A relação abelha-flor em Byrsonima sericea DC

Propaganda
II SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2013
245
A relação abelha-flor em Byrsonima sericea DC (Malpighiaceae) em área de
restinga do Espírito Santo
Camila S. Carpim¹; Tânia M. Guerra¹ & Geovana A. Mendes¹
1-Laboratório de Interações Biológicas, Departamento de Ciências Biológicas,
Universidade Federal do Espírito Santo, Av. Marechal Campos, nº 1468,
Maruípe, Vitória,
ES. CEP:
29.040-090.
Endereço
para correspondência:
[email protected]
Introdução
As abelhas (Apocrita, Apoidea) são insetos comuns encontrados em quase todos os
lugares, particularmente em flores (Triplehorn & Jonnson, 2011). São abundantes tanto
em espécies quanto em indivíduos. Alimentam-se de recursos florais, e o consumo de
pólen como fonte protéica é uma sinapomorfia do grupo (Michener, 2007).
Desempenham um papel extremamente importante na polinização das plantas e,
consequentemente nas comunidades naturais (Triplehorn & Jonnson, 2011).
Malpighiaceae compreende cerca de 75 gêneros e 1300 espécies distribuídas em regiões
tropicais e subtropicais (University of Michigan Herbarium, 2013). Byrsonima Rich. ex
Kunth tem ampla distribuição no Brasil. E Byrsonima sericea (Murici-da-praia) ocorre
nos domínios fitogeográficos da Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica (Lista de Espécies
da Flora do Brasil, 2013).
A polinização é um dos itens mais importantes em conservação da natureza. Para
Withgott (1999 apud Kerr et al., 2000), as pesquisas e os assuntos biológicos que mais
afetam a conservação, são os referentes à polinização, pois esta afeta a reprodução das
plantas e a vida de todos os animais e microorganismos dela dependentes. Estudos de
polinização na restinga são importantes, pois esses ecossistemas são considerados áreas
de preservação permanente, devido à acelerada degradação que vêm sofrendo pela ação
antrópica e ao número reduzido de estudos sobre a fauna, flora e as interações entre os
organismos que vivem nesse ambiente (Oliveira-Rebouças & Gimenes, 2004).
Este trabalho teve como objetivo verificar a composição da fauna de abelhas visitantes
de B. sericea em uma área de restinga.
Materiais e Métodos
O estudo foi realizado em uma área de restinga, o Parque Estadual Paulo César Vinha
(20°33’-20°38’S e 40°23’- 40°26’W), localizado em Setiba, Guarapari, ES.
Foram analisados dez indivíduos de B. sericea quanto às abelhas visitantes. As
observações foram realizadas semanalmente no período de floração, de novembro de
2012 a fevereiro de 2013 (início de frutificação). A seleção da área amostral foi
randômica e baseada na ocorrência de maior concentração de plantas com flores.
Foram feitas observações e registros (descritivo, fotográfico e filmagem) referentes aos
horários de visitação de cada grupo visitante, à frequência de visitas, ao tempo de
permanência nas flores e comportamento de visitação. As abelhas foram coletadas
diretamente nas flores, com frascos mortíferos (Guerra & Orth, 2004) e acetato de etila,
para posterior identificação. Os espécimes não coletados foram identificados por
observações ao menor nível taxonômico possível. O material coletado foi etiquetado,
armazenado em álcool 70% e conduzido ao Laboratório de Interações Biológicas da
Universidade Federal do Espírito Santo (LabIBio/UFES) para ser analisado e
246
CARPIM ET AL: A RELAÇÃO ABELHA-FLOR EM BYRSONIMA SERICEA
identificado até o nível genérico. A identificação foi feita com auxílio de microscópio
estereoscópio binocular Leica (MZ75) e chave de identificação de Silveira et al. (2002).
Posteriormente será depositado na Coleção Entomológica da UFES.
