REVISÃO DA LITERATURA Implantes em Pacientes Jovens: Contornamos a Contra-indicação? Implants in Young Patients: Did We Outline to Against Indication? Frederico Nigro* Katia Cristina Beltrame** Marcelo Sigolo de San Juan*** Nigro F, Beltrame KC, San Juan MS de. Implantes em pacientes jovens: contornamos a contra-indicação? Rev Bras Implantodont Prótese Implant 2005; 12(47/48): 254-8. Certas situações encontradas em crianças e pacientes jovens fazem com que o profissional pense na utilização de implantes osseointegrados na reabilitação destes casos. Pacientes jovens ainda apresentam crescimento ósseo e dental, o que pode gerar complicações futuras quando do uso de implantes. O presente artigo traz uma revisão da literatura com o propósito de se estabelecer parâmetros e condições, para que se possa lançar mão dos implantes osseointegrados na reabilitação de pacientes jovens em situações específicas. PALAVRAS-CHAVE: Implantes dentários; Osseointegração; Desenvolvimento ósseo; Crescimento e desenvolvimento. INTRODUÇÃO Desde a introdução da osseointegração por Brånemark, a implantodontia vem passando por avanços significativos, tanto nas técnicas cirúrgicas, como nos próprios sistemas de implantes. Atualmente, pode-se contar com técnicas cirúrgicas avançadas, tais como levantamento de seio maxilar, enxertos ósseos (mento, ramo de mandíbula, ilíaco e outros), técnicas de summers e outras evoluções que auxiliam no melhor posicionamento dos implantes e na sua estabilidade primária. Além destas técnicas, os sistemas de implantes foram desenvolvendo novos desenhos na sua geometria macroestrutural, bem como no tratamento dado à sua superfície, proporcionando, cada vez mais, melhora na qualidade e no tempo da osseointegração. Não obstante, pode-se ainda lançar mão do uso dos biomateriais para determinadas situações. A despeito de todas essas evoluções, ainda hoje uma questão permanece como dúvida: O quão cedo se pode instalar implantes em um paciente? Brånemark et al. (1987) já contra indicaram implantes em pacientes muito jovens, principalmente em menores de 16 anos, no entanto, com a difusão da implantodontia as pressões exercidas sobre os profissionais para que se lance mão de implantes em pacientes jovens vem aumentando. O importante a ser considerado na instalação de implantes é a idade biológica e não a cronológica do paciente (Spiekermann, 2000). Torna-se importante então, o conhecimento dos vetores de crescimento a fim de se decidir por um tratamento com o uso de implantes osseointegrados, uma vez que o desenvolvimento esquelético e dental é grande durante a infância e tendo novos picos durante a adolescência e continuando lentamente até atingir-se a maturidade óssea total (Cronin, 1998). * Mestrando em Implantodontia pela UNISA; Especialista em Prótese pela UNIP; Implantodontista à 13 anos; Rua Botucatu 572, Cj. 11, Vila Clementino – CEP 04023-061, São Paulo, SP; [email protected] ** Especialista em Cirúrgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial; Mestranda em Implantodontia pela UNISA *** Especialista em Implantodontia pela UMESP; Mestrando em Implantodontia pela UNISA Professor de Cirurgia Avançada – CETO/INP; Professor de Cirurgia e prótese sobre implantes – INP / NEO Implantes em Pacientes Jovens: Contornamos a Contra-indicação? Certas condições como a perda traumática de em adultos jovens têm a melhor chance de sucesso um dente, anodontias congênitas parciais, princi- em longo prazo. Em 1994, os mesmos autores re- palmente as displasias ectodérmicas, e em alguns lataram modelos de pesquisa demonstrando que os casos de tumores, são situações que são encontra- implantes osseointegrados impedem o mecanismo de das em pacientes jovens, que faz com que se pense crescimento compensatório da dentição natural na na utilização dos implantes na reabilitação destes mandíbula, deixando um implante não suportado por casos (Percinoto, 2001). osso ou submerso. A melhor idade para a colocação O tratamento de escolha, inicialmente nestes de implantes em pacientes jovens é após os 15 anos casos, deve ser feito por meio do uso de próteses para as meninas e aos 18 anos para os meninos, ge- removíveis, uma vez que estas possibilitam fácil rando assim um melhor prognóstico. Se um implante substituição nos períodos de crescimento. é colocado durante o crescimento ativo, ele pode ser Do ponto de vista fisiológico, a conservação do deslocado ou mal posicionado pelo crescimento con- osso alveolar pode ser a razão mais importante para o tínuo. Os mesmos autores, em 1998, relataram que uso de implantes nos pacientes em crescimento e em a reabilitação de pacientes jovens edêntulos tem sido alguns casos pode beneficiar, estimulando o desenvol- realizada com próteses removíveis antes da maturação vimento do processo alveolar (Percinoto, 2001). esquelética e dentária. Com o aumento da predicta- As maiores complicações e falhas encontradas bilidade dos implantes em forma de raiz, nos últimos nos implantes dentais