Heloísa Helena Gomes Coe, Cacilda Nascimento de Carvalho

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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física
II Seminário Ibero-Americano de Geografia Física
Universidade de Coimbra, Maio de 2010
SERIA CABO FRIO UM ENCLAVE SEMIÁRIDO NO LITORAL ÚMIDO DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO?
Heloisa Helena Gomes Coe, UERJ, [email protected]; Cacilda Nascimento de
Carvalho, UFF, [email protected]
RESUMO: Localizada na costa nordeste do Estado do Rio de Janeiro, Brasil, a região
de Cabo Frio, devido a peculiaridades climáticas, geológicas e ecológicas, é
considerada um “enclave” fitogeográfico, com um clima mais seco que o restante do
litoral fluminense. A região apresenta fracas precipitações (854 mm/ano), taxa de
evaporação anual entre 1.200 e 1.400 mm, temperatura média de 23ºC, insolação
entre 200 e 220h/mês, verão com predominância de ventos de NE e inverno marcado
por períodos descontínuos de ventos de S-SW. As peculiaridades climáticas da região
de Cabo Frio têm sido explicadas por fatores como a grande distância da linha de costa
até a Serra do Mar e a presença de uma ressurgência costeira intermitente,
intensificada pelos fortes ventos de NE. Para fins de caracterização climática da região,
foram feitas análises multivariadas de similaridade entre pluviosidade, insolação,
temperatura, evaporação e umidade relativa, comparando a região de Cabo Frio, com
seu entorno mais úmido e com a caatinga do Nordeste brasileiro. Pelos resultados,
pode-se afirmar que Cabo Frio se assemelha mais à caatinga que a seu entorno úmido,
comprovando-se o “enclave” climático. A região foi também objeto de estudos
paleoambientais, a fim de inferir sua evolução durante o Quaternário, usando como
indicadores silicofitólitos extraídos de perfis de solo. As variações observadas, desde
13ka cal BP, não indicam grandes mudanças no tipo de cobertura vegetal, sempre
pouco arbórea, característica de clima semiárido. Identifica-se um período
relativamente mais úmido em cerca de 4,5ka cal BP, que corresponde a registros de
ressurgência mais fraca e um período de menor densidade arbórea entre 6 e 5ka cal
BP, quando foram registrados episódios de ressurgência e El Niño mais intensos.
ÁREA DE ESTUDOS
Para fins de caracterização ambiental, optou-se pela delimitação climática e
fisionômica em uma unidade geográfico-ambiental que inclui no conceito de Região de
Cabo Frio os municípios de Arraial do Cabo, Búzios, Cabo Frio, Iguaba, São Pedro da
Aldeia e Araruama. Abrange uma área de aproximadamente 1.500 km2 e está
1
Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
localizada entre as coordenadas 22°30’ – 23°00’ S e 41°52’ – 42°42’ W, com altitudes
que variam desde o nível do mar até cerca de 300m. (figura 1)
A área apresenta peculiaridades climáticas, geológicas e ecológicas que se buscou
sistematizar no esquema da Figura 2. Elas condicionam diversas formações vegetais,
com muitas espécies endêmicas e raras. De todos os fatores físicos, o clima parece ser
o elemento que exerce maior influência sobre os ecossistemas da região. A marcante
ação climática se faz visível na fisionomia seca que caracteriza as matas de Cabo Frio.
Esta região apresenta um clima mais seco que o restante do litoral fluminense,
relacionado, entre outros fatores, à presença de uma ressurgência costeira local. É
considerada como um “enclave fitogeográfico”, reduto de vegetação com fisionomia
semelhante à da caatinga (Ab’Saber, 2003), dominada por florestas xeromórficas, com
abundância de Cactaceae e Bromeliaceae e cercada por florestas úmidas da Mata
Atlântica.
Figura 1: Localização da área de estudo
A região apresenta um complexo quadro geológico e geomorfológico, cuja litologia
é composta principalmente por paragnaisses originados de depósitos marinhos
pelíticos (Schmitt et al., 2004), muito antigos e intemperizados, areias e materiais
argilosos que formam espessos mantos de alteração, onde concreções ferruginosas e
linhas de pedra podem ser encontradas. Esta parte do litoral fluminense, também
conhecida como Região dos Lagos, é caracterizada por grandes lagoas de água salgada
ou salobra que foram isoladas do oceano por longos pontais distanciados do litoral, em
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grande parte, modeladas pelas variações do nível relativo do mar durante o
Quaternário.
