UNIVERSIDADE FEDERAL DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DE PORTO ALEGRE – UFCSPA CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HEPATOLOGIA Leonardo Wagner Grillo Análise do Desfecho de Pacientes Cirróticos Portadores de Carcinoma Hepatocelular em Lista de Espera para Transplante Hepático Porto Alegre 2013 I Leonardo Wagner Grillo Análise do Desfecho de Pacientes Cirróticos Portadores de Carcinoma Hepatocelular em Lista de Espera para Transplante Hepático Dissertação submetida ao Programa de PósGraduação em Hepatologia da Fundação Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre como requisito para a obtenção do grau de Mestre Orientador: Dr.Claudio Augusto Marroni Porto Alegre 2013 II III AGRADECIMENTOS Muitas são as pessoas que merecem meu agradecimento por haverem contribuído, de diferentes maneiras, para que eu conseguisse realizar esta pesquisa. À minha esposa Simone, pelo incentivo, companheirismo, afeto e pela alegria de ser a mãe de minhas filhas Maria Antônia e Carolina, meus maiores amores. Aos meus pais, Fernando e Judite, que me transmitiram os valores pelos quais norteio minha vida. Aos meus irmãos Rodrigo e Luciana pela amizade e parceria. Ao meu orientador, Dr. Claúdio Augusto Marroni, pelos seus ensinamentos, credibilidade e paciência. Aos colegas Gustavo Drügg Hahn, Leonardo Comerlatto e Lucas Gonçalves Matte pelo auxílio na coleta de dados do trabalho. À Secretaria do Programa de Pós-Graduação da UFCSPA, especialmente à Luciani por sua atenção e dedicação. Em especial a Deus, por todas as graças alcançadas. IV RESUMO Introdução e Objetivos: Cirróticos possuem maior risco de desenvolver carcinoma hepatocelular (CHC) e o transplante ortotópico de fígado (TOF) é opção terapêutica capaz de tratar o câncer e a disfunção hepática. Objetiva-se avaliar o desfecho de pacientes cirróticos portadores de CHC em lista para transplante hepático, determinando fatores preditivos de retirada de lista (dropout). Pacientes e Métodos: Estudo observacional, retrospectivo, de coorte histórica, em hospital geral no sul do Brasil de maio de 2006 a dezembro de 2010, de pacientes até a realização do transplante ou dropout. Análise por modelo de Regressão de Cox e curvas de Kaplan-Meier com comparação pelo teste de Log-rank. Resultados: De 148 pacientes, 70,9% foram transplantados e 29,1% foram excluídos da lista por progressão do tumor e ou morte, estando 79,1% dentro do critério de Milão. Fatores preditivos de dropout na análise univariada com significância estatística (p<0,05): nível de Alfafetoproteína > 20 ng/ml [Hazard ratio (HR), 2,4; 95% intervalo de confiança (IC), 1,3-4,4] e tumor fora do critério de Milão (HR, 3.4; 95% IC 1.8-6.2); em análise multivariável com significância estatística (p<0,05): classificação de Child-Pugh B e C (HR, 2,1; 95% IC 1,1-4,2) e tumor fora do critério de Milão (HR, 2,9; 95% IC 1,4-6,0). Fatores independentes de dropout da lista para TOF: tumor fora do critério de Milão (HR, 2,9; 95% IC 1,4-6,0) e possuir classificação de Child-Pugh B ou C (HR 2,1; 95% IC 1,1-4,2). Conclusão: O critério de Milão, assim como o nível da Alfafetoproteína e a classificação de Child-Pugh identificaram indivíduos com maior risco de saída de lista durante espera por órgão. Palavras-chave: Cirrose hepática. Transplante de fígado. Carcinoma hepatocelular. Dropout. V ABSTRACT Introduction and Objectives: Patients with cirrhosis present a high risk of developing hepatocellular carcinoma (HCC). The orthotopic liver transplant (OLT) is an effective therapeutic option for treating cancer and hepatic dysfunction. This study evaluates the outcome of patients with cirrhosis with HCC in liver transplant waiting list and predictive factors for dropout. Subjects and Methods: An observational, retrospective historical cohort study was conducted in a general hospital in the south of Brazil from May 2006 to December 2010 with patients up to the time of transplant or dropout. Analysis was performed using the Cox Regression model and Kaplan-Meier curves and comparison, by the Log-rank test. Results: Of the 148 patients evaluated, 70.9% underwent OLT and 29.1% were dropped out due to tumor progression or death; 79.1% were within the Milan criteria. Predictive factors for dropout at univariate analysis that presented statistic significance (p<0.05) were alphafetoprotein