CONCEPÇÕES ALTERNATIVAS SOBRE EFEITO ESTUFA E A FORMAÇÃO CIENTÍFICA DE PROFESSORES E ALUNOS ALTERNATIVE CONCEPTIONS ABOUT “EFFECT STOVE” AND A SCIENTIFIC FORMATION OF TEACHERS AND STUDENTS. Ana Cristina Leandro da Silva Libanore¹ Ana Tiyomi Obara² ¹Colégio Coração de Jesus/ [email protected] ²Universidade Estadual de Maringá/ Departamento de Biologia/ [email protected] Resumo Esta pesquisa objetivou investigar quais as concepções que alunos e professores têm sobre o fenômeno do efeito estufa. A pesquisa envolveu 40 alunos de 8ª série do Ensino Fundamental e duas professoras das disciplinas de Ciências e de Geografia do Ensino Fundamental de uma escola particular de um município da região Noroeste do Estado do Paraná - Brasil. Para a coleta de dados, os alunos responderam a um questionário e as professoras foram entrevistadas. A análise dos dados, seguindo os pressupostos da análise de conteúdo (BARDIN, 1977), constatou que tanto os alunos como as professoras possuem idéias alternativas a respeito do fenômeno, confundindo efeito estufa com aquecimento global e destruição da camada de ozônio. A análise dos dados realizada indica que a confusão conceitual manifestada pelos educandos e educadores tem suas raízes no processo de ensino e aprendizagem e interfere nitidamente na qualidade do ensino de ciências. Palavras-chave: Concepções alternativas, formação científica, efeito estufa. Abstract The research involved 40 students and two teachers, that teaching Sciences and Geography of the Fundamental Teaching of private school of a municipal district of the Northwest area of the State Paraná. For collection of data, the students answered to a questionnaire and the teachers were interviewed. With base the analysis of data, it was verified that so much students as the teachers possess alternative ideas, regarding the effect stove. Also it was take a stand for the educational system needs to plan more effectives strategies to improve the scientific formation of teacher and students. In that way, the analysis of the accomplished data indicates that the conceptual confusion manifested by the students and educators has it is roots in the teaching process and learning and it interferes sharply in the quality of the teaching of Sciences. Keywords: Alternative conceptions. Scientific formation. Effect Stove. 1 INTRODUÇÃO Neste panorama de discussões sobre as mudanças climáticas, somos massificados por inúmeras reportagens, relatórios e pesquisas sobre a temática, mas a grande maioria não apresenta de maneira clara e acessível as possíveis causas e soluções para as transformações ou impactos que a sociedade enfrenta ou pode vir a enfrentar. Se por um lado, há uma falta de contextualização das informações divulgadas, por outro, os alunos e a população brasileira como um todo carecem de uma formação científica que os habilite compreender a ampla e complexa teia de conceitos, fenômenos e processos que envolvem as questões relativas às mudanças climáticas. Segundo Krasilchik (2005), há no Brasil uma preocupação por parte da educação em formar o “estudante-trabalhador-cidadão” que necessita estar em constante aprimoramento, para dar conta da massa de informações científicas que está ao seu alcance e, efetivamente, compreender e atuar sobre a realidade em que vive, numa perspectiva do exercício pleno da cidadania. Contudo, a formação científica no país deixa muito a desejar. No último relatório do Programa Internacional de Alunos (PISA), divulgado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD), em 2007, o Brasil ficou na 52º posição no ensino de ciência num ranking de 57 países avaliados. De acordo com a autora, são inúmeras as causas que levam à precária situação do ensino de ciências, como: a massificação do sistema escolar, que dificulta o atendimento a todos os alunos, com conseqüente falta de estrutura para o desenvolvimento das atividades; a proliferação de instituições de formação de professores, com qualidade questionável, formando docentes despreparados; as disciplinas de ciências não se integram de maneira articulada junto às