Evoluo Vegetal

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BIO-865
Origem e Irradiação
das Angiospermas
Alessandro Rapini
Universidade Estadual de Feira de Santana
1
Da Origem das Plantas à
Conquista do Ambiente Terrestre
ReinoVegetal
Os moldes atuais da taxonomia foram
criados por Lineu, em 1753. Nessa primeira
classificação, ele havia reconhecido apenas
animais e plantas. Em meados do séc. XIX, no
entanto, estava claro que protistas e fungos não se
adequavam bem a essa dicotomia. Logo foi criado
o termo protista para incluir aqueles organismos
que não eram plantas nem animais, e essa divisão
passou a fazer parte da árvore da vida de Haeckel.
Na metade do século vinte, já havia uma
classificação com quatro reinos: Monera incluindo
organismos procariotos (bactérias), Protista
incluindo micróbios eucariotos, fungos e algas
(exceto as clorófitas, incluídas no reino vegetal),
animais e plantas. Desse esquema derivou a
classificação de cinco reinos, um reino exclusivo
para fungos, proposto por Margulis na década de
70 (antecipado por Whittaker nos anos 60s).
O monofilestismo das plantas, animais e
fungos tem sido sustentado em estudos
filogenéticos com dados moleculares. O reino
Monera tem sido divido em dois grupos, as
verdadeiras bactérias, incluindo as cianobactérias,
e as arqueobactérias (Archea), mais relacionadas
com os eucariotos. Curiosamente, nesses dois
grupos, as linhagens mais antigas são termofílicas,
habitando locais acima de 55oC, sugerindo que a
vida tenha surgido em ambientes extremamente
quentes. Os protistas incluem mais de 100.000
espécies
de
organismos
unicelulares
heterotróficos, algas autótrofas e alguns
plasmódios, formando um grado de difícil
resolução devido a eventos de endossimbioses e
transferências horizontais. Chegamos assim a um
esquema onde são reconhecidos três domínios:
Bacteria, Archaea e Eukarya (Woese et al. 1990).
Os eucariotos são definidos pela presença
de um núcleo limitado por uma membrana, onde
se localizam os cromossomos. A maioria dos
eucariotos são quimeras resultantes de
endossimbioses. Os plastídeos e outras organelas
são derivações de organismos fagocitados pelo
ancestral dos eucariotos. Os peroxissomo foram as
primeiras organelas, protegendo o hospedeiro dos
malefícios do oxigênio. A fagocitose de uma
proteobactéria teria dado origem a mitocondria e,
posteriormente, a de uma cianobactéria ao
cloroplasto. Eventos de endossimbiose ocorreram
diversas vezes na evolução dos eucariotos,
eventualmente seguidos de endossimbioses
secundárias e mesmo terciárias (Keeling 2004).
Essa relação intrínseca com organismos de eu e
archaebactérias acompanhada de inúmeros
eventos de transferência horizontal entre eles
tornou o genoma dos eucariotos uma mistura de
genes dos três domínios (Martin & Embley 2004).
Árvore não enraizada mostrando os três domínios: Eubacteria,
Archaebacteria e Eukaryota (acima). Transferência lateral de
genes entre os biomas (abaixo, à direita) teria dado origem ao
anel da vida (abaixo, à esquerda) (Martin & Embley 2004).
Propriedades estruturais e bioquímicas
indicam que as algas verdes são mais relacionadas
com as embriófitas do que com qualquer outro
grupo de eucariotos. Todas as plantas verdes
(Chlorobiota) possuem um conjunto de
características que permitem distingui-las dos
demais grupos. A presença de pigmentos de
clorofila a e b, reservas de amido no cloroplasto e
a uma estrutura estelar que liga os nove pares de
microtúbulos nas células flageladas são únicos
entre os eucariotos. O cloroplasto deriva
certamente da endossimbiose de um procarioto
fotossintetizante (cianobactéria) cuja maior parte
das funções passou a ser exercida pelo núcleo da
célula hospedeira, possivelmente alguma célula
amebóide.
As algas verdes são incluídas ou não no
reino vegetal conforme a classificação adotada;
quando não incluídas (e.g. classificação de
Margulis), as plantas são sinônimos de
embriófitas ou plantas terrestres. Por uma questão
prática essa é a delimitação adotada aqui.
Discussões sobre a evolução das algas ficam,
portanto, restritas ao seu relacionamento com as
2
embriófitas e assim com a origem das plantas
terrestres.
