Publicação Trimestral do Núcleo de Medicina Avançada de Mastologia do Hospital Sírio-Libanês Janeiro / Fevereiro / Março - 2009 Entrevista Uso de hormônios e risco de câncer de mama A relação entre o uso de pílulas anticoncepcionais e terapia de reposição hormonal e o aumento do risco de câncer de mama é um tema que, com frequência, preocupa as mulheres. Nesta entrevista para o Boletim da Masto, o Prof. Jorge Saad Souen, médico do Núcleo de Mastologia do HSL e professor-associado de Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, esclarece os principais pontos relacionados a esses assuntos tão atuais e importantes para as mulheres. Boletim da Masto - A mulher que usa pílula anticoncepcional tem mais chances de desenvolver câncer de mama? Prof. Souen - É controversa a possibilidade de que o emprego de pílulas anticoncepcionais favoreça o desenvolvimento do câncer de mama. Estudos referem aumento da incidência quando as adolescentes empregaram o método por 12 anos ou mais, havendo então uma chance de 11,8 vezes mais de adquirir o tumor, enquanto outros demonstram não haver correlação e alguns até sugerem que possa haver uma proteção em decorrência do uso da pílula anticoncepcional. Na realidade não se cogita a contra-indicação da pílula anticoncepcional para mulheres saudáveis. Ao contrário, quando uma mulher for tratada por câncer de mama recomenda-se não empregar medicamentos anticoncepcionais, sugerindo métodos não hormonais. faz necessário esclarecer que há dois tipos de tendências ligadas à família. Uma delas é circunstancial, ou seja, as pessoas da mesma família convivem com as mesmas condições estimulantes do câncer e têm maior tendência à doença quando parentes de 1º grau (mãe, irmão, filha) sofrem da moléstia. Nesses casos, o risco aumentado em relação à população em geral é de cerca de 30%. Diferentemente, quando o problema é genético e há alterações nos genes conhecido como BRCA1 e BRCA2, este risco pode chegar a 80%. Por isso, no primeiro caso se os benefícios da reposição hormonal forem inquestionáveis e melhorarem efetivamente a qualidade de vida, pode-se indicar a reposição. Nos casos de tendência genética deve-se evitar a reposição hormonal. Quanto à pílula anticoncepcional, não existem dados que a contraindiquem em nenhuma das situações. Boletim da Masto - Uma mulher cuja mãe ou irmã tiveram câncer de mama pode usar anticoncepcional hormonal? A terapia de reposição hormonal aumenta a chance de câncer de mama na população em geral? E na mulher de alto risco? Prof. Souen - Do ponto de vista da relação entre antecedentes familiares e câncer de mama, se Boletim da Masto - Quem já teve câncer de mama pode usar reposição hormonal? Prof. Souen - Não. Aliás, as próprias mulheres de modo geral relutam em empregar os hormônios nesses casos. É fundamental levar em conta recomendações comportamentais relacionadas a hábitos de vida saudáveis, prática de exercícios físicos, alimentação saudável e viver com otimismo. Como opções não-hormonais, há diversas medicações que melhoram especialmente as desagradáveis ondas de calor (conhecidas por fogachos). Por exemplo a Veraliprida, a Cinarizina, a Gabapentina. Esses medicamentos costumam aliviar sintomas desconfortáveis, mas não melhoram a de- Prof. Jorge Saad Souen sagradável secura vaginal, que além de dificultar as relações sexuais, cursam com outros problemas, como por exemplo perda involuntária de urina. Para melhorar esse aspecto há pomadas hormonais estrogênicas, que não são absorvidas pelo organismo e que podem ser empregadas. Trata-se da pomada de Promestriene. Boletim da Masto - Todas as mulheres no climatério precisam usar reposição hormonal? Prof. Souen - Não. Recomenda-se bom senso e uma avaliação criteriosa do seu risco-benefício. Não há dúvida de que a reposição hormonal cause uma maior incidência de câncer de mama e parece que esta chance é maior quanto maior o tempo de uso. Resumindo a terapia de reposição hormonal pode ser empregada em mulheres que não tiveram câncer de mama, sem antecedentes familiares importantes e com sintomatologia importante, empregandose a mínima dose de hormônio pelo mínimo espaço de tempo. Boletim da Masto - Existem alternativas não-hormonais para tratamento dos sintomas do climatério? Prof. Souen - Sim. Além do mencionado anteriormente, existem os fito-hormônios, especificamente os fito-estrogênios. Os mais conhecidos são os derivados da soja, que