outras disciplinas no currículo escolar; a falta de incentivo por parte do Governo com relação a atualização constante dos professores, entre outros. No cotidiano escolar, observamos professores com dificuldades em abordar questões relativas às mudanças climáticas e alunos confusos com tantas informações veiculados pela mídia sobre o tema. Tendo em vista este quadro, durante as aulas de Ciências, numa discussão sobre mudanças climáticas, ao observarmos que alunos de uma 8ª série do Ensino Fundamental manifestavam concepções diferentes das científicas sobre o efeito estufa, confundindo este com o processo da destruição da camada de ozônio e com o aquecimento global, numa verdadeira confusão de idéias e conceitos, surgiu a proposta de se investigar quais as concepções dos alunos sobre o fenômeno. Como o assunto é trabalhado pelas disciplinas de Ciências e Geografia, desde a 5ª série do Ensino Fundamental, tornou-se fundamental investigar se as concepções formuladas pelos professores sobre o fenômeno e sua prática pedagógica influenciaram na formação das concepções alternativas dos alunos. 1.1 Concepções Alternativas e a Formação do Professor Ao realizarmos uma revisão bibliográfica, pôde-se observar que os estudos sobre as concepções alternativas surgiram na década de 70, culminando com um programa de pesquisa, denominado por Movimento das Concepções Alternativas. Este programa tem como suporte teórico as pesquisas de Posner (1970) Doran (1972), Viennot (1979), Driver (1985) que foram algumas das investigações pioneiras nessa linha (NARDI; GATTI, 2007). Essas pesquisas revelaram que durante o processo de ensino e aprendizagem a maioria dos alunos elaborou conceitos alternativos sobre o conhecimento científico. E que esses conceitos inadequados do ponto de vista da ciência têm suas raízes no meio social, nas experiências de vida, nos valores transmitidos pela família, nas idéias defendidas pela escola e pela religião, pois todos esses aspectos constituem as bases para a formação das concepções dos indivíduos. O homem ao longo de sua vida e na interação com outras pessoas constrói seu conhecimento acerca do mundo e dos fenômenos que o rodeiam. Esse conhecimento é constituído de vários conceitos espontâneos e científicos que originam as concepções pessoais e subjetivas de cada indivíduo. Piaget (1980) reconhece o conhecimento como um processo contínuo de construção de novas estruturas, decorrente da interação do sujeito com o real; o conhecimento não é préformado, nem nos objetos, nem no sujeito, mas existe sempre uma auto-regulação e, por conseguinte, construção e reconstrução. O conhecimento não se trata jamais de uma cópia. Ele é sempre uma assimilação, isto é, uma interpretação feita através da integração do objeto às estruturas anteriores do sujeito. Os escritos de Piaget deixam claro que o conhecimento para ele é fruto da experiência, pois é através dessas relações do sujeito com o objeto (sentido amplo) que a aprendizagem é construída. É evidente então, que a elaboração de concepções pelas pessoas está relacionada com vários fatores de seu cotidiano, pois as concepções espontâneas surgem da relação de vida com outras pessoas, com a religião, com a cultura partilhada pelo seu grupo social, por valores e também por ideais. Sendo assim, as concepções dos indivíduos dependem de sua história de vida e demonstram-se resistente a mudanças, porque envolve estruturas internas dos homens. Mortimer (1996) explica que os alunos, a partir de suas experiências de vida, constroem por si mesmos, várias teorias acerca dos fenômenos da natureza, com coerência do ponto de vista pessoal, mas incoerente cientificamente; e o ensino escolar ineficaz pode estimular o surgimento dessas idéias alternativas. Cachapuz (2000) comenta que a subjetividade, a compreensão individual, que o educando tem dos conhecimentos trabalhados na escola, da explicação dada pelo professor, das leituras realizadas ou mesmo de situações vivenciadas e presenciadas no seu dia a dia podem gerar a formação de concepções alternativas. Diante dessas constatações surge a questão: como mediar o conhecimento científico após detectar a presença desse tipo de concepção? Surgiram então diversos trabalhos que tinham como finalidade discutir os processos mentais embasados no modelo de mudança conceitual. Ferraz e Terrazzan (2002) argumentam que a mudança conceitual é explicada por múltiplas perspectivas. Pesquisadores como Strike e Posner (1992) explicam a mudança conceitual pela substituição da concepção ingênua do aluno pela científica e outros como Driver (1994) e Mortimer (2000) propõem a idéia de que podem coexistir diferentes modos de pensar um mesmo conceito em diferentes domínios sem exigir que um modo deva substituir o outro. Neste sentido, Mortimer (2000) sugere que a evolução conceitual seja entendida como modificações de perfis conceituais. Para ele um perfil conceitual é um conjunto que reúne diferentes explicações para um mesmo conceito descrevendo a evolução das concepções na escola. Outras propostas, como a de El-Hani e Bizzo (2007) comentam que a aprendizagem de conceitos científicos consiste na aprendizagem de uma segunda linguagem, ou seja, é um processo de alfabetização em que o indivíduo deve aprender a pensar, falar, ler e escrever numa outra linguagem que traz com ela uma maneira particular de ver o mundo. Aprender uma linguagem também significa vir a compreender uma visão de mundo, ainda que não necessariamente adotá-la. O mesmo ocorreria no caso de uma alfabetização científica: a pessoa ao alfabetizar-se cientificamente, passaria a ver o mundo de uma outra maneira, mesmo que não adotasse uma visão de mundo que pudesse ser caracterizada como científica (EL-HANI, BIZZO, 2007, p. 15). Esses autores defendem que o processo de mudança conceitual não significa a ruptura ou substituição das concepções prévias do aluno pelas científicas, mas esclarecem que o papel do ensino de ciências deve ser de levar aos educandos o reconhecimento e a explicitação de domínios particulares do discurso nos quais as concepções científicas e as idéias dos alunos têm, cada qual o seu contexto. Cunha compartilha dessa idéia ao assinalar que a Mudança conceitual raramente envolve um abandono completo de uma noção a favor de uma outra. Do contrário, com freqüência envolve adição de novas noções, retenção de noções existentes e aquisição de um sentido do contexto no qual a nova noção é mais apropriada. (CUNHA, 1999, p. 87). Outros autores como Bastos, Nardi, Diniz e Caldeira (2006) argumentam que os processos mentais relacionados à aprendizagem podem seguir por caminhos diversos (mudança conceitual, formação de perfis conceituais, construção de conhecimentos sem status de concepção, ocorrência simultânea ou combinada de dois ou mais processos etc.) o que significaria uma visão mais plural dos processos de aprendizagem. (...) procuramos mostrar que os contextos e processos relacionados ao ensino e à aprendizagem em ciências são extremamente diversificados, o que enfatiza a necessidade de uma pluralidade de perspectivas teóricopráticas que permitam ao professor e ao pesquisador compreender de forma mais aberta e rica o trabalho educativo a ser empreendido pelo ensino escolar de disciplinas científicas (BASTOS; NARDI; DINIZ; CALDEIRA, 2006, p. 52) Com base nestas considerações, fica evidente a importância da escola e do professor estarem conscientes e preparados, teórica e metodologicamente, para lidar com os complexos caminhos da formação científica dos alunos. Neste contexto, Nardi e Gatti (2007) destacam “...a necessidade de que o docente seja preparado para atuar em uma nova perspectiva e adquira conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem de Ciências”. No entanto, diversos trabalhos têm demonstrado o insucesso com que a escola tem exercido sua função. Esse insucesso tem ocorrido porque a formação científica do professor de Ciências é questionável e consequentemente a do seu aluno. Maldaner e Schnetzler (2001) explicam que a desatualização do professor ainda acontece porque muitas pesquisas não chegam aos professores que efetivamente conduzem e produzem as aulas. Segundo os autores, os professores têm acesso restrito às publicações mais atualizadas, tanto em livros atualizados como em revistas nacionais e estrangeiras. Esse tipo de publicação circula e existe no ensino superior, mas são raras as escolas que mantêm assinaturas de revistas científicas. Os resultados apresentados neste trabalho retratam justamente esta realidade, as limitações na formação científica dos docentes, trazendo como resultado aulas com inconsistência científica, colaborando para a formação das concepções alternativas dos alunos. 