Influência do apoio psicossocial para pacientes com infecção pelo

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artículo original/artigo original
Influência do apoio psicossocial para pacientes
com infecção pelo vírus HIV
Influence of psychosocial support to patients
with infection by HIV virus
Áurea Regina Telles Pupulin1
Dennis Armando Bertolini2
Maria Waldrinez Lonardoni2
Eliana Shimauti3
Miguel Spack Junior4
Daniela Darce Motta5
Silvana Marques Araujo4
Professor Assistente Setor de Parasitologia
da Universidade Estadual de Maringá PR - Brasil.
2
Professor Adjunto Setor de Imunologia
Clínica da Universidade Estadual de Maringá
- PR - Brasil.
3
Professor Assistente Setor de Hematologia
Clínica da Universidade Estadual de Maringá
- PR - Brasil.
4
Médico. Especialização em Saúde Mental.
Professor Adjunto Setor de Parasitologia da
Universidade Estadual de Maringá PR - Brasil.
5
Professor Assistente Departamento de
Psicologia.
1
Rev Panam Infectol 2007;9(1):9-14
Conflicto de interés: ninguno
Recibido en 20/7/2006.
Aceptado para publicación en 2/3/2007.
Resumo
Desde o início da epidemia de Aids houve um grande esforço por
parte de pesquisadores e clínicos em entender o impacto psicossocial da infecção pelo HIV naqueles que vivem com o vírus. Pacientes
em condições de grande exclusão social ou que fazem uso abusivo
de álcool, drogas psicoativas e aqueles que não compreendem os
benefícios da terapia devem receber cuidados especiais. Pacientes
carentes atendidos no Centro de Apoio Emaús foram selecionados
para este estudo, cujo objetivo foi verificar o efeito do apoio psicossocial a pacientes carentes com infecção pelo vírus HIV. Foram
selecionados 60 pacientes divididos em dois grupos: Grupo I (com
apoio psicossocial) e Grupo II (sem apoio psicossocial). Os pacientes
foram submetidos a avaliação clínica, laboratorial e emocional. O
Grupo I recebeu orientações e intervenções necessárias durante 18
meses. Após esse período os dois grupos foram avaliados novamente.
O Grupo I apresentou menor ocorrência de infecções oportunistas,
menos depressão e melhoria em parâmetros laboratoriais, tais como
dislipidemia, parasitoses intestinais e anemia. Os resultados mostraram que o apoio psicossocial feito por equipes multidisciplinares
traz melhoria na evolução da Aids.
Palavras-chave: Apoio psicossocial, HIV, Aids.
Abstract
Since the beginning of SIDA epidemic, there has been a great
effort from researchers and clinical in understanding the psychosocial impact of the infection by HIV in those who live with the
virus. Patients in serious exclusion condition or that make abusive
alcohol use, psychoactive drugs and those who do not understand
the benefits of the therapy must receive special care. Poor patients
assisted in Emaús Support Center were selected to this study, which
objective was to verify the effect of the psychosocial support to poor
patients with infection by HIV virus. There were selected 60 patients,
divided in two groups: Group I (with psychosocial support) and group
II (without psychosocial support). The patients were submitted to
clinical, laboratorial and emotional evaluation. group I received
orientations and necessary interventions for 18 months. After this
Rev Panam Infectol 2007;9(1):9-14
period, both groups were evaluated again. Group I
presented smaller occurrence of opportunists infections, less depression and improvement in laboratorials
parameters such as dislipidemy, intestinal parasitoses
and anemy. The results showed that the psychosocial
support performed by multidisciplinar team brings
improvement in the evolution of the Aids.
Key words: Psychosocial support, HIV, Aids.
Introdução
A investigação científica intensa que acompanhou
e se seguiu à descoberta do HIV correlacionou-se a
resultados que constituíram marcos importantes na
evolução da epidemia, modificando a abordagem
terapêutica dessa infecção e alterando a sua história
natural. No Brasil, desde o início da epidemia de Aids,
ao lado de uma intensa atividade de prevenção, luta
pelos direitos humanos, estudos do comportamento
da infecção e seus determinantes biopsicossociais,
conseguiu-se garantir, de maneira sui generis para
países em desenvolvimento, o acesso universal aos
anti-retrovirais desde 1992(1).
