UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS CO-CIRCULAÇÃO DOS VÍRUS DENGUE TIPOS 1, 2 E 4 NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013 DIEGO MACHADO PEREIRA DA COSTA NATAL 2014 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DIEGO MACHADO PEREIRA DA COSTA CO-CIRCULAÇÃO DOS VÍRUS DENGUE TIPOS 1, 2 E 4 NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013 ORIENTADOR: Prof. Dr. Josélio Maria Galvão de Araújo NATAL 2014 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DIEGO MACHADO PEREIRA DA COSTA CO-CIRCULAÇÃO DOS VÍRUS DENGUE TIPOS 1, 2 E 4 NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013 Dissertação apresentada como parte dos requisitos para a obtenção do título de mestre em Ciências Biológicas. ORIENTADOR: Prof. Dr. Josélio Maria Galvão de Araújo. NATAL 2014 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊCIAS BIOLÓGICAS DIEGO MACHADO PEREIRA DA COSTA CO-CIRCULAÇÃO DOS VÍRUS DENGUE TIPOS 1, 2 E 4 NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013 ORIENTADOR: Prof. Dr. Josélio Maria Galvão de Araújo BANCA EXAMINADORA: Prof. Dr. José Veríssimo Fernandes – DMP/UFRN Prof Dr. Kleber Juvenal Silva Farias – DACT/UFRN Profa. Dra. Tatjana Keesen de Souza Lima – DBCM/UFPB Trabalho realizado no Laboratório de Biologia Molecular de Doenças Infecciosas e do Câncer (LADIC) do Departamento de Microbiologia e Parasitologia (DMP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) sob a orientação do Prof. Dr. Josélio Maria Galvão de Araújo com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Este trabalho é dedicado, Aos meus pais Gilson Alexandre e Edilene Machado, A minha noiva Denise Maria, E aos meus irmãos Diogo Alexandre e Daniel Alexandre. “Quando tudo nos parece dar errado acontecem coisas boas, que não teriam acontecido se tudo tivesse dado certo.” Renato Russo AGRADECIMENTOS Agradeço ao meu orientador Dr. Josélio Maria Galvão por ter me dado a chance de reingressar no mundo da ciência e pela sua ajuda e dedicação durante todo o tempo desde que ingressei no mundo dos flavivírus. À todos os membros do LADIC que me acompanharam durante toda essa jornada de recomeço na pesquisa e do dia a dia de trabalho, Denise Maria, Daíse Sousa, Joelma Dantas e Mário Branco que trabalharam duro nas análises das amostras recebidas pelo LADIC durante todos esses anos e a Renato Almeida e Tábata Lima. À CAPES pela concessão da bolsa de mestrado, ao CNPQ e UFRN pelo auxílio financeiro para realização deste trabalho. Ao programa de pós graduação em Ciências Biológicas, aos coordenadores, professores, secretaria e a todos os colegas de turma que enfrentaram as intermináveis aulas que faziam do CB quase que o nosso lar. Ao professor Dr. José Veríssimo Fernandes por ter ajudado tanto na correção da dissertação com toda sua experiência na área epidemiológica e ao professor Dr. Kleber Juvenal Silva Farias de quem a ajuda na correção também foi bastante valida. Aos amigos Melquisedec, Jennifer, Mariana, Wellington, Bruno, Luciana, Rodrigo pelo apoio e pelos momentos que me fizeram esquecer os problemas. Obrigado pelas horas de alegria. Em especial aos meus pais e meus irmãos, sem essa estrutura solida acho que seria mito mais difícil esse meu desafio. Sem a minha futura esposa Denise Maria, pelo incentivo, apoio incondicional e por todo o amor que com certeza me alimentaram de motivação durante essa caminhada. Só ela pra fazer de um dia pesado de trabalho um dia leve feito pluma. E a Deus por me proporcionar a vida e a saúde necessária para meu crescimento a cada dia. ÍNDICE LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS SIGLAS E ABREVIATURAS RESUMO ABSTRACT 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 1 1.1 BREVE HISTÓRICO.......................................................................................................... 1 1.2. AGENTE ETIOLÓGICO ......................................................................................................... 2 1.2.1. VARIABILIDADE GENÉTICA .......................................................................................... 6 1.3. VETOR ................................................................................................................................. 7 1.4. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS............................................................................................... 10 1.5. PATOGÊNSESE DAS INFECÇÕES PELO VÍRUS DENV .......................................................... 12 1.6. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL ......................................................................................... 14 1.7. EPIDEMIOLOGIA ............................................................................................................... 15 1.7.1. DENGUE NO BRASIL................................................................................................... 15 1.7.2. DENGUE NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA ............................. 16 2. OBJETIVOS ............................................................................................................................... 18 2.1. Geral ................................................................................................................................. 18 2.2. Específicos ........................................................................................................................ 18 3. MATERIAL E MÉTODOS ........................................................................................................... 19 3.1. DESENHO DO ESTUDO...................................................................................................... 19 Trata-se de um estudo epidemiológico observacional transversal, predominantemente descritivo, de dados primários. ................................................................................................ 19 3.2. ÁREA DE ESTUDO ............................................................................................................. 19 3.3. AMOSTRAS CLÍNICAS E BANCO DE DADOS ...................................................................... 20 3.4. EXTRAÇÃO DO RNA VIRAL ................................................................................................ 20 3.5. TRANSCRIÇÃO REVERSA SEGUIDA DA REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE ................. 21 3.6. ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................................................ 23 3.7. CONSIDERAÇÕES ÉTICAS .................................................................................................. 23 4. RESULTADOS ........................................................................................................................... 24 4.1. MONITORAMENTO DOS SOROTIPOS CIRCULANTES NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013 ......................................................................................................... 24 4.2. DISTRIBUIÇÃO DOS SOROTIPOS NOS MUNICÍPIOS DO RN E PB ...................................... 25 4.3. DISTRIBUIÇÃO TEMPORAL DOS CASOS DE DENGUE NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013. ........................................................................................................ 29 4.4. GÊNERO E FAIXA ETÁRIA MAIS AFETADA PELA DENGUE NOS ESTADOS DO RN E PB, 2013......................................................................................................................................... 33 5. DISCUSSÃO .............................................................................................................................. 35 6. CONCLUSÕES ........................................................................................................................... 41 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................... 43 ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Árvore Filogenética da família Flaviviridade baseeada na análise da região NS3 (Lindenbach et al., 2007)............................................................................................................... 2 Figura 2 - Organização genômica dos flavivírus e suas proteínas resultantes (Rothman, 2004). 3 Figura 3 - Estratégia de replicação dos vírus dengue (Rodenhuis-Zybert et al., 2010). .............. 6 Figura 4 - Mosquitos do gênero Aedes. A) Aedes aegypti; B Aedes albopictus (Paupy et al., 2009). ............................................................................................................................................ 8 Figura 5 - Exemplos de criadouros naturais e artificiais dos mosquitos (Paupy et al., 2009). ..... 9 Figura 6 - Classificação da dengue em níveis de gravidade de acordo com a Organização Mundial de Saúde (modificado de WHO, 2009). ........................................................................ 12 Figura 7 - Áreas com risco de transmissão de dengue, 2008 (adaptado de http://www.phacasp.gc.ca/2010/dengue011310-eng.php). ......................................................... 15 Figura 8 - Localização dos estados do Rio grande do norte e Paraíba. ...................................... 19 Figura 9 - Porcentagem dos sorotipos de dengue circulantes nos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba, 2013. ................................................................................................................. 24 Figura 10 - Mapa do RN demonstrando a distribuição espacial dos sorotipos do DENV identificados neste estudo em 2013. ............................................................................................ 26 Figura 11 - Mapa da Paraíba, demonstrando a distribuição espacial dos sorotipos de DENV identificados neste estudo em 2013. ............................................................................................ 26 Figura 12 - Distribuição mensal de casos estudados e confirmados de dengue no estado do rio Grande do Norte, 2013. ............................................................................................................... 29 Figura 13 - Distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV no estado do Rio Grande do Norte, 2013. ............................................................................................................................ 30 Figura 14 - distribuição mensal de casos estudados e confirmados de dengue no estado da Paraíba, 2013. .............................................................................................................................. 