Em 1868, Haeckel propôs um esquema
filogenético explícito representando as relações
entre os grupos pré-darwinianos. Ele se baseou na
semelhança morfológica como evidência de
ancestralidade comum. De maneira geral, ele
considerou as plantas terrestres, as vasculares, as
espermatófitas e as angiospermas monofiléticas,
mas as briófitas, as pteridófitas, as gimnospermas
seriam grupos parafiléticos. Para ele a
diversificação das plantas terrestres teria ocorrido
no Devoniano, as espematófitas no Carbonífero e
as angiospermas no Triássico.
São
possíveis
sinapomorfias
das
embriófitas o ciclo de vida diplobionte, com
alternância
de
gerações,
uma
haplóide
(gametófito) e outra diplóide (esporófito), o
esporófito multiceular, os esporos resistentes ao
dessecamento (parede composta de esporolina), a
cutícula e a presença de órgãos sexuais
(gametângios) masculinos e femininos no
gametófito
(anterídios
e
arquegônios,
respectivamente). O ciclo de vida consiste de uma
fase gametofítica, gerada assexuadamente a partir
de um esporo, e uma esporofítica originada a
partir da fusão de gametas (singamia ou
fertilização). A distinção mais evidente das
embriófitas é a formação do embrião. Nelas,
existe a retenção do gameta feminino (oosfera), e
o desenvolvimento inicial do esporófito a partir do
zigoto (embriogênese) ocorre no gametófito.
Tradicionalmente, são reconhecidos dois grandes
grupos de embriófitas: as briófitas e as
traqueófitas.
Origem das Embriófitas
Os primeiros sinais de vida na Terra são
evidências indiretas em minérios de ferro datadas
de 3,85 bilhões de anos (b.a). As primeiras
evidências diretas são estromatólitos e filamentos
microbianos
encontrados
na
Austrália,
possivelmente pertencentes às cianobactérias,
datando de 3,5 b.a. Apesar de alguns
pesquisadores
(e.g.
Moortbath
2005)
considerarem a possibilidade dessas marcas serem
artefatos e os registros confiáveis mais antigos
serem os de bactéria, a partir de 1,9 b.a., em
Ontário, outros (e.g. Awramik 2006) estão certos
de que os estromatólitos são biogênicos e marcam
o início da vida na Terra.
As algas azuis e verdes dominaram a vida
na Terra do Pré-Cambriano ao Paleozóico.
Eucariotos teriam surgido há cerca de 2,1 b.a.,
mas sua diversidade só aumento depois do
Neoproterozóico, há 1 b.a. Apesar de evidências
bioquímicas sugerirem a presença de algas verdes
a partir desse período, as primeiras algas
multicelulares apareceram apenas por volta de 750
milhões de anos (m.a.).
Estromatólitos encontrados no Oeste da Austrália e datados de
3,43 bilhões de anos (Awramik 2006). barra = 10 cm.
Evidências
seguras
(megafósseis)
indicam que as primeiras plantas terrestres datam
do início do Siluriano (425 m.a.). Entretanto,
fósseis de esporos em tétrades (criptósporos) são
conhecidos desde o Orduviciano (475 m.a.). Os
criptósporos apresentam uma distribuição
cosmopolita, mas são encontrados principalmente
em ambientes não marinhos. Eram produzidos em
grande
quantidade
(esporângios)
e
morfologicamente se assemelhavam aos das
hepáticas atuais pelo tamanho e presença de
lamelas (apesar de não possuírem elatérios),
confirmando sua relação direta com o ambiente
terrestre (Wellman et al. 2003).
Fóssil de um esporângio contendo tétrades nuas, datado de 475
m.a. (Ordoviciano). Barra = 50 µm (Wellman et al. 2003).
Registros de plantas polisporangiadas
(grupo que além das plantas vasculares incluem
plantas extintas cujo esporófito ramificado
produzia mais de um esporângio), as extintas
Cooksonia, possíveis precursoras das plantas
vasculares, datam de 420 m.a. (Siluriano), na
3
Austrália. As plantas vasculares surgiram logo
depois, possivelmente antes de 400 m.a.
Fóssil de Cooksonia pertonii. Note a ramificação dicotômica e
os esporângios no ápice dos ramos. A planta tinha ca. 2,5 cm
alt.