2 METODOLOGIA DA PESQUISA Participaram da pesquisa 40 alunos, de ambos os sexos, da 8ª série do Ensino Fundamental, de uma escola particular de uma cidade do Noroeste do Estado do Paraná. Esses alunos encontravam-se na faixa etária de 13 a 15 anos de idade. Para investigar as concepções dos alunos sobre efeito estufa, optou-se pelo uso de um questionário composto por cinco questões abertas referentes ao assunto sendo a última questão a solicitação de um desenho que representasse o fenômeno. As questões buscaram identificar os meios em que ocorreu a aprendizagem dos alunos sobre o tema investigado, como foi essa aprendizagem, o que realmente aprenderam e as concepções que foram elaboradas durante seus anos de escolarização. No segundo momento da pesquisa, realizou-se entrevistas do tipo semi-diretiva com as professoras de Ciências e Geografia, que ministraram aulas para esta turma quando cursaram a 5ª série do Ensino Fundamental. As entrevistas foram feitas com base num roteiro com 15 questões, a fim de verificar as concepções dos professores sobre o fenômeno analisado e suas reflexões a respeito da temática em questão. Para a análise das respostas obtidas nos questionários e nas falas das professoras, optou-se pelos pressupostos teóricos e metodológicos da análise de conteúdo de Bardin (1977). Tal método se baseia na junção de um conjunto de técnicas de análise dos relatos, no qual são utilizados procedimentos bem determinados para interpretar o conteúdo das mensagens. Esta pesquisa resultou em uma dissertação de Mestrado. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Concepções alternativas dos alunos sobre efeito estufa No questionário muitos dos estudantes, afirmaram ter aprendido sobre o fenômeno do efeito estufa na escola, durante as aulas de Ciências e Geografia na 5ª série. A grande maioria mencionou também que ouviu falar sobre esse tema na televisão, principalmente assistindo a programas jornalísticos. Outros alunos mencionaram a internet, leitura de livros didáticos, jornais e revistas. Após a análise temática, as respostas que predominaram nos alunos foram classificadas nas categorias descritas a seguir. Categoria 1- A destruição da camada de ozônio é o responsável pelo efeito estufa Para os estudantes os buracos que existem na camada de ozônio são decorrentes da poluição atmosférica e explicam o acontecimento do efeito estufa. Segundo eles, é através desses buracos que os raios ultravioletas do Sol entram na Terra e fazem o superaquecimento do Planeta (Figuras 2 e 3). Muitos alunos acreditam ser a poluição do ar a grande causadora do efeito estufa. Durante a análise dos questionários, ficou evidente que praticamente todos os alunos vêem esse fenômeno como maléfico e prejudicial ao Planeta. Efeito estufa é a degradação do meio ambiente e que acaba muito com a camada de ozônio. Ocorre com a poluição e nós poluímos o meio ambiente a toda hora até quando jogamos um papel de bala no chão nós poluímos. (A.B., menino de 14 anos) Esta concepção também está presente nos desenhos dos alunos (Figura-1). Figura 1 – Representação do efeito estufa, por A.B., menino de 14 anos. O efeito estufa ocorre quando a poluição quebra a camada de ozônio deixando os raios ultravioletas entrarem. (G.G., menino de 14 anos) Figura 2- Representação do efeito estufa, por G.G., menino de 14 anos. Figura 3- Representação do efeito estufa, por V.A., menino de 14 anos. Quando os alunos se referem aos raios ultravioletas do Sol eles o definem como o causador do câncer de pele e do derretimento das calotas polares. Esclarecem ainda que