Estas conquistas se consolidaram em 1996, quando, frente o anúncio internacional dos ótimos resultados do “coquetel” (esquema terapêutico composto por
dois inibidores da transcriptase reversa e um inibidor
de protease, intitulado de terapia anti-retroviral de
alta potência (Highly Active Antiretroviral Therapy HAART), os medicamentos que o compõem passaram
a ser garantidos por lei federal, a despeito de seus
altos custos, possibilitando, desta maneira, que os
pacientes de Aids do país tivessem acesso a todos os
avanços terapêuticos disponíveis no mercado mundial.
A disponibilização dessa terapia HAART na rede de
serviços, à semelhança do que aconteceu em outros
países, causou um impacto notável, de expressiva
redução da morbimortalidade em São Paulo e Rio de
Janeiro, bem como queda substancial do número de
internações hospitalares no país(2).
Estudos internacionais posteriores demonstraram
que os pacientes em uso desse tratamento apresentavam uma mudança impressionante no seu curso clínico, registrando-se, nessas populações, grande queda
dos coeficientes de mortalidade, drástica redução da
incidência de infecções oportunistas, grande aumento
da qualidade de vida e principalmente aumento significativo da sobrevivência(3-10).
Embora seja indiscutível o efeito positivo que a
terapêutica HAART teve na qualidade de vida e redução de mortalidade relacionada com o HIV, novos
problemas surgiram, condicionados pelo próprio tratamento, tais como a necessidade de manter a longo
prazo uma aderência absoluta e continuada a uma
terapêutica por vezes complicada na sua posologia
10
e com possibilidade de efeitos colaterais desagradáveis, toxicidade a longo prazo desta medicação e
emergência de vírus resistentes aos medicamentos
disponíveis. No mesmo sentido, houve um grande
esforço por parte dos pesquisadores e clínicos em
entender o impacto psicossocial da infecção naqueles que vivem com o vírus(11,12). O tropismo pelo
Sistema Nervoso Central(13) e o fato de os pacientes
serem jovens, pertencerem a grupos estigmatizados
e marginalizados socialmente devem ser levados em
consideração. Desde o início da epidemia descrevese uma síndrome caracterizada por depressão, apatia
e isolamento social. Os quadros psiquiátricos mais
freqüentemente descritos são alterações do humor e
depressão (Centro de Referência e Treinamento em
DST/Aids de São Paulo). Mais recentemente pensase, também, que a destruição dos vírus pelas células
chamadas mielomonocitos no SNC gera, como subproduto, um material viral neurotóxico que, junto com
moléculas produzidas pelo próprio organismo, pode
conduzir os neurônios à morte(14).
A prevalência da depressão na população HIV
positiva é em torno de duas vezes maior do que a da
população geral e está dentro da variação encontrada
em outras doenças crônicas (5% a 8%). A intensidade
dos sintomas é variável e depende da personalidade
pré-morbida e da capacidade do indivíduo de lidar
com o estresse.
Um paciente deprimido tende a não tomar as
medicações prescritas e a não acatar as orientações
médicas, além do risco aumentado de suicídio.
Um diagnóstico precoce e o tratamento adequado
de uma depressão podem alterar o prognóstico do
paciente.
É conhecido que o estresse pode influir na produção de citocinas(15), afeta processos inflamatórios
locais(16), reativa vírus latentes(17) e afeta a imunidade
local da pele, aumentando a suscetibilidade a infecções cutâneas(18). Estes dados indicam que altos
níveis de estresse também poderiam atuar como
aceleradores da progressão viral e desenvolvimento
da sintomatologia da Aids.
O apoio social parece ter um importante papel na
mediação do impacto que os acontecimentos negativos
produzem nas pessoas. Pacientes em condições de
grande exclusão social ou que fazem uso abusivo de
álcool, drogas psicoativas e aqueles que não compreendem os benefícios da terapia devem receber cuidados
especiais (Guia de Tratamento Clínico-Ministério da
Saúde, 2004).