31 Figura 15 - Distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV no estado da Paraíba, 2013. ..................................................................................................................................................... 32 Figura 16 - Distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV no estado da Praíba, 2013. ..................................................................................................................................................... 33 Figura 17 - Número de casos confirmados por faixa etária no RN e PB, 2013. ........................ 34 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Oligonucleotídeos iniciadores utilizados na transcrição reversa seguida pela reação em cadeia pela polimerase (RT-PCR) para detecção e tipagem dos DENV. .............................. 21 Tabela 2 - reagentes utilizados na transcrição reversa seguida pela reação em cadeia pela polimerase (RT-PCR).................................................................................................................. 22 Tabela 3 - Distribuição dos casos positivos e dos sorotipos por município do Rio Grande do Norte, 2013.................................................................................................................................. 27 Tabela 4 - Distribuição dos casos positivos e dos sorotipos por município da Paraíba. ............ 28 Tabela 5 - Distribuição mensal dos casos estudados e positivos por DENV no estado do Rio Grande do Norte, 2013. ............................................................................................................... 30 Tabela 6 - Distribuição mensal dos casos estudados e positivos por DENV no estado da Paraíba, 2013. .............................................................................................................................. 31 SIGLAS E ABREVIATURAS %: sinal de porcentagem l : Microlitro °C: Grau celsius µM: Micromolar Ae.: Aedes C: Proteína estrutural do capsídeo viral D1: Iniciador sense D1 D2: Iniciador anti-sense D2 DC: Dengue Clássica dc: Depois de cristo DENV: Vírus dengue DENV-1: Sorotipo 1 dos vírus dengue DENV-2: Sorotipo 2 dos vírus dengue DENV-3: Sorotipo 3 dos vírus dengue DENV-4: Sorotipo 4 dos vírus dengue E: Proteína estrutural do envelope ECP: Efeito citopático ELISA: Ensaio imunoenzimático indireto FHD: Febre hemorrágica da dengue IFI: Imunofluorescência indireta IgG: Imunoglobulina G IgM: Imunoglobulina M Kb: Kilobase kDa: Quilodaltons Km: Quilômetros Km²: Quilômetros quadrados LACEN: Laboratório Central LADIC: Laboratório de Biologia Molecular de Doenças Infecciosas e do Câncer M: Proteína estrutural da membrana ml: mililitro NS: Proteína não estrutural do vírus NS1: proteína não estrutural 1 NS2A: proteína não estrutural 2A NS2B: proteína não estrutural 2B NS3: proteína não estrutural 3 NS4A: proteína não estrutural 4A NS5: proteína não estrutural 5 NS4AB: proteína não estrutural 4B ORF:Open reading frame PAHO: Pan American Health Organization PB: Paraíba Pb: Pares de bases PCR: Reação em cadeia pela polimerase pH: Potencial Hidrogeniônico RN: Rio Grande do Norte RNA: Ácido ribonucleico RT-PCR: Transcrição reversa seguida da reação em cadeia pela polimerase SCD: Síndrome de choque da dengue TBE: Tris Borato EDTA TS1: Iniciador tipo-específico para DENV-1 TS2: Iniciador tipo-específico para DENV-2 TS3: Iniciador tipo-específico para DENV-3 TS4: Iniciador tipo-específico para DENV-4 UFRN: Universidade Federal do Rio Grande do Norte RESUMO A dengue é uma doença viral transmitida ao homem pela picada da fêmea de mosquitos do gênero Aedes, sendo o principal vetor urbano o Aedes aegypti. Atualmente a dengue tem causado, em escala global, considerável mortalidade e morbidade, o que a torna um grave problema de saúde pública em todo o mundo. São conhecidos quatro sorotipos antigenicamente distintos: vírus dengue (DENV) tipo 1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4. O objetivo desse estudo foi descrever o perfil epidemiológico da dengue nos estados do Rio Grande do Norte (RN) e Paraíba (PB) durante o ano de 2013. Para isso, foram estudados casos suspeitos de dengue, recebidos pelo Laboratório de Biologia Molecular de Doenças Infecciosas e do Câncer (LADIC-UFRN), provenientes de diferentes unidades de saúde dos estados do RN e PB, no período compreendido entre janeiro e dezembro de 2013. O RNA viral foi obtido da extração das amostras de soro de pacientes com suspeita de dengue, atendidos nas unidades de saúde do RN e PB. Foram estudados 478 casos suspeitos de dengue, sendo 252 (52,7%) do Rio Grande do Norte e 226 (47,3%) da Paraíba revelando uma taxa de prevalência global de infecção de 29,7% (142/478) considerando os dois estados. Foi observada a co-circulação de três sorotipos virais: DENV-1 (9,8% [14/142]), DENV-2 (3,5% [5/142]) e DENV-4 (86,7% [123/142]). A faixa etária de 21-30 anos foi a mais acometida pela doença em todo o período de estudo, representando 23,9% dos casos. O gênero mais acometido foi o feminino, representando 63,3% dos casos nos dois estados. O município de maior circulação do Estado do Rio Grande do Norte foi Pau dos Ferros, com 8,2% (8/97) dos casos identificados. Já na Paraíba, o município mais afetado foi João Pessoa, com 80% (36/45) dos casos. Os meses de maior circulação viral no RN e PB foram Março e Agosto, respectivamente. Estes resultados são de grande importância para a compreensão da atividade dos vírus dengue nos estados do RN e PB, fornecendo dados para nortear as ações de controle da doença, em apoio aos programas locais de combate a dengue. ABSTRACT Dengue is a viral disease transmitted by female mosquitoes from genus Aedes, the principal urban vector is Aedes aegypti. Actually dengue has caused, in global scale, substantial morbidity and mortality. Four serotypes (antigenically distinct) are known: DENV-1, DENV-2, DENV-3 and DENV-4. The objective of this study was described the epidemiological profile dengue in the states of Rio Grande do Norte (RN) and Paraíba (PB), 2013. For that, suspected cases of dengue were studied, received for Laboratory of Molecular Biology of infectious disease and cancer (LADIC-UFRN) from different Health Units from RN and PB between January and December of 2013. The viral RNA was obtained from serum samples of patient from health units from RN and PB. It were studied 478 suspected cases of dengue , 252 (52,7%) from Rio Grande do Norte and 226 (47,3%) from Paraíba, showeds a global rate of infection global prevalence of 29,7% (142/478). The co-circulation of three serotypes was observed: DENV-1 (9,8% [14/142]), DENV-2 (3,5% [5/142]) and DENV-4 (86,7% [123/142]). People between 21-30 years old were the most affected by the disease during all the period of the study, representing 63,7% of the cases in both states. The genus most affected was female, representing 63,3% of cases in both states. Pau dos Ferros, Rio Grande do Norte, had the highest circulation of disease, with 8,2% (8/97) of cases. In Paraíba, the city most affected was João Pessoa, with (80% (36/45) of cases. The months with the biggest viral circulation in RN and PB were March and August, respectively. These results are very important to understanding the dengue viral activity in RN and PB, providing data that can guide control actions of this disease in support to local control programs. 1 1. INTRODUÇÃO 1.1 BREVE HISTÓRICO As evidências científicas atuais sugerem que os vírus dengue (DENV) possam ter origem asiática, tendo esses vírus evoluído no processo de separação de populações de primatas não-humanos infectados há aproximadamente 500 anos atrás (Wang, 2000; Halstead, 1988). Essas evidências, aliadas ao fato de ter sido constatada a circulação dos quatro sorotipos na Ásia, reforçam a teoria da origem asiática desses vírus, em detrimento da origem africana citada em outros estudos (Gubler, 2004; Gubler, 1997). O registro mais antigo da doença foi feito na dinastia Chin (265-420 dc) (Gubler, 1998). A doença foi caracterizada por febre, dor nos olhos, artralgia, mialgia e manifestações hemorrágicas (Gubler., 1997). Havendo relatos na literatura médica que descrevem uma enfermidade com as características da dengue no período de 1779 e 1780 (Gubler, 1998; Lupi, 2007). Porém, ainda hoje, há dificudade em confirmar se essa doença se tratava da dengue, já que pelos dados clinicos é muito dificil fazer distinção de outras viroses, devido aos sinais e sintomas compartilhados com outras doenças (Vasilaski et al., 2010). Entre os séculos XVII e XIX, a dengue foi dispersa pela América do Norte, América do Sul, Bacia do Caribe, Ásia e Austrália. A grande propagação nas Américas se deu devido ás repetidas introduções do vetor stegomya (St.) aegypti (Aedes aegypti) através dos navios que atravessavam o oceano Atlântico vindo da África (RodriguezRoche & Gould, 2013). O isolamento das primeiras amostras de dengue ocorreu durante a Segunda Grande Guerra Mundial quase simultaneamente por pesquisadores japoneses e americanos, com o isolamento da cepa Mochizuki em 1943 por Kimura e Hotta, e em 1944, Sabin isolou as cepas Havaí e a Nova Guiné (Sabin & Schelinger, 1945). Ao constatar a existência de características antigênicas diferentes, passou a denominá-las respectivamente sorotipo 1 e sorotipo 2 (Sabin, 1952), consideradas atualmente como protótipos. Posteriormente, dois novos vírus sorologicamente relacionados foram isolados durante uma epidemia de dengue hemorrágica (DHF) ocorrida em Manila 2 (Filipinas) em 1956. Estes vírus foram classificados como DENV-3 e DENV-4 (Hammon et al., 1960) e as cepas H87 (DENV-3) e H241 (DENV-4) consideradas protótipos. Inicialmente a dengue se mostrou um grave problema de saúde pública na Ásia, mais precisamente no período após a Segunda Guerra Mundial, que gerou uma gama de alterações socioambientais que favoreceram a proliferação do vetor (Gubler, 1997, Gubler, 2002). No Brasil, os primeiros registros foram feitos em 1846 (Braga & Valle, 2007). O termo “dengue” foi oficialmente inserido na literatura médica em 1969, sendo usado até hoje (Halstead, 1980). 