29º Seminário de Extensão Universitária da Região Sul

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29º Seminário de Extensão Universitária da Região Sul
TEATRO: INSTRUMENTO DE REFLEXÃO HISTÓRICO-CRÍTICA, INTERAÇÃO
SOCIAL E PRÁTICA PEDAGÓGICA
Área temática: Cultura
Dra. Luciana Brito (Coordenadora da Ação de Extensão)
Dra. Luciana Brito1
Ms. Márcio Luiz Carreri2
Ms. Marcus José Takahashi Selonk 3
Aline Ignacio Calahani4
Bruna de Souza Lemos Camargo5
Desirre Bueno Tiburcio6
Ivan Pinheiro de Oliveira7
Kauê Pedroso Gonçalves8
Luis Eduardo Veloso Garcia9
Rodrigo Constantino Mariano10
Palavras–chave: Teatro, História-Crítica, Interação Social, Prática Pedagógica.
Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar os resultados do Projeto de
Extensão Universitária “Teatro: instrumento de reflexão histórico-crítica, interação
social e prática pedagógica”, pertencente ao subprograma Diálogos Culturais do
Programa Universidade Sem Fronteiras. O projeto teve por meta criar, junto às
escolas de ensino fundamental e médio, oficinas de teatro tendo como ponto
fundamental de ação a dinamização o trabalho de extensão e cultura,
proporcionando uma prática pedagógica apoiada na reflexão crítica que, de um
lado construiu o conhecimento da linguagem teatral e, de outro, foi capaz de
desenvolver a capacidade do aluno de receber as impressões do mundo externo
e interno, manifestando respostas pessoais adequadas.
Introdução
Pesquisas demonstram que, no setor educacional, a linguagem teatral vem
passando por um processo de valorização, tanto por estudiosos e artistas como
pelas próprias instituições de ensino, sejam estas de âmbito fundamental e médio ou
de ensino superior. Muitos estudos têm revelado que o teatro, numa perspectiva
1
Doutora em Letras, Diretora do CLCA/UENP/-JAC. Email: [email protected]
Mestre em História, professor do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
3 Mestre em História, professor do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
4 Acadêmica do Curso de Filosofia do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
5 Acadêmica do Curso de História do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
6 Acadêmica do Curso de Letras do CLCA/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
7 Acadêmico do Curso de Matemática do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
8 Acadêmico do Curso de Filosofia do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
9 Acadêmico do Curso de Letras do CLCA/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
10 Acadêmico do Curso de Matemática do CCHE/ UENP/-JAC. Email: [email protected]
2
educacional, trabalha com o potencial das pessoas, estabelecendo uma relação de
trabalho com as todas as disciplinas do currículo escolar, unindo imaginação à
prática e à observação de regras. O jogo teatral possibilita ao adolescente um
espaço para pensar suas atitudes, propiciando a construção de sua identidade e
autonomia.
As Diretrizes Curriculares do Paraná passaram a valorizar novas linguagens
pedagógicas, sendo que o teatro é uma das principais na medida em que envolve
não apenas a leitura silenciosa e isolada de textos, mas também a participação
coletiva e corporal dos alunos, numa perspectiva diversa da tradicional e muito afeita
à busca de formação de sujeitos críticos, em oposição ao mero acúmulo de
informação dita “objetiva” que marca a epistemologia científica convencional. Em
suma, seja pela reescrita e revalorização de sua história, pela atualização da crítica
e da teoria teatrais, seja pelas “novas” perspectivas didáticas e formadoras em
tempos de realidade virtual, o estudo do teatro se impõe como necessário
atualmente.
Para Freire (1996), o papel da educação é formar pessoas emancipadas,
autônomas, conscientes e capazes. A prática pedagógica deve romper com o
modelo tradicional da escola e resgatar a participação do aluno na construção do
processo emancipatório. Nessa proposição, o teatro desencadeia um processo de
aprendizagem construindo pessoas motivadas, críticas, emancipadas, dando início a
uma tomada de consciência necessária à construção de uma sociedade melhor.
