Corticotomias seletivas no osso alveolar para auxiliar a - ABOR-DF

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Caso Clínico
Corticotomias seletivas no osso
alveolar para auxiliar a
movimentação ortodôntica
Dauro Douglas Oliveira*, Ana Maria Bolognese**,
Margareth Maria Gomes de Souza***
Resumo
O movimento ortodôntico só é possível devido à grande capacidade de remodelação do tecido ósseo. Diversos
procedimentos laboratoriais conseguiram
potencializar a movimentação ortodôntica, em animais, aumentando o ciclo de
remodelação óssea, seja por alterações
hormonais, seja pela introdução de substâncias químicas. Entretanto, devido aos
seus possíveis efeitos colaterais, essas
abordagens não alcançaram aplicação
clínica rotineira em humanos. Por outro
lado, a realização de corticotomias seletivas no osso alveolar, antes do início da
movimentação dentária, apresentou-se
como alternativa para tornar mais eficiente a resposta biológica óssea ao estímulo mecânico causado pelos aparelhos
ortodônticos, sem a ocorrência de efeitos
sistêmicos indesejáveis. Com o intuito de
contribuir para o melhor entendimento
do tema, os autores revisaram a literatura
atual, esclarecendo as possíveis aplicações clínicas da associação movimento
ortodôntico-corticotomia. Por fim, os processos biológicos que justificariam o emprego dessa combinação terapêutica, em
determinados casos, foram abordados.
Palavras-chave: Corticotomia alveolar. Movimentação ortodôntica.
Eficiência do movimento dentário.
*Doutor em Ortodontia pela UFRJ. Professor Assistente do Mestrado em Ortodontia da PUC Minas, Belo Horizonte / MG.
**Professor Titular da Disciplina de Ortodontia da Faculdade de Odontologia da UFRJ.
***Professor Adjunto da Disciplina de Ortodontia da Faculdade de Odontologia da UFRJ, Rio de Janeiro / RJ.
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Dauro Douglas Oliveira, Ana Maria Bolognese, Margareth Maria Gomes de Souza
Introdução
O movimento ortodôntico só é possível devido à grande capacidade de remodelação do tecido ósseo. A busca pelo melhor
entendimento sobre os diversos fatores que regulam a movimentação dentária sempre despertou interesse, tanto no meio científico,
quanto entre os ortodontistas clínicos. Apesar dos grandes avanços
obtidos até então, vários estudos continuam sendo desenvolvidos,
a fim de se detalhar ainda mais os processos biológicos envolvidos
durante a movimentação ortodôntica. De uma maneira geral, tal
movimentação é afetada pela intensidade, constância e duração
das forças aplicadas aos dentes, pelas características de remodelação do osso alveolar ou pela combinação desses fatores.
O conhecimento sobre os efeitos que a aplicação dos diversos tipos de forças ortodônticas têm na movimentação dentária
se encontra num estágio mais avançado do que a compreensão
de como as diferentes condições de metabolismo ósseo modulam
o movimento ortodôntico. Um dos exemplos clínicos mais claros
dos efeitos que as condições metabólicas do osso alveolar exercem
sobre a movimentação dentária é a diferença de velocidade entre
o movimento dentário em pacientes jovens e adultos. A resposta
biológica mais lenta, a presença de espaços trabeculares menores2
e a maior densidade do osso alveolar4 são alguns fatores que explicariam porque a movimentação ortodôntica é mais difícil e lenta
em indivíduos mais maduros.
O tratamento ortodôntico mais longo é uma das resistências
que alguns pacientes, freqüentemente, relatam como empecilho
para se submeterem à terapia ortodôntica. Outro desafio comumente enfrentado pelos ortodontistas diz respeito às dificuldades
técnicas em se realizar certos movimentos dentários, tais como a
intrusão de dentes posteriores sem causar a extrusão dos elementos adjacentes. Diante do exposto, a possibilidade de diminuir a
duração do tratamento ortodôntico, ou de facilitar movimentações
dentárias consideradas mais complexas, sem comprometer a qualidade dos resultados alcançados, certamente seriam avanços muito
bem vindos ao meio odontológico.