1.2. AGENTE ETIOLÓGICO O vírus dengue pertence ao grupo dos arbovírus, vírus transmitidos por artrópodes. São vírus que permanecem na natureza em ciclos complexos envolvendo um ou mais vertebrados-reservatório que podem ser humanos ou animais domésticos e vetores artrópodes que se infectam após sugarem o sangue de vertebrado virêmico, transmitindo o vírus a outros vertebrados (após período de incubação extrínseca necessária) (Beaty, et al 1995). Dentro desse grupo temos vírus classificados em diferentes famílias (Togaviridae, Flaviviridae, Bunyaviridae, Reoviridae, Rhabdoviridae) (Brown, 1986). Os DENV estão inclusos na família Flaviviridae que é composta por três gêneros: O gênero Flavivirus (no qual estão agrupados os quatro sorotipos dos Vírus Dengue (DENV 1-4), Vírus da Febre Amarela, Vírus do Oeste do Nilo e da Encefalite Japonesa), o gênero Pestevirus na qual inclui-se os vírus da diarreia bovina e da peste suína clássica, e o gênero Hepacivirus, onde encontramos agrupados os vírus das hepatites C e G (Figura 1) (Gubler, 1998; Halstead, 1988). Figura 1 - Árvore Filogenética da família Flaviviridade baseeada na análise da região NS3 (Lindenbach et al., 2007). 3 Os flavivírus apresentam formato esférico, mas possuem capsídio com simetria icosaédrica envolvido por envelope contendo espículas, formando uma partícula com cerca de 40 a 50 nm de diâmetro. Seu genoma é constituído de RNA fita simples, linear, de polaridade positiva, contendo no terminal 5’7- metilguanosina (cap), no entanto, o terminal 3’ não é poliadenilado, o que os diferenciam dos outros vírus de polaridade positiva como constituinte do seu genoma (Lindenbach et al., 2007). O genoma tem uma única janela aberta de leitura (open reading frame, ORF), codificando uma poliproteína (Figura 2) que após o seu processamento dará origem a três proteínas estruturais (capsídeo, membrana e envelope) e a sete não-estruturais (ROTHAM, 2004). Figura 2 - Organização genômica dos flavivírus e suas proteínas resultantes (Rothman, 2004). O genoma do vírus dengue possui cerca de 11000 pares de base que codifica uma poliproteína de aproximadamente 3400 aminoácidos, como em todo flavivírus, a poliproteína é clivada por proteases virais e celulares em três proteínas estruturais (proteínas de core-C, da membrana-M e a glicoproteína de superfície-E) e sete não estruturais (NS1, NS2A, NS2B, NS3, NS4A, NS4B e NS5) sendo a proteína NS5 a que apresenta sequências nucleotídicas mais conservadas (Gubler, 1998; Mendez et al., 2010) e flanqueado por regiões não codificantes denominadas UTRs, que possuem de 100 a 400 pares de bases e tem importante papel na regulação de processos relativos à replicação viral (Lodeiro et al., 2009; Lindenbach et al., 2007). O primeiro polipeptídeo sintetizado durante a tradução é a proteína C que tem peso molecular de aproximadamente 13,5 kDa. A proteína M é produzida durante o processo de maturação da partícula viral na via secretora, oriunda da proteína precursora prM (21 kDa), têm peso molecular de 8 kDa (Lindenbach et al., 2007). A glicoproteína de envelope (E) é a maior proteína do envelope do vírus (53 kDa) e tem papel chave em importantes processos, tais como o de adsorção, a 4 penetração do vírus na célula e montagem das partículas virais, além de ser o principal determinante antigênico dos vírus dengue (Lindenbach et al., 2007; Ma et al., 2004; Guzmán; Kourí, 2004). A glicoproteína E é constituída por três domínios: o domínio I forma uma estrutura denominada barril beta, o domínio II se projeta ao longo da superfície da partícula viral e o domínio III está envolvido com a ligação aos receptores celulares (o principal alvo de anticorpos neutralizantes) (Lindenbach et al., 2007). Assim como todos os flavivírus, os DENV têm um grupo de epítopos comum na proteína do envelope que resulta em reações cruzadas em testes sorológicos (Gubler, 1998). De acordo com o sorotipo viral e as células em que o vírus é propagado, as proteínas E são glicosiladas diferentemente. Essa glicosilação de E vem sendo relacionada com a ligação ao receptor e fusão endossomal (Clyde; Kyle; Harris, 2006). A proteína NS1 (46 kDa) tem função importante nos estágios iniciais da replicação do RNA atuando na fase precoce da infecção viral e sua interação com a proteína NS4A, é essencial para atividade da replicase viral (Lindenbach et al., 2007; Khromykh et al., 1999) podendo ser encontrada no interior (retículo endoplasmático) e na superficie de células infectadas (ancorado na membrana), e na forma livre no soro do individuo infectado (forma secretada) (Lindenbach et al., 2007). A forma secretada é um alvo constante da imunidade humoral, assim como a glicoproteína E, e pode ter um papel importante na patogênese da doença (Clyde, Kyle, Harris, 2006). A proteína NS2A, uma proteína hidrofóbica, relativamente pequena (22kDa), aparentemente tem função na replicação do RNA viral (Lindenbach et al., 2007). Já NS2B possui 14 kDa e está associada a membrana, formando um complexo estável com NS3 estando envolvida na função de protease do complexo NS2B-NS3 serino protease (Falgout et al., 1991). A NS3 é uma proteína grande (70 kDa) e a melhor caracterizada. Sendo multifuncional, que tem importante função na replicação do RNA e no processamento da poliproteína (Lindenbach et al., 2007). NS4A (16kDa) e NS4B (27 kDa), são relativamente pequenas e hidrofóbicas. A interação de NS4A com NS1 é extremamente importante para a atividade da replicase viral, como foi mencionado anteriormente (Lindenbach et al., 2007; Khromykh et al., 1999). Tem sido citada a capacidade de NS4B e NS2A de, em conjunto, bloquear a tradução de sinal mediada por interferon Clyde, Kyle, Harris, 2006). 5 A proteína NS5 grande (103 kDa) quando comparada as outras proteínas não estruturais do DENV, é altamente conservada, multifuncional e apresenta atividade de metiltransferase (MTAse) e de polimerase RNA dependente ( RdRp) (Lindenbach et al., 2007). No momento da adsorção os DENVs interagem com múltiplos receptores celulares, acarretando em uma considerável variedade de células susceptíveis ao vírus no organismo humano, como as células da linhagem mononuclear fagocitária, cardíacas, cerebrais, renais, hepáticas, pulmonares e da medula óssea (Araújo et al., 2009; Jessie et al., 2004; Rodenhus-Zybert et al., 2010). Através da endocitose as partículas virais penetram nas células susceptíveis após o reconhecimento de proteínas virais do envelope por parte de receptores celulares específicos, seguido de uma reação mediada por clatrinas (Chu & Ng, 2004). Este processo resultará na formação de vesículas endocíticas que, ao atingirem o pH adequado, promovem a fusão do envelope viral com a membrana do endossoma, liberando o nucleocapsídeo no citoplasma da célula (Gollins & Porterfield, 1986; Kuhn et al., 2002; Modis et al., 2004). Com o genoma viral no citoplasma da célula, é iniciada a replicação do genoma. O RNA viral liberado no citosol é transcrito em um único RNA mensageiro, seguido de tradução em poliproteínas virais que são posteriormente clivadas dando origem a proteínas não estruturais, que atuam na regulação do ciclo replicativo e em proteínas estruturais. As cópias geradas de RNA são empacotadas para formarem novas partículas, vírions imaturos que brotam da membrana do retículo endoplasmático (Lindenbach et al., 2007). O amadurecimento das partículas virais ocorre durante a passagem através das vesículas do complexo de Golgi, onde é feita a glicosilação da glicoproteina-E e a prM é clivada por uma proteína do tipo furina, resultando na formação de partículas maduras. Por fim, através da exocitose as partículas de vírus são liberadas da célula (Figura 3). 6 Figura 3 - Estratégia de replicação dos vírus dengue (Rodenhuis-Zybert et al., 2010). 1.2.1. VARIABILIDADE GENÉTICA Os DENV apresentam grande variabilidade genética (assim como outros vírus de RNA) devido ao alto grau de mutação associado com a RNA polimerase RNAdependente e suas rápidas taxas de replicação e ausência de mecanismos de reparo, que pode ser comprovada pela existência de quatro sorotipos antigenicamente distintos entre si, os quais são compostos por diferentes genótipos e linhagens (Holmes, 2009; Twiddy, 2002). Atualmente, alguns estudos apontam para a descoberta de um novo sorotipo de DENV (possível DENV-5) de transmissão silvestre na Malásia onde foi detectado em humanos, estando inclusive associados a casos graves da doença (Vasilaskis et al., 2013). Através de estudos filogenéticos foi possível constatar diferentes genótipos em cada sorotipo. O DENV-1 possui cinco genótipos circulantes, o genótipo I (Sudeste 7 Asiático, China e África Oriental), o genótipo II (Tailândia), genótipo III (Malásia), o genótipo IV (Pacífico Sul) e o genótipo V (América/África) o único que possui evidencias de circular no Brasil (Rico-Hesse 1990; Myat et al., 2005; Kukreti et al., 2008). O DENV-2 possui cinco genótipos circulantes (Twiddy et al., 2002). Sendo um silvestre e quatro urbanos. Os genótipos urbanos são o “genótipo americano” (cepas isoladas recentemente na América Latina e outras isoladas entre os anos de 1950 e 1970 na Índia, no Caribe e Ilhas do Pacifico); o “genótipo cosmopolita” com ampla distribuição geográfica, estando presentes na Austrália, Ilhas do Pacífico, Sudeste Asiático, Índia, Ilhas do Oceano Índico, Oriente Médio e África; o “genótipo asiático/americano” (amostras oriundas da América Latina, Caribe, Vietnã e Tailândia e dois genótipos asiáticos); o “genótipo asiático 1”, (cepas isoladas na China, Filipinas, Sri Lanka, Taiwan e Vietnã) e o “genótipo asiático 2” (cepas oriundas da Malásia e Tailândia) (Twiddy et al., 2002). Também agrupando cinco genótipos está o sorotipo DENV-3. O genótipo I (vírus provenientes da Indonésia, Malásia, Filipinas e do Sul do Pacífico), o genótipo II (vírus da Tailândia, Bangladesh, Malásia e Mianmar) e o genótipo III (vírus do Sri Lanka, Índia, Samoa, África e das Américas). Já os genótipos IV e V possuem menor importância epidemiológica por serem compostos por cepas antigas oriundas de Porto Rico (GIV), Filipinas, Japão e China (GV) (Araújo et al., 2009; Lanciotti et al., 1992). O DENV-4 apresenta três genótipos, o Genótipo-1 (vírus das Filipinas, Tailândia e Sri Lanka), o genótipo-2 (vírus da Indonésia, Nova Caledônia, Taiti, Caribe e América do Sul) e o genótipo III (exclusivamente no ambiente silvestre da Malásia) (Lanciotti et al., 1997; Lanciotti et al., 1994). 