Resultados e Discussão
Recursos. B. sericea pode ser considerada uma planta de pólen, pois não foi constatada
a presença de néctar em suas flores (Covre et al., 2013). As flores apresentam elaióforos
contendo lipídeos florais, um recurso importante para abelhas do gênero Centris, que
são conhecidas por coletar e utilizar óleo de Malpighiaceae para o provimento das suas
células (Buchmann, 1987).
Visitantes e frequência de visitação. Os visitantes mais frequentes das flores de B.
sericea foram quatro morfoespécies de Centris (Centris sp.1, Centris sp.2, Centris sp.3
e Centris sp.4) e uma de Xylocopa. Centris sp.1 foi a mais abundante (34,28% das
visitas), seguida de Centris sp.2 (31,43%), Centris sp.4 (14,28%), Centris sp.3 (11,43%)
e Xylocopa sp. (5,71%). Uma morfoespécie de Meliponini e uma de Halictidae
visitaram as flores apenas uma vez, e não foram consideradas visitantes frequentes. A
freqüência de visitação foi maior durante o início da manhã e diminuiu até tornar-se
muito baixa próxima ao meio dia, horário em que o sol incidia fortemente sobre a
planta.
As visitas de Xylocopa foram registradas apenas no período da manhã. Já as visitas de
Centris iniciavam-se por volta de 7h da manhã e aumentavam gradativamente até às 9h,
depois diminuíam até às 16h, conforme a temperatura aumentava. A temperatura é um
fator determinante para que as abelhas exerçam suas funções normalmente, e
temperaturas muito elevadas fazem com que elas diminuam suas atividades externas
(Michener, 2007).
Todos os espécimes estudados de B. sericea localizavam-se em área aberta, de modo
que ficavam expostos ao sol e à força do vento durante todo o dia. No início da manhã,
as visitas, principalmente de Centris sp.2, eram muito rápidas (cerca de 2 segundos em
cada flor) e conforme as horas passavam, as visitas tornavam-se mais demoradas (até
10s).
Sazonalidade. A produção de flores por B. sericea teve seu auge do meio de dezembro
até janeiro (Covre et al., 2013). Em fevereiro, embora já em início de produção de
frutos, foi constatada a presença de visitantes nas flores disponíveis em menor
abundância. Tal fato indica a importância da disponibilidade destes recursos à biologia
das abelhas visitantes.
Centris sp.3 e Centris sp.4 foram observadas somente em janeiro, enquanto Centris sp.
1 e Centris sp.2 foram observadas durante todo o período da floração. O auge da
floração, portanto, contou com a presença dos quatro espécimes de Centris, e uma de
Xylocopa sp.
Comportamento. Tanto as morfoespécies de Centris quanto a de Xylocopa visitaram
várias flores em diversas inflorescências durante suas visitas e coletaram pólen através
de vibração do corpo (“buzz-pollination”). Em ambos os gêneros essa vibração é
facilmente observada, visto que estas abelhas produzem forte zumbido enquanto
vibram. Centris sp.1 é muito semelhante à Centris sp.3, em relação à coleta de pólen.
Ambas se agarram às pétalas da flor com as pernas medianas e posteriores e manipulam
os estames com as pernas anteriores. Centris sp.2 move o abdome rapidamente quando
II SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2013
247
em contato com os estames. São as abelhas mais ágeis entre as observadas, tanto no
modo de voo quanto no tempo de visitação. Entre as espécies visitantes, apenas Centris
sp.2 interagiu agonisticamente intra e interespecificamente.
A relação entre Centris spp. e B. sericea. B. sericea é autoincompatível (Teixeira &
Machado, 2000), o que destaca a importância de Centris na reprodução dessa planta.
Centris sp.1 e Centris sp.2 foram consideradas os polinizadores potencialmente mais
efetivos de B. sericea na restinga estudada, por apresentarem elevada frequência de
visita nas flores e permanecerem ativas em todos os meses do seu florescimento. Todas
as morfoespécies de Centris visitaram indivíduos próximos de B. sericea da área
amostral, o que indica que a transferência de pólen entre estes indivíduos ocorre.