Alguns estudos laboratoriais alcançaram tais resultados mudando o metabolismo ósseo, após alterar as concentrações ideais dos
hormônios que ajudam a controlar os níveis de cálcio no sangue14,
ou depois da aplicação de substâncias químicas, tanto local3 quanto
sistemicamente25. Essas alterações no metabolismo ósseo resultaram
na diminuição da densidade do osso alveolar e, conseqüentemente,
possibilitaram a obtenção do movimento ortodôntico acelerado e/ou
facilitado. Infelizmente, nenhuma dessas abordagens foi capaz de
transpor os limites que separam estudos laboratoriais, em animais,
da aplicação clínica rotineira em humanos.
Apesar dessa dificuldade de conexão entre pesquisas básicas
sobre alterações no metabolismo ósseo e a potencialização da movimentação dentária em humanos, resultados bastante promisso-
res foram apresentados, recentemente, abordando tais fenômenos.
Chung et al.5 relataram sucesso na correção de mordida aberta esqueletal em adultos com tração ortopédica vertical de segmentos
posteriores da maxila, após a realização de corticotomias segmentadas do osso alveolar. Além desse relato, Wilcko et al.28 apresentaram
casos de tratamentos ortodônticos nos quais a duração da terapia
ativa foi significativamente diminuída ao se combinar a Ortodontia
convencional com corticotomias interdentários no osso alveolar.
Mesmo apresentando resultados significativos, esses trabalhos
não elucidam uma série de importantes questões. Qual é a resposta
biológica à corticotomia seletiva do osso alveolar? Essa resposta
representaria fenômenos biológicos que justificariam a obtenção
dos resultados relatados? Existiriam outras aplicações clínicas para
essa abordagem terapêutica? Haveria realmente espaço para a associação entre o movimento ortodôntico e a corticotomia alveolar
na Odontologia atual? Diante dessas considerações, o presente artigo apresenta revisão da literatura sobre esse assunto, fornecendo
dados atuais a respeito das possíveis aplicações que a combinação
Ortodontia-corticotomia teria na clínica e detalhando quais fenômenos biológicos justificariam o emprego dessa abordagem em
situações clínicas adequadamente selecionadas.
HISTÓRICO E POSSÍVEIS INDICAÇÕES CLÍNICAS
As primeiras descrições sobre o uso da corticotomia alveolar
associada à movimentação dentária são atribuídas a L. C. Brian,
em 1892, e G. Cunningham, em 1893, (apud MERRIL; PEDERSEN22,
1976). Brian relatou casos tratados com tal associação durante o
encontro da American Dental Society of Europe e Cunningham
descreveu “o método imediato no tratamento de dentes irregulares” no Congresso Odontológico de Chicago, sendo limitado à
correção de incisivos laterais superiores lingualmente inclinados.
Cortes verticais do osso alveolar interdental foram realizados para
permitir o reposicionamento dos dentes em questão, que logo após
a movimentação eram estabilizados nessa nova posição22.
Em 1959, o cirurgião austríaco Heinrich Köle18 reintroduziu o
uso de intervenções cirúrgicas no osso alveolar, a fim de auxiliar na
movimentação dentária. O autor sugeriu a combinação Ortodontiacorticotomia para a correção de más oclusões que não poderiam
ser tratadas com cirurgias isoladamente, ou onde só a Ortodontia
demandaria um tempo de tratamento muito longo para alcançar
resultados satisfatórios e, mesmo assim, com estabilidade questionável.
Ainda segundo Köle18, a corticotomia do osso alveolar é um
procedimento limitado à porção cortical do osso alveolar, realizada após o deslocamento total de retalhos gengivais. Uma vez
afastados os tecidos moles, corticotomias interdentários verticais
deveriam ser realizadas tanto na superfície vestibular quanto na
lingual, estendendo-se além dos ápices radiculares. Finalmente, os-
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cientes sem crescimento e com más oclusões severas. Além disso,
essa associação terapêutica poderia facilitar a intrusão de molares
permanentes supra-irrompidos16,24 e a retração de dentes anteriores, em casos de extrações de pré-molares e com necessidade de
ancoragem máxima5,17.