Pacientes carentes atendidos no Centro de Apoio
Emaús foram selecionados para este estudo, cujo
objetivo foi verificar o efeito do apoio psicossocial a
pacientes carentes com infecção pelo vírus HIV.
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Metodologia
População
A população em estudo constituiu-se de pacientes portadores de HIV atendidos no Centro de Apoio
Emaús-Maringá-Paraná. A casa de apoio atende pacientes carentes da 15ª Regional de Saúde, envolvendo
30 municípios da região Noroeste do Paraná, que são
encaminhados pela Regional de Saúde.
Desenho do estudo
Foi realizado um ensaio clínico, randomizado, não
duplo-cego.
Amostra
Foram selecionados 60 (sessenta) pacientes por
meio de amostra sistemática utilizando-se as fichas
cadastrais dos pacientes em ordem alfabética. Foram
selecionados pacientes iniciando-se pelo número 3
e depois múltiplos de 3 até atingir-se a amostragem
necessária. Após explicação do trabalho assinavam o
termo de consentimento aprovado pelo Comitê de Ética
para Pesquisa em Seres Humanos. Os pacientes foram
separados em dois grupos de 30 sujeitos cada. Os grupos foram pareados quanto a gênero e idade. O Grupo
I foi constituído de pacientes aos quais foi fornecido
apoio psicossocial e o Grupo II constituiu-se de pacientes que não recebiam intervenção psicossocial.
Período de coleta de dados
Agosto/2004 a fevereiro/2006.
Aspectos éticos
O projeto foi aprovado pelo comitê de ética para
pesquisa em seres humanos da Universidade Estadual
de Maringá.
Instrumentos de Avaliação
1. Foi aplicado um questionário socioeconômico
abordando: hábito de vida, renda familiar, uso de drogas, uso de medicamentos e ocorrência de infecções
oportunistas.
2. A avaliação clínica inicial do paciente baseou-se
em exame clínico geral e na contagem de linfócitos T
CD4 e CD8, além da quantificação de carga viral.
3. O perfil laboratorial foi obtido por meio das
dosagens de: glicose sérica em jejum, lipidograma
(colesterol total, LDL colesterol, HDL colesterol, triglicérides), hemograma, perfil renal (ácido úrico, uréia,
creatinina), perfil hepático e pesquisa de enteroparasitas oportunistas.
4. O perfil emocional foi obtido mediante avaliação e mensuração de depressão utilizando-se a
Escala de Hamilton para Depressão (disponível em
http://www.ufrgs.br/psiq/hamdepr.html) e do estresse
utilizando Inventário de Sintomas de Estresse (ISE),
de autoria de Benevides-Pereira & Moreno-Jimenez
(2002)(19). Todos os instrumentos foram aplicados
somente por uma das autoras, o que garantiu a
uniformidade no contato e na coleta de dados. As
entrevistas foram individuais, agendadas previamente em local combinado (casa de apoio) com o
participante e tiveram duração média de 20 minutos.
O Inventário de Sintomas de Estresse (ISE) apresenta afirmações relativas aos sintomas referenciados
na literatura como freqüentes ou característicos de
estresse na vida diária. O instrumento compreende
27 itens, sendo sete referentes ao Fator sintomas
físicos de estresse (SF) e os demais ao Fator sintomas psicológicos de estresse (SP). A Escala de
Hamilton para Depressão aborda itens referentes ao
humor deprimido, sentimentos de culpa, suicídio,
insônia (inicial, intermediária, tardia), trabalho e
atividades, retardo, agitação, ansiedade (psíquica,
somática, gastrointestinal), sintomas somáticos
gerais, hipocondria, perda de peso, consciência,
despersonalização e perda da realidade, sintomas
paranóides, sintomas obsessivos e compulsivos. As
análises foram realizadas de acordo com a padronização e validação de cada instrumento.