Os solos na região são pouco desenvolvidos, normalmente rasos, com
características morfológicas, químicas e mineralógicas que sugerem um regime
pedogenético particular (Camargo, 1979; Moniz et al., 1990). Apresentam considerável
variabilidade vertical e horizontal, sendo fortemente influenciados por fatores
climáticos e topográficos. Os solos sob caatinga hipoxerófila constituem tanto o
substrato fundamental ao ambiente sui generis, quanto a possibilidade de
representarem pedoambientes outrora mais amplos e hoje isolados, mantidos graça às
peculiaridades morfoclimáticas regionais. (Ibraimo et al., 2004)
PECULIARIDADES DE CABO FRIO
História paleoevolutiva
Fatores geomorfológicos
Microclima atual
Regime dos ventos
(predominância de NE)
Flutuações climáticas
do Quaternário
Alternância de
períodos
quente/ úmidos
frio/ secos
Afastamento
da costa
em relação à
Serra do Mar
Situação de
cabo
Mudança na
inflexão da costa
(de N/S para E/W)
Deslocamento sazonal
do eixo da CB
Variações do
nível do mar
Zona de divergência
entre a costa e a CB
Afastamento das águas superficiais
próximas à costa
ANOMALIA
CLIMÁTICA
Afloramento de águas oceânicas frias
Diminuição das precipitações
Aumento da evaporação
Ressurgência costeira intermitente
Figura 2: Peculiaridades geológicas, geomorfológicas, oceanográficas e climáticas da região
de Cabo Frio
A principal característica oceanográfica da região de Cabo Frio é a ocorrência de
uma ressurgência costeira onde as águas frias e ricas em nutrientes, da Água Central
do Atlântico Sul (ACAS), afloram na plataforma continental, devido à mudança brusca
de orientação da costa, que passa de uma direção mais ou menos norte-sul a uma
leste-oeste; ao deslocamento sazonal do eixo da Corrente do Brasil (CB), que é
3
Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
desviado ao largo no verão; e, sobretudo, ao regime de ventos da região (Barbosa,
2003). De setembro a abril, a CB está afastada da costa e a ACAS ultrapassa o talude
continental e invade o fundo da plataforma, onde permanece. Durante os meses de
primavera e verão, a atuação direta dos ventos locais do setor leste, de alta freqüência
e intensidade, promove a subida da ACAS à superfície (Valentin, 1994). O ciclo de
ressurgência é interrompido mais frequentemente durante o inverno, quando os
ventos SW prevalecem, na passagem de frentes frias, proporcionando o empilhamento
das águas superficiais na costa, fazendo com que a ACAS retorne às profundezas. A
intensificação da ressurgência na região de Cabo Frio induz a uma redução na
precipitação e, conseqüentemente, a um aumento na aridez climática, evaporação e
salinidade das lagoas.
A condição climática mais seca da região de Cabo Frio determina um panorama
peculiar em termos de cobertura vegetal do Rio de Janeiro, ou seja, suas formações
vegetais fogem do aspecto exuberante que as Florestas de Encosta do Estado
costumam apresentar. As matas da região enquadram-se perfeitamente na definição
de floresta seca, proposta por Mooney et al.,1995 (apud Farág, 1999). Já foram
também classificadas como “uma disjunção fisionômico-ecológica da estepe
nordestina” (Ururahy et al., 1987). Esta vegetação foi considerada por alguns autores
como um “enclave” fitogeográfico, com fisionomias de “caatingas”, rodeada por
grandes contínuos de mata Atlântica. Acredita-se que, com as mudanças ambientais
ocorridas na última glaciação, as caatingas se estenderam por grande parte do Brasil
Tropical Atlântico, permanecendo, em alguns locais, desde então, como mini ou mesoredutos onde dominam cactáceas e bromeliáceas. Esta região foi considerada como
um testemunho paleoclimático do clima seco e frio do último Período do Quaternário,
tendo sido postulado que a área de caatinga antes ocupava um espaço muito maior
(Ab’Saber, 1977).