Recentemente, Wilcko et al.28 relataram tratamentos ortodônticos em adultos, onde a duração da terapia ativa foi reduzida sobremaneira com o emprego de outra variação da técnica proposta por
Köle18. Esses autores preconizaram que, além dos cortes horizontais
serem limitados à porção cortical do osso alveolar, como sugerido
por Generson et al.13, pequenas perfurações esféricas deveriam ser
realizadas na área retangular contida entre os cortes verticais e
horizontais (Fig. 2), a fim de se aumentar a resposta biológica do
osso alveolar. Por último, sugeriram a colocação de enxertos de
osso liofilizado ao longo de toda a área operada (Fig. 3), seguido do
reposicionamento do retalho e sutura.
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Figura 1 - A) Combinação de osteotomia supra-apical com corticotomias interdentários para “movimentação de blocos ósseos” (Modificada a partir de Köle, 195918). 35
B) Vista lateral da técnica descrita por Köle18 mostrando osteotomia supra-apical extendo-se por todo alvéolo.
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Figura 2 - Modificação da técnica original pelo acréscimo de perfurações esféFigura 3 - Colocação de enxerto de osso liofilizado sobre toda área operada.
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ricas a fim de aumentar o ciclo de remodelação do osso alveolar.
teotomias horizontais supra-apicais, atravessando toda a extensão
vestíbulo-lingual do alvéolo, conectariam os cortes interproximais
previamente realizados (Fig. 1). Segundo o autor, as vantagens
desse método envolveriam a diminuição significativa do tempo de
tratamento ativo e a prevenção de necroses ósseas, uma vez que o
osso esponjoso intacto garantiria a nutrição do bloco ósseo. Além
disso, sugeriu-se que o processo cicatricial da cortical óssea contribuiria para o aumento da estabilidade dos resultados alcançados.
Após a introdução formal da movimentação ortodôntica póscorticotomia, no final dos anos cinqüenta, outros autores relataram sucesso em sua aplicação clínica. Generson et al.13 apresentaram casos tratados com êxito em período menor de tempo, mesmo
com a substituição da osteotomia supra-apical pela corticotomia
simples, circunscrevendo os ápices radiculares dos dentes a serem
movimentados. De acordo com Anholm et al.2 e Gantes et al.12, tal
combinação seria útil na redução do tempo de tratamento em pa-
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Os relatos expostos na literatura mostram duas indicações
para a combinação movimento dentário e corticotomia alveolar:
(1) aumentar a eficiência da movimentação ortodôntica em situações clínicas complexas e (2) diminuir o tempo total de tratamento. Como a maioria das publicações sobre a movimentação
ortodôntica pós-corticotomia alveolar se fez em forma de relatos
de caso, não está totalmente claro quais mecanismos biológicos
regem esse método de tratamento. Para que tal abordagem clínica seja adotada de forma segura e rotineira pelos ortodontistas,
é necessário compreender melhor como a realização de corticotomias alveolares influencia o movimento ortodôntico. Existem
duas teorias para explicar tal condição, que serão discutidas em
seguida.
QUAIS FENÔMENOS BIOLÓGICOS JUSTIFICARIAM O AUMENTO DA EFICIÊNCIA DA MOVIMENTAÇÃO ORTODÔNTICA PÓS-CORTICOTOMIA ALVEOLAR?
Movimentação de blocos ósseos x aumento do
metabolismo ósseo
Ao apresentar a corticotomia alveolar como uma intervenção que facilitaria o movimento dentário, Köle18 acreditava que a
maior resistência a essa movimentação viria da continuidade da
cortical do osso alveolar, uma vez que os processos de remodelação são mais lentos nessa área. Especulou-se que tal resistência à
movimentação ortodôntica poderia ser superada criando-se blocos ósseos conectados uns aos outros apenas por osso medular.
Por isso, a técnica cirúrgica descrita na época, era na verdade
uma combinação de corticotomias interdentários vestibulares e
linguais com osteotomias supra-apicais que penetravam toda a
extensão do alvéolo. A teoria de que esses blocos ósseos, delineados pelos cortes cirúrgicos, poderiam ser movimentados independentemente uns dos outros, em resposta às forças ortodônticas,
foi mantida pelos outros autores que relataram sucesso na utilização dessa combinação terapêutica5,12,16. Os poucos estudos em
animais, realizados sobre o assunto, não investigaram os efeitos
que justificariam tais resultados7,17,31.