5. As avaliações clínica, laboratorial e emocional
foram feitas no início do estudo (T = 0), após 12 meses
(T = 1) e após 18 meses (T = 2) nos dois grupos de
pacientes.
Intervenções psicossociais aplicadas
Após estudo do perfil emocional, laboratorial, clínico e socioeconômico foram definidas intervenções
educativas individuais e coletivas.
Intervenções individualizadas
Os pacientes do Grupo I recebiam acompanhamentos individualizados semanais, quinzenais ou mensais,
conforme a necessidade individual. Esses acompanhamentos constavam de exame clínico, laboratorial e
encaminhamento psicológico. Os pacientes eram instruídos quanto à alimentação, uso de medicamentos,
realização de exames clínico-laboratoriais e procura
de profissional técnico especializado (especialidade
clínica e/ou hospital) quando necessário.
Intervenções coletivas
De acordo com as necessidades detectadas individualmente foram propostas atividades coletivas que
constaram de:
1. Palestras: Abordaram os assuntos de maior
relevância para o grupo de pacientes acompanhados: uso de anti-retrovirais, infecções oportunistas,
11
Rev Panam Infectol 2007;9(1):9-14
Tabela 1. Distribuição da freqüência da população estudada
de acordo com as características sociodemográficas
(n = 60). Maringá - PR - 2004/2006
CARACTERÍSTICAS
N
%
Masculino
Feminino
< 30 anos
Idade
> 30 anos
< R$ 350,00
Renda mensal
> R$ 350,00
UDI
Transfusão sangüínea
Heterossexual
Transmissão
Homossexual
Não sabe
Uso Álcool/Drogas ilícitas
Ensino fundamental
Escolaridade
Ensino médio
Não estudaram
34
26
19
41
20
40
06
02
41
10
01
36
47
11
02
56,7
43,3
31,6
68,3
33,3
66,7
10,0
3,3
68,3
20,0
5,0
60
78,3
18,3
3,3
Sexo
Tabela 2. Ocorrência de infecções oportunistas nos dois
grupos de pacientes HIV avaliados. Grupo I (pacientes que
receberam apoio psicossocial) e Grupo II (pacientes que não
receberam apoio psicossocial). Maringá - PR - 2004/2006
Infecções
oportunistas
Candidíase oral
Câncer cervical
Criptococose pulmonar
Herpes-zóster
Hepatite C
Herpes cutâneo
Tuberculose pulmonar
Meningite
Pneumonia bacteriana
Sarcoma de Kaposi
Molusco contagioso
Sífilis genital
Total
Taxa de prevalência
GRUPO I
GRUPO II
N
%
N
%
03
10,0
02
6,66
01
3,33
00
00
00
0,00
01
3,33
01
3,33
03
10
01
3,33
03
10
02
6,66
04
13,3
03
10,0
05
16,6
01
3,33
00
00
00
00
03
10,0
01
3,33
02
6,66
00
00
01
3,33
00
00
03
10,0
13*
43,3
27
83,3
*P < 0,05
diarréias e parasitas intestinais, higiene (pessoal
e doméstica), automedicação, nutrição, lazer e
exercício físico. As palestras eram feitas usando
recursos audiovisuais, atividades práticas tais como
demonstração da lavagem das mãos e de alimentos,
limpeza correta do ambiente, demonstração de uso
e conservação de medicamentos, coleta adequada
de material para exames laboratoriais, tais como
escarro e sangue. Todas as palestras eram feitas por
equipe multidisciplinar e permitiam a participação
ativa dos pacientes.
2. Grupos de discussão: Foram reunidos grupos de
sete a oito pacientes, que eram convidados a expor
ansiedades, problemas pessoais e dúvidas com relação à doença. Todos podiam opinar e pelo menos
dois membros da equipe multidisciplinar participavam
orientando as discussões.
Análise estatística
As diferenças de proporção foram analisadas pelo
teste do qui-quadrado.
Resultados
Os dados sociodemográficos estão apresentados
na tabela 1. Quanto ao gênero, 34 (56,7%) eram do
sexo masculino e 26 (43,3%) do sexo feminino. A
idade das mulheres variou entre 22 e 56 anos (média
de 36 anos) e dos homens variou de 20 a 56 (média
de 37 anos).