level > 20 ng/ml [Hazard Ratio (HR), 2.4; 95% confidence interval (CI), 1.3-4.4] and tumor outside Milan criteria (HR, 3.4; 95% CI 1.8-6.2); and in multivariate analysis with statistic significance (p<0.05) were Child-Pugh B and C (HR, 2.1; 95% IC 1.1-4.2). Factors independent from OLT waiting list dropout were tumor outside the Milan criteria (HR, 2.9; 95% CI 1.4-6.0) and Child-Pugh B or C (HR 2.1; 95% CI 1.1-4.2). Conclusion: Milan criteria, alpha-fetoprotein, and Child-Pugh classification were able to identify individuals at higher risk of dropout from liver transplant waiting list. Keywords: Hepatic cirrhosis. Liver transplantation. Hepatocellular carcinoma. Dropout. VI LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Número de pacientes CHC listados para o transplante hepático e o número de pacientes CHC submetidos ao transplante de 2006 a 2010. ..................................................... 57 Figura 2 – Número de pacientes CHC listados entre 2006 e 2010 que não preencheram o critério de Milão. ...................................................................................................................... 58 Figura 3 – Probabilidade de dropout em pacientes portadores de CHC em lista de transplante hepático..................................................................................................................................... 59 Figura 4 – Sobrevida acumulada de dropout da lista em pacientes que preencheram e não preencheram o critério de Milão. .............................................................................................. 60 Figure 1 – Number of HCC patients listed for hepatic transplantation with and number of HCC patients who underwent transplantation. 2006-2010....................................................... 76 Figure 2 – Number of CHC patients listed between 2006 and 2010 not conforming Milan criterion. .................................................................................................................................... 77 Figure 3 – Dropout probability in patients carrying HCC in waiting list for hepatic transplantation. ......................................................................................................................... 78 Figure 4 – Accumulated survival after dropout from list in patients conforming and not conforming Milan criterion. ..................................................................................................... 79 VII LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Características clínicas e demográficas de 148 pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular ao entrar em lista de transplante hepático no Hospital Dom Vicente Scherer. Período de maio de 2006 a dezembro de 2010. .......................................................... 56 Tabela 2 – Características macroscópicas do carcinoma hepatocelular no momento da entrada em lista de espera para o transplante hepático. ......................................................................... 58 Tabela 3 – Análise univariada e multivariável de preditores de dropout de lista de espera de candidatos a transplante hepático portadores de carcinoma hepatocelular .............................. 61 Table 1 – Clinical and demographic characteristics of 148 cirrhotic patients carrying HCC in waiting list for hepatic transplantation at Hospital in south of Brazil. May 2006-December 2010. ......................................................................................................................................... 75 Table 2 – Macroscopic features of HCC at entry in waiting list for hepatic transplantation. .. 77 Table 3 – Univariate and multivariate analysis of waiting list dropout predictors for candidates to hepatic transplantation carrying HCC. ................................................................................. 80 VIII SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 1 2 JUSTIFICATIVA .................................................................................................................. 36 3 OBJETIVO ............................................................................................................................ 38 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 39 5 ARTIGO CIENTÍFICO - VERSÃO EM PORTUGUÊS ...................................................... 