são as isoflavonas. São 100 a 2000 vezes menos potentes que os hormônios naturais e eventualmente agem melhorando os fogachos; no entanto não se conhece sua ação quanto ao favorecimento do câncer mamário. Câncer de mama hereditário Dr. Bernardo Garicochea, Médico coordenador do Serviço de Aconselhamento Genético do Centro de Oncologia do HSL Será que existe uma maneira de sabermos que pessoas terão câncer de mama antes que o mesmo ocorra? Bem, este é um sonho da medicina: poder prevenir as doenças, especialmente câncer, de forma que estas não representem mais risco de morte a nenhuma pessoa. É possível que este tipo de medicina não seja tão “ficção científica” e que possa se tornar realidade em algumas décadas com as descobertas que se tem feito sobre a genética do câncer. Se ainda não é possível este tipo de prevenção individualizada para todas as pessoas, podemos conseguir prevenir câncer em um grupo de pessoas muito especiais com as ferramentas que possuímos hoje. São as pessoas que pertencem a famílias com muitos casos de câncer de mama, ou famílias com câncer de mama hereditário. O câncer de mama hereditário corresponde a 5% dos casos de câncer de mama na nossa população e uma boa parte destas pessoas são facilmente identificáveis: duas ou mais gerações com pessoas que tiveram câncer de mama de um mesmo lado da família (por exemplo: avó materna e mãe com câncer de mama). Um grande número de casos, todavia não tem uma história tão fácil de se identificar. Algumas vezes os casos de câncer “pulam” uma geração, ou a história dos antepassados não é disponível. Neste caso, algumas dicas podem ajudar ao médico a suspeitar de que o caso pode ser de câncer hereditário. Por exemplo, câncer hereditário é mais comum em mulheres jovens. Alguém que teve uma irmã com 35 anos de idade com câncer de mama pode estar em risco de pertencer a uma família com câncer hereditário. Pessoas que tiveram dois casos de câncer de mama (tumores bilaterais, por exemplo) podem também fazer parte deste grupo. Uma outra característica dos cânceres hereditários é o aumento de chance de câncer de ovário. De fato, existem famílias com apenas um caso de câncer de mama e dois ou três casos da doença no ovário que tem câncer hereditário. O que causa o câncer hereditário? Na maioria das vezes estes casos são causados por alterações (mutações) em genes chama- 2 Boletim da Masto jan/fev/mar - 2009 dos BRCA1 e BRCA2. Estes genes quando estão alterados facilitam a transformação das células mamárias normais em malignas e o portador de uma mutação nestes genes tem 50% de chance de passá-lo para um filho. Uma vez que uma pessoa é portadora de um gene BRCA1 ou BRCA2 mutado, a sua chance de desenvolver câncer de mama até os 80 anos é de 80% e de ovário, 40%. Quando se suspeita que uma pessoa possa ser de uma família com câncer hereditário é importante tentar fazer o estudo destes genes, porque se uma mutação for encontrada, os recursos que a medicina possui para proteger as pessoas desta família são muito poderosos. A redução de risco nestas pessoas pode cair de 80% para menos de 10% se certas medidas forem tomadas. Mesmo nos casos em que o teste não é possível de ser feito, um acompanhamento com exames especiais e com medicações que reduzem o risco de câncer são medidas muito eficientes. A informação que poderia parecer uma condenação no passado, hoje passa a ser a peça fundamental para a proteção. Se você tem alguma dúvida sobre pertencer ou não a este grupo de risco, converse com seu mastologista. O HSL possui uma Unidade de Aconselhamento Genético capaz de realizar estes exames. Exemplo de história familiar de câncer Diagnóstico do Câncer = Cólon (intestino) Diagnóstico do Câncer = Fígado Diagnóstico do Câncer = Mama Pais Marcos 60 Cólon = Intestino Filhos João 49 Cólon = Intestino Roberto 59 Fígado Netos Carla 45 Mama Entre em contato com o Núcleo de Mastologia pelo telefone: (11) 3155-0854 ou e-mail: [email protected] Florescer, um exercício de solidariedade Consultor de imagem dando palestra e orientações sobre maquiagem www.hospitalsiriolibanes.org.br/masto A preocupação com o bem-estar das mulheres que fazem tratamento contra o câncer de mama vai além do atendimento médico de excelência oferecido pelo Hospital Sírio-Libanês. Para dar apoio e orientação às pacientes que passam por esse tratamento, o Núcleo de Mastologia do Ambulatório de Filantropia do HSL desenvolve desde 2006 o