No final da década de 70, Generson et al.13 relataram resultados tão animadores quanto os descritos por Köle18. Entretanto,
havia uma diferença sutil, porém muito relevante, entre as técnicas cirúrgicas empregadas até então. O procedimento descrito
pelo primeiro autor substituía as osteotomias supra-apicais por
corticotomias, ou seja, cortes limitados à cortical óssea, o que
não separava os blocos ósseos totalmente. Apesar de ter passado
despercebido, esse detalhe pode ter sido o primeiro sinal de que
a teoria de movimentação de blocos ósseos seria de difícil comprovação.
Em 2001, Wilcko et al.28 sugeriram que o aumento do metabolismo ósseo causado pelo estímulo traumático da corticotomia
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Figura 4 - Eliminação dos cortes verticais e horizontais dificultaria a comprova49
ção da teoria de movimentação de blocos ósseos.
justificaria a resposta biológica aumentada às forças mecânicas
geradas pelos aparelhos ortodônticos e a conseqüente diminuição do tempo de tratamento ativo. Segundo esses autores, análises radiográficas e de tomografias computadorizadas, realizadas
antes, durante e após o tratamento, não comprovaram o conceito
da movimentação de blocos ósseos pós-corticotomia alveolar. Na
verdade, essas avaliações foram mais sugestivas de um aumento
do fenômeno de desmineralização e remineralização óssea29.
Para testar essa hipótese, os autores trataram casos com a
combinação movimento dentário-corticotomia, sem realizar cortes interdentários, verticais ou supra-apicais horizontais, que
foram substituídos por pequenas perfurações esféricas ao longo de toda área operada (Fig. 4). Essa abordagem, teoricamente,
eliminaria a possibilidade de se movimentar blocos ósseos, pois
não existiam mais os cortes que delimitavam e separavam tais
blocos do restante do processo alveolar. Os resultados alcançados
mostraram movimentação dentária tão acelerada quanto aquela
observada quando cortes verticais e horizontais foram realizados29. Esses achados levaram os autores citados a reafirmarem
que a diminuição do tempo de tratamento ortodôntico estaria
relacionada ao aumento do metabolismo ósseo em níveis locais e
não à movimentação de blocos ósseos. Sugeriu-se que a porção
trabecular do osso alveolar era induzida, temporariamente, a um
estado mais “maleável”, caracterizado pela diminuição da densidade e não do volume ósseo.
Apesar de não se encontrar estudos comprovando diretamente nenhuma das hipóteses descritas acima, parece haver mais indícios na literatura médico-odontológica para comprovar a segunda teoria do que a primeira. Quais seriam esses indícios?
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Alterações no metabolismo ósseo e sua influência
na velocidade do movimento dentário
A maioria dos estudos sobre movimentação dentária se concentrou, inicialmente, na avaliação dos efeitos de diferentes forças
ortodônticas nesses movimentos. Midgett et al.23 foram alguns dos
primeiros autores a provar a importância do metabolismo ósseo na
movimentação ortodôntica. Os resultados de seus estudos mostraram que a deficiência significativa de cálcio, na dieta de cães,
resultou no aumento das concentrações de paratormônio (PTH) no
sangue, ou seja, em um estado definido como hiperparatireoidismo
induzido. Nessas condições, observou-se diminuição considerável
na densidade do osso trabecular e a movimentação ortodôntica
nos animais experimentais ocorreu mais rapidamente do que no
grupo controle. Goldie e King14, num estudo com metodologia semelhante, observaram condições características de osteoporose em
ratas submetidas à dieta deficiente em cálcio. Esse quadro de osteoporose provocada se mostrou associado ao aumento significativo
na remodelação do osso alveolar, que por sua vez, teria contribuído
para a potencialização do movimento dentário.
Yamashiro e Takano30 também avaliaram os efeitos de desequilíbrios hormonais na movimentação ortodôntica. Os pesquisadores
causaram deficiências nas taxas de estrógeno em ratas, ao submetêlas a ovarectomia. A diminuição na concentração ideal desse hormônio resultou em alterações significativas na remodelação óssea,
o que ocasionou o decréscimo da densidade do osso alveolar em
sua porção trabecular. O movimento ortodôntico nos animais experimentais submetidos às condições denominadas de osteopenia
ou osteoporose induzida aconteceu numa velocidade significativamente maior do que em animais do grupo controle. A queda na
densidade do osso alveolar e o conseqüente aumento na eficiência
da movimentação dentária, ambas compatíveis com essas condições
metabólicas, foram comprovadas histologicamente pelo aumento
significativo nos espaços intertrabeculares do osso alveolar27.