50 6 ARTIGO CIENTÍFICO - VERSÃO EM INGLÊS ............................................................... 69 7 CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 87 1 1 INTRODUÇÃO A cirrose é definida como o estágio final da doença hepática crônica. Ela decorre da destruição e regeneração das células hepáticas promovendo mudanças histológicas, como a presença de fibrose e formação de nódulos regenerativos, levando, assim, à desorganização da arquitetura parenquimatosa e vascular hepática. A cirrose possui distribuição global e estimase que sua prevalência oscile entre 4,5% e 9,5%, o que corresponderia a aproximadamente 100 milhões de indivíduos no mundo. Existem marcadas diferenças geográficas relacionadas à prevalência e incidência dessa patologia, associadas fundamentalmente à distribuição dos fatores causais. A hepatite pelo vírus B é o principal agente etiológico da cirrose em países asiáticos, enquanto a hepatite pelo vírus C, o álcool e, recentemente, a esteato-hepatite não alcoólica destacam-se como causas principais de hepatopatia crônica em países desenvolvidos. Em 2001, estimou-se que 771 mil mortes deveram-se à cirrose, e existe a expectativa de que, em 2020, esta, que hoje é considerada a 14ª principal causa de morte em todo o mundo, ocupará a 12ª posição entre os motivos de óbito da população. Assim, é facilmente perceptível a relevância do tema e seu impacto em termos de saúde pública1. Pacientes cirróticos são suscetíveis a inúmeras complicações clínicas, o que poderá acarretar na drástica redução de sua expectativa de vida. A cirrose foi causa de 25 mil mortes e 373 mil internações nos Estados Unidos no ano de 1998 de acordo com o Centro Nacional de Estatística em Saúde. Estudo de Nader e colaboradores2 identificou que a cirrose é a principal causa não apenas de internação hospitalar, mas também de mortalidade por doenças hepáticas no Brasil. A doença é responsável por 128.988 mortes no período de 2001 a 2010, representando 42% dos óbitos por hepatopatias e uma média de 14.342 mortes/ano, sendo a 13ª causa de morte no Brasil no ano de 2007, subindo para a 12ª posição nos anos de 2008 e 2009. No Brasil, o carcinoma hepatocelular é a segunda causa de morte por doenças 2 hepáticas, sendo responsável por 52.560 óbitos quando se considera o período de 2001 a 20103. Múltiplos fatores podem predispor a descompensação em portadores de cirrose, incluindo sangramento digestivo, uso de álcool, infecções, uso de medicamentos, desidratação e neoplasias. A transição entre os dois estágios da cirrose ocorreria a uma taxa de cerca de 57% ao ano, e, enquanto a sobrevida de cirróticos compensados costuma ser de mais de 12 anos, aquela dos descompensados gira em torno de dois anos4,5,6. De acordo com a forma de apresentação clínica, os pacientes portadores de hepatopatia crônica são classificados em compensados ou descompensados; pela presença de ascite, icteríca e/ou encefalopatia; ou, ainda, por meio de condições laboratoriais e clínicas, divididos em três grupos diversos (A, B ou C) em ordem de gravidade. Esta última classificação, chamada de Child-Turcotte, modificada por Pugh, apresenta importante valor prognóstico em relação à mortalidade dos pacientes cirróticos. As principais apresentações clínicas de cirrose como hemorragia digestiva, icterícia, ascite, encefalopatia, síndrome hepatorrenal e carcinoma hepatocelular (CHC) relacionam-se à piora do prognóstico dos pacientes. Um modelo desenvolvido por D’Amico e colaboradores7, para predizer óbito desses pacientes em um ano, demonstra que pacientes com cirrose compensada sem varizes apresentam alta probababilidade de sobrevida nesse período (99%), diferentemente do óbito de mais da metade (57%) dos que apresentam ascite e hemorragia por varizes. Embora a classificação de Child-Turcotte-Pugh (CTP) venha sendo aplicada para analisar o prognóstico a longo prazo, o Model for End-stage Liver Disease (MELD) traduz, atualmente, a melhor maneira de predizer a evolução desses indivíduos, e, portanto, tem sido utilizada como critério de alocação de órgãos para o transplante hepático mundialmente. O MELD é um escore desenvolvido prospectivamente para avaliar a severidade da doença hepática crônica, que utiliza valores laboratoriais de bilirrubina sérica, creatinina sérica e INR 3 (international normalized ratio) do tempo