A diferença mais evidente das
embriófitas é a formação de um embrião. Sua
origem, portanto, está relacionada a mudanças no
ciclo de vida. Existem duas teorias para explicar a
origem das plantas terrestres. Segundo a Teoria de
Homólogos ou de Transformação, o ciclo de vida
das algas ancestrais seria diplobionte, com
alternância de gerações isomórficas, na qual tanto
o gametófito quanto o esporófito seriam
multicelulares e independentes. Teria havido a
partir daí, uma transformação levando a um ciclo
heteromórfico, ou seja, com diferenças
morfológicas entre as fases de vida. Nesse caso, as
briófitas
não
são
consideradas
estados
intermediários entre algas e plantas vasculares. O
esporófito das briófitas seria resultado de redução
em contraposição ao das traqueófitas, resultante
de elaboração. Essa teoria, no entanto, não explica
a formação de um embrião a partir de gerações
livres. Não existem algas diplobiontes,
oogâmicas; os gametas são sempre liberados do
gametófito, de modo que a fertilização e o
desenvolvimento do embrião são livres,
independentes do gametófito parental.
Segundo a Teoria Antitética ou de
Interpolação, as algas que deram origem as
plantas terrestres teriam ciclo de vida
haplobiôntico (uma única geração multicelular),
com alternância de gerações anisomórfica, onde
os gametófitos seriam multicelulares e os
esporófitos unicelulares (apenas o zigoto). Nesse
caso, o esporófito das briófitas representaria um
estado intermediário entre o das algas e o das
plantas vasculares. Ao desenvolver a Teoria
Antitética, Bower sugeriu que as plantas terrestres
teriam derivado de algas verdes terrestre ou de
água doce com ciclo haplobiôntico (dominância
do gametófito), semelhantes as atuais carófítas. A
partir daí teria surgido a oogamia, formação de
um gameta feminino (oosfera) grande e imóvel,
seguido da retenção dessa oosfera e,
posteriormente, do zigoto no arquegônio
(gametângio feminino) do gametófito. O retardo
da meiose do zigoto e a inserção de divisões
mitóticas na fase diplóide (embriogênese) teriam
evoluído em direção à formação de um esporófito
multicelular diplóide associado ao gamétofito
haplóide. A partir daí teria se estabelecido uma
relação
de
nutrição
(matrotrofia)
e
desenvolvimento entre esporófito e gametófito.
O ciclo diplobiôntico pode ter sido
selecionado de maneira independente em várias
linhagens porque amplia as possibilidades do
produto meiótico através de recombinações na
fase diplóide. A associação do esporófito
multicelular ao gametófito passou a protegê-lo
com camadas estéreis e disponibilizar recursos
que garantissem a produção de muitos esporos,
maximizando a reprodução.
Ciclo haplobionte semelhante àquele que teria dado origem às
embriófitas.
O ancestral das plantas terrestres estariam
certamente dentre as clorófitas, mas precisamente
dentre as carofíceas. Essas algas verdes são
exclusivamente haplobiontes e oogâmicas,
sustentando assim a Teoria Antitética. As algas
verdes incluem cerca de 8.000 espécies (90% de
4
água doce). As Charophyta são as mais
relacionadas às embriófitas, especialmente as
ordens Coleochaetales (15 espécies) e Charales
(400). As carófitas parecem formar um grado em
relação as embriófitas e juntas compõem as
Estreptófitas. Fósseis desse grupo são registrados
desde o Siluriano.
Chara (Charales) estão entre as algas verdes mais relacionadas
com as plantas terrestres.
Dentre as características que sustentam a
relação das carófitas com as plantas terrestres
estão a capacidade de produzir esporolina, cutina
e compostos fenólicos, formação de fragmoplasto
(conjunto de microtúbulos que surge na fase final
da divisão celular e auxilia na formação da parede
celular) e plasmodesmatas (canais intercelulares
formados pelo retículo endomplasmático durante
a divisão celular), o citoesqueleto dos gametas
flagelados masculinos (ausente apenas em grupos
mais derivados de espermatófitas, onde ocorre a
sifonogamia), a fotorrespiração (mesma organela:
peroxissomos; e enzima: oxidase glicolata) e a
possível ocorrência de fitocromos (pigmento
protéico de plantas ativado pela luz e que está
envolvido no desenvolvimento). Além disso, nas
Charales, encontramos os primeiros sinais de
meristema
apical,
especialização
celular,
capacidade de ramificação e divisão celular
desigual levando a um corpo tridimensional,
novidades que levariam a uma mudança no corpo
básico das plantas (Graham et al. 2000). Com a
evolução das plantas, houve uma tendência em
elaboração do esporófito em detrimento do
gametófito.