esses raios do Sol são os responsáveis pelo calor que fazem com que a Terra se pareça com uma estufa devido o calor gerado (Figura 4). Os raios ultravioletas entram na atmosfera pelos buracos da camada de ozônio. Isso se chama efeito estufa porque é como se o mundo fosse uma estufa e que se os raios entrarem as plantas podem morrer. (V.A., menino de 14 anos) Alguns alunos afirmaram com grande convicção que o efeito estufa causa câncer de pele nos seres humanos, demonstrando a concepção de que o efeito é provocado pelos raios ultravioletas do Sol. O efeito estufa causa maior porcentagem de câncer de pele e uma grande mudança no ecossistema, [...] (G.C. menino de 13 anos) Figura 4- Representação do efeito estufa, por M.S., menino de 14 anos. Categoria 2- Efeito estufa é sinônimo de aquecimento global Os alunos foram categóricos ao afirmarem que, para eles, efeito estufa e o aquecimento global são sinônimos. Cientistas como Mozeto (2001) e Molion (1995) explicam que é a exacerbação dos gases que ocasionam o efeito estufa que gera o aquecimento global, fenômeno que é agravado devido às ações antrópicas. Para mim efeito estufa é o aquecimento global da Terra. (M.S., menino de 14 anos) O efeito estufa é um aquecimento geral no Território global, sendo ocasionado pelas falhas da camada de ozônio que está havendo na Terra, ocasionada pelo homem que está destruindo a natureza e construindo indústrias, essas indústrias soltam seus gases, falhando a camada que protege a Terra dos raios solares, assim causando um aquecimento global e ocasionando o efeito estufa que aquece a Terra. (A.L. menina de 14 anos) Os alunos não deixaram de mencionar um acontecimento que para eles é conseqüência do efeito estufa – o derretimento das geleiras. Como esses educandos acreditam que esse efeito é sinônimo de aquecimento global, responsabilizam-no pelo derretimento das geleiras (Figura 5). Com o efeito estufa o planeta fica mais quente e derrete as geleiras e faz o nível de água subir e destruir várias cidades e destruiria a fauna. (J.F., menino de 13 anos) Figura 5- Representação do efeito estufa, por J.F., menino de 13 anos. 3.2 Concepções alternativas das professoras sobre o efeito estufa As concepções das professoras de Ciências e de Geografia sobre o fenômeno do efeito estufa são muito parecidas com as concepções dos alunos. Nas falas dessas profissionais fica evidente que suas aulas estão fundamentadas nos mesmos meios de informação dos alunos livros didáticos, jornais, revistas, internet - mas não mencionam a utilização de artigos, periódicos, ou outros tipos de materiais de cunho científico. Livros didáticos, pesquisas na Internet, jornais, telejornais e tudo que seja correlacionado com essas mudanças climáticas, tudo que está envolvendo, que são comentários e os conhecimentos prévios dos alunos, então tudo isso vai, a gente vai fazendo um apanhado geral e trabalhando com os alunos. (Professora de Geografia) Além do livro didático que eu tinha eu sempre pesquisava em outros livros de Ciências e na Internet, na Globo Ciências, revistas que tinha muito ou sempre alguma coisa. (Professora de Ciências) Professora de Ciências da 5ª série Com base na análise das falas da professora de Ciências, observamos uma categoria que explica a sua concepção de efeito estufa. Categoria 2- Efeito estufa é sinônimo de aquecimento global A idéia de que o efeito estufa ocasiona essas mudanças climáticas tão profundas que estão ocorrendo na Terra é evidente no discurso da professora de Ciências. O efeito estufa seria o aquecimento global da Terra com o aprisionamento da temperatura na atmosfera. (Professora de Ciências) A fala que segue abaixo denota o fenômeno como uma das conseqüências negativas da ação do homem sobre a natureza, especialmente quando as ações são puramente econômicas. No decorrer da entrevista com essa docente percebe-se que ela não tem segurança sobre o que responde. Suas respostas são rápidas e inconsistentes de informação e conhecimento. A gente acaba falando dos desgastes do próprio homem que esse efeito estufa o que acontece ele é relacionado