MEDICINA E ASTROLOGIA MEDICINA E ASTROLOGIA ASTROLOGIA - INFLUÊNCIA DOS ASTROS NO CORPO SÉCULO XVI Prof.Dr. HC João Bosco Botelho O encantamento da astrologia, como prática divinatória, consolidou-se nos primeiros núcleos urbanos, pelo menos há cinco mil anos. Poucos resistiam à sedução do astrólogo anunciando a saúde ou a doença futuras. Não há como separar as práticas de adivinhação da astrologia das muito antigas crenças e idéias religiosas. Os vestígios dessa intrincada dependência podem ser rastreados em alguns registros em escrita cuneiforme. O sinal gráfico correspondente ao divino, elemento incomensurável e todo poderoso do passado e do futuro, é o mesmo que designa a palavra estrela. Os deuses babilônicos, Schamasch, Sin e Ischtar, eram os guardiões do céu sob a forma do Sol, da Lua e do planeta Vênus, os três astros mais destacados do firmamento. A força da astrologia, na modernidade, não deveria causar tanta admiração. A fé no poder dos astros, determinando o destino do mundo, é tão velha quanto as primeiras aglomerações urbanas. Muitas palavras atuais estão repletas de significado astrológico. O prefixo latino menstruus, que originou menstruação, está ligado ao processo repetitivo de vinte e oito dias do mês lunar. Para estarem mais próximos dos astros – representação física dos deuses – os homens instalaram os tempos nas montanhas mais altas: os chineses, no Himalaia; os japoneses, na Fuji; os gregos, no Olimpo e os hebreus, no Sinai. Onde não existia montanha, os povos construíram montes artificiais. Os mais antigos exemplos, os zigurates, na Mesopotâmia, com o topo dedicado à morada e culto dos deuses. Apesar das adaptações sofridas, a astrologia divinatória conservou a primitiva estrutura de sedução. Utiliza a adivinhação dedutiva, a partir da interpretação do movimento astral. Sob esse enfoque, pode ser considerada uma história de longa duração e uma herança física das divindades. Todo saber acumulado dos ciclos da Lua, dos planetas e das estrelas foi repassado às gerações. O elo com um poder transcendente comum foi metamorfoseado e recebeu, da linguagem superficial, nomes diferentes. No Império de Augusto, em Roma, foi adotada a semana planetária de sete dias. De acordo com a crença no poder dos astros, cada dia era dedicado a um planeta, ao Sol e à Lua. Com a gradativa cristianização, os primeiros padres iniciaram uma forte resistência contra o culto do Sol, identificado com o deus egípcio Mitra. O intento era desfazer a possível associação alegórica entre a adoração pelo grande astro com Jesus Cristo. A preocupação está muito clara no Evangelho de São Paulo, repreendendo, com o rigor da disciplina, os Gálatas (Gl 4,8-10), que continuavam adorando as mesmas divindades do politeísmo, para identificar os dias e os meses. Os médicos medievais ao utilizarem a concepção neoplatônica de similitude entre o macrocosmo e o microcosmo conduziram ao extremo seus prognósticos astrológicos, criando situações bizarras. A saúde, a doença, o sexo e a procriação estavam sob a decisiva influência dos astros. Existia, por exemplo, contra-indicação absoluta para realizar uma cirurgia na perna, se a Lua estivesse no signo zodiacal do paciente. As complicações advindas seriam conseqüência da umidade do planeta sobre a ferida operatória. O mestre João, mistura de astrólogo e médico, vindo na esquadra de Cabral, ao desembarcar no litoral brasileiro, não se interessou pelos nativos. Na sua carta ao monarca português, descreveu a constelação, em forma de cruz, visível no hemisfério sul, origem do nome da nova terra. O Renascimento chegou e reafirmou o prestígio da astrologia. Reis e papas só seriam coroados, se a data fosse de presságio auspicioso. A expressão artística renascentista ressaltou a alegoria dos corpos celestes. As ricas residências, capelas, igrejas, abadias ficaram repletas de afrescos, ampliando a glória do poder astral. Os doze apóstolos e os deuses do Olimpo grego eram louvados nas mensagens poéticas dos pintores e escultores e correspondentes aos doze signos do zodíaco. Em pleno século XVII, a certeza coletiva de que os planetas determinavam o rumo da vida era de tamanha solidez que a estatística de mortalidade da cidade de Londres, no ano de 1632, registrou treze mortes por planet ou pela influência do planeta. O céu continua causando fascínio e admiração. É possível vê-lo, todas as noites, pleno de luzes, de grandeza incomensurável, impossível de ser compreendido e tocado. Poucas coisas enchem mais de medo do que o futuro. A Medicina astrológica, como no passado, continua sendo utilizada pelos adivinhos, atuando como curadores, para diminuir a insegurança em relação ao futuro desconhecido e à morte temida.