Difração de elétrons por um cristal de grafite Roteiro Apesar de todas as evidências de que o elétron é uma partícula, como observado diretamente ou indiretamente nas experiências de razão carga/massa, do efeito fotoelétrico, e na de Franck-Hertz, pode-se mostrar, curiosamente, que o elétron apresenta uma característica ondulatória. Este é um daquele aparentes paradoxos que surge ao tentar idealizar um ente quântico com aproximações semiclássicas do tipo “é uma partícula” ou “é uma onda”. Tal “dualidade” apareceu no meio do desenvolvimento da mecânica quântica, foi muito debatida então, mas já está resolvida: o elétron é um objeto puramente quântico, obedece às leis da física quântica, e por isso não pode ser comparado com partícula ou com onda (conceitos puramente clássicos!!). Deixando a filosofia de lado, na experiência do efeito fotoelétrico havia sido mostrado que a luz, que na época era considerada uma onda eletromagnética, tinha todas as características de uma partícula, sendo que esta partícula até foi chamada de fóton. Foi Louis de Broglie, em 1924, quem primeiro ousou imaginar uma complementaridade: que assim como uma onda pode apresentar características corpusculares, a matéria convencional (corpuscular por “natureza”) também poderia se comportar como uma onda. A idéia foi tão insana quanto a proposta de Einstein para o efeito fotoelétrico, e funcionou tão perfeitamente que de Broglie ganhou o prêmio Nobel em 1929. Na onda dessa idéia, alguns pesquisadores começaram a realizar experimentos para identificar essa nova faceta da matéria. Em 1927 dois experimentos diferentes foram realizados, um por G. P. Thomson (filho de J. J. Thomson, prêmio Nobel de 1906 pela descoberta do elétron como partícula!!) e outro por C. J. Davisson e L. H. Germer. O primeiro trabalhou diretamente com difração por folhas finas de metais, enquanto os últimos realizaram experimentos de reflexão de elétrons de 54 eV incidindo num monocristal de Ni (há quem diga que descobriram a difração por acaso...). E claro, Thomson e Davisson receberam seu Nobel de 1937 por essa comprovação fantástica. Curioso que hoje fazemos o experimento de Thomson em sala de aula... De Broglie postulou que partículas de massa "m" e velocidade "v" teriam um momento: p = h/λ = mv (1) Ec = hν = mv2 /2 , (2) e uma energia cinética: fazendo a ligação entre a característica ondulatória e a corpuscular. Das idéias de von Laue e dos Bragg, sabia-se que sólidos cristalinos funcionavam como rede de difração para raios-X, cuja energia era relativamente alta de modo que o comprimento de onda fosse da ordem do espaçamento atômico. Elétrons acelerados a energias similares, segundo a idéia de de Broglie, deveriam apresentar comportamento similar e dar origem a um padrão de difração, cujos ângulos onde se espera interferência construtiva dos feixes espalhados seguiriam a lei de Bragg: 2 d . sen θ = n . λ. (3) Hoje, a difração de elétrons é uma ferramenta muito comum usada na caracterização de cristais. Voce encontra esta técnica em microscópios eletrônicos de transmissão, assim como em câmaras de LEED (low energy electron difraction) ou de RHEED (reflection high energy electron diffraction) utilizadas para verificação em tempo real da qualidade de crescimento de sólidos em algumas técnicas modernas. 1) Objetivos O objetivo deste experimento é medir a(s) separação (ões) interplanar (es) da grafite policristalina, verificando o comportamento ondulatório dos elétrons, e compará-los com os valores mais aceitos atualmente. 