1.3. VETOR Os mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus (figura 4) pertencentes à família Cullicidae e são considerados os principais vetores da dengue (Gubler, 2006; Jansen & Beebe al., 2010). Para ser possível considerar uma espécie como vetor de um agente etiológico, essa espécie deve ser capaz de ser infectada por um determinado patógeno 8 via oral, conseguir resistir à replicação e transmiti-lo a um hospedeiro susceptível. O Aedes aegypti e o Aedes albopctus são capazes de transmitir os quatro sorotipos de DENV, já que podem ser infectados pelo vírus em suas células epiteliais do intestino, onde ocorre a replicação e a disseminação deste para a hemocele e em seguida suas glândulas salivares (Salazar et al., 2007). Figura 4 - Mosquitos do gênero Aedes. A) Aedes aegypti; B Aedes albopictus (Paupy et al., 2009). O mosquito Aedes aegypti é o mais importante vetor da dengue (Ministério da Saúde, 2009), sendo um culicídeo de origem africana, levado as Américas no período do descobrimento (Rey, 2008). Nas Américas se tornou um mosquito urbano e doméstico, estreitamente ligado ao hábitat humano. É um mosquito pequeno, de coloração preta e branca encontrado em regiões tropicais e subtropicais do mundo que coloca seus ovos em recipientes com água encontrados comumente dentro e ao redor das casas (Gubler, 1998; Jansen & Beebe, 2010). Tendo como criadouros preferenciais os recipientes abandonados ou utilizados pelo homem, como garrafas, vidros, pneus, toneis, latões, etc (Consoli & Oliveira, 1994). Possuem dificuldades em percorrerem longas distâncias, geralmente não voam muito, chegando a 100 m de onde surgiram (WHO, 2009). O Ae. aegypti é considerado um mosquito cosmopolita, sua distribuição se dá nas regiões tropicais e subtropicais (Consoli & Oliveira, 1994). Além das condições climáticas, sua distribuição está ligada a fatores inerentes ao ambiente doméstico que oferece condições ideais, mesmo quando o ambiente externo encontra-se 9 temporariamente adverso, ele não se torna totalmente dependente da chuva por encontrar nesses locais recipientes artificiais com água utilizados pelo homem (Figura 5) (Jansen & Beebe, 2010). Na década de 30, o mosquito já ocupava uma grande área do Brasil. Na década de 40 teve inicio uma campanha de controle dos mosquitos vetores da Febre Amarela que acarretou na erradicação do mosquito, já em 1955 não houve notificações de dengue ou febre amarela no Brasil. Porém, devido a uma descontinuidade dos programas de controle, os Aedes aegypti foram reintroduzidos no Brasil na década de 70 (Gubler, 1998). Figura 5 - Exemplos de criadouros naturais e artificiais dos mosquitos (Paupy et al., 2009). Durante o dia, o Ae. aegypti realiza seu repasto sanguíneo, diferentemente de outros mosquitos, se alimenta em dois períodos do dia, durante o amanhecer e ao entardecer (Jansen et al., 2010), realizando inúmeros repastos para uma única ovoposição. Apenas a fêmea se alimenta de sangue, a preferência é por sangue humano, este fato determina um aumento considerável no número de ovos se comparado ao repasto em outros vertebrados. Os ovos são postos em recipientes que acumulam água, podendo resistir à dessecação por mais de um ano (Gubler et. al.2007). Se o mosquito se alimentar do sangue de um indivíduo infectado por dengue, o vírus irá replicar-se no seu trato digestivo e atingirá suas glândulas salivares, após um período de incubação extrínseca de 8 a 12 dias. Após esse período, o mosquito é capaz de transmitir a infecção durante o resto da sua vida (Lupi et al., 2007; Muller, 2011). Os machos também possuem hábito alimentar diurno, porém, se alimentam de substâncias açucaradas e durante esse período também seguem as fêmeas para realizar a cópula (Consoli & Oliveira, 1994). 10 Alguns fatores são agravantes para a transmissão e disseminação da dengue, como os sucessivos repastos sanguíneos para uma única postura de ovos (Jansen & Beebe, 2010), a capacidade dos ovos se manterem viáveis por vários meses, devido sua alta capacidade de resistir à dessecação (Tauil, 2002) e a transmissão transovariana do vírus (Consoli & Oliveira, 1994). Outro importante vetor da dengue é o Aedes albopictus também conhecido como “tigre asiático”, considerado o vetor secundário da dengue em áreas rurais do sudeste da Ásia e Ilhas do Pacífico (Gratz, 2004). Sendo um vetor competente para pelo menos 22 arbovírus, inclusive os 4 sorotipos do DENV (Cecílio et al., 2009), que invadiu o continente americano em 1985 e teve seu primeiro relato no Brasil em 1986 no Rio de Janeiro e Minas Gerais (Martins et al., 2006). O Ae. albopictus possui o tórax enegrecido, frequentemente com faixa, manchas ou desenhos de cor branca-prateada (Forattini, 1986), seus microhabitats são buracos em árvores e recipientes naturais e artificiais e assim como o Ae. aegypti, seus ovos resistem a dessecação por vários meses (Cecílio et al., 2009). Desde sua descoberta no Brasil, se dispersou tão fácil e rapidamente que já pode ser encontrado em quase todas as regiões do país (Martins et al., 2006), podendo ser encontrado dentro de domicílios como o Ae. aegypti, mas é comum encontrá-lo no peridomicílio onde se alimenta e faz ovoposição. Possui hábito alimentar diurno, sendo a fêmea o gênero hematófago da espécie (Lima-camara et al., 2006). Além do A. aegypti e do A. albopictus várias outras espécies como Ae. scutellaris e Ae. polynesiensis, foram relacionadas a epidemias em diversas regiões do mundo, no entanto, nenhuma delas é um vetor tão eficiente quanto o A. aegypti (WHO, 1997). 1.4. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A infecção pelos vírus DENV pode ocorrer de forma assintomática, indiferenciada, clássica ou grave (Febre Hemorrágica do Dengue e Síndrome do choque da dengue) (Rigau-Pérez et al., 1998). A dengue assintomática ocorre devido a fatores relacionados a vírus (virulência) ou a fatores ligados ao hospedeiro (resposta imunológica). Já a forma indiferenciada é comumente confundida com a gripe, pois tem manifestações clinicas semelhantes. Neste 11 caso muitos pacientes são diagnosticados, erradamente, como portadores de simples virose ou gripe (Souza et al., 2008). Estas infecções apresentam grande importância epidemiológica por serem fonte silenciosa de transmissão de vírus (Vasconselos et al., 1998). A dengue clássica é uma doença febril, auto limitante e raramente fatal, cujos principais sintomas são: febre, dor de cabeça frontal, dor retrorbital, dor muscular e articular, náuseas, vômitos e erupções cutâneas (Kalayanarooj et al., 1997; Rigau-Pérez et al., 1998; Mendez et al., 2010). Também podem ocorrer hemorragias leves ou graves. As mais comuns são as hemorragias de pele, gengiva, nasais, gastrointestinais e menorrágicas (Gubler, 1998). A fase aguda da doença tem duração curta, de 3 a 7 dias, com um período de recuperação que pode se prolongar por algumas semanas, não estando nenhum tipo de sequela associada a mesma (Gubler, 1998). A FHD apresenta sintomas semelhantes aos do DC no inicio de seu desenvolvimento, com o surgimento de sintomas específicos por volta do terceiro ao sétimo dia de infecção (Rigau-Pérez et al., 1998; Gubler, 1998; OMS, 1997). As principais manifestações clínicas são: febre alta, fenômenos hemorrágicos como petéquias, lesões purpúricas e equimose. Em muitos casos ocorre hepatomegalia e falha no sistema circulatório (Gubler, 1998; OMS, 1997). Essas manifestações clinicas específicas são causadas por uma série de alterações fisiopatológicas como aumento da permeabilidade vascular, lesões imunopatólogicas nas paredes dos vasos e queda significativa no número de plaquetas (OMS, 1997). Apesar de na maioria dos casos, a administração de fluidos intravenosos se mostrarem suficiente para o reestabelecimento das funções normais do paciente, é de extrema importância o monitoramento do mesmo pois o quadro pode evoluir de forma rápida para o choque (Rigau-Pérez et al., 1998). Tendo como base esse vasto espectro de manifestações clínicas, em 2009, a Organização Mundial de Saúde publicou uma atualização da classificação dos casos da doença objetivando um diagnóstico mais eficiente das formas graves de infecção. Neste 12 documento, a dengue foi classificada em: 1) Dengue sem sinais de alerta que corresponde ao dengue clássico, com sintomas característicos da doença; 2) Dengue com sinais de alerta que reúne pacientes com manifestações clinicas que podem indicar o desenvolvimento de formas graves e; 3) Dengue grave, caracterizada pelo extravasamento de plasma, hemorragia e grave comprometimento de órgãos (Figura 6). . Figura 6 - Classificação da dengue em níveis de gravidade de acordo com a Organização Mundial de Saúde (modificado de WHO, 2009). 1.5. PATOGÊNSESE DAS INFECÇÕES PELO VÍRUS DENV Estudos da patogênese dos vírus dengue no organismo humano são essenciais para a compreensão da ação desse agente infeccioso contribuindo para o desenvolvimento de medicamentos e vacinas (Halstead, 1988). No entanto, observamos a existência de lacunas significativas nessa área, fato que pode ser justificado pela inexistência de um modelo animal eficiente para este tipo de estudo (Halstead, 1988; Chaudry et al.,2006). Após a picada de uma fêmea de Aedes aegypti infectada, as partículas virais penetram através da pele do hospedeiro seguindo para os linfonodos regionais e subsequentemente atingindo a circulação sanguínea causando viremia, que é caracterizada pela ocorrência de febre (Lupi et al., 2007; Tavares et al., 2005). Durante a infecção ocorre ativação da imunidade celular e humoral, caracterizadas pela ativação de linfócitos (TCD4+ e TCD8+) e produção de anticorpos específicos a proteínas constituintes do envelope viral (Lanciotti et al., 1992). A partir do quarto dia de infecção, anticorpos da classe IgM podem ser encontrados no soro de indivíduos infectados, se constituindo numa informação 13 importante para a realização de testes diagnósticos rápidos. Ainda durante a primeira semana de infecção, os anticorpos da classe IgG, responsáveis pela imunidade específica ao sorotipo, já podem ser detectados e permanecem detectáveis por muitos anos (Lupi et al., 2007). A presença de anticorpos específicos (IgG) explica o fato de um individuo só poder ser infectado uma única vez por cada um dos sorotipos, uma vez que a imunidade é permanente (Ministério da Saúde, 2009). Os mecanismos por trás do desenvolvimento das formas graves da doença (FHD e SCD) não são bem compreendidos, no entanto existem algumas teorias que inferem sobre essa questão. Dentro desse contexto, algumas teorias sugerem explicações para essa variação de formas de evolução clínica. Entre elas podemos citar a teoria da infecção sequencial proposta por Halstead (1988). Essa teoria sugere que anticorpos produzidos por uma infecção prévia não são capazes de neutralizar outro sorotipo em uma infecção secundária. A interação desses anticorpos com os vírus na infecção secundária formaria imunocomplexos que se ligariam a receptores de FC de monócitos e macrófagos, sendo endocitados por essas células de defesa, onde replicariam livremente e após a conclusão do ciclo replicativo estariam livres para infectar novos monócitos e macrófagos. Dessa forma, observa-se uma otimização do processo de replicação viral. Durante esse processo são liberadas substâncias de ação vasoativas que aumentam a permeabilidade vascular, fator de risco importante para o desenvolvimento de hipovolemia e choque Halstead, 1998; Lupi et al., 2007; Gubler, 1998). Rosen (1977) inferiu sobre a importância da virulência da cepa viral para a evolução de formas graves de infecção, explicando dessa forma a ocorrência de formas graves em infecções primárias. Por fim, Kouri et al., (1987) e Martinez (1998), sugeriram em seus estudos que esse processo não está relacionado apenas a fatores inerentes ao agente etiológico ou ao hospedeiro, atribuindo um caráter multifatorial a essa questão, onde fatores epidemiológicos, individuais e virais estariam relacionados de forma integral a evolução de formas graves da doença. 