A renda mensal da maioria é proveniente de apo-
12
sentadorias e trabalhos esporádicos; apenas 20% tem
trabalho fixo.
Para o sexo feminino, a renda mensal/família foi de
um a três salários mínimos, sendo que 58% ganham
até um salário mínimo. Para o sexo masculino, a renda
mensal/família foi de um a cinco salários mínimos,
sendo que 36,6% ganham um salário mínimo.
Em relação ao nível educacional, 37 (78,3%)
possuíam ensino fundamental, 11 (18,3%) ensino
médio e dois (3%) nunca freqüentaram a escola.
Desses, a escolaridade mais baixa foi observada no
sexo feminino.
Quanto ao mecanismo de infecção, 24 mulheres
e 17 homens adquiriram o vírus através de contato
heterossexual; dez homens por meio de contato homossexual, enquanto duas mulheres e quatro homens
relataram contaminação através de drogas injetáveis;
duas mulheres tiveram contágio através de transfusão
sangüínea e um homem não sabe como adquiriu a
infecção. Relatam uso de álcool e/ou drogas ilícitas
36 (60%) pacientes.
A tabela 2 mostra a taxa de infecções oportunistas
diagnosticadas nos dois grupos de pacientes durante o
período de estudo. Com maior prevalência para o Grupo
I aparece candidíase oral e tuberculose pulmonar; no
Grupo II tem maior prevalência tuberculose pulmonar e
herpes cutâneo. O total de infecções oportunistas para
o Grupo I foi de 13 (43,3%) pacientes e para o grupo
II foi de 25 (83,3%) pacientes, sendo esta diferença
significativa (p < 0,05).
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Tabela 3. Alterações clínicas e laboratoriais diagnosticadas nos dois grupos de pacientes HIV antes (T = 0) e 18 meses após o
apoio psicossocial (T = 2) - Maringá - PR - 2004/2006. Grupo I (com apoio psicossocial) e Grupo II (sem apoio psicossocial)
Grupo I
Alterações clínico-laboratoriais
Taxa de linfócitos TCD4+< 200 Cls/mm3
Agravo ou óbito
Dislipidemia
Diabetes
Enteroparasitas
Anemia
Tempo = 0
N. %
13
43,3
05
16,7
10
33,3
00
00
06
20
04
13,3
Tempo = 2
N. %
17
56,7
02
6,66
06
20
00
00
00
00
02
6,66
Tabela 4. Resultados da aplicação de escalas para avaliação de
alexitimia e estresse em pacientes HIV - Maringá - PR - 2004/2006
Depressão
Leve
Moderada
Grave
Sem depressão
Grupo
I
Grupo
II
Nível de
estresse
Grupo
I
Grupo
II
12
03
00
15
22
02
04
02
Estressado
Não estressado
Total geral
24
06
30
28
02
30
A tabela 3 mostra a ocorrência de alterações
clínicas e laboratoriais nos dois grupos de pacientes
antes e 18 meses após a aplicação das intervenções
propostas. Com relação ao item taxa de linfócitos
TCD4+ e agravo/óbito, não houve diferença entre os
dois grupos; com relação às alterações dislipidemia,
diabetes, enteroparasitoses e anemia, estas ocorreram
com maior prevalência no Grupo II após os 18 meses
(T = 2). A tabela 4 mostra os níveis de depressão e
estresse diagnosticados nos pacientes após 12 meses
do estudo. O Grupo I apresentou um número menor de
pacientes com depressão e estresse do que o Grupo II,
sendo esta diferença significativa estatisticamente no
caso da depressão (p < 0,05) e não para o estresse.
Discussão
Este trabalho avaliou o efeito do apoio psicossocial
para pacientes HIV utilizando como medida parâmetros
clínicos, laboratoriais e emocionais. Foram avaliados
pacientes com Aids cadastrados na Casa de Apoio
Emaús, os quais eram todos carentes, pertencentes a
grupos populacionais estigmatizados, freqüentaram as
atividades propostas e colaboraram com tal estudo. Nenhum dos pacientes encontrava-se internado durante o
estudo, consistindo-se em um grupo homogêneo.