Enquanto alguns pesquisadores focaram-se nos efeitos de desequilíbrios hormonais no metabolismo ósseo e sua influência na
movimentação ortodôntica, outros vêm direcionando seus esforços na compreensão das conseqüências que a administração de
determinadas substâncias químicas gerariam nesses fenômenos
biológicos. Ashcraft et al.3 relataram movimento dentário 3 ou 4
vezes mais rápido em coelhos submetidos à condição de osteoporose induzida pela aplicação de corticóides. Os autores demonstraram diminuição significativa na densidade óssea desses animais,
o que foi considerado como o fator decisivo para a aceleração do
movimento ortodôntico, uma vez que a força aplicada foi mantida
constante durante todo o experimento.
O uso de prostaglandinas (PG) também tem se mostrado um
método eficiente para estimular o aumento da neoformação óssea em modelos animais. Shih e Norrdin25,26 comprovaram que a
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administração de PGE2 por via oral e de PGE1 localmente, induziu
o aumento significativo da formação de novos osteóides em áreas de fratura, em beagles. Hashimoto et al.15 demonstraram que
a administração local de osteocalcina elevou significativamente a
atividade osteoclástica nas áreas de pressão, resultando em maior
absorção óssea, diminuição da densidade trabecular e, conseqüentemente, em movimentação ortodôntica maior e mais rápida no
grupo experimental.
Parece claro na literatura que quando ocorre diminuição da
densidade do osso alveolar trabecular, a resistência ao movimento
ortodôntico também é reduzida, o que permitiria maior eficiência
dessa movimentação. Infelizmente, ainda não é possível obter tais
resultados em humanos de forma localizada e reversível, seja por
alterações hormonais, seja pela via medicamentosa. Estando essas
possibilidades descartadas até então, existiriam outras formas de
se tornar a movimentação dentária mais eficiente?
Movimento ortodôntico em áreas de
neoformação óssea
O conhecimento sobre a fisiologia do tecido ósseo e de suas características de neoformação e remodelação é imprescindível para
a compreensão adequada dos mecanismos biológicos envolvidos
na movimentação dentária. Sabe-se que o início da neoformação
óssea ocorre com a deposição de osso imaturo, desorganizado e
pouco denso, que é progressivamente substituído por um tipo de
tecido ósseo mais organizado e mineralizado (lamelar)10. A neoformação óssea resultante da distração osteogênica (DO) exemplifica
bem esse processo.
A distração osteogênica possibilita a criação de áreas de formação de osso novo a partir do seccionamento e do contínuo
afastamento de duas extremidades de tecido ósseo vascularizado
pré-existente8. O que aconteceria se um dente fosse movimentado através do osso recém criado pela DO? Segundo Liou et al.21, o
movimento ortodôntico através do osso jovem e imaturo, criado
pela DO, acontece de forma mais rápida e sem efeitos adversos.
Os resultados apresentados mostraram movimentação dentária
quatro vezes maior do que aquela observada em tecidos ósseos
maduros. Resultados semelhantes foram apresentados em outros
trabalhos6,19,20, que justificaram tais achados pela menor resistência
ao movimento dentário, proporcionada pela concentração mineral
reduzida, presente no osso imaturo.
Outra situação clínica, a princípio não diretamente relacionada
à Ortodontia, onde também se observam áreas de neoformação óssea, associadas à diminuição temporária da densidade do osso trabecular, é o processo de cicatrização óssea. Ao explicar o reparo de
fraturas ósseas, o médico ortopedista Harold Frost9 relatou que, ao
longo desse processo, ocorre atividade biológica indispensável para
a restauração da condição tecidual normal: o fenômeno acelera-
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tório regional (Regional Acceleratory Phenomenon - RAP). O RAP
não resulta em novas etapas do processo cicatricial, mas sim no incremento da rapidez com que as fases da cicatrização acontecem.