14 1.6. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL Os métodos de diagnóstico da dengue envolvem a detecção do vírus, do material genético viral (RNA), de antígenos virais (ex: NS1) ou anticorpos (IgM ou IgG), sendo a escolha do método diretamente relacionada à sua finalidade (diagnóstico clínico, vigilância epidemiológica, desenvolvimento de vacinas), do período de coleta da amostra biológica, do laboratório onde serão realizadas as análises, dos profissionais que realizarão os testes e dos custos financeiros dos mesmos (Nogueira et al., 1999; WHO, 2009; Lanciotti, 1992). Os métodos mais utilizados para diagnóstico clínico de rotina da dengue são os sorológicos, representados pela técnica da MAC ELISA, capaz de detectar anticorpos das classes IgM e IgG no soro do paciente, geralmente utilizado para confirmação de casos suspeitos sendo capaz de detectar infecções atuais ou recentes com amostra colhida a partir do sexto dia após início dos sintomas (Ministério da Saúde, 2011). O diagnóstico também pode ser realizado através da detecção do antígeno viral NS1 de forma eficiente e precoce, uma vez que NS1 pode ser detectada antes da detecção de IgM (Alcon et al., 2002; WHO, 2009). Com o objetivo de monitorar o sorotipo viral circulante, as técnicas de isolamento viral e da transcrição reversa seguida da reação em cadeia da polimerase (RT-PCR) são as mais utilizadas (MS, 2010). O isolamento viral é uma técnica geralmente realizada usando clones de células C6/36, muito sensíveis a infecção pelos DENV e de fácil manutenção, sendo a presença do vírus detectada pelo seu efeito citopático (ECP), por imunofluorescência indireta (IFI) ou RT-PCR (Gubler et al., 1984). A técnica de RT-PCR exige tecnologias complexas e profissionais qualificados para sua realização. Entre essas podemos citar a RT-PCR, o sequenciamento genômico e a RT-PCR em tempo real. A técnica de RT-PCR é muito eficiente na determinação do sorotipo infectante, uma vez que se trata de um método rápido e sensível, estando suas limitações restritas ao custo elevado e a necessidade de instalações laboratoriais adequadas e profissionais treinados para sua realização (Miagostovich et al, 1997). O sequenciamento genômico, por sua vez, pode ser realizado de forma parcial (gene do envelope) ou completa (genoma completo) e tem como principal aplicação o 15 monitoramento de variantes virais (genótipos e linhagens) circulantes na região a ser estudada (Miagostovich et al, 1993). 1.7. EPIDEMIOLOGIA A dengue vem alcançando o status de pandemia. Atualmente coloca em risco a saúde de aproximadamente 2,5 bilhões de pessoas ao redor do mundo que residem em mais de 50 países, de clima tropical e subtropical (Bricks, 2004) (Figura 7). Anualmente, cerca de 50 milhões de infecções por dengue ocorrem segundo a Organização Mundial de Saúde. Houve um aumento considerável do número de casos nos países em desenvolvimento, que pode ser atribuído ao crescimento desordenado, propiciando condições ideais para a multiplicação do mosquito vetor (Bricks, 2004; Gubler, 2004). . Figura 7 - Áreas com risco de transmissão de dengue, 2008 (adaptado de http://www.phacasp.gc.ca/2010/dengue011310-eng.php). 1.7.1. DENGUE NO BRASIL Surtos de dengue são registrados desde 1864, com relatos no Rio de Janeiro e com prováveis ocorrências no Sul, Sudeste e Nordeste do Brasil durante o século 19 (Figueiredo, 2000). 16 Nas décadas de 50 e 60 não houve mais relatos de mosquitos vetores da dengue no Brasil, graças a uma campanha de combate ao vetor da Febre Amarela que englobou os países da América Central e do Sul (Rigau et al., 1998). Porém na década de 70, a partir de Salvador na Bahia, o Ae. aegypti voltou a ser encontrado no Brasil, como o mosquito se alastrou por países vizinhos, essa nova infestação não pode ser eliminada (Tauil, 2001; 2002). Em 1981 ocorreu um surto de dengue na cidade de Boa Vista no estado de Roraima, onde foram isoladas as primeiras amostras de DENV-1 e DENV-4 (Osanai et al., 1983). Após cinco anos sem notificações no Brasil, uma epidemia de DENV-1 foi registrada no município de Nova Iguaçu e se espalhou por todo o Rio de Janeiro. No mesmo ano, o movimento de pessoas propagou o vírus por outras regiões do país (Figueiredo, 2000). Em 1990 o DENV-2 foi detectado pela primeira vez no Brasil, no estado do Rio de Janeiro, quando houve a co-circulação de DENV-1 e DENV-2 o que agravou a situação da dengue no país. Nesse período, foram notificados os primeiros casos de FHD (Nogueira et al., 1991). O DENV-3 foi detectado em Dezembro de 2000 e predominou na maior parte dos estados Brasileiros entre 2002 e 2006 (SVS, 2010). No ano seguinte, 2007, a taxa de letalidade foi duas vezes maior, tendo como responsável desta maior gravidade na ocorrência da doença a re-emergência do DENV-2 (SVS, 2007). O DENV-4 foi reintroduzido em 2010, com casos confirmados em Roraima (SVS, 2010). Essa reintrodução era iminente, já que o sorotipo já circulava por países vizinhos (Guzma & Kouri, 2002). No ano de 2011 o sorotipo 4 tornou-se o prevalente no Brasil, modificando a situação epidemiológica da doença (SVS, 2011). 1.7.2. DENGUE NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA Os primeiros casos de dengue no RN foram notificados em 1994 no Município de Assú. Em 1996, vários municípios registraram a ocorrência de casos da doença, com episódios epidêmicos e não epidêmicos. Em 1997 foi registrada a primeira grande epidemia de dengue no RN, com 25.579 casos notificados (sendo 25 FHD e 6 óbitos). 17 Posteriormente, duas graves epidemias ocorreram no estado: em 2001 com 37.485 casos (31 FHD e 10 óbitos) e em 2008 com 28.531 casos (344 FHD e 11 óbitos) (SVS, 2013). Durante o período de 1994 a 2012, 291.471 casos de dengue foram notificados, com 1.237 casos de FHD e 73 óbitos (SVS, 2013). No Estado da Paraíba, durante o período de 1995 a 2012, um total de 229.922 casos de dengue foram notificados, sendo 366 de FHD e 33 óbitos (SVS, 2013). De 1° de janeiro a 27 de julho de 2013, foram notificados 3.963 casos de dengue na Paraíba. Nesse período, foram notificados 95 casos de FHD e 16 óbitos (SES/PB, 2013). O maior número de casos ocorreu nos municípios de João Pessoa, Campina Grande, Sousa, São João do Cariri, Santana de Mangueira, Remígio, Itaporanga, Santa Rita e Uiraúna (SES/PB, 2013). Neste estudo, descrevemos e avaliamos o contexto epidemiológico da dengue nos estados do RN e PB, no período de janeiro a dezembro de 2013. Isto foi realizado através da aplicação de métodos moleculares específicos de detecção e tipagem viral. Assim, foi possível ter uma melhor compreensão sobre a ação desses vírus na população estudada, fornecendo subsídios às intervenções voltadas ao controle da doença na região, constituindo uma importante contribuição, ao se considerar o grande impacto dessa doença no RN e PB. 18 2. OBJETIVOS 2.1. Geral - Descrever o perfil epidemiológico da dengue nos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba durante o ano de 2013. 2.2. Específicos a) Realizar a análise espaço temporal da dengue nos estados do RN e PB, 2013; b) Monitorar os sorotipos circulantes nos dois estados durante o período do estudo; c) Investigar os municípios mais afetados pela dengue durante o ano de 2013; d) Investigar o período do ano com maior número de casos de dengue nos dois estados durante o período de estudo; e) Verificar se existe diferença nas taxas de incidência da infecção nos dois estados durante o ano de 2013, em relação ao gênero e faixa etária. 19 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1. DESENHO DO ESTUDO Trata-se de um estudo epidemiológico observacional transversal, predominantemente descritivo, de dados primários. 3.2. ÁREA DE ESTUDO O Estado do Rio Grande do Norte possui área de 52.811,047 km2, população estimada em 3.373.959 habitantes e densidade demográfica de 63,9 hab./km2 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 2011). O RN possui 167 municípios, 4 mesorregiões e 19 microrregiões divididas de acordo com aspectos físicos e humanos. A região metropolitana é composta por 10 municípios: Natal, Parnamirim, Ceará-Mirim, Extremoz, Macaíba, Monte Alegre, Nísia Floresta, São Gonçalo do Amarante, São José de Mipibú e Vera Cruz. O Estado está situado na região Nordeste do Brasil. Limita-se com o Estado do Ceará a Oeste, ao Sul com o Estado da Paraíba, e a Leste e ao Norte com o Oceano Atlântico (Figura 8). Figura 8 - Localização dos estados do Rio grande do norte e Paraíba. 20 O estado da Paraíba possui área total de 56.469,778 km², com uma população estimada em 3.914.421 habitantes e densidade demográfica de 66,70 hab/km² (IBGE 2013). A Paraíba agrupa 223 municípios, quatro mesorregiões e 23 microrregiões. Sua região metropolitana é composta por 12 municípios, Bayeux, Cabedelo, Conde, Cruz do Espírito Santo, João Pessoa, Lucena, Rio Tinto, Santa Rita, Alhandra, Pitimbu, Caaporã e Pedras de Fogo (IBGE). O estado está localizado a leste da Região Nordeste do Brasil, fazendo divisa com os estados do Rio Grande do Norte (norte), de Pernambuco (sul) e do Ceará (a oeste) e o Oceano Atlântico (a leste) (Figura 8). 