A invasão do ambiente terrestre pelas
plantas há pelo menos 470 m.a. (Orduviciano) foi
um dos mais importantes eventos da história da
Terra. As primeiras plantas terrestres deviam
ocupar locais encharcados. A água continuava
essencial para a sobrevivência das plantas e
principalmente para a reprodução, pois os gametas
masculinos flagelados (anterozóides) ainda tinham
que alcançar o feminino (oosfera) nadando. As
condições deviam ser rigorosas, sob alta
exposição solar, períodos de seca freqüentes e
solos pobres. Os níveis de CO2 estavam
diminuindo e os de O2 subindo. A fotossíntese
promoveu o acúmulo de oxigênio levando a
formação da camada de ozônio, essencial para que
as plantas pudessem emergir do escudo de água.
Inicialmente, as plantas terrestres deviam ser
semelhantes às briófitas, sem restrições
mecânicas, compostas por um corpo taloso sem
tecidos
de
condução
ou
sustentação
especializados. Mudanças moleculares (veja
Waters 2003), anatômicas e fisiológicas durante o
Orduviciano e o Siluriano foram então as mais
importantes. Mas o contato com a atmosfera
exigiu
também
mudanças
biofísicas
e
bioquímicas, dentre elas a formação de camadas
protetoras, como a cutícula e a esporolina, que
amenizaram a perda de líquidos. As trocas gasosas
passaram mais tarde a ser realizadas por poros
especializados denominados estômatos. A
produção de metabólitos secundários como os
compostos fenólicos também contribuiu para a
proteção contra os raios ultavioletas, o parasitismo
e a predação. Gametóforos mais altos proveriam
uma dispersão mais eficiente para os esporos
gerados nos esporófitos que ali germinassem. Os
esporos deixaram de ser flagelados (zoósporos,
como em algumas Charales), o que deve estar
relacionado a sua menor eficiência em ambientes
terrestres. Sem sistema vascular, o sistema axial
das primeiras plantas terrestres era mantido
exclusivamente devido ao turgor, limitando o
crescimento de apêndices e a altura da planta a
apenas alguns centímetros. O desenvolvimento de
um sistema de condução representou uma
inovação fisiológica e mecânica importante para
as plantas terrestres, mas elas continuaram
restritas a ambientes úmidos (Bateman et al.
1998).
As briófitas são pequenas e simples.
Típicas de ambientes úmidos, elas não possuem
tecidos vasculares especializados para a condução
de fluídos e nutrientes; eles são distribuídos por
difusão. Nelas, o gametófito é a fase dominante na
alternância de gerações. O esporófito consiste de
um pé embebido no gametófito, um pedúnculo
(seta) e um esporângio (cápsula) no ápice. Apesar
de existir cutícula em alguns grupos, ela é
bioquimicamente pouco conhecida e está
associada com poros ou estômatos. A absorção de
água e nutrientes ocorre diretamente no
gametófito, eventualmente com a ajuda de
estruturas especializadas, como tricomas. Rizóides
5
uni ou multicelulares servem apenas para a
fixação da planta.
São reconhecidos três principais grupos
de briófitas. Marchantiopsida (hepáticas, com
6.000-8.000
espécies),
Anthocerotopsida
(antóceros, 100-400) e Briopsida (musgos,
10.000).
As hepáticas são definidas pelos corpos
de óleos, ausência de columelas e estômatos.
Marchantia é um de seus representantes mais
conhecidos.
Destaca-se
pelo
gametófito
dicotômico e gametangióforos, estruturas
especializadas onde nascem os gametângios. Os
esporângios possuem, além dos esporos, elatérios
higroscópicos que ajudam na dispersão. Elas
também se reproduzem vegetativamente através
de gemas, corpos multicelulares que darão origem
a um novo gametófito, localizadas em cúpulas
(conceptáculos) no dorso do gametófito e
dispersadas por gotas de chuva. Não existe um
meristema no esporófito; a seta é reduzida e se
alonga por distensão das células.
Os antóceros são definidos por um
meristema intercalar entre o pé e a cápsula. Não
existe uma seta definida e a cápsula é alongada.