2) Metodologia O tubo de difração de elétrons (PHYWE 06721.00) é composto de um canhão de elétrons, um cristal de grafite plano, e uma tela fluorescente para a visualização do fenômeno. Como em várias experiências anteriores que voce já fez, os elétrons são produzidos pelo efeito termoiônico num filamento quente. Há uma série de grades e aberturas, as quais, se devidamente manejadas com potenciais adequados, geram um feixe de elétrons colimado. Este feixe incide numa lâmina plana muito fina (transparente para os elétrons) de grafite. O grafite é um cristal composto de monocamadas de carbono ligadas entre si por fracas forças de van der Waals. Dentro das monocamadas cada carbono está ligado a outro por orbitais híbridos sp2 covalentes. Estas ligações sp2 fazem entre si ângulos de 120o, o que leva a uma geometria hexagonal da rede cristalina. A rede do grafite é composta por planos principais de átomos de carbono afastados entre si de distâncias "d" bem características, as quais foram bem determinadas por difração de raios-x. Um detalhe importante é que a lâmina de grafite não é monocristalina! Isso faz com que os máximos de difração (seriam seis por causa da simetria hexagonal) dêem origem a um círculo de difração sobre a tela fluorescente, já que cada microcristal contribui com seis pontos, mas suas orientações com relação ao feixe são aleatórias. A geometria do tubo é tal que a distância entre a grafite e a tela (L) é de (127 ± 3) mm. Para esta experiência serão utilizados, além do tubo descrito acima, uma fonte de média tensão PASCO SF-9585A (a mesma da medida da razão carga/massa do elétron), uma fonte de alta tensão (kilovolts) PASCO SF-9586, e um resistor de carga já montado em suporte apropriado. Há dois tubos disponíveis seqüência de passos para este experimento é, então: ● Ligue os fios às fontes de tensão. Siga o esquema abaixo. Chame o mestre para a conferência (você já sabe porquê...). Cuidado com o resistor de carga! ● Ligue as fontes. ● Coloque a tensão AC da fonte de média tensão na posição 5. Isso aquece o filamento e permite a emissão de elétrons. ● Aplique algo como 50 a 100 V na fonte de média tensão. Ainda nada acontece na tela fluorescente. ● Aplique uns 4000 V na fonte de alta tensão. O feixe de elétrons agora deve ser energético o suficiente para atravessar o grafite e aparecer na tela. ● Ajuste as tensões 50 V e 500 V de maneira a obter o melhor contraste/iluminação e possibilitar a visualização de dois anéis concêntricos na tela fluorescente. ● Vá até a tensão máxima, repita o ajuste de visibilidade, meça com um paquímetro o diâmetro dos círculos. Anote as incertezas para cada medida (inclusive tensão). ● Reduza 500 V na fonte de alta tensão. Repita o ajuste de visibilidade e a medida dos raios. ● Continue a reduzir a alta tensão em passos de 500 V até o limite inferior onde ainda seja possível visualizar os círculos. Faça a medida dos raios para cada tensão possível (usualmente até uns 3 kV). 3) Análise A análise consiste basicamente em obter, a partir dos valores de raio medidos, a separação interplanar d a partir da lei de Bragg dada na eq. (3). Antes, porém, alguns cuidados devem ser tomados. Primeiro, verifique se pelas voltagens aplicadas os elétrons seriam relativísticos ou não, para justificar o uso ou não de um tratamento relativístico para os elétrons ao computar sua velocidade. A partir dos dados de velocidade, calcule o comprimento de onda para cada tensão de aceleração. Não se esqueça de calcular as incertezas! Use os dados geométricos do tubo e os raios medidos para calcular o ângulo de difração θ (com respectiva incerteza). Use a lei de Bragg para calcular as separações interplanares da grafite (por meio gráfico ou por médias e desvios padrão, o que achar mais conveniente). Note que os dois círculos podem ser explicados por duas hipóteses possíveis: primeira ordem de difração para duas separações interplanares diferentes; ou primeira e segunda ordem de difração para uma única distância interplanar. Avalie seus dados e informe qual das duas opções seria a correta. Compare o(s) valor(es) obtido(s) com o que é mais aceito na literatura.