Acredita-se que por se tratar de espécies robustas e com voo ágil, elas percorram
distâncias maiores, o que permite realizar a polinização de espécimes mais afastados.
Do mesmo modo, B. sericea tem grande valor para Centris, pois sua floração dura um
tempo relativamente longo (quatro meses), oferece grande abundância de flores e tem
boa resistência ao período seco, no qual havia flores em poucas espécies vegetais
(Carpim, observação pessoal). Diversos trabalhos descrevem a relação das abelhas
Centridini com as Malpighiaceae, principalmente com Byrsonima (ver Machado, 2004).
Conclusões
Os visitantes mais frequentes de B. sericea foram quatro morfoespécies de Centris e
uma de Xylocopa. B. sericea é autoincompatível e necessita de Centris spp. e de
Xylocopa sp1 para transportar o pólen de um indivíduo ao outro. Centris spp. tem
grande importância para esta planta, pois mantém-se ativa durante todos os meses da
floração. Como Centris spp. depende dos recursos florais de B. sericea nesta época do
ano, infere-se que a relação entre esses grupos é muito importante para a conservação
dos mesmos.
Agradecimentos
Agradecemos à UFES, à FAPES (PRONEX processo no 52263010) e ao IEMA por
viabilizarem a realização desta pesquisa.
Referências bibliográficas
Buchmann, S. L. 1987. The Ecology of Oil Flowers and their Bees. Annual Review of
Ecology and Systematics, 18: 343-369.
Covre, C.; Guerra, T. M.; Mendes, G. A. & Carpim, C.S. 2013. Inventário das
angiospermas visitadas por abelhas Apidae e seus recursos florais, em uma área
do Parque Estadual Paulo César Vinha, Guarapari, ES. II SIMBIOMA (Em
preparação).
Guerra, T. M. & Orth, A. I. 2004. Direct sampling technique of bees on Vriesea
philippocoburgii (Bromeliaceae, Tillandsioideae) flowers. Biotemas 17(2):191196.
Kerr, W. E.; Assis, M. G. P. & Souza, A. C. M. 2000. Estudos das Abelhas da
Amazônia Central. p. 24 – 26. In: Anais do IV Encontro Sobre Abelhas.
248
CARPIM ET AL: A RELAÇÃO ABELHA-FLOR EM BYRSONIMA SERICEA
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras / Departamento de Biologia / USP,
Ribeirão Preto.
Lista de Espécies da Flora do Brasil 2013. Disponível em: http://floradobrasil.jbrj.gov.br
(29/04/2013).
Machado, I. C. 2004. Oil-collecting bees and related plants: a review of the studies in
the last twenty years and case histories of plants occurring in NE Brazil, p. 255279. In: Freitas, B. M. Solitary bees: conservation, rearing and management for
pollination. Fortaleza, Imprensa Universitária, 285 p.
Michener, C. D. 2007. The Bees of the World. 2. ed. The Johns Hopkins University
Press, Baltimore, 953 p.
Oliveira-Rebouças, P. e Gimenes, M. 2004. Ecology, Behavior and Bionomics Abelhas
(Apoidea) Visitantes de Flores de Comolia ovalifolia DC Triana
(Melastomataceae) em uma Área de Restinga na Bahia. Neotropical
Entomology, 33(3):315-320.
Silveira, F. A.; Melo, G. A. R.; Almeida, E. A. B. 2002. Abelhas Brasileiras Sistemática
e Identificação. 1.ed. Fernando A. Silveira, Belo Horizonte, 253 p.
Teixeira, L. A. G. & Machado, I.C. 2000. Sistema de polinização e reprodução de
Byrsonima sericea DC. (Malpighiaceae). Acta Botanica Brasilica, 14(3):347357.
Triplehorn, C.A. & Jonnson, N.F. 2011. Estudo dos Insetos. 7. ed. Cengage Learning
Ltda, São Paulo, 803 p.
University of Michigan Herbarium - MICH. 2013.
http://herbarium.lsa.umich.edu/malpigh (29/04/2013).
Disponível
em
Download