instalados em pacientes jo- 10 anos, existe um interesse potencial na utilização vens referem-se à resposta vertical de crescimento de implantes dentais em pacientes em crescimento. dos dentes adjacentes e do processo alveolar, uma Do ponto de vista fisiológico a conservação do osso vez que os implantes funcionam como uma anqui- pode ser uma importante razão para a colocação de lose não se adaptando às mudanças secundárias implantes em pacientes jovens. do crescimento desse processo alveolar (Percinoto, Existem mudanças adaptativas nos adultos, segundo Oesterle, Cronin (2000), essas mudanças 2001). Rossi (2003) demonstrou, por meio de um caso oclusais podem resultar na perda da oclusão verti- clínico, acompanhando durante 15 anos, esse tipo cal e no mau posicionamento dos dentes naturais de anquilose, onde foi registrada uma discrepância adjacentes, relativo à coroa do implante. Essas mu- entre o colo do implante e a junção amelocementária danças requerem ajustes de manutenção ou possível do dente adjacente de 9mm. reposição da coroa do implante como resultado do Nesse mesmo artigo o autor mostrou que o crescimento e das mudanças estéticas da idade. maxilar reabsorve no aspecto vestibular durante o Segundo Becktor et al. (2001) pacientes com crescimento vertical em conformidade com que se displasia ectodérmica freqüentemente necessitam encontra na literatura. de tratamento protético durante seu desenvolvimento; em uma análise de 12 anos de crescimento PROPOSIÇÃO revelou-se o deslocamento dos implantes, tanto na Por uma revisão de literatura, o presente artigo maxila, quanto na mandíbula. A variação do cresci- tem o objetivo de estabelecer critérios e em que mento de indivíduo para indivíduo e as dificuldades condições se torna viável a utilização de implante em predizer a quantidade e a direção do crescimento osseointegrados em pacientes que ainda se encon- devem ser consideradas. tram em fase de crescimento ósseo. Bergendal (2001) sugeriu que o tratamento protético em pacientes em crescimento deveria REVISÃO DA LITERATURA Cronin et al. (1993) sugeriram que um implante preferencialmente ser realizado por uma equipe multidisciplinar. osseointegrado na maxila permanece estacionado no Bonin et al. (2001) propuseram cirurgia re- osso que o circunda e não se adapta à remodelação construtiva com implantes instalados precocemente óssea. Implantes colocados na puberdade tardia ou para os casos excepcionais de displasia ectodérmica. RBP – Revista Brasileira de Implantodontia & Prótese sobre Implantes 2005; 12(47/48):254-8 255 Implantes em Pacientes Jovens: Contornamos a Contra-indicação? Um estudo multicêntrico prospectivo desta doença implantes não acompanham o crescimento nor- poderia ser útil. mal dos maxilares e se comportam como dentes Percinoto et al. (2001) recomendaram que anquilosados, também podendo interferir no cres- se deve esperar o completo crescimento dental e cimento normal do processo alveolar, resultando esquelético, exceto para casos severos de displasia numa evidente infraposição. O fator mais impor- ectodérmica. A localização do implante, o sexo do tante a ser visto é o crescimento esquelético, o paciente e o nível da maturação esquelética são os qual necessita estar completo e testado por meio fatores mais importantes na decisão final de quando de radiografias da mão do paciente ou análise se colocar implantes. cefalométrica, por pelo menos 1 ano. Também, Imirzalioglu et al. (2002) relataram que a dis- de acordo com o caso relatado, da colocação de plasia ectodérmica é caracterizada pela ausência ou um implante no local do incisivo central superior deficiência dos processos alveolares, sendo que a oti- esquerdo, concluíram que a colocação de um único mização cirúrgica e protética varia em relação à idade implante nesta região é contra-indicada. do paciente e a quantidade de osso que está presente, DISCUSSÃO esta última sendo o principal problema, quando este osso é insuficiente para a colocação de implantes. osseointegrados em pacientes jovens, entre elas, co de displasia ectodérmica e oligodontia, onde pode-se salientar os traumas, anodontias, tumores, os implantes instalados não acompanharam o displasia ectodérmica e outras. crescimento ósseo dos dentes naturais e suas Nos últimos anos, com a predictabilidade dos estruturas adjacentes, conseqüentemente ficando implantes em forma de raiz, o interesse pela utiliza- os implantes numa infraposição em relação aos ção de implantes nesses pacientes vêm aumentando dentes naturais. (Cronin, 1998). Como solução para o caso, os autores fizeram No entanto, do ponto de vista fisiológico, ainda uso da distração osteogênica, que posicionou os tem-se que reagir com cautela a esses tratamentos implantes e suas estruturas circundantes num nível devido aos vetores de crescimento existente nesses mais adequado da relação coroa/implante. pacientes. Com essa técnica os autores observaram, além Cronin (1994) sugeriu que a melhor idade do crescimento ósseo, uma