A comparação entre o perfil clínico-laboratorial dos
pacientes mostrou uma diferença significativa quanto
à ocorrência de infecções oportunistas, sendo que no
Grupo II (sem apoio psicossocial) houve maior ocorrência destas. Isto seria explicado pelo fato do apoio
Grupo II
Tempo = 0
N. %
12
40
03
10
10
33,3
02
6,66
04
13,3
03
10
Tempo = 2
N. %
18
60
06
20
10
33,3
02
6,66
04
13,3
03
10
psicossocial permitir contato semanal/quinzenal com o
paciente, levando a um diagnóstico precoce da infecção e os devidos encaminhamentos para tratamento.
Da mesma maneira observa-se que os parâmetros
laboratoriais mostram-se diferentes nos dois grupos na
segunda avaliação (T = 2), que foi feita 18 meses após
as intervenções psicossociais. Os parâmetros laboratoriais lipidemia, hemograma e parasitológico de fezes
mostraram-se distintos para os dois grupos devido ao
diagnóstico e tratamento das alterações encontradas
(tabela 3). Quanto ao item taxa de linfócitos TCD4+ não
houve diferença, o que é explicado pela complexidade
deste parâmetro, envolvendo recuperação imunológica,
resistência aos anti-retrovirais, falência terapêutica,
que precisariam de um tempo maior de estudo para
chegar-se a uma conclusão.
No que se refere às variáveis psicológicas, observam-se diferenças significativas nos dois grupos. O
Grupo I apresenta menor prevalência de depressão
e estresse em relação ao Grupo II após 12 meses do
início do apoio psicossocial (tabela 4).
Os resultados obtidos através deste trabalho indicam
que o apoio psicossocial parece ter um importante papel
na mediação do impacto que os acontecimentos negativos
produzem nas pessoas. Hipotetiza-se que os indivíduos
que dispõem de uma rede social da qual podem obter
ajuda são menos vulneráveis a sofrer alterações mediadas por um alto nível de estresse e depressão(20). Como
conseqüência, o paciente tem maior probabilidade de
acatar as orientações quanto ao tratamento, seja do HIV,
das infecções oportunistas ou da depressão.
Os pacientes acompanhados relataram ainda sentirse mais confiantes e animados para enfrentar a doença, passam a ter maior compreensão do tratamento,
doenças oportunistas, interações medicamentosas e
cuidados com a saúde.
Estes dados ratificam estudos(21-25) que apontam o
apoio social como um forte atenuador do impacto negativo da soropositividade na vida das pessoas afetadas.
Segundo os autores anteriormente citados, o apoio
social é um recurso pessoal externo que pode facilitar
13
Rev Panam Infectol 2007;9(1):9-14
a adaptação ao processo da doença. As atividades desenvolvidas em grupo possibilitam ao participante uma
fonte substituta de apoio e encorajamento, faz diminuir
seus medos, ansiedades, a sensação de isolamento
e proporciona a aprendizagem de novas maneiras de
lidar com HIV/Aids.
As intervenções grupais, segundo Rasera(24), capacitam seus membros a desenvolver um senso positivo
de si próprio, a serem mais ativos e seguros, havendo
um aumento da auto-estima e o encontro de novos
significados de vida.
Segundo Malbergier(21), os contatos com os outros
que estão passando por situações semelhantes e que
podem ter desenvolvido estratégias positivas podem
servir de exemplo, propiciando tentativas saudáveis de
lidar com a estigmatização e a desesperança.
Este trabalho reforça ainda a necessidade de equipes
multidisciplinares no atendimento a pacientes HIV, além
de um trabalho de educação e informação contínua.
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Correspondência:
Universidade Estadual de Maringá
Av. Colombo, 5.790 - Bloco I - 90 - Sala 11
CEP 87020-900 - Maringá - Paraná - BR.
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