ASPECTOS MORFOSSINTÁTICOS DAS PREPOSIÇÕES

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ASPECTOS MORFOSSINTÁTICOS DAS PREPOSIÇÕES PORTUGUESAS À
LUZ DO FUNCIONALISMO
Daniele Felizola de Oliveira*
RESUMO: Este trabalho objetiva apresentar um breve estudo a respeito do surgimento
das preposições, com destaque às preposições portuguesas originadas na própria língua
portuguesa. Explicaremos o uso do particípio presente que no latim pertencia à
categoria gramatical dos verbos e que na língua portuguesa apresentam-se na categoria
das preposições, por meio dos processos de gramaticalização.
PALAVRAS-CHAVE:
preposições,
gramaticalização,
particípio
presente,
funcionalismo
ABSTRACT: This work aims to presents a short study about to the rising of the
prepositions, focusing its attention to the Portuguese prepositions which arose in
Portuguese language, we will explain the use of present participle which had another
classification in Latin, and which are classified as prepositions in Portuguese due to the
gramaticalization process they had suffered.
KEYWORDS: prepositions, gramaticalization, present participle, funcionalism
INTRODUÇÃO
Este trabalho é parte da minha dissertação de mestrado que tem o objetivo de
investigar e descrever o estudo das preposições portuguesas e seus sentidos sob a
perspectiva historiográfica. É uma pesquisa historiográfico-descritiva das preposições
*
Mestranda em Língua Portuguesa pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
portuguesas, cujo foco está nos estudos das preposições portuguesas originadas do latim
com bases nas gramáticas históricas e nos textos teóricos dos séculos XIX, pautado na
compreensão dos conceitos linguísticos da época a fim de melhor entendermos as
classificações e definições dadas às palavras como pertencentes à categoria das
preposições, visando destacar os diversos matizes semânticos dessas palavras no texto.
Nesse artigo a atenção volta-se para o estudo das preposições sob a perspectiva
funcionalista com o propósito de explicarmos o maior número de preposições no
português e o aparecimento de novas palavras funcionando sob tal rótulo, em
gramáticas do português, que no latim pertenciam a outra categoria gramatical. Dessa
forma, antes, tecemos um breve panorama acerca do surgimento das preposições no
português.
ORIGEM DAS PREPOSIÇÕES PORTUGUESAS
Inicialmente as preposições começaram a ser empregadas no latim para
subordinar o complemento ao verbo, posteriormente sendo mais usadas em decorrência
da redução dos casos latinos, que foi ocasionada pela indistinção dos casos pelas
flexões, com o objetivo de dar clareza a alguns valores semânticos empregados no
discurso.
“Vieram-nos as preposições parte do idioma latino que conhecemos através da
literatura, parte do românico; outras foram tiradas de advérbios portuguêses
acrescentando-lhes a palavra de: depois de, diante de, em cima de, etc.” (SAID ALI,
1971: 203)
No latim as funções sintáticas eram marcadas pelas desinências casuais, porém,
com as modificações fonéticas e morfológicas ocorridas na língua, elas se tornaram
imprecisas, fazendo com que fosse necessário o uso de preposições para melhor
expressão do que se estava dizendo. O falante necessitava de novos recursos para dar
mais clareza às informações que ele queria exprimir, visto que, com tais modificações,
ele encontrava dificuldades em expressar determinadas circunstâncias: origem,
instrumento etc., as quais antes eram expressas pelas flexões casuais. Dessa forma,
surgiu no latim vulgar um número maior de preposições, configurando-se como
elemento necessário para estabelecer determinados conteúdos semânticos, que foram
esvaziados dos casos.
Assim o desenvolvimento do uso da preposição foi paralelo à redução da declinação. Esse
desenvolvimento teve seu início em relações concretas (de lugar, de tempo, de instrumento,
de causa, de origem etc.) e os casos que as expressavam se enfraqueceram, chegando a
desaparecer (POGGIO, 2002: 93).