3.3. AMOSTRAS CLÍNICAS E BANCO DE DADOS Foram estudadas amostras de soro provenientes de pacientes com suspeita de dengue, coletadas com até cinco dias após o inicio dos sinais e sintomas, atendidos em diferentes Centros de Saúde e Hospitais da Rede Pública dos Estados do Rio Grande do Norte e Paraíba. Cada amostra era acompanhada de ficha de notificação compulsória de dengue, com dados de informação pessoal e de coleta. As amostras foram recebidas pelos LACENs dos respectivos estados e posteriormente encaminhadas para o Laboratório de Biologia Molecular de Doenças Infecciosas e do Câncer - LADIC (DMP/CB/UFRN), para análise molecular visando à detecção do genoma viral. As amostras foram mantidas a -70ºC até o momento da utilização. As informações disponíveis nas fichas de notificação e os resultados de diagnóstico foram armazenados em banco de dados nos programas Microsoft Access e Microsoft Excel. 3.4. EXTRAÇÃO DO RNA VIRAL Os RNAs das amostras de soro de pacientes foram extraídos através do QIAmp Viral Mini Kit (QIAGEN, Inc., Valencia, EUA), de acordo com o protocolo descrito pelo fabricante, para a realização da técnica de RT-PCR. 21 3.5. TRANSCRIÇÃO REVERSA SEGUIDA DA REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE Foi utilizada a metodologia descrita por Lanciotti et al. (1992), para detecção e tipagem dos DENV a partir de amostras de soro. Este procedimento detecta os quatro sorotipos simultaneamente em um procedimento semi-nested, gerando produtos amplificados (amplicons) com tamanhos específicos (pb) para cada sorotipo dos DENV. A técnica de transcrição reversa seguida pela reação em cadeia de polimerase (RT-PCR) foi realizada em duas etapas. Na primeira etapa, foram utilizados iniciadores consensuais, D1 e D2, para os quatro sorotipos dos DENV, complementares as sequências dos genes que codificam as proteínas C e prM. No procedimento seminested, foram utilizados iniciadores específicos TS1, TS2, TS3 e TS4 para os DENV-1 a 4, respectivamente, além do iniciador D1, mostrados na Tabela 1. Tabela 1 - Oligonucleotídeos iniciadores utilizados na transcrição reversa seguida pela reação em cadeia pela polimerase (RT-PCR) para detecção e tipagem dos DENV. Na 1ª etapa (transcrição reversa seguida de PCR) foi realizado o seguinte procedimento: em tubo tipo eppendorf de 0,3ml foram adicionados 2,5l do RNA extraído, 8 µl de água livre de nucleases, 0,75 µl dos iniciadores D1 e D2, em concentração de 100µM, 0,5µl da enzima AMV-RT à 5U/µl e 12,5µl do PCR Acessquick Master Mix (2x) (Promega, Madison, EUA), para chegarmos em um total de 25l da mistura RT-PCR como mostra a Tabela 2. Os tubos foram colocados imediatamente no bloco aquecido do termociclador. Após a transcrição reversa (45°C por 45 minutos), a enzima foi ativada (95°C por 2 minutos) e as amostras foram submetidas a 30 ciclos subsequentes de desnaturação (94°C por 35 segundos), 22 hibridização (56°C por 1 minuto), extensão (72°C por 2 minutos) e um tempo de extensão final (72°C por 10 minutos). Na etapa semi-nested PCR, são diluídos em 1:100 os produtos obtidos da 1a etapa em água deionizada (IDT, Iowa, USA) (2,5l do produto da 1a etapa + 247,5l de água). Em novos tubos tipo eppendorf de 0,3mL, foram adicionados 6,25l de água livre de nucleases, 0,75l dos iniciadores D1, TS1, TS2, TS3 e TS4 (100M), 12,5µl do PCR Acessquick Master Mix (2x) (Promega, Madison, EUA)e 2,5l da amostra diluída representados na Tabela 2. As amostras foram submetidas a ativação da enzima (95°C por 2 minutos) e em seguida, 18 ciclos de desnaturação (94O.C por 35segundos), hibridização (56OC por 1 minuto), extensão (72OC por 2 minutos) e um tempo de extensão final (72OC por 10 minutos). Tabela 2 - reagentes utilizados na transcrição reversa seguida pela reação em cadeia pela polimerase (RT-PCR). Reagentes Mistura para RT-PCR (1X) Mistura para Semi-nested (1X) Água livre de nucleases 8 µl 6,25 µl 100µM iniciador D1 0,75 µl 0,75 µl 100µM iniciador D2 0,75µl ------------ ------------ 0,75µl 0,5µl ------------ 12,5 µl 12,5 µl 2,5µl ----------- ------------ 2,5µl 100µM iniciadores TS1-4 5 U/µl enzima AMV-RT PCR Master Mix 2X RNA cDNA da RT-PCR Para a análise dos amplicons, foi realizada eletroforese à 100V por 60 minutos onde 5l do produto amplificado acrescido de 2,5l de azul de bromofenol (Amresco, Ohio, USA) e 2,5l de GelRed foram aplicados em um gel de agarose (BioAmerica, Inc., Miami,USA) a 1% em Tris-Ácido Bórico-EDTA 0,5X. Após a corrida, o gel foi visualizado em luz ultravioleta. 23 3.6. ANÁLISE DOS DADOS Os dados obtidos foram analisados pelos programas Microsoft Office Access 2007 e Microsoft Office Excel 2007. 3.7. CONSIDERAÇÕES ÉTICAS Para a realização deste estudo, este projeto foi previamente submetido à apreciação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Protocolo N° 136/2009 CEP-UFRN). 24 4. RESULTADOS 4.1. MONITORAMENTO DOS SOROTIPOS CIRCULANTES NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013 No período de janeiro a dezembro de 2013, foram estudados 478 casos suspeitos de dengue, sendo 252 (52,7%) provenientes do Rio Grande do Norte e 226 (47,3%) do estado Paraíba. Todas as amostras foram submetidas à extração para obtenção do RNA viral e analisadas por RT-PCR. A infecção por DENV foi confirmada em 29,7% (142/478). Foi detectada a co-circulação de três sorotipos do vírus nos dois estados (DENV-1, DENV-2 e DENV-4). O sorotipo predominante foi o DENV-4 detectado em 86,6% (123/142) dos casos positivos, seguido do DENV-1 com 9,9% (14/142) e por último o DENV-2 com 3,5% (5/142). Não foi identificada a circulação do DENV-3 na população estudada. Analisando o estado Rio Grande do Norte isoladamente, pôde-se confirmar 38,4% (97/252) dos casos confirmados, sendo que dentre estes, o DENV-4 foi o sorotipo predominante com 83,5% (81/97), seguido por DENV-1 com 12,3% (12/97) e DENV-2 com 4,1% (4/97). Apesar de em números totais a ocorrência de casos confirmados de dengue tenha sido menor 19,91% (45/226), o perfil epidemiológico da infecção na Paraíba foi semelhante ao encontrado no RN. Na Paraíba o DENV-4 foi o mais prevalente, representando 93,3% (42/45) dos casos positivos, seguido do DENV-1 com 4,5% (2/45) e DENV-2 com 2,2% (1/45) (Figura 9). % Figura 9 - Porcentagem dos sorotipos de dengue circulantes nos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba, 2013. 25 4.2. DISTRIBUIÇÃO DOS SOROTIPOS NOS MUNICÍPIOS DO RN E PB Neste estudo, foi possível descrever a distribuição dos sorotipos de DENV pelos municípios dos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba. A infecção por DENV foi identificada em 39 municípios, sendo 35 municípios do Rio grande do Norte e quatro da Paraíba (Tabelas 3 e 4). No Rio grande do Norte, o DENV-1 foi detectado em quatro municípios, DENV-2 em quatro municípios e DENV-4 em 30 municípios, além de três casos que não tiveram seus municípios de origem identificados, todos positivos para DENV-4 (Figura 10, Tabela 3). Na Paraíba, somente quatro municípios apresentaram casos confirmados da doença. O DENV-1 foi identificado em um município, o DENV-2 em um município e o DENV-4 em todos os quatro municípios (Figura 11, Tabela 4). 26 . Figura 10 - Mapa do RN demonstrando a distribuição espacial dos sorotipos do DENV identificados neste estudo em 2013. Figura 11 - Mapa da Paraíba, demonstrando a distribuição espacial dos sorotipos de DENV identificados neste estudo em 2013. No estado do RN, a prevalência global de infecção pelo vírus da dengue foi de 38,5% no período estudado, sendo a grande maioria dos casos (32,1%) causados pelo 27 DENV-4. Considerando-se apenas os casos positivos, 83,5% deles foi causado pelo DENV-4, seguido pelo DENV-1 com 12,3% e DENV-2 com 4,1% (Tabela 3). No RN, a co-circulação dos DENV-1, 2 e 4 foi identificada no município de Jandaíra. A co-circulação dos DENV-2 e 4 foi observada no município de Parnamirim. O DENV-1 foi identificado também nos municípios de Macau, Pau dos Ferros e Rafael Fernandes. De forma interessante, dos 8 casos positivos em Pau dos Ferros, todos foram DENV-1. O DENV-2 foi identificado também nos municípios de Lagoa de Pedra e Nísia Floresta. Além de Jandaíra e Parnamirim, o DENV-4 foi identificado em Angicos, Caicó, Florânia, Ipueira, Jardim de Piranhas, João Câmara, Lagoa de Pedra, Lagoa dos Velhos, Lagoa Nova, Lajes Pintada, Macaíba, Macau, Mossoró, Natal, Ouro Branco, Parelhas, Passa e Fica, Riacho de Santana, Santana do Mato, São Fernando, São José de Campestre, São José do Seridó, São Paulo do Potengi, Serra Negra do Norte, Tabuleiro Grande, Taipu, Tangará, Várzea, Lagoa D’anta e Serra Caiada (Tabela 3). . Tabela 3 - Distribuição dos casos positivos e dos sorotipos por município do Rio Grande do Norte, 2013. CASOS ESTUDADOS POSITIVOS (%*) Angicos 6 1 (1) 0 0 0 1 Caicó 6 5 (5,1) 0 0 0 5 Florânia 3 2 (2) 0 0 0 2 Ipueira 5 1 (1) 0 0 0 1 Jandaíra 28 4 (4,1) 2 1 0 1 Jardim de Piranhas 1 1 (1) 0 0 0 1 João Câmara 1 1 (1) 0 0 0 1 Lagoa D'anta 9 5 (5,1) 0 0 0 5 Lagoa de Pedras 3 1 (1) 0 1 0 0 Lagoa dos Velhos 6 6 (6,1) 0 0 0 6 Lagoa Nova 3 1 (1) 0 0 0 1 Lajes Pintadas 1 1 (1) 0 0 0 1 Macaíba 1 1 (1) 0 0 0 1 Macau 1 1 (1) 1 0 0 0 MUNICIPIOS DENV-1 DENV-2 DENV-3 DENV-4 Mossoró 1 1 (1) 0 0 0 1 Natal 36 9 (9,2) 0 0 0 9 Nisia Floresta 1 1 (1) 0 1 0 0 Ouro Branco 3 2 (2) 0 0 0 2 Parelhas 6 5 (5,1) 0 0 0 5 Parnamirim 14 6 (6,1) 0 1 0 5 28 Passa e Fica 1 1 (1) 0 0 0 1 Pau dos Ferros 9 8 (8,2) 8 0 0 0 Rafael Fernandes 3 1 (1) 1 0 0 0 Riacho de Santana 5 2 (2) 0 0 0 2 Santana do Mato 2 2 (2) 0 0 0 2 São Fernando 2 1 (1) 0 0 0 1 São José de Campeste 2 2 (2) 0 0 0 2 São José do Seridó 4 4 (4,1) 0 0 0 4 São Paulo do Potengi 1 1 (1) 0 0 0 1 Serra Caiada 10 2 (2) 0 0 0 2 Serra Negra do Norte 6 5 (5,1) 0 0 0 5 Tabuleiro Grande 1 1 (1) 0 0 0 1 Taipu 11 3 (3) 0 0 0 3 Tangará 11 2 (2) 0 0 0 2 Várzea 12 4 (4,1) 0 0 0 4 Não Informado 37 3 (3) 0 0 0 3 TOTAL (%) 252 97 (38,5) 12 (4,8) 4 (1,6) 0 (0) 81 (32,1) *Percentual calculado do número de casos positivos por município pelo número total de casos positivos. Na Paraíba, a prevalência global da infecção pelos vírus dengue foi de 19,9%, sendo a grande maioria dos casos (18,6%) causados pelo DENV-4. Considerando apenas os casos positivos, 93,3% dos casos foram causados pelo DENV-4, seguido de DENV-1 com 4,4% e DENV-2 com 2,2%. A capital da Paraíba, João Pessoa, foi a única cidade a apresentar co-circulação dos DENV-1, 2 e 4. Nas demais cidades (Bayeux, Brejo da Cruz e Cajazeiras) foram detectadas apenas o sorotipo 4 (Figura 4). Tabela 4 - Distribuição dos casos positivos e dos sorotipos por município da Paraíba. CASOS ESTUDADOS POSITIVOS (%*) DENV-1 DENV-2 DENV-3 DENV-4 Bayeux 10 4 (8,9) 0 0 0 4 Brejo da Cruz 10 3 (6,7) 0 0 0 3 Cajazeiras 2 2 (4,4) 0 0 0 2 João Pessoa 182 36 (80) 2 1 0 33 Não Informado 22 0 0 0 0 0 TOTAL (%) 226 45 (19,9) 2 (0,9) 1 (0,4) 0 (0) 42 (18,6) MUNICÍPIO *Percentual calculado do número de casos positivos por município pelo número total de casos positivos. 