de protrombina para predizer sobrevida (MELD = 0,957 loge [creatinina mg/dl] + 0,378 loge [bilirrubinas mg/dl] + 1,120 loge [RNI] + 0,643) (6,7,8). Esse escore prediz a mortalidade em três meses8. A necessidade de obtenção de critérios mais consistentes e a determinação de objetivos para indicação de transplante hepático e alocação de órgãos foram os estímulos fundamentais para a criação, posterior divulgação e aceitação do escore MELD. O modelo foi inicialmente proposto para estimar a sobrevida de cirróticos submetidos a TIPS (transjugular intrahepatic portosystemic shunt). A coorte de 231 pacientes submetidos ao procedimento em centros norte-americanos apresentou 110 óbitos por doença hepática durante o acompanhamento. Utilizando-se o modelo de regressão de azares proporcionais de COX, com dados clínicos e de laboratório, foram definidas quatro variáveis independentes preditoras de sobrevida: INR, creatinina sérica, etiologia da doença hepática e bilirrubina total9. Posteriormente, foi feita a exclusão da variável etiologia, sendo sugerida a equação referida no parágrafo anterior. A principal aplicabilidade do escore MELD é ordenar os pacientes na forma de lista de espera para o transplante hepático em centros que utilizam o critério de gravidade na alocação de órgãos, atendendo prioritariamente os pacientes mais graves. Com esse ideal, o MELD é preferível ao CTP, pois utiliza variáveis objetivas, não requer a interpretação do observador e tem maior reprodutibilidade10. Nos Estados Unidos, os centros que utilizaram o CTP como critério de alocação perceberam que à medida que o tempo passava, o número de candidatos crescia e cada subgrupo do CTP ficava congestionado, formado por pacientes muito heterogêneos e com gravidades distintas. Assim, o tempo de espera em lista se tornou mais significativo do que a gravidade dos pacientes na priorização dos enxerto8. Nos EUA, o MELD foi implementado para substituir o CTP na alocação de fígados, em 2002, pela United Network of Organ Sharing – UNOS. A adoção do MELD parece ter 4 atingido seus objetivos, pois resultou na redução da inscrição e mortalidade em lista de espera, sem alterar a sobrevida em curto prazo pós-transplante, apesar de haver pacientes de maior gravidade sendo transplantados. Os efeitos da política de alocação também podem ser avaliados de forma objetiva, tanto em candidatos, como em receptores de enxerto. No Brasil, o escore MELD foi implementado para a alocação de fígados em adultos em junho de 200611,12,13. Um ajuste importante na pontuação do escore MELD foi realizado pela UNOS. Uma vez que pacientes com CHC podem apresentar função hepática preservada e, consequentemente, um escore MELD baixo predizendo um menor risco de morte em três meses pela disfunção hepática, um ajuste foi necessário para permitir a antecipação do risco de morte pelo CHC. De acordo com a classificação do estágio UNOS, para pacientes com CHC T1 (lesão única ≤ 1,9 cm) era dado um escore MELD de 24, correspondendo a uma mortalidade de 15% em três meses. Aqueles com CHC T2 (nódulo único de 2 a 5 cm ou dois a três nódulos todos ≤ 3 cm) recebiam valor de escore 29, o que refletia uma taxa de mortalidade de 30% em 3 meses. Além disso, esses pacientes recebiam um incremento no escore MELD correspondente a um aumento de 10% na mortalidade para cada três meses de espera subsequente, contanto que permanecessem no estágio T2. Pacientes com estágio CHC T3 (nódulo único > 5 cm ou dois ou três nódulos sendo ao menos um > 3 cm) ou T4 (quatro ou mais lesões de qualquer tamanho ou invasão vascular) não eram elegíveis para a priorização do escore MELD para CHC em lista de espera para transplante hepático14. Em 29 de maio de 2006, o Ministro da Saúde do Brasil, por meio da Portaria número 1.160 modificou os critérios de distribuição de fígado de doadores cadáveres para transplante, implantando o critério de gravidade de estado clínico do paciente. Para aferir essa variável, foi adotado o sistema MELD, calculado por meio da equação citada previamente. Pacientes portadores de CHC ≥ 2 cm, dentro dos critérios de Milão, com diagnóstico baseado nos 5 critérios de Barcelona (tumor único menor 5 cm, até 3 nódulos menores 3 cm, sem comprometimento vascular, Child-Pugh B ou C) e sem indicação de ressecção recebiam o valor mínimo de MELD 20. Caso o paciente não seja transplantado