PREPOSIÇÕES NO LATIM CLÁSSICO
No latim clássico o emprego das preposições ocorria, em uso moderado; havia um
uso secundário das preposições. Dentre as preposições portuguesas, as que
originalmente já funcionavam sintaticamente como preposições no latim, como nos
assegura Cândido Jucá (1945: 251), são: a, ante, até, com, contra, de, dês, em, entre,
para, per, por, pós, sem, sob, sobre e trás, as quais, veremos abaixo, em suas formas
primitivas, classificadas por Said Ali (1971: 203)
Said Ali dividiu as preposições em dois grupos, em conformidade ao modo como
elas foram aproveitadas na língua portuguesa, classificando-as da seguinte maneira:
1)
Preposições que passaram para o português sem alterar sua forma: ante,
contra, de, per.
2)
Preposições que passaram para o português com suas formas modificadas:
ad>a, post>pós; cum>com; inter>antre, entre; sine>sem; trans>trás; pro>por;
secundum>segundo; in>em, em; sub>sob, so; super>sôbre; e tenus, que o autor
não precisou sua origem, apresentando-nos duas possibilidades: ataa, até ,té >
tenus e a de que tenus viria da partícula árabe hatta.
Em adição às preposições acima destacadas, tínhamos no sistema português do
período arcaico a preposição atá, de origem árabe e per que se modificava em par:
pardês, pardelhas, assim afirmado por Coutinho. (1973: 269)
Adiante veremos que outras preposições apareceram no português em decorrência
do processo de gramaticalização, como por exemplo: durante, mediante, tirante,
advindas do particípio presente.
PRESENÇA NO LATIM VULGAR (CORRENTE)
Latim vulgar, latim corrente ou familiar são denominações da modalidade falada
não-culta da língua, à qual os romanos convencionaram chamar de sermo vulgaris, e da
qual o português originou-se. Contido por muito tempo em suas expansões por
influência da ação dos gramáticos e da literatura, o latim vulgar se expande livremente
após a queda do Império Romano, momento em que ocorre o fechamento de escolas e o
desaparecimento da aristocracia, espaços e pessoas que cultivavam as boas letras.
No latim vulgar existiam os casos: o nominativo, o vocativo, o dativo, o ablativo,
o genitivo e o acusativo, que serão vistos a seguir, ficaram reduzidos a poucas formas.
Coutinho (1973: 33) trata das mudanças ocorridas no latim vulgar que
influenciaram o uso das preposições. São elas:
1) Redução das cinco declinações do latim clássico a três, proveniente da
confusão da quinta com a primeira e da quarta com a segunda.
2) Redução dos casos, tendo-se igualado, em todas as declinações, o vocativo com
o nominativo; o genitivo, o dativo e o ablativo, já desnecessários pelo uso mais
frequente das preposições com o acusativo. Ex.: cum filios (cum filiis), ex litteras (ex
litteris).
A redução das declinações fez com que certos casos ficassem indistintos, nas
palavras de Poggio (2002: 83), criaram-se “morfemas homófonos”, o que dificultou a
clareza das informações.
No latim vulgar, como assinala Coutinho (1973: 268), as preposições
apresentavam-se de duas formas: as compostas – combinação de duas ou mais
preposições – que eram frequentes, e as simples, constituídas por um só vocábulo. Já no
português, teremos também um grande número de locuções prepositivas, que são
combinações de substantivos ou advérbios + preposições e, apesar do grande número
das preposições portuguesas, a maior parte, ter vindo do latim, o número de preposições
no português é maior, porque palavras como adjetivos, particípios passados e particípios
presentes passaram a ser empregadas como preposições.
No português temos as seguintes preposições portuguesas destacadas por Sousa da
Silveira (1983: 135), em Lições do português, com suas respectivas origens
etimológicas:
A ETIMOLOGIA
13. Etimologia das diversas espécies de palavras:
VIII
224. PREPOSIÇÕES
a < ad.
ante < ante.
após < ad + post.
até < ? Às vezes reduzidas a te (v.492).
com < cum.
contra < contra.
de < de.
dês < de + ex.
desde < de + ex + de.
em < in.
entre < inter. Formas arcaicas: antre e ontre
pera, arc.
} < per + ad.
para
per < per.
perante< per + ante
por < per
por < pro, convertido em * por, talvez por influência de per(1).
sem < sine (i breve = e)
sob, so arc. < sub (u breve = ô)
sobre < super (u breve = ô)
trás < trans.
___________________
(1) Grandgent, Introducción al Latín Vulgar, Madrid, 1928, 31.