Fernando Peixoto, em seu livro O que é teatro (1986), apresenta questões de
grande relevo para os estudiosos que se propõem a trabalhar com essa modalidade
da arte. Ele menciona a trajetória do teatro no cenário nacional e internacional e a
importância dessa arte na formação cultural do indivíduo. Para ele, o teatro, dentre
suas variadas facetas, aprofunda o conhecimento lúdico e crítico da realidade que
cerca os expectadores “engravidando-o de um prazer capaz de torná-los mais
vigorosos enquanto homens racionais, dotados da possibilidade de agir e dominar
as forças da natureza e da sociedade, transformando as relações entre os homens
na necessária urgência de construir democracia e liberdade (PEIXOTO, 1986, p.11).
Augusto Boal (1980) afirmar que o teatro é a arte de vermos a nós mesmos, de nos
vermos vendo. Para ele, o teatro, no sentido mais arcaico do termo, é a capacidade
dos seres humanos de se observarem a si mesmos em ação. Segundo Boal, todos
os seres humanos são atores porque agem, e espectadores porque observam,
porém a diferença existente entre atores e não-atores está exatamente na
consciência de que os atores têm de usar a linguagem teatral e as técnicas
embutidas nela, o que não acontece com os não-atores que ignoram o fato de
estarem fazendo teatro. Passando a falar sobre o difícil acesso aos bens culturais
por parte da sociedade, como é o caso do teatro, afirma que:
Não basta consumir cultura: é necessário produzi-la. Não basta
gozar arte: necessário é ser artista! Não basta produzir ideias,
necessário é transformá-las em atos sociais, concretos e
continuados. Em algum momento escrevi que ser humano é
ser teatro. Devo ampliar o conceito: Ser Humano é ser artista!
Arte e estética são instrumentos de libertação. (BOAL, 2009
p.19, grifo do autor)
Para o estudioso, o acesso à arte, como é o caso do teatro, deve configurar-se como
forma de questionamento da realidade em que se vive, como forma de libertação e
melhoria da qualidade de vida. O teatro “é uma forma de conhecimento e deve ser
também um meio de transformar a sociedade. Pode nos ajudar a construir o futuro,
em vez de mansamente esperarmos por ele.” (BOAL, p.XI, 1998)
Diante das considerações de Augusto Boal, é imprescindível a presença de
atividades teatrais no contexto escolar. O teatro amplia o horizonte dos alunos,
melhora sua autoimagem e colabora para torná-los mais críticos e abertos ao
mundo. O teatro é sabidamente uma arte com potencial para o processo de ensinoaprendizagem, uma vez que estimula a criatividade, a interdisciplinaridade, o
trabalho coletivo e a pesquisa, colaborando para a formação integral do indivíduo,
desenvolvendo aspectos sociais, afetivos, estéticos, éticos e cognitivos, ao mesmo
tempo em que reflete e relaciona as questões que envolvem o seu cotidiano com a
realidade social mais ampla.
O teatro a serviço da educação dá ao educando o ensejo de valorizar-se, de
integrar-se harmoniosamente a um grupo, aumentando o senso de
responsabilidade, e o sucesso do trabalho se dá devido à soma dos esforços de
todo o conjunto. É o momento em que ocorre o desenvolvimento de cada um e do
grupo, fundamentado na complementaridade das diferenças. A atividade teatral
ensina os alunos a aprenderem com a diversidade, pois somente assim é que pode
ocorrer a construção do conhecimento do sujeito.
Estudos feitos a partir de experiências com a aplicação do teatro na educação diante
do fracasso escolar estão abordados na obra de Neves e Santiago (2009), O uso
dos jogos teatrais na educação - possibilidade diante do fracasso escolar.
Nessa obra, encontram-se importantes considerações de renomados filósofos e
pedagogos, tais como: Courtney, Rousseau, Peter Slade, Antunes, Camargo,
Piaget, Vygotsky e outros, no que diz respeito à prática dos jogos teatrais na
educação com objetivos pedagógicos, a fim de favorecer o desenvolvimento de
crianças e jovens estigmatizados pelo diagnóstico de fracasso escolar. As autoras
apresentam uma síntese do teatro na educação no mundo ocidental, e relatam o
resultado de uma série de oficinas realizadas com alunos com dificuldades de
aprendizagem.
Nos dias atuais, vive-se uma época de comunicação ostensiva, extensiva e
impulsiva e o teatro desenvolve nos alunos a expressividade. De acordo com
Reverbel (1996) “é preciso lutar para que o teatro tenha seu lugar na Educação,
porque se ele existe na sociedade, deve existir na escola” (REVERBEL, 1996, p.