29 4.3. DISTRIBUIÇÃO TEMPORAL DOS CASOS DE DENGUE NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO NORTE E PARAÍBA, 2013. A análise da distribuição temporal dos casos de dengue revelou que Março, Junho e Novembro foram os meses de maior incidência da doença no RN. O mês de Março apresentou um maior número de casos (n=17), correspondente a 17% (17/97), observando-se um novo pico de incidência nos meses de outubro e novembro. (Figura 12). Figura 12 - Distribuição mensal de casos estudados e confirmados de dengue no estado do rio Grande do Norte, 2013. A distribuição mensal dos sorotipos do vírus detectados no Estado do Rio Grande do Norte, no período estudado mostrou a ocorrência de casos de infecção pelo DENV-4 ao longo de todo o ano de 2013, apresentando um pico de incidência no período de fevereiro a abril. Alguns casos de infecção por DENV-1 e DENV-2, nos meses de junho e julho e um pico de incidência de infecção pelo DENV-2 no mês de novembro. (Figura 13 e Tabela 5). 30 Tabela 5 - Distribuição mensal dos casos estudados e positivos por DENV no estado do Rio Grande do Norte, 2013. MÊS Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro Não informado TOTAL (%*) CASOS ESTUDADOS 6 13 23 12 41 35 43 19 17 17 17 1 8 252 CASOS POSITIVOS (%*) 2 (33,3) 10 (76,9) 17 (73,9) 8 (66,6) 5 (12,1) 14 (40) 5 (11,6) 7 (36,8) 4 (23,5) 9 (52,9) 13 (76,4) 0 (0) 3 (37,5) 97 (38,5) DENV-1 DENV-2 0 0 0 0 0 1 2 0 0 0 9 0 0 12 (4,7) 0 0 0 0 0 2 1 1 0 0 0 0 0 4 (1,5) DENV-4 2 10 17 8 5 11 2 6 4 9 4 0 3 81 (32,1) *Percentual calculado do número de casos positivos pelo número total de casos estudados (por mês). Figura 13 - Distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV no estado do Rio Grande do Norte, 2013. A distribuição mensal dos casos estudados e positivos para os vírus da dengue no estado da Paraíba revelou a ocorrência de casos da infecção durante todo o período 31 estudado, sendo as maiores taxas de incidência registradas no período de agosto a outubro, apresentando uma média de 30,3% ( Figura 14 e Tabela 6). Figura 14 - distribuição mensal de casos estudados e confirmados de dengue no estado da Paraíba, 2013. Tabela 6 - Distribuição mensal dos casos estudados e positivos por DENV no estado da Paraíba, 2013. MÊS Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro TOTAL (%*) CASOS ESTUDADOS 0 0 9 23 60 27 25 34 41 7 0 0 226 CASOS POSITIVOS (%*) 0 (0) 0 (0) 2 (22,2) 4 (17,3) 7 (11,6) 3 (11,1) 4 (16) 13 (38,2) 10 (24,3) 2 (28,5) 0 (0) 0 (0) 45 (19,9) DENV-1 DENV-2 0 0 0 1 1 0 0 0 0 0 0 0 2 (0,8) 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 (0,4) *Percentual calculado do número de casos positivos pelo número total de casos estudados (por mês). DENV-4 0 0 2 3 6 2 4 13 10 2 0 0 42 (18,6) 32 A distribuição mensal dos sorotipos do vírus detectados no Estado da Paraíba mostrou a ocorrência de casos de infecção pelo DENV-4 ao longo de todo o período estudado, apresentando um pico de incidência nos meses de agosto e setembro. O DENV-1 foi detectado nos meses de abril e maio e o DENV-2 apenas no mês de junho. (Tabela 6 e Figura 15). Figura 155 - Distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV no estado da Paraíba, 2013. A distribuição mensal dos casos confirmados de dengue nos estados do Rio Grand do Norte e da Paraíba mostrou semelhança nos perfis epidemiológicos, com registro de casos em todos os meses do ano pesquisados, apresentado dois picos de incidência da doença durante o ano de 2013, um nos meses de março e abirl e o outro no período compreendido entre agosto e novembro (Figura 16). 33 Figura 166 - Distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV no estado da Praíba, 2013. 4.4. GÊNERO E FAIXA ETÁRIA MAIS AFETADA PELA DENGUE NOS ESTADOS DO RN E PB, 2013. No Rio Grande do Norte, a faixa etária mais afetada pela dengue variou de 21 a 30 anos, representando 26,8% (26/97) dos casos, com uma parcela significativa de crianças entre os indivíduos infectados. Já na Paraíba, não houve uma faixa etária predominante, onde se percebe que os sorotipos virais circularam em quase todas as faixas etárias, com registros de casos em indivíduos com variando de 11-60 anos (Figura 17). 34 Figura 17 - Número de casos confirmados por faixa etária no RN e PB, 2013. A nossa análise constatou que o sexo mais afetado pela dengue foi o feminino em ambos os estados. No RN o sexo feminino representou 67% (65/97), enquanto que na Paraíba as mulheres representaram 55,5% (25/45) dos casos positivos (Figura 18). Figura 17 - Número de casos confirmados por faixa etária no RN e PB, 2013. 35 5. DISCUSSÃO Apesar da grande importância da dengue nos estados do Rio grande do Norte e Paraíba, poucos estudos têm sido realizados para caracterizar as epidemias, ocorridas nos últimos anos, especialmente aqueles envolvendo métodos de diagnóstico específicos para dengue, como métodos moleculares de detecção e tipagem. Na Paraíba, especialmente na capital João Pessoa, ocorre um grande fluxo de pessoas de outras regiões e países, devido a sua importância turística. Apesar disso, não há um sistema de vigilância virológica para a dengue. As informações virológicas são essenciais para traçar o perfil epidemiológico da doença e compreender a atividade desses vírus na população local. Além disso, muitas vantagens têm sido atribuídas ao diagnóstico molecular dos vírus dengue, como alta sensibilidade, especificidade, reprodutibilidade e rapidez (Araújo et al. 2009). A vigilância virológica contínua, através de métodos moleculares específicos, é de suma importância para compreender a distribuição temporal e identificação dos sorotipos do vírus dengue circulantes. Este monitoramento é primordial não apenas para a detecção da introdução de novos sorotipos, mas também para entender as mudanças no padrão epidemiológico da doença, como mudanças na faixa etária acometida e na melhor compreensão das circunstâncias que ocasionam os casos graves da doença. Neste estudo, descrevemos o contexto epidemiológico da dengue nos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba, durante o ano de 2013. Isto foi realizado através da aplicação de métodos moleculares específicos de detecção e tipagem viral. Durante o ano de 2013 onde foi possível identificar a co-circulação de três sorotipos do DENV (DENV-1, DENV-2 e DENV-4) em ambos os estados. De acordo com o trabalho realizado por Branco (2014) no estado do Rio Grande do Norte, apenas o DENV-4 havia circulado durante todo ano de 2012. Não existem estudos na literatura sobre a detecção de casos de dengue no estado da Paraíba. O DENV-4 foi identificado durante os últimos 20 anos em diversos países e regiões como no México, America Central, America do Sul e em Ilhas Caribenhas sendo reintroduzido no Brasil em 2010 (Temporão et al., 2011). Neste estudo, o DENV-4 foi o sorotipo mais prevalente, nos dois estados estudados. 36 Segundo a teoria da infecção seqüencial, a co-circulação de diferentes sorotipos dos vírus dengue pode indicar um risco aumentado do surgimento de casos graves da doença (Halstead, 1988) ou abre portas para a possibilidade de infecção concomitante por mais de um sorotipo. Ainda não é possível afirmar se existe alguma correlação entre a co-infecção por dois sorotipos do DENV e uma maior gravidade da doença, porém, alguns estudos como o de Gubler et al. (1985), mostram co-infecções pelos sorotipo 1 e 4 em pacientes com sintomas leves da doença. Entretanto, Santos et al. (2003) alerta sobre a gravidade da infecção concomitante por diferentes cepas do DENV em células do vetor ou humanas, devido ao potencial para recombinação dos DENV. Além disso, pode haver a co-circulação de diferentes linhagens do mesmo sorotipo ou de sorotipos diferentes, o que pode promover um agravante de virulência como visto em estudos na Índia (Kukreti et al., 2008) e Malásia (Holmes et al., 2009). Devido a esse quadro diverso, é necessário o aprofundamento de estudos de caracterização genética dos isolados virais detectados no Rio grande do Norte e Paraíba. Já era esperada uma predominância do sorotipo 4 (86,6% dos casos positivos) considerando-se os dois estados, já que desde o ano de 2010 (Temporão et al., 2011) esse sorotipo vem sendo encontrado no Brasil e em 2012 se estabeleceu como o sorotipo de maior incidência em todo país. A distribuição espacial dos casos confirmados de dengue no estado da Paraíba foi mais restrita em comparação com a distribuição dos casos do Rio Grande do Norte, ficando clara a necessidade de ampliar a coleta em mais municípios da PB. Observa-se uma diminuição na detecção viral na PB (na proporção de casos positivos e estudados), em comparação ao RN. Isto pode ser explicado pelo tempo de transporte das amostras e forma como essas amostras podem ter sido transportadas (muito tempo em temperaturas acima do ideal para a conservação do material biológico ou para conservação do RNA viral presente no soro) até o Laboratório de Biologia Molecular de Doenças Infecciosas e do Câncer (LADIC) da UFRN, local de desenvolvimento desse estudo. As amostras do RN foram enviadas para o LACEN/RN e encaminhadas para o LADIC, já as amostras da PB foram enviadas para o LACEN – PB, encaminhadas ao LACEN – RN, que por sua vez, encaminhou-as para o LADIC. Esse tempo de transporte pode ter comprometido a conservação de algumas amostras, resultando em resultados falso negativo, em alguns casos. 