Olhar e ver - Revista de Medicina Desportiva

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Olhar e ver
Rev. Medicina Desportiva informa, 2013, 4 (2), pp. 28–29
Radiografia do ombro
Dr. Daniel Cruz Cardoso1, Dr. Joaquim Agostinho2
1
Interno Complementar de Radiologia, 2Assistente Graduado de Radiologia
Centro Hospitalar de Tondela Viseu
Fig.1 – Radiografia AP do ombro normal.
Resumo Abstract
A radiografia convencional do ombro deve ser, na maioria das situações clínicas, a
primeira modalidade de imagem a realizar, pois é uma ferramenta útil na avaliação do
ombro, quer na situação de trauma agudo, quer na dor crónica. O conhecimento das várias
projeções e dos achados radiológicos garantem uma ótima avaliação do ombro, independentemente da etiologia.
1. Apófise coracoide; 2. Acrómio; 3. Clavícula; 4. Omoplata; 5. Glenoide; 6. Cabeça
Umeral; 7. Articulação GU; 8. Espaço
subacromial; 9. Articulação AC
A conventional radiograph of the shoulder should be, in most clinical situations, the first imaging
modality to perform, as it is a useful tool in the assessment of shoulder pain, either acute or chronic.
The knowledge of the various projections and radiographic findings described below will ensure an
optimal evaluation of the shoulder regardless of the etiology of shoulder pain.
Palavras-chave Keywords
Ombro, radiografia convencional
Shoulder, conventional radiography
Introdução
A dor no ombro é a 2.ª causa de
queixa de dor no aparelho locomotor dos adultos em geral1. Além do
trauma agudo, fraturas ou luxações,
a dor no atleta tem sido atribuída a
uma variedade de causas: conflito
subacromial, instabilidade primária
e tração excessiva sobre os tendões e
ligamentos2.
Avanços na TC e RM na última
década têm revolucionado o diagnóstico das lesões do ombro, sendo a
radiografia frequentemente subestimada e subutilizada3, mas deverá
ser o primeiro exame a realizar1,4.
O ombro é uma estrutura complexa, composta pelas articulações
glenoumeral (GU), acromioclavicular
(AC) e esternoclavicular, bem como
numerosos músculos e ligamentos3.
Esta complexidade torna necessária
a existência de numerosas incidências radiográficas, que são muito
úteis na definição de trauma agudo
para avaliar fraturas ou luxações e
também podem demonstrar alterações na dor crónica, incluindo
tendinite calcificada ou bursite3.
A incidência mais comum, a anteroposterior (AP), pode ser realizada
com o braço em posição neutra,
rotações interna ou externa, permitindo uma excelente visualização
28 · Março 2013 www.revdesportiva.pt
x
das articulações GU e AC e estruturas adjacentes.
Observações importantes na análise da radiografia do ombro:
1. A porção medial da cabeça do
úmero sobrepõe-se parcialmente
à cavidade glenoide, pelo que a
articulação GU não é visualizada
como espaço completamente
“aberto”.
2. Para medir a entrelinha articular GU desenham-se duas linhas
através das superfícies articulares
(fig. 2). O alargamento pode ser
sugestivo de derrame articular,
luxação posterior do úmero ou
acromegalia e o estreitamento
pode sugerir doença articular degenerativa ou artrite reumatoide.
3. Para avaliar a articulação AC deve
medir-se a distância coracoclavicular e o espaço articular (fig. 3).
4. Avaliar a existência de depósitos
de cálcio nos músculos, tendões
ou bursas5.
Lesões no ombro
As lesões mais comuns após trauma
incluem diástase da articulação AC,
luxação GU e fraturas da clavícula,
omoplata e úmero proximal.
A diástase da articulação AC pode
ser classificada de leve (grau I), com
Fig. 2 – Entrelinha articular GU5
Fig. 3 – Avaliação da articulação AC: distância coracoclavicular (A) e o espaço da
articulação (B)5
alongamento dos ligamentos AC,
sem interrupção da cápsula articular e com radiografias normais, até
grave (grau III) com interrupção completa dos ligamentos e elevação da
extremidade distal da clavícula, não
havendo contato entre a clavícula e
o acrómio distal e com aumento da
distância coracoclavicular.
A osteólise pós-traumática da
clavícula distal (lateral) pode ocorrer
como resultado de microtraumas
repetitivos (em levantadores de
peso)3. No início há perda da linha
branca normal da cortical da clavícula distal, que pode evoluir até à
reabsorção de 1–2 cm da clavícula,
permanecendo o acrómio normal.
Durante a fase de regeneração, uma
porção da clavícula pode reconstituir-se, no entanto, o córtex distal
geralmente permanece indistinto e
ocasionalmente com esclerose subcondral ou formação de quistos.
As fraturas da omoplata são
incomuns e embora a maioria seja
visível, geralmente são negligenciadas porque a atenção é desviada
para lesões mais graves7.
Nas fraturas do úmero proximal
considera-se deslocamento significativo se o fragmento estiver angulado
mais de 45° ou deslocado mais de 1
cm. Na classificação de Neer, com o
número crescente de fragmentos o
prognóstico deteriora-se e o risco de
complicações, como a necrose avascular da cabeça do úmero, aumenta3.
Na luxação do ombro devemos
responder a algumas perguntas:
Qual é a posição da cabeça do
úmero? Houve fratura da glenoide
ou da grande tuberosidade? A cabeça
do úmero mostra evidência de fratura de compressão6? Cerca de 95%
das luxações são anteriores, mas a
cabeça do úmero pode também deslocar-se posterior, inferior ou superiormente. No jovem, no primeiro
episódio de luxação, geralmente
há avulsão do complexo labroligamentar da glenoide inferior, referido
como lesão de Bankart. A impactação da cabeça do úmero póstero-superiormente contra o bordo inferior da glenoide pode resultar numa
fratura da cabeça do úmero referido
como lesão de Hill-Sachs.
Os achados da luxação posterior
aguda são subtis, sendo crucial
obter-se uma incidência lateral
do ombro (“Y“– é a preferível porque pode ser obtida com pouca ou
nenhuma manipulação do braço).
Nessa situação, a cabeça do úmero
aparece na mesma posição na
incidência AP em rotação interna e
externa, pois é incapaz de efetuar
rotação externa da cabeça umeral3.
O conflito subacromial tem sido
correlacionado com a morfologia
da superfície inferior do acrómio,
havendo 4 tipos de morfologia: plana
(tipo I), curvatura suave (tipo II),
gancho anterior (tipo III) e convexa
(tipo IV). Os tipos II e III estão associados a aumento da incidência de
conflito. Outros achados frequentes
são os osteófitos, a não fusão do
“os acromial” e o espessamento do
ligamento coracoacromial, que é
ocasionalmente visível como calcificação3,7.
Na lesão crónica da coifa dos
rotadores, a cabeça do úmero
surge elevada, com estreitamento
do espaço subacromial (<6–7 mm),
remodelação da superfície inferior
do acrómio, reversão da convexidade normal da superfície inferior
do acrómio, alterações quísticas da
grande tuberosidade da cabeça do
úmero e perda do arco escapuloumeral ou de Moloney3.
Conclusão
A radiografia convencional é uma
ferramenta útil na avaliação do
ombro, no contexto de trauma
agudo e de dor crónica. Na maioria
das situações clínicas deve ser a
primeira modalidade de imagem a
realizar. O conhecimento das várias
projeções e achados radiológicos
descritos acima irão assegurar uma
ótima avaliação do ombro independentemente da etiologia.
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