PROCESSOS DE GRAMATICALIZAÇÃO
Neste momento observar-se-ão as preposições sob a perspectiva da gramática
funcional, dos processos de gramaticalização pelos quais esses itens se modificaram,
definidos aqui como mecanismos de extensão de sentidos utilizados na língua com o
objetivo de conceituar circunstâncias, relações não passíveis de serem expressas pelos
recursos até o momento existentes, dessa forma reformulando-os. Também
explicaremos o uso de determinadas palavras que no latim pertenciam a outras
categorias gramaticais e que na língua portuguesa apresentam-se na classe gramatical
das preposições. Tal concepção de estudo da linguagem considera a interdependência
entre langue e parole. Trata-se do estudo da língua sob a perspectiva do uso (MOURA
NEVES, 2001: 115).
Para entendermos como se processam os mecanismos pelos quais algumas
preposições foram gramaticalizadas, recorremos ao estudo que Poggio (2008) elaborou,
com base na comparação entre os dois primeiros livros de Diálogos de São Gregório e a
sua tradução mais antiga em português arcaico do século XIV, no qual ela observa, no
percurso das preposições do latim ao português, as alterações gramaticais e semânticas
que as preposições sofreram quando gramaticalizadas.
Na versão latina dos Diálogos de São Gregório, Poggio notou que, do ponto de
vista semântico, algumas preposições foram intensamente gramaticalizadas, ao passo
que, outras eram bastante transparentes. Dentre as intensamente gramaticalizadas, a
autora destacou ad, in e de, que não possibilitavam uma clareza de sentido na análise,
enquanto que, ante, cum, contra excepto, inter, per, pro, secundum, sine, sub, super
eram evidentes na expressão do sentido, por isso transparentes.
Nos dados documentados no corpus analisado pela autora, ela verificou que há um
entrecruzamento do sistema preposicional, em que várias preposições podem expressar
a mesma relação, mesmo com cada uma dessas preposições possuindo um sentido
fundamental e sendo distintas entre si, o que poderíamos dizer, foi ocasionado pelo
apagamento semântico de algumas preposições como exposto acima, denunciando,
dessa forma, que foram gramaticalizadas.
Segundo os dados de Poggio (op. cit.) as preposições foram gramaticalizadas, em
sua maioria, na passagem do latim ao português, por extensão metafórica, e alguns
casos por extensão metonímica, processo o qual as preposições expandem sua função
básica de relacionar vocábulos para relacionar sentenças.
Ao traçar a história das preposições, Poggio (op.cit.) destacou as seguintes
modificações, observadas na passagem do latim ao português:
1- Preposições cujas formas desapareceram e tiveram seus conceitos expressos
por outras preposições ou locuções prepositivas: apud, propter, coram e usque
2- Preposições cujas formas desapareceram na passagem para o português, mas
estão presentes na língua portuguesa na forma de prefixos e que têm hoje seus conceitos
expressos por outras preposições ou locuções prepositivas. São elas: a/ab, e/ex, extra,
intra, juxta, e ultra, dentre as quais a/ab, e/ex e extra já eram usadas no latim clássico
como prefixos.
3- Preposições cujas formas sofreram modificações na sua passagem para o
português.
4- Preposições que foram originadas da junção de duas preposições.
O processo de gramaticalização das preposições torna-se evidente diante da
valoração dos sentidos efetivamente possíveis nos diversos contextos de uso, na medida
em que esses diversos valores contribuem para a construção de um referente no
discurso, assim também pelo seu caráter transpositor de atribuir função sintática ao
termo a ela subsequente, ao estabelecer relações entre termos, sejam eles vocábulos ou
orações. Visualizamos nessas preposições um processo de recategorização por
inferências pragmáticas de sentido que se desenvolveram diacronicamente, ou seja, na
evolução da língua (a diacronia). Notamos, então, que a gramaticalização é motivada
pelo léxico, pela sintaxe e pela pragmática, produzindo novos sentidos, assim
modificando seus referentes.
Nas estruturas linguísticas, as preposições podem ser índices sintáticos de
adjuntos adverbiais, adjuntos adnominais, complementos nominais, objetos indiretos e
de objetos diretos preposicionados, assim, recategorizando sintaticamente os termos que
a elas sucedem. Dessa forma, as preposições, em combinação com os verbos e nomes,
complementam também os sentidos de seus antecedentes, tendo nessa relação, elas
mesmas seus sentidos originários estendidos, modificados, recategorizados.