MÉTODOS
Para comparar o clima de Cabo Frio com o de seu entorno, só estiveram disponíveis
dados de precipitação em 15 estações meteorológicas localizadas a menos de 150 km
de Cabo Frio (tabela 1), abrangendo períodos de observação maiores que 14 anos.
Entretanto, para a região da caatinga foi possível usar dados de evaporação (Eva);
insolação (Ins); precipitação (Ppt); temperatura média (Temp) e umidade relativa (Umi)
de 34 estações meteorológicas, coletados em um mesmo período de 60 anos. Assim,
após uma análise exploratória dos dados, e comparação entre médias de precipitação,
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fez-se análise multivariada de grupamento, com matriz de distância euclidiana entre os
locais, amalgamação dos grupos pelo método da variância mínima, utilizando as
variáveis padronizadas.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
QUADRO CLIMÁTICO
Na porção leste do litoral do Estado do Rio de Janeiro, as estações meteorológicas
de Cabo Frio, Iguaba Grande e Saquarema registram precipitações anuais inferiores a
1.000mm, enquanto outras, não muito distantes, podem receber até mais de 2.500
mm anuais de chuva (Barbiére & Coe, 1998).
No Estado do Rio de Janeiro, Nimer (1989) distingue a Serra do Mar, com uma
vegetação superúmida, que separa a baixada litorânea quente e úmida do planalto
interiorano, onde são bem mais definidas as épocas de secas e de chuvas. Na parte
norte do estado, o clima é influenciado pela ascensão de ar quente dos vales e da
baixada, na margem esquerda do rio Paraíba do Sul. Davis & Naghettini (2001)
reforçam os comentários de Nimer (1989), destacando que os níveis mais elevados da
Serra da Mantiqueira recebem em média entre 2.000 a 2.500mm de chuva durante o
ano e na Serra do Mar os valores variam entre 2.000 a 4.500mm. As encostas
meridionais, na maioria das vezes a barlavento, são bem mais chuvosas que as
encostas a sotavento. No verão, a forte incidência da radiação solar aumenta a
evaporação das águas oceânicas que, devido à posição geográfica e ao relevo bastante
acidentado, aumenta a turbulência do ar pela ascendência orográfica, provocando a
formação de pancadas de chuvas, normalmente, no final da tarde.
A região de Cabo Frio possui um clima sui generis para o litoral sudeste brasileiro
(tabela 1), com pluviosidade reduzida em relação às regiões contíguas, destacando-se
do conjunto tropical úmido por apresentar um microclima classificado como semiárido
quente, uma variação do Bsh de Köppen (Barbiére, 1975). Caracteriza-se por fracas
precipitações (em média em torno de 770 a 854 mm/ano) e por uma taxa de
evaporação compreendida entre 1.200 e 1.400mm/ano (Barbiére, 1984), notadamente
em período estival. A temperatura média é ligeiramente superior a 21ºC de junho a
setembro e fica entre 23 e 25ºC de novembro a abril, não apresentando, portanto,
grande amplitude térmica anual. A insolação varia entre 200 e 240 horas/mês
(Barbiére, 1984), com exceção do período entre setembro e novembro, quando varia
de 150 a 190 horas/mês. A região é caracterizada pela existência de duas estações
5
Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
bem marcadas: uma estação estival úmida e uma invernal seca (Nimer, 1989). O verão
é caracterizado pela predominância de ventos de direção NE, enquanto que o inverno
é marcado por períodos descontínuos de ventos do S-SW, ligados à subida de “frentes
frias”.