Possui fendas de mucilagem e anterídios
produzidos numa cavidade no talo. Muitas
espécies apresentam células com um único
cloroplasto grande, com um pirenóide no centro,
como em Coleochaete (carófita).
Finalmente, os musgos são definidos pela
presença de filóides (folhas gametofíticas) e
rizóides multicelulares. Eles possuem um tecido
condutor (hadroma) formado por células
alongadas e altamente permeáveis chamadas
hidróides, que se assemelham a elementos
traqueais de plantas vasculares, mas sem lignina.
Como nos antóceros, possuem estômatos, mas em
vez de um meristema intercalar, possuem um
meristema subapical entre a seta e a cápsula. A
auxina, nesse grupo, tem movimento bidirecional,
semelhante ao encontrado em plantas vasculares,
e que teria possibilitado a diferenciação das
células da raiz (Poli et al. 2003) e possivelmente a
irradiação das plantas terrestres (Cooke et al.
2003).
A relação entre as briófitas ainda está em
aberto. Estudos filogenéticos com dados
morfológicos (e.g. Garbary & Rezanglia 1998) e
moleculares (e.g. Nickrent et al. 2000) têm
demonstrado que as briófitas formam um grupo
parafilético em relação as traqueófitas. Entretanto,
análise utilizando aminoácidos do genoma
completo de cloroplasto indicam que as briófitas
atuais formam o grupo irmão das plantas
vasculares (Nishiyama et al. 2004).
Os musgo são possivelmente o grupo de briófitas mais
relacionado com as plantas vasculares. Notem os esporófitos
(seta e esporângio visíveis).
Em alguns estudos, os antóceros
aparecem na raiz das plantas terrestres, o que é
corroborado pelo cloroplasto com pirenóides em
alguns antóceros, evidência de que esse grupo
compartilha uma plesiomorfia com as carófitas
ausente
nas
demais
plantas
terrestres.
Tipicamente, no entanto, as hepáticas são
consideradas o grupo irmão das demais plantas
terrestres, o que é evidenciado por marcadores
genômicos raros (ausência de três íntrons no gene
mitocondrial nad1). As relações filogenéticas
internas nos três grandes grupos de briófitas foram
revisadas recentemente (Shaw & Renzaglia 2004),
mas não serão abordadas aqui.
Origem das Plantas Vasculares
Com a saturação dos ambientes úmidos,
passou a haver uma seleção para características
que permitissem a falta temporária de água.
Surgiram
então
sistemas
radiculares
especializados na captação de água, e capazes de
fixar plantas maiores. O aumento na cutinização
da epiderme e das paredes celulares de células
subepidérmicas amenizou ainda mais a perda de
líquidos por transpiração. O desenvolvimento de
sistemas complexos de ramificação maximizando
a superfície fotossintética foi acompanhado por
sistemas mais eficientes de condução de água e
sustentação obtidas com a produção de lignina nos
tecidos vasculares.
As primeiras plantas vasculares, como a
extinta Rhynia (entre 425 e 380 m.a.), não
possuíam raízes, nem folhas; eram homospóricas,
com ramificação dicotômica. As raízes derivaram
6
a partir da ramificação de um rizoma com
rizóides. Elas auxiliaram não apenas na captação
de líquidos, mas também na fixação das plantas.
As folhas parecem ter surgido mais de uma vez
nas traqueófitas. As folhas das Lycophyta
(micrófilas) são simples e supostamente derivadas
de esporângios estéreis (ou de enações do teloma).
As folhas das demais traqueófitas (megáfilas), por
outro lado, teriam surgido diversas vezes a partir
da expansão de ramos (Friedman et al. 2004). A
partir de um sistema de ramificações dicotômicas,
teria havido a dominância de um ramo que
continuaria o crescimento. O outro ramo seria
determinado e congenitalmente modificado, plano
e interligado por tecidos fotossintetizantes.
Reprodução da extinta Rhynia, uma das primeiras plantas
vasculares.
A heterosporia, produção de micro e
megásporos, o primeiro levando a formação de
gametófitos masculinos e o segundo de
gametófitos femininos (plantas com sexos
separados), também surgiu diversas vezes a partir
de ancestrais homospóricos (sem diferenciação de
esporos) e com gametófitos produzindo anterídios
e arquegônios. Ainda assim, a maiorias das
traqueófitas que não produzem sementes são
homospóricas. Apesar de bissexuadas, existe
freqüentemente uma assincronia na produção de
gametas masculinos e femininos na mesma planta,
forçando os gametas masculinos a nadarem até
outro gametófito para realizarem a fertilização de
um gametófito feminino. A heterosporia foi
freqüentemente acompanhada por endosporia
(desenvolvimento do gametófito no interior da
parede do esporo).