37 No RN, houve co-circulação dos sorotipos de DENV em dois municípios. Em Parnamirim, município da região metropolitana, foram detectados os sorotipos 2 e 4, e o município de Nísia Floresta, onde apenas casos de DENV-2 foram relatados. No município Jandaíra foi detectada a co-circulação dos três sorotipos encontrados neste estado. A presença dos sorotipos DENV-1 e DENV-2 nesses três municípios sugere que alguns indivíduos não se infectaram com esses vírus durante as epidemias que eles causaram, ou indivíduos susceptíveis vindo de outras regiões passaram a residir nesses municípios. Um fato curioso que merece uma melhor investigação é o ocorrido em Pau dos Ferros onde foram detectados apenas o sorotipo 1, sendo o município de maior frequência deste sorotipo, onde foram detectadas 8 casos positivos dos 9 casos estudados. É possível considerar a faixa etária desses pacientes, porém a distribuição dos casos varia entre indivíduos de 15 a mais de 60 anos. Além disso, o município faz fronteira com outro estado (Ceará) a onde pode ter ocorrido casos de DENV-1, acarretando em uma introdução desse sorotipo por esse município decorrente do constante deslocamento de pessoas por essas regiões já que em 2013, segundo a secretaria de saúde do Ceará (2014) foram notificados dois casos de DENV-1 (municípios de Fortaleza e Madalena), logo, Pau dos Ferros pode estar sendo a porta de entrada para o DENV-1 no RN, porém é necessário uma investigação mais aprofundada visando esclarecer essa questão. No estado da Paraíba, apenas quatro cidades apresentaram casos de DENV. Em todas foram encontradas DENV-4 e em apenas uma, foi encontrada a co-circulação dos três sorotipos (DENV-1, DENV-2 e DENV-4). Na capital João Pessoa foram encontrados casos positivos para os três sorotipos do vírus. Segundo De Simone et al. (2004), a co-circulação de diferentes sorotipos virais pode ser atribuído a grande circulação de pessoas de outras regiões; além da alta densidade populacional característica da maioria das capitais do Brasil. A detecção da circulação de DENV-1 e DENV-2 nos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba merecem atenção especial, já que a co-circulação desses dois sorotipos já caracterizou uma grande epidemia no estado do Rio de Janeiro em 1990 e 1991 (Nogueira et al., 1999) e em uma nova epidemia durante os anos 1995 e 1996 (Nogueira 38 et al., 2001). Assim como em Natal, João Pessoa foi também o município com o maior número de casos positivos, fato que pode ser explicado por serem as capitais e centros das regiões metropolitanas dos seus respectivos estados, sendo provavelmente o resultado da alta densidade populacional, do grande fluxo de pessoas e maior monitoramento médico feito nessas cidades, fato que corrobora com outros estudos como os de Cordeiro et al. (2007) em Pernambuco e De Simone et al. (2004) no Rio de Janeiro. Também pode se atribuir a esses resultados a reserva de água em recipientes inadequados, a baixa qualidade na estrutura de saneamento, o fornecimento de água e a coleta de lixo as principais formas de propiciar a multiplicação do vetor (Tauil, 2001; Bricks, 2004). A concentração dos casos positivos de dengue nas grandes cidades da zona urbana nos dois estados, da força a afirmação de que a dengue tem como característica ocorrência predominante em zonas urbanas, fato já visto no restante do continente americano (Santos et al., 2009; Silva Junior, 2012). Segundo o Ministério da Saúde, o período onde ocorre o maior número de casos da dengue é durante o verão, devido ao clima quente e chuvoso dessa estação. Quanto à sazonalidade dos casos de dengue, o RN apresentou dois picos de incidência da doença um no período entre fevereiro e abril com taxa de incidência média de 72,4% e o outro no mês de novembro com 76.4%. A Paraíba apresentou uma distribuição mensal semelhante, sendo que o segundo pico ocorreu um pouco antes abrangendo o período de agosto a outubro. O primeiro pico de incidência observado neste estudo em ambos os estado, está de acordo com a característica da dengue no Brasil, onde é relatado um aumento no número de casos a partir de janeiro, com um pico no mês de março, quando ocorre o fim do verão (MS, 2010). Com relação ao segundo pico de incidência ele foge do padrão esperado no Brasil. Sua existência se deve possivelmente, ao acúmulo de água nos domicílios em recipientes descoberto o que favorece a proliferação do mosquito vetor. Todavia, alguns estudos na Paraíba mostram que a maior incidência da dengue é durante o outono (Furtado et al., 2004). Temos que considerar o clima como um fator de extrema importância para a epidemiologia da dengue, já que o vetor tem seu desenvolvimento influenciado pelas 39 condições climáticas (Coneglian, 2012). Mesmo que alguns estudos como o de Silva et al. (2007) afirmem que o que possibilita as condições ideais para proliferação do vetor é a presença de criadouros. Ambos estados mostraram resultados peculiares, no RN a faixa etária mais afetada foi a 21-30, com 26,8% dos casos positivos, mas casos de infecção foram diagnosticados em todas as faixas etárias, corroborando com alguns estudos epidemiológicos que encontraram a predominância em adultos (Ribeiro et al., 2006; Souza & Dias, 2010). Na Paraíba foi um pouco diferente, com a faixa etária 11-20 (adolescentes ou jovens) foi a que apresentou maior incidência de casos positivos, 24,4% mas com incidência muito baixa em crianças até 10 anos e indivíduos com mais de 60 anos. Estes resultados divergem daquele encontrados por Cavalcante et al (2011) onde as maiores incidências ficaram entre 20-49 anos. Os resultados de ambos os estados (PB e RN) são discordantes dos resultados obtidos por Cordeiro et al., (2007) e Cavalcanti et al (2011) onde o maior número de casos esta associado a faixa etária de 0-10 anos, outros estudos também mostram essa tendência para infecções em faixas etárias mais jovens, como estudos realizados na Venezuela, Honduras e Nicarágua (Hammond et al., 2005; de Rivera et al., 2008). No Brasil é possível encontrar a maior incidência de FHD entre jovens adultos (San Martín et al.,2010) Em ambos os estados o gênero mais atingido pela dengue foi o feminino. No RN o sexo feminino representou 67% dos casos confirmados de dengue e na PB as mulheres representavam 55,5% dos casos positivos. Estes resultados corroboram com aqueles obtidos por Cordeiro et al (2007) e Rosa et al.(2000) em Recife e Belém, respectivamente. Geralmente os estudos apontam a dengue como uma doença que acomete mais frequentemente as mulheres, não porque seja uma doença ligada ao sexo, mas devido a alguns fatores ligados a forma de transmissão e a fatores sociais. Entre estes fatores destacam-se: o número de mulheres ser maior do que os homens segundo o IBGE (2012), as mulheres procurarem mais os serviços de saúde do que os homens e o fato dos mosquitos Ae. aegypti terem hábitos peridomiciliares e as mulheres passarem mais tempo em suas residências, as tornando mais expostas ao repasto da fêmea do vetor e assim mais expostas ao agente etiológico (Torres, 2005; Cordeiro et al., 2007; Monteiro et al., 2009). 40 Desse forma é necessário a manutenção da vigilância sorológica e epidemiológica do DENV em ambos os estados para um entendimento melhor da doença e uma otimização no combate e na profilaxia da mesma. Além da implementação de um estudo filogenético e fitogeográfico para ajudar no entendimento das vias de passagem do DENV entre os estados do Nordeste brasileiro e uma melhor compreensão da circulação do vírus entre os mesmos. 41 6. CONCLUSÕES • Neste estudo, a prevalência da infecção por DENV considerando-se as amostras coletadas nos dois estados foi de 29,7%. • Foi detectada a co-circulação de três sorotipos (DENV-1, DENV-2 e DENV-4) nos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba. O sorotipo predominante foi o DENV-4 detectado em 86,6% dos casos, seguido do DENV-1 com 9,9% e o DENV-2 com 3,5%. Não foi identificada a circulação do DENV-3 na população estudada. • No estado do Rio Grande do Norte, a co-circulação dos DENV-1, 2 e 4 foi identificada no município de Jandaíra e dos DENV-2 e 4 no município de Parnamirim. • No estado do Rio Grande do Norte, o DENV-1 foi detectado também nos municípios de Macau, Pau dos Ferros e Rafael Fernandes. De forma interessante, dos 8 casos positivos em Pau dos Ferros, todos foram DENV-1. O DENV-2 foi identificado também nos municípios de Lagoa de Pedra e Nisia Floresta. • O DENV-4 foi identificado em, Angicos, Caicó, Florânia, Ipueira, Jardim de Piranhas, João Câmara, Lagoa de Pedra, Lagoa dos Velhos, Lagoa Nova, Lajes Pintada, Macaíba, Macau, Mossoró, Natal, Ouro Branco, Parelhas, Passa e Fica, Riacho de Santana, Santana do Mato, São Fernando, São José de Campeste, São José do Seridó, São Paulo do Potengi, Serra Negra do Norte, Tabuleiro Grande, Taipu, Tangará, Várzea, Lagoa D’anta e Serra Caiada, RN. • No estado da Paraíba, a capital João Pessoa, foi a única cidade a apresentar co- circulação dos DENV-1, 2 e 4. Nas demais cidades (Bayeux, Brejo da Cruz e Cajazeras) foram detectadas apenas o sorotipo 4. • No estado do Rio Grande do Norte, em 2013, o mês de maior ocorrência da doença foi março. A distribuição mensal dos sorotipos circulantes no estado revelou que o DENV-4 prevaleceu entre os meses de janeiro e outubro de 2013. Foi observada a reintrodução do DENV-1 e DENV-2 no mês de junho e um aumento expressivo de casos de DENV-1 em novembro. (Novembro 76,4% março 73,9%) Tabela 5 • No estado da Paraíba, o mês de maior circulação viral foi agosto. A distribuição mensal dos sorotipos circulantes de DENV nesse estado revelou que o DENV-4 42 prevaleceu entre os meses de fevereiro e outubro de 2013, com um pico entre agosto e outubro. Foi observada a reintrodução do DENV-1 no mês de abril e de DENV-2 no mês de junho. • No Rio Grande do Norte, a faixa etária mais afetada pela dengue foi a de 21 a 30 anos. Já na Paraíba, não houve uma faixa etária predominante, onde se pode perceber que os sorotipos virais circularam em quase todas as faixas etárias. • O sexo mais afetado pela dengue foi o feminino em ambos os estados. No RN o sexo feminino representou 67% dos casos, enquanto que na PB as mulheres representaram 55,5%. 43 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALCON, S.; TALARMIN, A.; DEBRUYNE, M.; FALCONAR A, DEUBEL V, FLAMAND M. Enzyme-linked immunosorbent assay specific to Dengue virus type 1 nonstructural protein NS1 reveals circulation of the antigen in the blood during the acute phase of disease in patients experiencing primary or secondary infections. J Clin Microbiol,v.40, n.2, p.376-381, 2002. ARAÚJO, J.M.; SCHATZMAYR, H.G.; DE FILIPPIS, A.M.; DOS SANTOS, F.B.; CARDOSO, M.A.; BRITTO, C.; COELHO, J.M.C.O.; NOGUEIRA, R.M.R. A retrospective survey of dengue vírus infection in fatal cases from an epidemic in Brazil. Journal of Virology Methods, v.155, n.1, p.34-38, 2009. BARONI, J.C, OLIVEIRA, T.B. Aspectos Epidemiológicos da Febre Clássica da Dengue, em Giruá – RS. RESURBAC; 2009. 41(4): 289-293. BRAGA, I.A. & VALLE, D. Aedes aegypti: histórico do controle no Brasil. 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