Estação Climatológica de CABO FRIO (Álcalis)/RJ – 1961/90
Lat : 22°59' S Long : 42°02' W Alt : 7,00 m
MÊS
JAN
FEV
MAR
ABR
MAI
JUN
JUL
AGO
SET
OUT
NOV
DEZ
EVAPORAÇÃO INSOLAÇÃO PRECIPITAÇÃO
(mm)
(hs)
(mm)
80,9
78,5
77,4
78,1
71,2
67,5
78,3
79,8
83,3
78,7
79,8
78,6
239,8
235,2
227,8
197,7
214,3
201,1
218,5
203,7
156,2
179,1
189,6
201,6
78,1
44,1
52,8
78,3
69,1
43,9
44,7
36,1
61,0
80,7
81,0
101,1
TEMPERATURA
MÉDIA
COMPENSADA (ºC)
25,1
25,4
25,4
24,3
22,8
21,6
21,3
21,2
21,3
22,2
23,3
24,5
UMIDADE
RELATIVA
(%)
82,0
82,0
82,0
80,0
81,0
81,0
80,0
81,0
81,0
82,0
82,0
82,0
Tabela 1: Cabo Frio - Normais mensais de 1961 a 1990
Precipitação: Comparando-se uma série de dados de algumas estações
meteorológicas do Estado do Rio de Janeiro com outras da região da caatinga
(Nordeste do Brasil e norte de Minas Gerais), observou-se que em Cabo Frio chove em
média 770 mm/ano, enquanto no resto do estado as precipitações são superiores a
1100 mm/ano, podendo atingir quase 2000 mm/ano nas áreas mais chuvosas (Angra
dos Reis). Entretanto, várias estações da caatinga apresentam totais anuais
semelhantes aos de Cabo Frio, em torno de 800 mm/ano, como se pode observar na
figura 3.
Insolação: Os dados do total anual de horas de insolação de Cabo Frio também são
superiores aos das outras estações fluminenses (cerca de 2500 horas contra 1700 a
2200 horas), ficando, entretanto, na média das estações da caatinga. (figura 4).
Considerando que há grande diferença latitudinal entre as duas regiões estudadas, a
semelhança de insolação, entre Cabo Frio, RJ e a Caatinga nordestina, pode estar
associada à umidade relativa do ar e à frequência de nuvens.
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Fazendo-se a análise através de Box plot (figura 5), verifica-se que Cabo Frio e
Iguaba, distantes entre si apenas 14 km, têm precipitação considerada como outliers
quando comparados com seu entorno. Já com a caatinga, a região de Cabo Frio se
enquadra perfeitamente nos valores medianos, considerando precipitação,
evaporação, insolação e umidade relativa.
A análise de grupamentos indicou que as menores distâncias euclidianas entre Cabo
Frio e os municípios da Caatinga foram com Palmeira dos Índios (AL) - 1,25; Araçuaí
(MG) - 2,17 e Jacobina (BA) - 2,88 (figuras 6 e 7).
7
Totais
anuais
(h)
2900
2700
2500
2300
2100
1900
1700
1300
Fortaleza (CE)
Campos Sales (CE)
Crateús (CE)
Barbalha (CE)
Bom Jesus da Lapa
(BA)
Palmeira dos
Índios(AL)
Estações
Figura 4: Insolação (total de horas/ano) nas estações meteorológicas de Cabo Frio e da caatinga.
8
Cabo Frio
Pedra Azul (MG)
Araçuí (MG)
Senhor do Bonfim
Vitória da
(BA)
Conquista(BA)
Remanso (BA)
Morro do Chapéu
(BA)
Paulo Afonso (BA)
Lençóis (BA)
Jacobina (BA)
Itaberaba (BA)
Cariranha (BA)
Caetité (BA)
Barra (BA)
Petrolina (PE)
Garanhuns (PE)
Cabrobó (PE)
Arco Verde (PE)
Campina Grande
(PB)
Monteiro (PB)
0
Mossoró (RN)
Macau (RN)
Florania (RN)
Ceará Mirim (RN)
Apodi (RN)
Tauá (CE)
Niterói (Ilha do Modesto)
Manoel Ribeiro (Maricá)
Bom Jesus do Piauí (PI)
Pedra Azul (MG)
Vitória da Conquista (BA)
Remanso (BA)
Paulo Afonso (BA)
Morro do Chapéu (BA)
Lençóis (BA)
Jacobina (BA)
Itaberaba (BA)
Cariranha (BA)
Caetité (BA)
Araçuí (MG)
Senhor do Bonfim (BA)
Palmeira dos Índios (AL)
Bom Jesus da Lapa (BA)
Barra (BA)
Petrolina (PE)
Garanhuns (PE)
Cabrobó (PE)
Arco Verde (PE)
Monteiro (PB)
Campina Grande (PB)
Mossoró (RN)
Macau (RN)
Florania (RN)
Ceará Mirim (RN)
Apodi (RN)
Tauá (CE)
Sobral (CE)
Quixeramobim (CE)
Fortaleza (CE)
Crateús (CE)
Campos Sales (CE)
Barbalha (CE)
Teresina (PI)
Picos (PI)
Paulistana (PI)
Parnaíba (PI)
Floriano (PI)
Cabo Frio
Iguaba
Macaé
Rio de Janeiro
Rio Bonito
Rio Mole (Saquarema)
Palmital (Saquarema)
Maricá
Juturnaíba (Araruama)
Sambaetiba (Itaboraí)
Itaboraí
Total anual
(mm)
Quixeramobim (CE)
Sobral (CE)
1500
Teresina (PI)
200
Picos (PI)
800
Tanguá
1000
Paulistana (PI)
1200
Parnaíba (PI)
1400
Niterói (Horto Florestal)
1600
Floriano (PI)
400
Barra de São João
600
Bom Jesus do Piauí
(PI)
Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
Precipitação total anual - Estações da Caatinga e do Estado do Rio de Janeiro
Estações meteorológicas
Figura 3: Total anual (mm) de precipitação de estações meteorológicas do entorno de Cabo Frio e da caatinga.