Após sua origem no Siluriano, as plantas
vasculares se diversificaram rapidamente no
Devoniano. Esse período pode ser acompanhado
com detalhe através de fósseis silicificados do
sítio Rhynie, na Escócia. A colonização do
ambiente terrestre pelas plantas foi acompanhada
pela dos animais, tanto invertebrados (milípides
no Siluriano, e insetos sem asas e aracnídeos já no
Devoniano), como vertebrados (tetrápodas, no
Devoniano). No início, no entanto, eles eram
predominantemente detritivos ou predadores.
A formação de um câmbio nas plantas e
o conseqüente crescimento secundário, assim
como um sistema vascular mais eficiente permitiu
que as plantas pudessem crescer em tamanho,
aumentassem seu tempo de vida e ocupassem
ambientes sazonais. As comunidades e as
paisagens terrestres cresceram bastante em
complexidade no fim do Devoniano. As
progimnospermas (especialmente Archaeopterys),
com crescimento secundário e mais de 18 m de
altura formavam extensas florestas paludosas e
matas de galerias repletas de Racophyton (présamambaias) no subosque.
O domínio dos ambientes terrestres
proporcionou uma série de alterações ecológicas,
como a formação de serrapilhera, criando um
microclima importante para a sobrevivência de
animais e fungos, a maior estabilidade do solo
devido às raízes e o aumento da umidade local
devido a transpiração. Com o desenvolvimento
das raízes, os solos passaram a sofrer maior
intemperismo
químico,
tornaram-se
mais
profundos, extensos, finamente sedimentados e
ricos em matéria orgânica gerada pela grande
produção primária dos vegetais. As plantas
diminuíram também a erosão dos solos,
transformando drasticamente o regime dos rios e
possibilitando um tempo maior de residência do
carbono, reduzindo enormemente a concentração
de CO2 na atmosfera.
Os detritos orgânicos tornaram as águas
continentais pobres em oxigênio, o que pode ter
sido uma pressão seletiva importante para o
surgimento do pulmão e a colonização do
ambiente terrestre pelos vertebrados. Dos rios até
o mar, essas águas pobres em oxigênio, mas ricas
em nutrientes promoveram a eutrofização das
zonas costeiras. Isso promoveu o acúmulo de
algas, o que teria provocado uma anoxia nas águas
epicontinentais. A diminuição de CO2 atmosférico
pode também ter contribuído para uma queda na
temperatura do planeta, chegando às glaciações do
7
Reconstrução da paisagem do Início do Devoniano.
final do Devoniano. Juntas, essas perturbações
podem ter contribuído para que no final do
Devoniano ocorresse uma das cinco maiores
extinções em massa, focada principalmente em
águas continentais dos trópicos (Algeo et al. 1995,
1998, 2001).
Com a extinção das Archeopteris, no
final do Devoniano, houve uma redução das
florestas, que só voltaram a aparecer
marcadamente no Carbonífero. Nesse período, as
florestas eram diversificadas e marcadas pelo
domínio
de
licófitas
arbóreas
(e.g.
Lepidodendropsis) em áreas pantanosas. As
licófitas atingiam até 40 m de altura e eram
sustentadas por um espesso córtex. Eram
tolerantes a águas pouco oxigenadas e formavam
extensos pântanos. Esses alagados eram
circundados por florestas mais sazonais
dominadas por gimnospermas, especialmente
pteridospermales
(plantas
com
sementes
semelhantes vegetativamente a samambaias) e
cordaitales (possíveis ancestrais das coníferas).
Durante o Permiano, as licófitas foram
gradativamente cedendo espaço para as
gimnospermas, as quais dominaram a flora
terrestre até o Jurássico e permitiram o
aparecimento de vertebrados herbívoros terrestres
(Greb et al. 2006).
As traqueófitas possuem tecidos
vasculares, denominados floema e xilema, que
transportam líquidos e nutrientes. O xilema possui
lignina que sustenta a planta ereta. Nelas, é o
esporófito a fase dominante no ciclo de vida. Ele é
vistoso, possuindo diferenciação de raízes, folhas
e caule. Fotossintetizante, o esporófito cresce de
maneira independente. O gametófito por sua vez é
reduzido, especialmente nos grupos mais
derivados. A redução do gametófito é marcante
especialmente
nas
espermatófitas.
