roma ( Voltarei de Roma – crase não confirmada). Observação: Se o nome próprio geográfico aparecer modificado por um adjunto adnominal, ocorrerá a crase: Viajarei à Roma das ruínas. (Voltarei da Roma das ruínas – crase confirmada). Segundo Caso : A letra a dos pronomes demonstrativos aquele(s), aquela(s), aquilo também receberá acento grave se o termo regente exigir complemento regido da preposição a. Nota-se fazendo o desdobramento da contração: Dei pão àquele(s) ( = a + aquele) pobre(s). Iremos àquela(s) ( = a + aquela) cidade(s). Fiz críticas àquilo ( = a + aquilo) que você disse. Esta história é igual à(s) ( = a + a ) que vovó contava. Terceiro caso: A letra a que forma locução com palavras femininas recebe o acento grave. Usamos crase diante das locuções adverbiais, prepositivas e conjuntivas, formadas de substantivo feminino: a) Locuções adverbiais: às vezes, à noite, à tarde, às ocultas, à esquerda, à direita, às pressas, etc. b) Locuções adjetivas: (fato) à-toa, (soldado) à paisana, (baile) à fantasia, etc. c) Locuções prepositivas: à beira de, à espera de, à procura de, etc. d) Locuções conjuntivas: à medida que, à proporção que ( apenas estas duas). Observações: 1. Não ocorre a crase em locuções adverbiais que indicam modo ou instrumento, embora alguns autores coloquem o acento por força da tradição de seu emprego: O cão foi morto a bala. Escrevo a máquina. Pagamento a vista. 2. Se a locução adverbial apresentar a singular + palavra adjetivada plural, não ocorrerá a crase: Ficaram a portas fechadas. Rimos a bandeiras despregadas. 3. A locução adverbial a distância não deve ser acentuada: Olhávamos o incêndio a distância. Porém, se a palavra “distância” aparecer determinada, teremos locução prepositiva, e não adverbial. Portanto, ocorrerá a crase: Olhávamos o incêndio à distância de cem metros. 4. Em locuções adverbiais formadas por palavras repetidas não ocorre a crase: Estávamos frente a frente. Tomei o remédio gota a gota. 5. Se as locuções prepositivas à moda de e à maneira de ficarem subentendidas, ocorrerá a crase, mesmo que o a esteja anteposto a palavra masculina. Escrevi um poema à Cecília Meireles. Fiz um gol à Pelé. Ele usa sapatos à Luis XV. Quarto caso:. Ocorre crase diante de horas quanto houver o artigo definido, feminino, a que se refere à palavra “hora” e a preposição “a” regida pelo verbo: O jogo começará às 9 horas. Papai voltará às 17 horas. Espere-me às 8 horas em ponto. Quinto caso: Diante de nomes de cidades, regiões, países e lugares em geral, haverá crase se o nome admitir artigo feminino. Pode-se dizer: Inglaterra é país antigo ou A Inglaterra é país antigo. O nome Inglaterra, por questão de uso, aceita artigo. Então se escreverá: Iremos à Inglaterra, um dia... Sexto caso: Usa-se crase diante da palavra distância se ela estiver seguida de algum adjunto: O menino parou à distância de dois metros. Casos Facultativos da Crase O acento grave pode ser usado facultativamente nos seguintes casos: a) antes de nomes de mulheres: Refiro-me à ( ou a) Amélia. Observação: com nomes adjetivados, ocorre obrigatoriamente a crase: Refiro-me à prestativa Amélia. b) Antes de pronomes possessivos femininos no singular: Fiz alusão a ( ou à ) sua carta. Observação: Se tivermos as (plural) e pronome possessivo feminino plural, a crase será obrigatória: Fiz alusão às suas cartas. c) Após a preposição até: Iremos até a ( ou à ) escola. Casos em que não ocorre crase Não se coloca o acento grave nos seguintes casos: a) antes de palavras masculinas, desde que não estejam subentendidas as locuções à moda de e à maneira de: Refiro-me a Carlos. Não façam a prova a lápis. b) antes de verbos: Começou a chover. Pôs-se a falar muito alto. c) no a singular anteposto a substantivo plural: Não me refiro a atividades desonestas. Não vou a festas. d) antes de numeral: O número de reprovados chegou a