Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ Cinética da produção de antígeno viral em ovos embrionados a partir de amostras patogênicas e apatogênicas do Vírus da Doença de Newcastle Paula Amorim Schiavo1, Gabrielle Sales de Oliveira1, Cristiana Portz2, Jorge Granja de Oliveira Júnior3, Bernardo Oliveira Loureiro4, Carlos Mazur5 & Cláudio de Moraes Andrade6 1. Graduanda em Medicina Veterinária, bolsista IC-PIBIC/UFRRJ. E-mail: [email protected]; 2. Médica Veterinária, mestranda CPGMV-PV; 3. Médico Veterinário; 4. Graduando em Medicina Veterinária, estagiário LVV/DESP/IV/UFRRJ; 5. Prof. Adjunto DMIV/IV/UFRRJ; 6. Prof. Adjunto DESP/IV/UFRRJ. Laboratório de Viroses Veterinárias, DESP/IV/UFRRJ, BR 465, Km 7, Seropédica, RJ. 23890-000 . Palavras-chave: Newcastle, NDV, Viral Cultivation, Paramyxoviridae. Abstract rapidamente entre aves susceptíveis, em alguns casos de maneira aparentemente misteriosa (MURPHY, et al, 1999). Foi reportada pela primeira vez em Java, em 1926, como doença economicamente importante em galinhas domésticas e perus (KRANVELD, 1926). A primeira descrição da Doença de Newcastle no Brasil data de 1953, quando CUNHA & SILVA realizaram o isolamento da amostra M33 na cidade de Macapá-Amapá, atribuindo o surto da doença à importação de carcaças de frangos congelados provenientes dos Estados Unidos (CUNHA et al, 1955). A partir desta data, a doença se disseminou por todo o território nacional, ocasionando graves perdas econômicas para os avicultores brasileiros (HASTENREITER, 1976). Classificado na família Paramyxoviridae, gênero Rubulavirus (LAMB et al, 1996), este e muitos outros paramixovírus aviários se desenvolvem bem em vários sistemas celulares, mas a técnica mais sensível para o isolamento primário destes vírus é a inoculação em ovos embrionados de galinha com 9 a 10 dias de incubação (ALEXANDER, 1989) (LLENNETE, 1995). Os ovos embrionados de galinha foram introduzidos na bateria de técnicas virológicas em 1940 e rapidamente se tornaram um dos fatores principais no progresso sucedido. Apresentavam vantagens consideráveis sobre os sistemas animais usados até então (coelhos, cobaios e camundongos): é um meio vivo, altamente sensível a vários vírus; é um sistema fechado, teoricamente estéril, relativamente barato e pode ser obtido e manipulado em grandes quantidades. Pode ser inoculado por várias vias que correspondem às sensibilidades e aos diferentes graus de adaptação de vários vírus (MANGUEIRA et al, 1999). A via alantóica é um meio simples de inoculação de ovos embrionados, sendo utilizada na produção de grandes quantidades de We had confronted the viral response of J99, M33 and La Sota strains of Newcastle Disease Virus in one-hundred-eight 10-days-old SPF chicken embryos obtained from immunized against Newcastle Disease hens and non-vaccinated ones, analyzing the haemagglutinating activity of allantoic fluids collected with 24, 48, 72 and 96 hours post-inoculation. It was searched if there was any interference of egg’s origin; if any strain prevailed over another; if any HA title prevailed over another when it was considered egg’s origin. We observed a high HA title in first collects, followed by a decrease and subsequent increase, establishing HA highest titles on allantoic fluids collected with 96 hours post-inoculation, except about La Sota strain in immunized eggs, which higher title was obtained in the first collect. J99 was the strain that provides the greater haemagglutinating titles; La Sota strain provides lower ones. We concluded that the best time to collect allantoic fluids is 96 hours post-inoculation. Chicken embryos obtained from immunized against Newcastle Disease hens may difficult the NDV primary isolation, but can be used for antigen production. Introdução O Vírus da Doença de Newcastle (VDN), um dos mais importantes patógenos de aves de várias espécies, está mundialmente distribuído e produz quadros clínicos que inclui a morte súbita em 100% dos casos à doença subclínica, dependendo da cepa infectante e do hospedeiro (ALEXANDER, 1989). A Doença de Newcastle é uma das mais contagiosas de todas as doenças virais, disseminando-se 165 v. 11, n. 2, p. 165-168, 2001 Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ Cinqüenta e quatro (54) ovos embrionados SPF provenientes de galinhas hiperimunizadas contra a Doença de Newcastle foram adquiridos junto à Granja Guedes, Quatis-RJ. Convencionamos chamar este grupo de ovos “vacinados” (VAC). Inoculação em ovos embrionados: 100 mL de diluições 1/10 em PBS das preparações virais foram inoculadas pela via alantóica em ovos embrionados de galinha com 10 dias de incubação, de acordo com as técnicas de isolamento viral (LENNETE, 1955). A inoculação dos ovos foi feita em baterias de 8 ovos para cada cepa e dia, sendo 4 destes vacinados e 4 não-vacinados, e destes 2 foram inoculados com a cepa correspondente, 1 com PBS na quantidade equivalente e 1 não inoculado, estes 2 últimos como controles do grupo. Os líquidos alantóicos de 12 ovos, sendo 6 vacinados e 6 não-vacinados, foram coletados no 1º dia e testados, como controles do experimento. Os grupos inoculados foram, portanto, divididos segundo a tabela 1. vírus necessárias para o preparo de antígenos para ensaios sorológicos, vacinas, cultivo de espécimes clínicos, etc. Vírus inoculados na cavidade alantóica se propagam nas células endodérmicas da membrana alantóide com subseqüente liberação de vírus no fluido alantóico, portanto tanto a membrana quanto o fluido alantóicos podem ser usados como fontes de vírus (LENNETE, 1995). ALEXANDER (1989) preconizou o uso de ovos obtidos de uma criação soronegativa para VDN, quando o uso de ovos obtidos de uma criação livre de patógenos específicos (SPF) não for possível, afirmando que o uso de ovos de criações com anticorpos para VDN reduziriam a capacidade do vírus se replicar e o sucesso do isolamento viral (ALEXANDER, 1989). No presente estudo, buscamos comparar a resposta viral das cepas patogênicas M33 (IPIC=1,81) (BELLUCI et al, 1999) e J99 (IPIC=1,42) (OLIVEIRA et al, 2000) do VDN e da cepa apatogênica (ALEXANDER, 1989) La Sota à inoculação em ovos embrionados de galinhas hiperimunizadas contra a Doença de Newcastle e em ovos provenientes de criação SPF, analisando a atividade dos líquidos alantóicos coletados com 24, 48, 72 e 96 horas pósinoculação. Pesquisamos a interferência da origem do ovo na replicação viral; se havia predominância de uma cepa sobre a outra; se algum título hemaglutinante prevalecia sobre outro, levando em consideração a origem do ovo. Tabela 1. Esquema de inoculação e colheita por cepa, origem do embrião e momento da colheita. (horas pós-inoculação). Coleta (hs) PBS C. cego La Sota J99 M33 Total Material e Métodos Vírus: as suspensões do VDN, cepas La Sota, J99 e M33, foram previamente cultivadas em ovos embrionados de galinha. A amostra La Sota foi adquirida no comércio, sob a forma de vacina (Newvacin BioVet®). A amostra selvagem J99, identificada e caracterizada pelo Laboratório de Referência Animal do Ministério da Agricultura (LARA-Campinas), foi isolada no Laboratório de Viroses Veterinárias, DESP/IV/UFRRJ, a partir de material fecal coletado em Japeri-RJ (OLIVEIRA et al, 2000). A amostra selvagem M33 do VDN foi obtida junto ao Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ovos embrionados de galinha: cinqüenta e quatro (54) ovos embrionados SPF (Specific Pathogens Free) de galinha foram adquiridos junto à Granja Rezende, Uberaba-MG. Convencionamos chamar este grupo de ovos “não-vacinados” (NON). 0 V 6 6 24 N 6 6 V 3 3 2 2 2 12 48 N 3 3 2 2 2 12 V N 3 3 3 3 2 2 2 2 2 2 12 12 108 72 V 3 3 2 2 2 12 96 N 3 3 2 2 2 12 V 3 3 2 2 2 12 N 3 3 2 2 2 12 Após a inoculação os embriões foram incubados a 37ºC. O líquido alantóico foi coletado com 24, 48, 72, 96 horas pós-inoculação, após serem resfriados a 4ºC por 30 minutos. O sobrenadante foi estocado a -20ºC, após centrifugação por 10 minutos a 600 x g. Prova de Hemaglutinação (HA): foi realizada em placas de 96 cavidades e fundo em “U”. Diluições geométricas do líquido alantóico foram feitas em PBS, adicionadas do sistema revelador e incubadas por 30 minutos em temperatura ambiente. O título foi definido a partir da maior diluição de líquido alantóico capaz de exercer atividade hemaglutinante completa (BRASIL, 1994). Sistema revelador: Suspensão de hemácias