programa Florescer, dedicado a mulheres com câncer de mama encaminhadas ao hospital pelo SUS para se submeterem a cirurgia, inclusive com radioterapia intraoperatória e reconstrução mamária. Os principais objetivos desse trabalho são apoiar, orientar e informar as mulheres com câncer de mama sobre a doença e o tratamento, possibilitando a elas uma melhor reintegração social após a cirurgia. Além disso, o Florescer promove a valorização da qualidade de vida e da auto-estima das participantes. Após a cirurgia, as pacientes são convocadas pela Assistente Social do Núcleo para fazer parte das atividades do grupo conduzido por uma equipe multiprofissional, que tem à frente a coordenadora do Serviço de Voluntários, Isa Maria Marchetti de Oliveira. A equipe é integrada por médico, enfermeira, assistente social, psicóloga, nutricionista, fisioterapeuta e voluntárias. O trabalho também conta com a colaboração de um consultor de imagem que orienta sobre maquiagem e cuidados com o corpo para melhorar a auto-estima das mulheres. Cada grupo de pacientes participa de quatro reuniões – uma por semana – , sempre com a presença de, no mínimo, dois profissionais. Esses encontros proporcionam uma grande integração entre as participantes, auxiliando as pacientes a lidarem melhor com sua atual realidade. Ao final de cada reunião é oferecido um lanche especial e no último encontro é realizada uma confraternização, com sorteio de brindes e atividades surpresas. Desde sua implantação, cerca de 300 mulheres encaminhadas pelo SUS ao HSL já fizeram parte da programação oferecida pelo Grupo Florescer e a avaliação tem sido muito positiva. Numa consulta feita ao final de cada série de reuniões, a aprovação ao trabalho tem sido de 100%. Boletim da MASTO jan/fev/mar - 2009 3 A MAMA NA ARTE TIRANDO DÚVIDAS Prof. Alfredo Carlos S. D. Barros, Coordenador do Núcleo Avançado de Mastologia do HSL 1. Existe uma vacina no HSL para evitar tumor de mama? (Angela Atalla - São Paulo/ SP) Não existe em nenhum lugar vacina para evitar câncer. No HSL pode ser feito um tratamento experimental com anticorpos para câncer de rim em fase avançada, refratário a outras medidas, que tem dado bom resultado, melhorando e até prolongando a vida dos pacientes. Mas é bem diferente de uma vacina para evitar ou tratar qualquer tipo de câncer, como andaram divulgando em corrente pela internet, sem o conhecimento do Hospital. 2. O uso de desodorantes nas axilas causa câncer de mama? (Jussara Tobias – Juquiá/ SP) Como o câncer de mama teve sua incidência aumentada nas últimas décadas, várias atitudes e comportamentos próprios da mulher moderna têm sido sugeridos por pessoas não médicas, como possíveis fatores causais. Assim, por exemplo, o uso de desodorantes, hábito de depilar as axilas, sutiãs apertados, uso de cintos de segurança, viagens de avião e outras coisas sem fundamento, frequentemente aparecem na mídia ou na internet. Não tem nenhuma base científica este tipo de afirmação. Ao que tudo indica, o acréscimo na incidência de câncer de mama tem se devido à mudança de hábitos reprodutivos (pouco número de filhos e curtos períodos de amamentação), alimentação não-natural, obesidade, sedentarismo e fatores tóxicos ambientais. 3. É verdade que homem também pode ter câncer de mama? (Helena Reis Costa – São Paulo/SP) Sim. Os homens apresentam tecido mamário em reduzida quantidade, que pode sofrer transformação para câncer como qualquer órgão; mas é raro. Para cada 100-120 mulheres com câncer de mama detecta-se um em mama masculina. Geralmente o diagnóstico é feito pela palpação de um nódulo e o tratamento, em linhas gerais, não difere do oferecido no câncer da mulher. “O nascimento de Vênus” - Botticelli Galeria Degli Ufizzi - Firenze, Itália Envie suas dúvidas para o Boletim da Masto para o e-mail: [email protected] Expediente: Editor: Prof. Alfredo Carlos S. D. Barros - Gerência De Comunicação: Katia Camata Ribeiro Coordenação DE COMUNICAÇÃO: Marjorie Sapatel - Edição e Produção: Estela Ladner (Espaço 2 Comuni­cações - Tel: (11) 3815-3686) - arte: Adriana Cassiano - Jornalista Respon­­­sável: Simon Widman (MTb. 15460) - Endereço: Rua Dona Ad­ma Jafet, 91 - Cep 01308-050 - Tel: (11) 3155-0949 Fax: (11) 3155-1265 - E-mail: [email protected] - Tiragem: 12.000 exemplares 4 Boletim da Masto jan/fev/mar - 2008 Entre em contato com o Núcleo de Mastologia pelo telefone: (11) 3155-0854 ou e-mail: [email protected]