trinta. Observação: Se se tratar de locução adverbial feminina, ocorrerá a crase: Viajarei às quinze horas. e) Antes da palavra casa, não especificada: Voltei tarde a casa. Observação: Se a palavra casa aparecer determinada por um adjunto adnominal, ocorrerá a case; Voltarei à casa de meus pais.. f) Antes da palavra terra usada no sentido de “chão firme”: Os marinheiros foram a terra para descansar. Observação: Se a palavra terra indicar região, local, pátria, ocorrerá a crase: Os marinheiros voltaram à terra onde nasceram. g) Antes de pronomes que repelem o artigo: Entreguei meu coração a ela. Ela sentou-se junto a mim. Você é a pessoa a quem sempre obedecerei. Apelo a Vossa Senhoria. h) Diante de substantivos femininos usados em sentido geral: Isto me cheira a coisa velha. Dedicou o trabalho a homem ou a mulher? i) Diante de expressões de tratamento mais cerimoniosas que não aceitam o artigo feminino: Falarei a Vossa Senhoria. Observações Gerais a) Os pronomes senhora, senhorita, dona e madame admitem artigo. Logo, coloca-se o acento grave no a que os antecede: Levarei flores à senhora Leopoldina. Dedico estes versos à dona Ernesta. b) O corre crase antes do pronome relativo qual ( e flexão: quais), desde que seu antecedente seja uma palavra feminina, e que o pronome relativo dependa de um termo regido pela preposição a Recorra ao seguinte artifício: Substitua o pronome relativo pelo seu antecedente, antepondo-lhe o pronome indefinido certo ( ou variações: certa, certos, certas). Haverá crase se antes do indefinido aparecer a preposição a: Dobre essa folha, a qual será grampeada. ( Certa folha será grampeada – crase não confirmada) – Dobre essa folha, á qual anexarei um convite. ( Anexarei um convite a certa folha – crase confirmada) – São situações as quais enfrentamos ( Enfrentamos certas situações – crase não confirmada) – São situações às quais me refiro. ( Refiro-me a certas situações – crase confirmada). GRAMÁTICA NORMATIVA E CRASE 1. Napoleão Mendes de Almeida O gramático Napoleão Mendes de Almeida define crase (do grego crásis = mistura) como a fusão escrita e oral de duas vogais idênticas. Neste sentido, a palavra crase pode ser aplicada a outras grafias como: têm (teem), vêm (vêem). No entanto, essa denominação visa a especificar principalmente a contração ou fusão da preposição a com: - artigo definido ou pronome substantivo feminino átono a, as; os demonstrativos aquele, aquela, aqueles, aquelas e aquilo. Essa contração expressa-se, na grafia, mediante o acento grave: à, às, àquele, àqueles, àquelas e àquilo. à = a (preposição) + a (artigo ou pronome) Após esta explicação inicial, o gramático passa a explanar sobre as regras para o perfeito uso da crase: Primeira regra – é condição essencial que a crase venha antes de palavra feminina. De maneira nenhuma se pode usar a crase antes de nomes masculinos. São erros gravíssimos formas como: Ele foi à pé Isso pertence à seu irmão. Compras à prazo. Também não se pode usar a crase antes dos verbos, porque são considerados do gênero masculino: Ele esta a morrer – Ele está à morrer. Segunda regra – É necessário que a palavra dependa de outra que exija a preposição “a”. Erro seria na frase “A rosa murchou” crasear o a, porque rosa é sujeito e o a que o antecede é simples artigo. Terceira regra – É necessário que a palavra admita o artigo feminino “a”. Na frase: “Ele foi a Roma” – não podemos crasear o a que antecede Roma porque ela não admite antes de si o artigo feminino. Diz-se: “Roma é cidade linda” e não “A Roma...”