de galinha a 1% em PBS, coletadas de aves doadoras derivadas de ovos SPF, 166 Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ mantidas no Laboratório de Viroses Veterinárias da UFRRJ especificamente para este fim. Os ovos provenientes de galinhas hiperimunizadas contra a Doença de Newcastle ofereceram os maiores títulos hemaglutinantes, quando analisadas individualmente cada cepa por intervalo. O único título hemaglutinante médio proporcionado por ovos não-vacinados que prevaleceu sobre o de ovos vacinados, quando pesquisados os maiores títulos por intervalo, foi dado pela cepa M33 às 24 horas. As cepas patogênicas ofereceram os maiores títulos hemaglutinantes, exceto na primeira coleta. A cepa apatogênica apresentou seu maior título hemaglutinante médio, analisando-se todos os resultados em conjunto, na primeira coleta, em ovos vacinados. NAGAI et al. (1979) afirmaram que os altos títulos proporcionados por cepas patogênicas do VDN, em relação a cepas apatogênicas, quando ambas eram inoculadas na cavidade alantóica de ovos embrionados com 11 dias de incubação deviase ao fato de que as primeiras se replicavam em várias membranas embrionárias e extraembrionárias, enquanto cepas apatogênicas se replicavam apenas no endoderma, de acordo com a susceptibilidade das glicoproteínas virais à clivagem proteolítica (NAGAI, et al, 1979). Em todas as amostras se observou um decréscimo dos títulos nas primeiras coletas, seguido de aumento subseqüente, com estabelecimento de alto título nas últimas coletas, refletindo a recuperação dos títulos encontrados ainda no inóculo, nos primeiros dias, e o aumento segundo a replicação, como esperado, nos dias seguintes. Resultados e Discussão Conforme esperado, nenhum dos líquidos alantóicos controle deste experimento apresentou atividade hemaglutinante, não interferindo, portanto, no resultado final. Para a análise comparativa dos demais líquidos alantóicos, calculamos o título hemaglutinante médio de cada grupo, somando-se os títulos hemaglutinantes de cada indivíduo do grupo e dividindo pelo número de indivíduos. Estes estão relacionados nas figuras 1 e 2. O v o s v a c in a d o s 2 50 0 2 04 8 Títulos 2 00 0 1 50 0 1 28 0 1 02 4 7 68 5 12 1 00 0 5 00 6 40 3 84 2 56 35 26 0 2 1 02 4 0 24 hs 48 hs 72 hs 96 hs C o l h e it a L a S o ta M 33 J 99 Figura 1. Cinética da produção de antígeno viral em ovos provenientes de plantel imunizado. Conclusões O vos n ão-vac in ados · Títulos decrescentes para a cepa La Sota em ovos provenientes de galinhas hiperimunizadas com esta cepa demonstram que o uso de tais ovos no isolamento de amostras de campo pode interferir no resultado. 2500 2048 Títulos 2000 1500 1040 1000 · O alto título encontrado na primeira coleta para a amostra La Sota se deve à adaptação da cepa ao embrião. 768 500 0 570 512 272 144 24 hs 256 96 48 hs 192 72 hs · Todas as amostras apresentaram queda dos títulos hemaglutinantes às 48 e 72 horas. Na produção de antígeno viral, o melhor momento para a coleta de líquidos alantóicos é às 96 horas pósinoculação de ovos embrionados com 10 dias de incubação. 96 hs C olh e ita L a Sota M 33 J 99 Figura 2. Cinética da produção de antígeno viral em ovos SPF. 167 v. 11, n. 2, p. 165-168, 2001 Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ · Os títulos encontrados na última colheita são compatíveis com as características de cada amostra (vacinal ou selvagem), reforçando resultados encontrados em outros experimentos (NAGAI et al, 1979). KRANVELD, F.C. A Poultry disease in the Dutch East Indies. Ned. Nd. Bl. Diergeneesk, 28: 448.450. 1926. LAMB, R. & KOLAKOFSKY, D. Paramyxoviridae The Viruses and their Replication. In: Fundamental Virology. 3rd ed. Fields, B.N., Knipe, D.M., Howley, P.M. et al., Lippincott-Raven Publishers, Philadelphia, p. 577-604. 1996. Agradecimentos e Auxílio Financeiro Agradecemos a FAPERJ e ao PIBIC pelo suporte financeiro. LENNETE, E.H.; LENNETE, D.A.; LENNETE, E.T.: Diagnostic Procedures for Viral, Rickettsial, and Chlamydial Infections. 7th ed. American Public Health Association, p. 22. 1995. Referências Bibliográficas MANUGUERRA, J.C.; HANNOUN, C. 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