Durante a cicatrização, a remodelação normalmente encontrada
nos tecidos ósseos precisa ser acelerada para que o osso lesionado
seja reparado no mais curto espaço de tempo possível10,11.
O fenômeno aceleratório regional se inicia poucos dias após o
trauma, resultando em grande aumento da atividade das células
envolvidas com a remodelação óssea. Inicialmente, essa condição
catabólica se manifesta como desmineralização, levando à diminuição temporária e localizada da densidade óssea. Posteriormente, esse fenômeno é caracterizado pelo momento de intensa remineralização, produzindo tecido ósseo jovem (Woven bone), que em
seqüência é substituído por osso maduro e mais compacto10.
A diminuição da densidade do osso trabecular após fraturas
é observada em exames radiográficos, não ocorrendo apenas na
área lesada, mas também no osso adjacente. A neoformação óssea
requer grandes quantidades de minerais disponíveis na circulação
sanguínea para deposição da nova matriz óssea. Mesmo que a absorção de cálcio pelo intestino aumente, a demanda para o reparo
adequado é tão grande que o organismo precisaria mobilizar esse
mineral a partir de outras fontes1. Por isso, inicialmente, aumentase a atividade osteoclástica em outras partes ósseas a fim de redistribuir o cálcio para as regiões em maior necessidade, como as
áreas a serem reparadas. Ao final desse processo, a fratura, ou mesmo a agressão, como a osteotomia, por exemplo, é completamente
reparada. As propriedades físicas, bem como as características histológicas e radiográficas do osso alveolar são então recuperadas9.
A pergunta que ainda não foi respondida é: os cortes realizados
durante as corticotomias, ou seja, limitados à cortical óssea, causariam esses efeitos biológicos no osso trabecular adjacente? Caso a
resposta seja positiva, aí estaria a evidência científica que explicaria a razão pela qual a movimentação ortodôntica é mais eficiente
quando iniciada após a realização de corticotomias alveolares.
CONCLUSÃO
A análise crítica da literatura atual sobre a movimentação ortodôntica após a realização de corticotomias seletivas do osso alveolar mostrou que essa abordagem terapêutica teria basicamente
duas indicações: (1) aumentar a eficiência da movimentação ortodôntica em situações clínicas complexas e (2) diminuir a duração
do tratamento ortodôntico.
Os resultados apresentados nos relatos de caso sobre esse tema
mostram que a realização de corticotomias em determinadas áreas do osso alveolar pode auxiliar a movimentação ortodôntica em
más oclusões bem selecionadas e de complexidade moderada. Entretanto, o ortodontista cuidadoso não pode deixar de analisar tal
informação de forma crítica, pois o número de publicações sobre
a movimentação ortodôntica pós corticotomias alveolares é relativamente baixo e as pesquisas em animais, escassas, sendo ambos
insuficientes para conclusões definitivas. Há a necessidade de se
colher melhores dados em estudos laboratoriais e de aumentar a
casuística em humanos. O estudo minucioso dessas informações,
avaliando o custo-benefício biológico real dessa abordagem terapêutica, antes de se considerar a aplicação rotineira dos conceitos
aqui apresentados, é indispensável.
Selective alveolar corticotomy to assist orthodontic tooth
movement
Abstract
Orthodontic tooth movement is possible due to the
great remodeling potential of the bone tissues. Different animal studies have shown that orthodontic
tooth movement can be potentiated under conditions
of increased alveolar bone turnover caused by either
pharmacological modulation or hormonal alterations.
However, the results of these experiments have never
reached a routine application in the orthodontic prac-
tice. Performing selective alveolar bone corticotomies
may be a viable alternative to increase the biological
response to the mechanical stimuli caused by conventional orthodontic appliances. Therefore, the authors
of this article reviewed the possible clinical applications of corticotomy assisted orthodontics and reported on the biological concepts which could justify such
approach in selected cases.
Keywords: Alveolar corticotomy. Orthodontic movement. Accelerated tooth movement.
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Corticotomias seletivas no osso alveolar para auxiliar a movimentação ortodôntica
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Endereço para correspondência
Dauro Douglas Oliveira
Av. Cristóvão Colombo, 550/404, Savassi
CEP: 30.150-140 - Belo Horizonte / MG
E-mail: [email protected]
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