Diante da perspectiva de língua como prática social, na gramática funcional a
língua em uso tem seu “ponto de partida nos propósitos do falante, que constrói seus
enunciados conferindo relevância aos argumentos segundo o que seja conveniente a
esses propósitos”, (NEVES, 2006: 80) nos quais a produção de sentidos está
diretamente vinculada à intenção do falante ao se expressar, que serve de motivação
para o processo de gramaticalização.
Estudarmos as preposições sob a perspectiva da gramaticalização é situarmos esse
estudo numa visão de língua contemporânea, no qual tanto os fatores intralinguísticos,
quantos os extralinguísticos são relevantes para uma análise dos sentidos, e reconhecer
que tal teoria se sustenta no conceito de estudo pancrônico da língua, no qual
verificamos as diversificações mórficas e semânticas da língua no devir do tempo.
Nas preposições que surgem no português, o que se nota são palavras funcionais
originadas de palavras de conteúdo lexical, o que se poderia considerar instâncias
prototípicas da gramaticalização. (MOURA NEVES, 2001: 120) Como exemplos
Moura Neves cita as preposições durante e mediante e as locuções prepositivas apesar
de, a par de, a fim de, a despeito de.
Neste momento trataremos, então, das preposições que foram originadas no
português, dedicando atenção às oriundas do particípio presente latino.
O particípio presente é uma forma híbrida, pois pertencia ao sistema verbal latino
como forma verbo-nominal (OLIVEIRA, 2004: 59), e devido a essas suas
características ora de nome, ora de verbo são formas propícias à gramaticalização. Sua
forma híbrida favorece mudanças tais como sua recategorização em nomes (adjetivos e
substantivos), e em preposição, e sua substituição pelo gerúndio. Dada a essa variação
Oliveira (op. cit.) está de acordo com Cândido Jucá Filho quando este afirma que a
classificação dos vocábulos deve se dar dentro do contexto, na oração, em que se pode
avaliar as relações entre os vocábulos.
No percurso do latim às línguas romanas, especialmente no português, Oliveira
(op. cit.) destacou os vários processos de recategorização pelo qual o particípio presente
passou, e aqui destacaremos o que é de nosso interesse: a recategorização do particípio
presente em preposição. Nessa transição ocorre o processo de mudança no qual o
particípio presente se atualiza na língua portuguesa como preposição seguindo o
princípio da unidirecionalidade, em que um elemento de uma categoria maior modificase e passa a integrar uma categoria menor. Como exemplos de preposições advindas do
particípio presente temos: durante, mediante, salvante, tirante.
As preposições portuguesas que surgem dos particípios latinos são classificadas
nas gramáticas tradicionais como preposições acidentais, o que significa dizer que
foram originadas a partir de vocábulos de outras classes gramaticais.
Em Oliveira (2004: 159) a preposição é descrita como “uma categoria prototípica,
cuja propriedade cuida de organizar, no discurso, os elementos de conteúdo lexical,
relacionando palavras, orações e partes do texto, marcando estratégias interativas,
expressando noções como tempo, aspecto, modo, entre outras”.
As preposições oriundas do particípio presente ao sofrer gramaticalização
neutralizam o marcador morfológico –nte, que indicava o tempo verbal, e assumem
características próprias de sua nova categoria, funcionando como elementos de relação,
sem que o sufixo -nte tenha qualquer interferência sintática e semântica no texto. Neste
caso o que ocorre é o processo de perda da função e produtividade do morfema -nte.
Assim, temos que “durante, tirante, salvante, e exceto são formas nominais de verbos,
imobilizadas entre as preposições, e como tais são empregadas.” (PEREIRA,1940: 367)
PAPEL SINTÁTICO DAS PREPOSIÇÕES
Segundo Faria (1944: 228) as preposições são antigos advérbios usados junto de
alguns nomes, para tornarem mais precisas as relações indicadas pelos próprios casos,
cujo uso não era obrigatório, utilizados para dar ênfases às relações já expressas pelos
casos. Do enfraquecimento do valor significativo dos casos, devido a sua redução, o uso
destes advérbios se torna mais frequente, o que determina o aparecimento de uma nova
classe gramatical: a das preposições. Diante dessa mudança o autor conclui que não
eram as preposições que regiam os casos, mas, ao contrário, eram os casos que
passavam a exigi-las pela necessidade de clareza da expressão.