em 3 meses, sua pontuação passa automaticamente para MELD 24 e, em 6 meses, para MELD 2911. Até os anos 1970, o CHC era tido como uma neoplasia rara, com exceção do sudoeste asiático e África, sendo, rotineiramente, diagnosticado em estágios avançados, quando nenhum tratamento modificava sua evolução. Quarenta anos depois, o CHC é foco de atenção em diferentes partes do mundo, sendo debatido por diferentes especialistas com justificadas razões. É considerado um dos tumores malignos mais comuns, sendo o sexto em incidência (749 mil casos novos), terceiro em mortalidade (692 mil casos) e corresponde a 7% de todas as neoplasias. Representa mais de 90% dos tumores primários do fígado, sendo um problema de saúde global. Está muito relacionado a fatores ambientais, tendo agentes etiológicos bem conhecidos como os vírus da hepatite B e C, uso abusivo de álcool e aflatoxinas. Ainda possui íntima relação com a cirrose hepática, considerada seu principal fator de risco. Os grandes avanços dos métodos diagnósticos por imagem possibilitam a detecção precoce do tumor de forma não invasiva com boa acurácia. Quando diagnosticado de forma precoce, pode ser tratado de maneira radical e efetiva, melhorando seu prognóstico15,16. O carcinoma hepatocelular possui variáveis epidemiológicas peculiares, apresenta fatores etiológicos compartilhados globalmente de maneira diversa e um comportamento carcinogênico complexo, motivo pelo qual as características do CHC, incidência, apresentação clínica, evolução natural e prognóstico são distintos nas mais diferentes regiões mundiais. Sua incidência é avaliada em aproximadamente 700 mil casos por ano, com grande variação geográfica. É a neoplasia maligna mais prevalente em homens em regiões africanas e do sudoeste asiático, mais frequente em países tropicais subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, com exceção do Japão, que apresenta alta incidência. Cerca de 80% dos 6 casos estão localizados na África e sudoeste asiático, com destaque para a China. Sua incidência vem se elevando em algumas áreas do mundo, devido, principalmente, à maior longevidade dos pacientes cirróticos e aumento dos pacientes portadores do vírus da hepatite C. Áreas do sudoeste asiático e regiões africanas têm reduzido sua incidência, associada a programas de vacinação para hepatite B e contaminação alimentar por aflatoxinas17,18,19. Contudo, na África e sudoeste asiático, o principal fator etiológico é a infecção crônica pelo vírus B (60%), enquanto que no mundo ocidental apenas 20% dos casos são atribuídos à infecção pelo vírus B, ficando a hepatite C como agente causal em destaque. Em todo o mundo, 54% dos casos de CHC estão associados à hepatite B, que afeta 400 milhões de pessoas, estando 31% relacionados à hepatite C, que atinge 170 milhões de pessoas em todo o planeta, ficando 15% dos casos associados a outros fatores15. A predominância do CHC é maior no sexo masculino, em decorrência de inúmeras variáveis. Homens têm maior prevalência de hepatite B e de cirrose, são mais expostos a toxinas do meio ambiente, mais ocorrência de alcoolismo, acúmulo de ferro e fatores hormonais. A relação homem/mulher pode atingir 8:1 em algumas áreas de incidência elevada, como o sudoeste asiático e a África. Em áreas de baixa ocorrência do tumor e em pacientes não cirróticos, essa relação tende à igualdade, ficando em 1,8:1. A idade, de maneira semelhante, possui variáveis geográficas, sendo menor em áreas de maior incidência e mais elevada em regiões de pequena ou média incidência. Possivelmente, a transmissão vertical do vírus B e sua contaminação precoce na Ásia, e contaminação por aflatoxinas na África explicam a média de idade baixa nessas regiões. Por outro lado, a infecção pelo vírus C ocorrendo em idade mais elevada explica a média etária mais elevada em áreas como o Japão. A raça aparentemente não possui papel de destaque no desenvolvimento do CHC20,21. A associação com a cirrose é destaque na história natural do CHC. Em cerca de 90% dos casos, esse tumor ocorre em cirróticos, sendo que aproximadamente 30% dos indivíduos 7 com cirrose evoluem para CHC, em associação com sua etiologia. No Brasil, estudo de Carrilho e colaboradores22 evidenciou que a cirrose estava presente em 98% dos pacientes analisados com diagnóstico de CHC, sendo a hepatite crônica pelo vírus C o principal