168). O teatro é o caminho para as escolas atingirem uma integração entre os
sujeitos de forma criativa, produtiva e participativa, é um recurso pedagógico eficaz
no desenvolvimento do educando, preparando-o para os problemas que irá enfrentar
na sua trajetória de vida.
Considerando a importância do teatro no contexto educacional, em que se apresenta
como uma prática que desenvolve a expressividade, o relacionamento, a
espontaneidade, a imaginação, a observação e a criticidade, que são indispensáveis
para a arte de aprender, que o projeto “Teatro: instrumento de reflexão históricocrítica, interação social e prática pedagógica” foi idealizado.
Metodologia
O projeto
Andirá/Pr,
Programa
envolviam
desenvolveu-se no Colégio Estadual Stella Maris, no município de
considerado “de superação”, contando com o auxilio financeiro do
Universidade Sem Fronteiras (USF). Lá ocorriam oficinas de teatro que
alunos do colégio, orientados e supervisionados pelos acadêmicos dos
cursos de licenciatura da UENP-CLCA/CCHE, previamente selecionados pelo
coordenador do projeto. As oficinas tinham como ponto fundamental de ação a
dinamização o trabalho de extensão e cultura, proporcionando uma prática
pedagógica apoiada na reflexão crítica que, de um lado construía o conhecimento da
linguagem teatral e, de outro, desenvolvia a capacidade do aluno de receber as
impressões do mundo externo e interno, manifestando respostas pessoais
adequadas.
No início do projeto, março de 2009, ocorreu a seleção dos bolsistas (três
profissionais recém-formados e cinco graduandos), a contratação e a assinatura do
termo de compromisso. Isso feito, iniciaram-se os estudos acerca da teoria e prática
teatral necessários para a execução do projeto, supervisionados pela Profa. Dra.
Luciana Brito (coordenadora do projeto), e que tinham como base teórica os estudo
de Augusto Boal. Em seguida, tratou-se de elaborar uma estratégia de atuação junto
à comunidade contemplada, que seguiu o seguinte cronograma: reunião com o
Núcleo Regional de Ensino, escolha do Município e Instituição de Ensino que
receberia o projeto, contato com a instituição eleita, reunião com o Diretor,
apresentação do projeto às coordenadoras pedagógicas e, finalmente, a divulgação
do projeto junto aos alunos por meio de atividades circenses. Para tanto, o projeto
contou com a ajuda do Prof. Marcus Selonk (colaborador). Em seguida, iniciaram-se
as práticas na escola através de oficinas e jogos teatrais que tiveram como base
teórica as técnicas do Teatro do Oprimido de Augusto Boal.
Dentro do calendário previsto, tiveram início os estudos teóricos sobre história,
memória e pesquisa histórica. As discussões versavam sobre os princípios, as
técnicas e os métodos de coleta, seleção, organização e análise de documentos que
possibilitassem a reconstrução histórica da escola Stella Maris e da cidade de
Andirá, com o propósito de oferecer referentes para a criação teatral e para a
reflexão crítica.
Em seguida, os monitores e os alunos iniciaram a montagem de esquetes
com base na história oral local, utilizadas como forma de resgate das vivências
cotidianas da comunidade envolvida no projeto, e que foram apresentadas no
Cinema/Teatro Cine São Carlos de Andirá, no dia 21 de dezembro de 2009, com o
título “História da Praça de Ingá”.
No primeiro semestre de 2010, continuando as oficinas teatrais baseadas no
método de Augusto Boal e as discussões sobre história e memória, os estagiários,
em conjunto com os alunos do Colégio Stella Maris, criaram a primeira peça coletiva
do projeto, “Extra Extra: verdades e inconveniências”, elaborada a partir da técnica
do “Teatro Jornal”, pertencente ao Teatro do Oprimido de Boal, que trata da
transformação dos cidadãos no âmbito social, cultural, econômico e emancipatório.
Diz Boal que, ao trabalhar com teatro, “Buscamos o belo que se esconde em cada
cidadão mesmo que alguns não sejam capazes de criar um produto artístico, todos
são capazes de desenvolver um processo estético.” (BOAL, 2009, p.168, grifo do
autor) Ou seja, ao ter acesso à arte teatral, o ser “Aprende esteticamente – amplia o
conhecer e lança o conhecedor em busca de novos conheceres. Aprendemos a
aprender!” (BOAL, 2009, p.168, grifo do autor).