diminuição da bolsa para se instalar implantes em pacientes jovens é periodontal existente inicialmente no caso. de 15 anos para o sexo feminino e de 18 para o Guckes et al. (2002) avaliaram a sobrevida masculino. de implantes orais em pacientes de várias idades Percinoto (2001) recomenda que se espere o com displasia ectodérmica e hipodontia severa, por completo crescimento dental e esquelético, excetu- um período de 0 a 78 meses após a reabertura dos ando-se os casos de displasia ectodérmica. implantes. Observa-se, no entanto, que mesmo nos casos Com relação à idade, os pacientes foram di- de displasia ectodémica (Guckers, 2002; Imirzalio- vididos em 3 grupos: menor que 11 anos; de 11 a glu, 2002; Bonin, 2001; Becktor, 2001) problemas 18 anos; maior que 18 anos. ocorrem devido ao fato de que os implantes com- A taxa de sucesso dos implantes instalados na mandíbula foi de 91% e na maxila de 76%, os auto- portam-se como um dente anquilosado ao longo do crescimento ósseo (Rossi, 2003). res atribuíram essa diferença devido aos padrões de Torna-se então fundamental que tal tipo de crescimento ósseo serem diferentes para a maxila tratamento tenha uma execução multidisciplinar e a mandíbula, fazendo com que algumas destas (Bergendal, 2001). próteses, para um melhor acomodamento ao plano oclusal, fossem substituídas. Rossi, Andreasen (2003) relataram que os 256 Várias situações sugerem o uso de implantes Celar et al. (2002) relataram um caso clíni- Apesar do sucesso da osseointegração nesses pacientes (Gucker, 2002), inúmeros problemas quanto à reabilitação protética vêm sendo relata- RBP – Revista Brasileira de Implantodontia & Prótese sobre Implantes 2005; 12(47/48):254-8 Implantes em Pacientes Jovens: Contornamos a Contra-indicação? dos com as mais diversas soluções possíveis (Celar, 2002; Oesterle, 2000; Rossi, 2003). Nestes casos, para se ter certeza da parada do crescimento, pode-se lançar mão de radiografias Mediante o exposto, parece conveniente que cefalométricas e seus traçados e repetir as mesmas o uso de implantes osseointegrados só se realize após 1 ano. Se houver estabilidade, pode-se assumir quando da maturação óssea. que há maturidade óssea. Deve-se levar em conta que a idade cronoló- CONSIDERAÇÕES FINAIS gica nem sempre coincide com a idade óssea do indivíduo, uma vez que uma é altamente influenciada por fatores múltiplos relacionados às condições fisio- Mediante o exposto nesse artigo, pode-se concluir que: lógicas, psíquicas, nutricionais e sócioeconômicas. 1 – Não existe um consenso entre os autores Para a determinação da idade óssea, ainda a para se afirmar a viabilidade de se instalar implantes análise de radiografia de mão e punho (Índice Carpal), nos permite diagnosticar o maior pico de crescimento e o término deste para cada indivíduo. O fim do crescimento ósseo, segundo alguns em pacientes jovens; 2 – Em algumas situações, pode-se lançar mão de implantes osseointegrados para pacientes jovens, sabendo-se dos problemas futuro que isso acarretará; autores, varia de idade e conforme o sexo. Para Ricketts (1968) o fim do crescimento para 3 – Preferencialmente, deve-se esperar a meninos é em média de 18,5 anos e para meninas maturidade óssea do indivíduo para a instalação de 14,5. de implantes; Para Björk (1967) situa-se em 19,5 anos para 4 – Existem divergências sobre a idade de ma- meninos e 15,0 para meninas e para Bambha (1963) turidade óssea, podendo lançar-se mão de análises fica em 19,69 anos para meninos e 15,6 para as de índices para se estabelecer esses critérios; Com tudo o que foi colocado uma pergunta meninas. Pode haver variações que vão dos 14 aos 23 anos para o sexo feminino e dos 17 aos 23 para o ainda permanece: Contornamos a contra-indicação de se instalar implantes em pacientes jovens? sexo masculino. Nigro F, Beltrame KC, San Juan MS de. Implants in young patients: did we outline to against indication? Rev Bras Implantodont Prótese Implant 2005; 12(47/48):254-8. Certain situations found in children and young patients do with that the professional thinks about the use of osseointegrated implants in the rehabilitation of these cases. Young patients still present bone and dental growth what can generate future complications when of the use of implants. The present article brings a revision of the literature with the purpose of establishing parameters and conditions, so that can throw hand of the osseointegrated implants in the young patients’ rehabilitation in specific situations. KEYWORDS: Dental implants; Osseointegration; Bone development; Growth and development. REFERÊNCIAS Bambha JK, Vam Natta P. Longitudinal study of growth in relation to skeletal maturation during adolescence. Am J Orthodont 1963; 49:481-93. Becktor KB, Becktor JP, Keller EE. Growth analysis of a patient with ectodermal dysplasia treated with endosseous implants: A case report. Int J Oral Maxillofac Implants 2001; 16(6):864-74. Bergendal B. 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