Caatinga e Cabo Frio- Insolação (h)
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Box Plot Caatinga e Cabo Frio:
Precipitação, Evaporação, Insolação e Umidade Relativa
Boxplot Precipitação Cabo Frio e Entorno
1500
4500
1400
4000
Paulistana (PI)
3500
1300
3000
1200
2500
1100
2000
1500
1000
Itaberaba (BA)
Bom Jesus do Piauí (PI)
1000
900
800
Cabo Frio
Iguaba
700
Ppt (mm)
Median = 1168
25%-75%
= (1140,5, 1285,5)
Non-Outlier Range
= (1055, 1432)
Outliers
Extremes
500
0
-500
Precip
Insola
Evapo
Umidade rel
Median
25%-75%
Non-Outlier Range
Outliers
Extremes
Figura 5: Box plot de: a) precipitação, evaporação, insolação e umidade relativa da Caatinga e Cabo Frio e b) da precipitação de Cabo Frio e entorno.
9
Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
D e n d o g ra m a d o s 3 5 m u n icíp io s
A m a lg a m a çã o d e g ru po s p e lo m é to d o d e va riâ n cia m ín im a;
D istâ n cia E u clid e an a e n tre m un icíp io s.
V a riá veis p a d ro n iza d a s
B o m J e s u s d o P ia u í
F lo ria n o
S o b ra l
P ic o s
Q u ix e ra m o b im
Apodi
M o s s o ró
Macau
P a u lo A fo n s o
B a rb a lh a
Tauá
B om Jesus da Lapa
C a rira n h a
C ra te ú s
F lo ra n ia
B a rra
R emanso
P a u lis ta n a
C a b ro b ó
P e tro lin a
C a m p o s S a le s
M o n te iro
A rc o V e rd e
C a e tité
C a m p in a G ra n d e
P a lm e ira d o s In d io s
A ra ç u i
J a c o b in a
S e n h o r d o B o n fim
P e d ra A z u l
C a b o F rio
Ita b e ra b a
G a ra n h u n s
M o rro d o C h a p é u
V itó ria d a C o n q u is ta
0
5
10
15
20
25
30
D istâ n cia d e lig a çã o
Distância Euclidiana de Cabo Frio aos municípios da Caatinga
C21= Palmeira dos Indios (AL); C27=Jacobina (BA); C33=Araçui (MG)
C_1
C_2
C_3
C_4
C_5
C_6
C_7
C_8
4.63
4.01
6.38
5.01
4.17
4.22
4.50
3.55
C_9
C_10
C_11
C_12
C_13
C_14
C_15
C_16
3.14
4.31
3.71
4.18
3.27
3.20
2.40
3.66
C_17
C_18
C_19
C_20
C_21
C_22
C_23
C_24
3.57
5.63
3.58
5.36
1.95
4.30
3.94
4.27
C_25
C_26
C_27
C_28
C_29
C_30
C_31
C_32
4.36
3.92
2.88
4.58
3.83
4.48
3.48
3.81
C_33
C_34
C_35
2.17
3.10
0.00
Figura 6: Análise multivariada (Cluster com matriz de distância) comparando-se as variáveis:
evaporação, insolação, precipitação e umidade relativa, entre as estações meteorológicas de
Cabo Frio e 34 estações da caatinga.