com a própria falta de estrutura do homem em preservar o meio ambiente, por isso tanto desgaste assim da Terra como se acaba trazendo as conseqüências, a destruição, o desmatamento. (Professora de Ciências) Professora de Geografia da 5ª série Pelas falas da professora de Geografia identificamos as duas categorias que predominaram nas respostas dos alunos. Categoria 1- A destruição da camada de ozônio é o responsável pelo efeito estufa Percebe-se que a professora de Geografia não tem conhecimento científico sobre o efeito estufa, pois sua explicação sugere que o efeito estufa não é um fenômeno atmosférico natural, mas um fenômeno ocasionado por ações antrópicas. Bom, efeito estufa ele é um fenômeno, uma poluição causada pelos gases que o homem emite através dos escapamentos dos carros das indústrias e que provoca um aquecimento global. (Professora de Geografia) Nessa categoria verifica-se uma grande confusão de conceitos sobre os fenômenos do efeito estufa e a destruição da camada de ozônio. È de consenso da ciência atual que a destruição da camada de ozônio não tem essa relação com o efeito estufa descrita na entrevista da professora de Geografia e nas respostas dos alunos da 8ª série. Sim, já trabalhei, é nas 5ª séries, apesar de trabalhar em todas as séries, sempre estou comentando sobre esse fenômeno causado pelos gases que o homem emite na camada de ozônio. (Professora de Geografia) Novamente aparece a idéia que também predominou nas respostas dos alunos de que o efeito estufa é tão maléfico que causa doenças como o câncer de pele. Inclusive e aí a gente pode puxar pra questão do câncer de pele, da proteção que nós devemos ter em questão ao Sol, os horários, porque que eles assistem na televisão, porque das 10 às 4 horas da tarde a gente tem que se prevenir passar um filtro solar. (Professora de Geografia) Categoria 2- Efeito estufa é sinônimo de aquecimento global Em nenhum momento o aquecimento global é comentado como um outro fenômeno que está acontecendo na Terra, mas as explicações dadas para o efeito estufa atribuem a ele características próprias do aquecimento global. Bom efeito estufa ele é um fenômeno...é uma poluição que provoca um aquecimento global... (Professora de Geografia) A professora de Geografia acredita que o efeito estufa é desencadeado pela poluição humana. A falta de conhecimento científico sobre esses assuntos é evidente na fala que segue abaixo: Então é justamente isso, então tentar fazer com que eles relacionem algo que está sendo gerado pelo homem que é o efeito estufa por causa dos gases e que está afetando diretamente a nossa vida e sempre trabalhar algo que é mais concreto para eles, algo que eles entendam (Professora de Geografia). Como os problemas ocasionados pelo derretimento das geleiras estão sendo muito comentados pela mídia como uma das mais temidas conseqüências das mudanças climáticas deste século percebe-se que também é um assunto trabalhado por essa docente em suas aulas, porém de maneira confusa. As implicações pelo que a gente tem estudado e pesquisado é esses efeitos podem implicar na destruição de algumas espécies, [...] e no derretimento das calotas polares. Então seria uma mudança na biologia tanto terrestre quanto marinha. (Professora de Geografia) Após a análise das respostas dos alunos, ficou claro o quão relevantes são as aulas de ciências de qualidade, para que estes possam, efetivamente, construir uma aprendizagem significativa sobre os fenômenos e processos que permeiam o cotidiano. A pesquisa permitiu, ainda, refletir sobre a postura tradicional de muitos professores, ao não valorizarem o conhecimento prévio de seus alunos, posicionando-se como o centro do processo de ensino-aprendizagem e como detentor do saber, acabam por reforçar ainda mais as idéias de senso comum em detrimento às idéias defendidas pela ciência. O educador deve estar bem informado sobre os assuntos da ciência na atualidade. Sem falar o quanto é importante o conhecimento sobre as questões ambientais, uma vez que a sociedade vive uma crise ambiental de dimensão global. Se os cidadãos não tiverem conhecimentos científicos básicos sobre os problemas ambientais vigentes, como poderão se posicionar de forma crítica e atuar na sociedade na busca de soluções para os mesmos? 