Em
angiospermas, o gametófito fica limitado a poucas
células e é nutrido pelo esporófito, atuando como
um parasita.
Além das extintas Rhyniophytas e das
Lycophyta, compostas atualmente por três
gêneros, Lycopodium (400 spp.), Selaginella (700)
e Isoetes (100), encontram-se entre as plantas
vasculares as Euphyllophyta (Pryer et al. 2001).
Esse grupo é dividido em moniliformopses e as
Lignophyta. As moniliformopses incluem as
demais plantas vasculares atuais sem sementes
(Psilotales, Ophioglossales, Marattiales, as
samambaias verdadeiras e Equisetum). As
Psilotales, com dois gêneros, Psilotum (2 spp.) e
8
Evolução da flora do Siluriano e Devoniano (Greb et al. 2006).
Tmesipteris (2), são caracterizadas pela ausência
de raízes e pela formação de eusporângios em
sinângios. Tradicionalmente, eram consideradas
relacionadas com as extintas Psilophyton. Estudos
recentes, no entanto, têm apontado uma
proximidade evolutiva com as Ophioglossales,
que incluem três gêneros, destacando-se
Botrychium, com 25 spp., e Ophyoglossum, com
Exemplo de samambaia verdadeira (Filicales), as Cyathea
podem alcaçar vários metros de altura.
30 spp. Diferente do que se esperava e apesar de
algumas incongruências com a distribuição de
íntrons no gene mitocondrial atp1 (Wikström &
Pryer 2005), Equisetum (rabo de cavalo, com 15
spp. atuais; tradicionalmente considerada em seu
grupo a parte, Sphenophyta), com esporângios
reunidos em estróbilos, tem sido confirmado no
clado que inclui as Marattiales (200 spp.) e as
plantas leptosporangiadas (ca. 11.000 spp.,
incluindo ai as samambaias verdadeiras (Pryer et
al. 2004). Apesar de possivelmente relacionado
evolutivamente com plantas existentes no
Paleozóico (e.g. Calamites, extintas no Permiano)
e principalmente no Mesozóico (e.g. Equisetittes),
o gênero Equisetum tem uma origem recente, no
Cenozóico, representando a ponta de uma
linhagem bem antiga que teria surgido no
Permiano (Des Marais et al. 2003).
As
conhecidas
samambaias
são
geralmente rizomatosas, com folhas frondosas,
nascendo em báculos. Os esporângios ficam na
face abaxial ou na margem das folhas, geralmente
estão reunidos em soros, protegidos ou não por
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questionáveis. A antigüidade dessas linhagens, a
velocidade de diversificação em determinados
grupos e a ausência de muitos representantes
extintos tornam a filogenia das plantas terrestres
um enigma. Irradiações rápidas e antigas geram
problemas analíticos que dificultam a detecção de
relações filogenéticas através de dados
morfológicos e moleculares e o excesso de
homoplasias tem dificultado análises morfológicas
e uma interpretação segura da evolução dos
caracteres. Folhas, por exemplo, surgiram cerca
de seis vezes na evolução das traqueófitas. Uma
conclusão possível apenas com a inclusão de
táxons extintos na análise mostrando a derivação
de seis grupos atuais com folhas a partir de táxons
extintos áfilos.
Cladograma mostrando a classificação das plantas vasculares e
a evolução do meristema apical no grupo (Friedman et al.
2004).
um indúzio. A maioria das espécies está incluída
em Filicales, com gametófitos exospóricos,
bissexuados, mas funcionalmente unissexuados,
esporófitos leptosporangiados, homospóricos.
Perspectivas
As relações de parentesco entre os
grandes grupos de plantas terrestres ainda são
Leitura:
Kenrick, P. & Crane, P.R. 1997. The origin and
early evolution of plant on land. Nature 389:
33-39.
Algeo, T.J. & Schckler, S.E. 1998. Terrestrialmarine teleconnection in the Devonian: inks
between the evolution of land plants,
weathering process, and marine anoxic
events. Phil. Trans. R. Soc. Lond. B 353:
113-128.
Ciclo Geral
das
Plantas
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Ciclo Geral das
Briófitas
Ciclo Geral das Pteridófitas
11
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