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Figura 7: Mapa de localização dos municípios da caatinga cujo clima mais se assemelha a
Cabo Frio
PALEOCLIMAS
A região de Cabo Frio foi também objeto de estudos paleoambientais (Coe, 2009;
Coe et al, 2007, 2008, 2009), a fim de inferir mudanças na sua vegetação e,
consequentemente do clima, durante o Quaternário. Para tal foram utilizados como
indicadores silicofitólitos extraídos de perfis de solo. Foram calculados índices de
densidade arbórea (D/P= fitólitos de dicotiledôneas lenhosas/ fitólitos de Poaceae).
Se interpretarmos os períodos de maior densidade arbórea como mais úmidos e os
de menor densidade como mais secos, podemos inferir que há 13.000 anos cal BP,
final do Pleistoceno, o clima na região de Cabo Frio era mais seco que o atual.
Os resultados fitolíticos sugerem que no final do Pleistoceno (13.000 anos cal BP), a
vegetação era menos arbórea que atualmente, podendo ter ocorrido uma vegetação
semelhante em torno de 5.000 anos cal BP. O período de maior densidade arbórea
durante o Holoceno deve ter ocorrido em cerca de 4.500 anos cal BP. As mudanças
mais significativas da vegetação foram observadas entre 6.210 anos cal BP e 5.600
anos cal BP, com menores valores do índice D/P. Estes resultados foram corroborados
por análises δ13C (mais enriquecido, característico do predomínio de gramíneas) e de
fenóis das ligninas, índice que apresentou neste período um aumento da razão C/V
(aumento de angiospermas não lenhosas).
11
Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
CONCLUSÕES
Das análises realizadas, conclui-se que Cabo Frio tem precipitação
significativamente menor que o seu entorno, ao mesmo tempo em que se assemelha à
caatinga, quanto à precipitação, evaporação, insolação e umidade relativa. Comprovase assim, também por análise numérica de dados climatológicos, a existência do
“enclave” climático. Este contraste pluviométrico em relação ao restante do Estado do
Rio de Janeiro proporciona dois climas distintos a uma reduzida distância: um clima
tropical úmido, dominando o estado, e um clima semiárido em Cabo Frio.
As razões que respondem pela existência desse enclave climático são múltiplas e
complexas, destacando-se a flutuação climática ocorrida no Quaternário, que se
observou no litoral leste (Ab’ Saber, 1973) e as condições climáticas especiais da área.
Estas peculiaridades climáticas têm sido explicadas por fatores como a grande
distância da linha de costa até a Serra do Mar e a emergência de águas frias em uma
costa dominada por correntes quentes (fenômeno da ressurgência), resultando na
atenuação das precipitações e numa dinâmica climática diferenciada durante os meses
de janeiro e fevereiro (Barbiére, 1975). Esta ressurgência é do tipo intermitente,
intensificada pelos fortes ventos de nordeste, os quais são fortalecidos durante a
primavera-verão. Um fator topográfico explica porque este fenômeno é mais intenso
na região de Cabo Frio. Nesse ponto, a costa brasileira muda da direção norte-sul para
leste-oeste, inflexão que provoca uma zona de divergência entre a costa e a Corrente
do Brasil.
Estudos paleoambientais (análises fitolíticas) na região não indicam uma grande
mudança no tipo de cobertura vegetal: a vegetação desde 13.000 anos cal BP foi
sempre de tipo pouco arbórea (floresta xeromórfica), sugerindo que a vegetação local
não atingia a densidade arbórea característica das florestas úmidas do restante do
litoral fluminense. Os resultados das análises fitolíticas foram correlacionados com
outros estudos paleoambientais sobre a região. As variações no nível do mar,
registradas a nível regional (costa leste do Brasil), não parecem ter relações diretas
com as mudanças na cobertura vegetal de Cabo Frio. Estas mudanças parecem ser
mais influenciadas por variações na intensidade da ressurgência, de âmbito local. O
enclave climático da região de Cabo Frio deve existir desde o início do Holoceno, com
períodos relativamente mais ou menos úmidos, mas sempre com características mais
áridas que o restante do litoral sudeste brasileiro.
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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física
II Seminário Ibero-Americano de Geografia Física
Universidade de Coimbra, Maio de 2010
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