No latim, as partículas adverbiais, após se anteporem obrigatoriamente aos verbos
como “preverbos”, aglutinaram-se aos verbos, ou associaram-se intimamente ao
complemento cuja relação com o verbo era recorrente. É essa junção da partícula
adverbial ao complemento que deu origem à categoria e ao mecanismo da preposição,
estabelecendo um sistema de redundância em que as preposições e as desinências do
caso acusativo ou ablativo eram empregadas para definir a relação estabelecida entre o
complemento e o seu verbo. Essa estrutura pleonástica é típica do latim clássico,
modificando-se no português, e em outras línguas românicas ao acabarem com essa
duplicidade eliminando a desinência de caso. (CÂMARA JR., 1979: 116).
Então, a partir do desaparecimento do sistema casual, as preposições passam a ter
função obrigatória de estabelecer relações entre os nomes, e os verbos e os seus
complementos, já que determinados conceitos só podiam ser expressos na língua com o
uso da preposição. Nesse momento surge na língua uma estrutura sintática de maior
rigidez, nas quais a posição dos termos relacionados passa ser fixa, contrariamente ao
que pré-existia no emprego dos casos latinos, principalmente no latim clássico, em que
o emprego de um nome em determinado caso era o suficiente para definir o que se
pretendia expressar em um enunciado, independentemente da ordem que aparecesse na
frase.
Segundo Mattoso Câmara Jr. (1979: 175), no latim, os complementos verbais
(nomes) vinham no caso acusativo ou ablativo, acompanhados pela partícula adverbial
que lhes antepunha, indicando sua subordinação ao verbo, entretanto, as preposições já
apareciam antepostas a esses nomes para melhor definir suas condições de dependência.
Com a queda da flexão causal, a marca da subordinação recai exclusivamente sobre as
preposições.
Um traço característico das línguas românicas é a utilização das preposições para
relacionar nomes. Com a perda do sistema de casos latino o uso das preposições ganha
relevância como mecanismo sintático. No português as preposições são as responsáveis
pela subordinação dos termos na frase, estabelecendo tanto a regência nominal,
relacionando um substantivo a outro, quanto a regência verbal, subordinando o
complemento ao verbo. “Na regência verbal, as preposições essenciais – a, para, em,
de, por, com – associam-se a determinados verbos para a eles subordinarem seus
complementos básicos que necessariamente os acompanham” (CÂMARA JR., 1979:
245).
Ressalta-nos a atenção nos estudos de Mattoso Câmara Jr. o fato como descreve a
relação de subordinação entre o verbo e seu complemento, que contrariamente ao que
estamos a muito acostumados a ouvir é que o verbo exige o uso de determinada
preposição, em que o estudioso nos aponta que “o que há, na realidade, é o
aparecimento sistemático de dado tipo de complemento com dado verbo, e, por sua vez,
o tipo de complemento condiciona a escolha da preposição” (CÂMARA JR., 1979:
245).
No referente às preposições descendentes do particípio, sua função sintática,
segundo Oliveira (2004: 160), é de estabelecer relação semântico-adverbial,
funcionando diferentemente das preposições essenciais fora do sistema de
transitividade, o que significa dizer que não introduzem complemento, no entanto
encabeçam as orações adverbiais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Finalizando, concluímos que o que condiciona o emprego de palavras de outras
categorias a funcionarem na língua portuguesa como preposição é esse novo padrão
sintático estabelecido na língua em virtude da perda dos casos, e consequentemente, as
preposições passam cada vez mais a agregarem mais funções anteriormente expressas
pelos casos. Ocorre o enfraquecimento funcional das preposições e o empobrecimento
na quantidade dessas partículas, a partir de então, surge a necessidade de novos itens
serem empregados na função das preposições, daí iniciam os processos de
gramaticalização, em que termos de outras categorias gramaticais passam a pertencer ao
quadro das preposições. (CÂMARA JR, 1979: 177).
Dessa forma, durante, mediante, salvante, tirante são antigos particípios do
presente de suas respectivas formas verbais latinas, que se gramaticalizaram no
português como preposições.
Recebido em setembro de 2009
Aprovado em outubro de 2009
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Libri
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Disponível
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