4. CIÊNCIA, UM BEM A SER DISSEMINADO... Num segundo momento, os resultados da pesquisa foram apresentados aos alunos e problematizados os conceitos: efeito estufa, aquecimento global e destruição da camada de ozônio. Foi o momento que os educandos perceberam que tinham idéias equivocadas do ponto de vista científico. Motivados pela professora de Ciências, os alunos decidiram que o tema a ser pesquisado para a Feira de Ciências daquele ano seria: “Efeito Estufa e Aquecimento Global”, com o objetivo de divulgar aos colegas da escola de maneira clara os fenômenos citados. A partir de então foi organizado um projeto, com o envolvimento ativo dos alunos nas diversas atividades: pesquisas em livros e revistas científicas, organização dos dados e confecção de maquetes, cartazes, esquemas, fotos e gráficos. Após apresentarem o projeto na Feira de Ciências da escola, os alunos foram convidados a participarem com o trabalho na Multifeira, encontro que reúne diversas escolas do estado, em Curitiba, capital do Paraná, permitindo que mais pessoas compreendessem realmente o que é o efeito estufa e o aquecimento global, suas causas e conseqüências. Esse trabalho resultou, ainda, em uma publicação científica, na perspectiva de divulgar aos professores do ensino básico uma estratégia metodológica para se trabalhar questões relativas às mudanças climáticas. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os dados obtidos e analisados neste estudo vêm fortalecer o pressuposto de que alunos e professores apresentam idéias alternativas sobre determinados conceitos e fenômenos, porque a escola não tem exercido com sucesso a sua função de formar uma cultura e um saber científico adequado. Hoje mais do que nunca, é indispensável avaliar periodicamente a formação científica dos professores, proporcionando-lhes uma atualização continuada de seus conhecimentos. É necessário que o educador tenha uma concepção pedagógica clara. Ele precisa entender que uma aula improvisada, sem objetivos claros e sem caminhos metodológicos definidos não cria momentos para a construção de conhecimento por parte dos alunos. As aulas devem, ainda, valorizar a realidade vivenciada por eles. Ensinar o que eles já sabem não tem utilidade, daí a importância de saber as idéias prévias dos alunos, trabalhando o conhecimento cotidiano com o científico. E para o educador conseguir obter sucesso na sua função em sala de aula, como mediador do saber científico, é relevante que ele esteja aberto a entender o pluralismo teórico e metodológico existente para se trabalhar o ensino de ciências, não se fechando em verdades absolutas ou em receitas prontas. Para isso é fundamental que o educador tenha acesso a artigos, revistas, teses e dissertações científicas; bem como participe de grupos de estudos, simpósios, congressos e discussões desta área, aprendendo a ser um professor pesquisador. Por fim, somente com investimentos na educação científica, formando cidadãos preparados em atuar, viver e participar deste novo século, cujos dilemas e problemas ambientais, sociais, éticos e tecnológicos avolumam-se a cada dia, é que poderemos contribuir para padrões mais dignos de existência para a sociedade como um todo. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: 70, 1977. BASTOS, F. Construtivismo e ensino de ciências. In: NARDI, R. (Org). Questões atuais no ensino de ciências. São Paulo: Escrituras, 1998. p. 11-15. BASTOS, F.; NARDI, R.; DINIZ, R. E.; CALDEIRA, A. M. A.. Da necessidade de uma pluralidade de interpretações acerca do processo de ensino e aprendizagem em Ciências. Revista Educação para a Ciências. EL-HANI, C. N.; BIZZO, N. Formas de construtivismo: mudança conceitual e construtivismo contextual. Disponível em: www.fae.ufmg.br/ensaio/v4-n1/4113.pdf. acesso em 20 mar 2007. CACHAPUZ, A. F. Formação de Professores Ciências - Perspectivas de Ensino. 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