. Prova isto que o a da oração “Ele foi a Roma” é simples preposição e na pode, conseqüentemente, ser craseado. Todavia, quando queremos particularizar, empregamos a crase. Exemplo: “Refiro-me à Roma de César” – “Reporto-me à Lisboa de Camões” O gramático também oferece em sua obra o que ele chama de regras práticas para o emprego da crase. São elas: Primeira Regra Prática: Emprega-se crase sempre que, substituindo-se o vocábulo feminino por um masculino, aparece a combinação “ao” antes do nome masculino. Por exemplo: Eu vou a cidade - Eu vou ao teatro. Para o cumprimento desta regra prática, é necessário, no entanto, o cumprimento de todas as regras anteriores; assim, em: “Eu vou a Roma”, de nada valerá aplicar a regra prática, uma vez que Roma não admite antes de si o artigo feminino. Da mesma maneira, não se emprega a crase quando, substituindo-se na locução o nome feminino por outro masculino, não aparece a forma ao; por isso é que não se craseia o a da expressão: “Ele foi ferido a bala”. Assim, não se pode grafar: “Escrever uma carta à máquina, à mão, à tinta”, porque não se diz: “Escrever uma carta ao lápis”. Não se grafa “pagamento à vista” mas “pagamento a vista” (não se diz pagamento ao prazo; não há determinação); grafa-se, porém, “O resultado está à vista de todos”, porque se diz “O resultado está ao alcance de todos” (= na vista de todos; há determinação). Segunda Regra Prática: Craseia-se o a de uma frase quando pode ser substituído por para, a na, pela, com a, ou, de conformidade com o caso, por qualquer preposição acompanhada do artigo a; assim, craseia-se o a em: “Dei isso à Casa de Misericórdia”, porque se pode dizer “Dei isso para a Casa de Misericórdia”. “Estou às portas da morte”. “Às três horas”, porque se pode dizer: “Pelas (per+as) três horas”. Finalmente, Napoleão Mendes de Almeida conclui seus estudos sobre crase com algumas observações: 1. Será livre o emprego da crase quando livre for o emprego do artigo feminino. Em: “Dei isto a minha irmã” fica à vontade do autor o emprego da crase, porque tanto, nesse caso, empregamos o artigo feminino. (“A minha irmã não está”), como o deixamos de fazer: “Dei isto às minhas irmãs” – deveríamos sem dúvida crasear o as, o que evidentemente demonstra a primeira regra prática: “Dei isto aos irmãos”. O s indica a presença do artigo. 2. Unicamente quando ficar comprometida a clareza da frase é que poderemos fugir das regras acima; é difícil atinar com o significado da sentença: “Fique a vontade em seu lugar”, onde não sabemos se a vontade é sujeito ou locução adverbial. Se queremos dizer: “Fique você a vontade”, isto é, a gosto, podemos crasear o a, embora de encontro a todas as regras expostas: “Fique à vontade em seu lugar.” 3. Em expressões como “Vestir-se à Luís XV” – “Móveis à Luís XV” o a aparece craseado, por modificar a palavra feminina moda, oculta nessas frases: Agiram à palhaços de circo”. 4. O a, quando seguido de nome plural, é mera preposição; não pode, por isso, levar crase: “Quanto a referências...” – Chegou a vias de fato” – “Daremos a pessoas dignas...” 5. Possuímos duas palavras femininas que, ordinariamente, não admitem o artigo: casa, na acepção de morada, residência: “Vim de casa” – “Estive em casa” – “Ó de casa” – são expressões que mostram claramente a não existência do artigo antes do vocábulo casa, pois do contrário as expressões seriam “Vim da casa” – “Estive na casa” – “Ó da casa”. Daqui facilmente concluiremos ser erro crasear o a antes dessa palavra, quando empregada com o sentido de lar, residência, domicílio: “Eu vou a casa” e não “Eu vou à casa.” Se, porém, o vocábulo casa vier seguido de uma especificação qualquer, como “A Casa X”, “A casa de Pedro”, é admissível e necessária a crase (quando, naturalmente, essa palavra estiver em relação complementar). “Fui à Casa Anglo-Brasileira” – “Dirigi-me à casa de Pedro” – “Irei à Casa da Moeda” – pois, aplicando-se a segunda regra prática, diremos: “Estive na Casa da Moeda”. 6. Outro caso de supressão do artigo se dá com a palavra terra na acepção de chão firme, empregada para contrastar com o elemento movediço do mar: “Estive em terra” – “Iremos por terra”. Portanto, dadas as mesmas razões que apontamos no caso anterior, devemos escrever: “Levamo-lo a terra” ( e não à) – “Chegamos ainda hoje a terra” (e não à). 