5910187 – Biofísica II – FFCLRP – USP – Prof. Antônio Roque – Aula 22 Registro extracelular de campos O fluido extracelular é um meio condutor que circunda os neurônios. Quando os neurônios estão em repouso, suas membranas estão polarizadas de maneira uniforme ao longo de suas extensões: o potencial do lado de dentro está a um valor negativo, por exemplo, −70 mV, em relação ao potencial do lado de fora em todos os pontos dos neurônios. Nesse caso, não há fluxo líquido de corrente através da membrana em nenhum ponto de nenhum dos neurônios. Se um dos neurônios fica ativo, a sua membrana deixa de estar uniformemente polarizada: a diferença de potencial entre o lado de dentro e o lado de fora do neurônio tem um valor em um ponto de um de seus dendritos que é diferente do valor no soma que, por sua vez, é diferente do valor da diferença de potencial de membrana em um ponto do axônio. Além disso, à medida que o potencial de ação se propaga pelo axônio o potencial de membrana terá valores diferentes em diferentes pontos do axônio. Essa não uniformidade na distribuição do potencial de membrana pela superfície do neurônio produz fluxos de correntes extracelulares entre diferentes pontos do neurônio. O meio extracelular, portanto, funciona como um condutor volumétrico (isto é, um meio condutor tridimensional). 1 5910187 – Biofísica II – FFCLRP – USP – Prof. Antônio Roque – Aula 22 O fluxo de corrente pelo espaço extracelular (condutor volumétrico) produz campos elétricos extracelulares que exercem forças sobre cargas elétricas presentes nesse espaço. Esses campos elétricos estão associados a diferenças (gradientes) de potencial elétrico entre pontos distintos do espaço extracelular que podem ser medidas por eletrodos colocados nesse meio. Esta é a base para o chamado registro extracelular de sinais elétricos (isto é, quando os eletrodos que captam os sinais elétricos associados à atividade dos neurônios são colocados fora dos neurônios, a uma certa distância deles). Quando apenas um neurônio produz um fluxo extracelular de corrente, o campo elétrico associado a essa corrente é tão fraco que o eletrodo extracelular precisa ser colocado muito próximo a ele para detectar um sinal significativo. Um registro extracelular desse tipo é chamado de registro extracelular unitário, pois ele capta de maneira muito boa a atividade elétrica de um único neurônio (seus potenciais de ação, por exemplo). Normalmente, porém, é muito difícil realizar registros unitários e é mais comum o registro de atividades de populações de neurônios. Esses registros da atividades coletiva de muitos neurônios são denominados de registros de potenciais de campo. 2 5910187 – Biofísica II – FFCLRP – USP – Prof. Antônio Roque – Aula 22 Quando o registro do potencial de campo é feito pela inserção de um ou mais microeletrodos (de metal ou vidro) no interior do tecido cerebral (dentro do córtex ou de alguma outra estrutura do cérebro, por exemplo), cada microeletrodo capta sinais de uma população relativamente localizada de neurônios. Por essa razão, esse tipo de registro é denominado de registro de potencial de campo local. Os registros de potenciais de campo locais são invasivos e costumam ser usados apenas em pesquisas com animais ou em procedimentos cirúrgicos. Na maioria das aplicações clínicas, os registros de potenciais de campo são feitos por eletrodos colocados sobre a superfície do couro cabeludo (sem necessidade de procedimento cirúrgico) ou sobre a superfície do cérebro (com necessidade de procedimento cirúrgico). No primeiro caso o registro é chamado de eletroencefalograma (EEG) e, no segundo, é chamado de eletrocorticograma (ECoG). Nesses dois tipos de registro extracelular, a população de neurônios captada pelos eletrodos é tão grande que eles costumam ser chamados de registros de atividade de massas neurais. Nas aulas anteriores, quando estudamos a geração e a propagação de um potencial de ação em um neurônio, supusemos que o espaço extracelular está todo ele ao mesmo potencial, que era tomado como zero (o espaço extracelular era o terra do circuito). 3 5910187 – Biofísica II – FFCLRP – USP – Prof. Antônio Roque – Aula 22 Essa aproximação é justificável quando se modela uma única célula porque a resistividade do espaço extracelular é muito mais baixa que a do meio intracelular. Na realidade, porém, se todo o meio extracelular estivesse ao mesmo potencial não haveria gradientes de potencial extracelulares e não seria possível realizar registros extracelulares. A evidência fornecida pelos registros eletroencefalográficos, portanto, mostra que existe fluxo de correntes pelo espaço extracelular durante a atividade dos neurônios e que esse fluxo de corrente produz gradientes espaciais de potencial elétrico. Para maiores informações, ver o artigo de Buzsáki, Anastassiou e Koch (colocado na página da disciplina): Buzsáki, G., Anastassiou, C. A. and Koch, C. (2012), The origino f extracelular fields and currents – EEG, ECoG, LFP and spikes. Nature Reviews Neuroscience, 13:407-420. http://www.buzsakilab.com/content/PDFs/BuzsakiKoch2012.pdf 4