No segundo semestre de 2010, a pedido do secretário de cultura da cidade
de Andirá, o projeto abriu espaço para a participação de toda a comunidade,
contando inclusive com a presença dos alunos do projeto de inserção social
PROJOVEM e mantendo a participação dos alunos do Colégio Stella Maris. Devido
ao bom andamento das atividades propostas, os estagiários, juntamente com os
alunos do Stella Maris e os integrantes da comunidade, fundaram o grupo A.T.O
(Artistas de Teatro do Oprimido) que atua apresentando seus espetáculos e oficinas.
A primeira peça do grupo A.T.O, “A Tempestade”, de Willian Shakespeare, estreou
no CAT - Conjunto Amadores de Teatro, durante o Seminário de Iniciação Científica
– Soletras, evento do CLCA/UENP-JAC. O texto original foi adaptado (abrasileirado)
e a peça elaborada com traços de opereta. Outro dado importante foi a presença
constante da metalinguagem teatral, como é o caso do sistema “troca de
personagens”, método que visa a não propriedade privada dos atores sobre os
personagens, bem como a dramaturgia simultânea proposta pelo método de Boal. A
cênica, figurino, direção, cenário e sonoplastia (esta última composta pelos músicos
do projeto), foram criadas pelos estagiários juntamente com a ajuda de voluntários,
como é o caso do musicista Robson Marchesani e a professora colaboradora
Mônica Garbellini.
No que tange à divulgação externa e o caráter científico, o projeto participou do VIII
e IX Congresso de Educação do Norte Pioneiro, do VI e VII Só-Letras, da Semana
de História, da Semana Jurídica e da Semana de Filosofia, oferecendo oficinas,
apresentando comunicações, publicando artigos e fazendo intervenções artísticas.
Além disso, publicou um artigo na revista Iluminart (CEFEET de Sertãozinho-SP) e
um capítulo no livro Filosofia e educação. Devido ao intenso estudo de textos
teóricos sobre a teoria e historiografia teatral, a Profa. Dra. Luciana Brito, com a
anuência dos demais participantes do projeto, criou, junto ao CNPQ, o Grupo de
Pesquisa “A Arte Teatral: Conceituação, História e Reflexões”, cujas reuniões
acontecem às terças-feiras no CLCA-UENP.
Conclusão
Na medida em que criou um espaço cultural vinculado à história local, oral e
de dramaturgia, o projeto conseguiu revelar a identidade da população envolvida,
“criando”, na prática, a história regional e local que, através das atividades teatrais
propostas, foram difundidas no ambiente escolar e outros espaços alternativos de
cultura. Desse modo, transformou as apresentações e oficinas em espaço de
experimentação e reflexão histórico-crítica dos temas a serem abordados.
O teatro, além de ser uma arte com potencial para o processo de ensinoaprendizagem, uma vez que estimula a criatividade, a interdisciplinaridade, o
trabalho coletivo e a pesquisa, colaborando para a formação integral do educando,
também reflete e relaciona as questões que envolvem o seu cotidiano com a
realidade social mais ampla. Assim, conhecer as especificidades teatrais, organizar
grupos dentro das instituições públicas de ensino fundamental/médio/universitário
envolvendo alunos e professores e sociabilizá-los de forma democrática é
fundamental para criar uma base de reflexão histórico-crítica sobre a complexidade
dos processos criativos/produtivos teatrais e poder gerar conhecimento que
contribua com toda a comunidade. Afinal, como diz Augusto Boal, “Cidadão não é
aquele que vive em sociedade – é aquele que a transforma!” (BOAL, 2009, p. 22)
Referências
BOAL, Augusto. A estética do oprimido. Rio de Janeiro : Garamond, 2009.
____________. Teatro do oprimido e outras poéticas políticas. 2 ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática
educativa. 39ª. ed. São Paulo-SP: Paz e Terra, 1996.
NEVES, Libéria Rodrigues; SANTIAGO, Ana Lydia Bezerra. O uso dos jogos
teatrais na escola: possibilidades diante do fracasso escolar. CAMPINAS - SP:
Papirus, 2009.
PEIXOTO, Fernando. O que é teatro. São Paulo: Brasiliense, 1986.
REVERBEL, Olga Garcia. Jogos teatrais na escola: atividades globais de
expressão. São Paulo-SP: Scipione, 1996.
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