7. O emprego da crase antes de nomes próprios femininos obedece à possibilidade ou não do artigo: se antes de nomes próprios femininos de pessoas íntimas por relações de parentesco, amizade ou política empregamos o artigo (a Maria, a Laura, a Noemi, a Chiquinha), é claro que esses nomes, quando em relação complementar, devem vir precedidos de a craseado: “Vou levar isto à Maria” – “Darei o dinheiro à Laura”. Se, porém , costumamos referir-nos a essas pessoas conhecidas sem empregar artigo (Laura está doente – Maria não veio), é também claro que esses nomes, quando em relação complementar, não devem vir precedidos de a craseado: “Escrevi a Laura” (e não à Laura”. Tratando-se de pessoas célebres ou a nós não íntimas, não empregamos o artigo: Maria Stuart, Joana D´Arc. Quando tais nomes estiverem em relação complementar, não poderão vir precedidos de crase: “Impuseram condições a Maria Stuart” (e não à). 8. Três nomes existem – Europa, Ásia e África – que outrora não levavam artigo; daí o dizer “Meter lanças em África”. Esses nomes, e mais os de alguns países, como Espanha, França, Inglaterra, Holanda, não exigem obrigatoriamente o artigo, quando regidos de preposição: vir de França, Leão de França, estar em Holanda. Pois bem, o emprego da crase antes de tais nomes é livre, tal qual acontece com a crase antes de possessivos. 9. Uma vez que os pronomes de tratamento começados por possessivos (sua senhoria, vossa majestade, sua santidade) não admitem o artigo antes de si, jamais poderão vir precedidos de a craseado: “Dei isso a vossa senhoria” (e não: à vossa senhoria). 10. As expressões “devido a”, “relativo a”, “referente a”, “com respeito a”, “quanto a”, “obediência a” e outras devem ter o a craseado quando vêm antes de nomes femininos determinados pelo artigo: devido à morte do pai, devido às dificuldades, obediência às leis, referente à prisão, com respeito à situação, quanto à natureza. Por último, uma observação sobre as locuções adverbiais. As locuções adverbiais levam crase ou para evitar ambigüidade ou quando se enquadram nas regras práticas do emprego da crase: “Peguei à mão” (com crase, tão somente para evitar ambigüidade; pela regra não havia necessidade de crase, uma vez que se diz “pegar a laço” e não “pegar ao laço”). “Peguei-o a mão” (aqui já não é necessário crase, pois deixa de existir perigo de ambigüidade). 2. Evanildo Bechara Evanildo Bechara trata a crase como “emprego do à acentuado” ou acento grave. Para ele o acento grave no a é usado para indicar que soa como vogal aberta nos seguintes dois casos: 1. quando representa a construção da preposição a como artigo a ou o início de aquele, aquela, aquilo. 2. quando representa a pura preposição a que rege um substantivo feminino no singular, formando uma locução adverbial que, por motivo de clareza, vem assinalada com acento diferencial: à força, à míngua, à bala, à faca, à espada. Para este gramático a crase é um fenômeno fonético que se estende a toda fusão de vogais iguais. Também não há razão para condenar-se o verbo crasear para significar: “pôr o acento grave indicativo de crase”. O que se não deve é chamar crase ao acento grave. Bechara lista os casos seguintes em que a crase ocorre ou não: A) diante de palavra feminina, clara ou oculta, que não repele artigo: Fui à cidade. Para sabermos se um substantivo feminino não repele artigo, basta construí-lo em orações em que apareçam regidos das preposições de, em, por, Se tivermos puras preposições, o nome dispensa artigo; se tivermos necessidade de usar, respectivamente da, na, pela, o artigo será obrigatório: Fui à Gávea. B) A crase não ocorre diante de palavra de sentido indefinido: Falou a uma pessoa. C) Há acento antes do numeral uma: Irei vê-la à uma hora.