fator etiológico em 54% dos indivíduos cirróticos. A cirrose, independente de causa, é fator predisponente para o desenvolvimento do CHC, e todo o paciente com cirrose é considerado sobre risco, sendo rara a ocorrência dessa patologia em fígados normais. A presença de cirrose não é fator obrigatório nos casos de CHC. Em modelos experimentais de camundongos transgênicos para o vírus da hepatite B e C, ocorre o surgimento de tumor sem cirrose. Em casos de CHC em fígado não cirrótico, são observadas frequentemente outras alterações histológicas, tais como: inflamação crônica, esteatose, graus variados de fibrose e excesso de ferro. A ocorrência de CHC em fígado totalmente normal é fato raro. O CHC é uma patologia multifatorial e que apresenta uma fisiopatogenia ímpar. Inúmeros fatores causais podem atuar de forma isolada ou conjuntamente para o desenvolvimento da enfermidade, alguns com atuação carcinogênica direta e outros indiretamente, como coadjuvantes dessa patologia. A diferente atuação dos fatores etiológicos tem relação com as diferentes áreas geográficas e seus comportamentos biológicos diversos nessas regiões. O CHC é um tumor com fatores etiológicos bem definidos. Os fatores: infecção crônica pelo vírus da hepatite B e C, contaminação alimentar pelas aflatoxinas, uso exagerado de álcool e doenças metabólicas, com principal destaque para a esteato-hepatite não alcoólica, estão relacionados à cirrose, patologia precursora que, na maioria dos casos, antecede o tumor23,24. Um terço dos pacientes cirróticos irão desenvolver CHC durante a vida. Estudos de follow-up longo demonstraram que aproximadamente 1 a 8% dos cirróticos por ano desenvolvem CHC, sendo cerca de 2% ocorrendo em cirróticos infectados pelo vírus B e 3 a 8% dos cirróticos infectados pelo vírus C. Recentes estudos vêm demonstrando que a 8 incidência do CHC vem aumentando com o aumento da pressão portal e o grau de rigidez hepática medida à elastografia25,26,27. Desde a década de 1970, existem evidências da associação causal entre o vírus da hepatite B e o CHC. Destacam-se a distribuição geográfica semelhante, uma vez que onde ocorre uma grande incidência de CHC existe uma grande prevalência do vírus B, uma maior prevalência de HBsAg em indivíduos portadores de CHC quando comparado à população em geral e a redução significativa da incidência do CHC em áreas onde o programa de vacinação contra a hepatite B foi difundido, como ocorre na experiência de Formosa. Inúmeros estudos identificaram fatores relativos ao vírus B como preditor chave para o desenvolvimento do CHC em pacientes com hepatite B crônica. A presença do vírus da hepatite B, soropositividade para antígeno e, carga viral alta e genótipo C são preditores independentes para o surgimento do CHC28,29,24,30. Outros fatores também influenciam o surgimento do tumor, como sexo masculino, idade elevada, transmissão vertical, coinfecção com vírus C ou delta e abuso de álcool. A vacinação contra o vírus B é a forma mais efetiva de prevenção contra o vírus e o CHC. Estima-se que a vacinação de rotina na infância, com a primeira dose ao nascer, pode prevenir até 85% das mortes relacionadas ao vírus B. O tratamento antiviral para hepatite B crônica deve seguir os protocolos estabelecidos. Interferon, lamivudina, adefovir, entecavir, telbivudina e tenofovir estão disponíveis para o tratamento do vírus B, mas informações acerca de sua ação na prevenção secundária no seguimento a longo prazo somente estão disponíveis para interferon e lamivudina. Estudos observacionais analisando o efeito do interferon demonstram um potencial efeito na redução da incidência de CHC23. Similarmente, um estudo randomizado e controlado realizado por Liaw e colaboradores31, avaliando o efeito da lamivudina, demonstrou uma redução significativa na incidência de CHC. 9 A vinculação etiológica entre o vírus da hepatite C e o CHC é forte, sendo o RNA do vírus encontrado no soro, fígado e tecido tumoral. Em termos mundiais, o papel do vírus C na etiologia do CHC somente é superado pelo vírus B. O período de tempo entre o contágio pelo vírus C e o aparecimento do CHC geralmente é superior a 30 anos, com risco anual alternando entre 1% e 8%32,33. O risco de desenvolvimento do CHC em portadores de hepatite C está associado a características do indivíduo, do ambiente e do próprio vírus. Sexo masculino, idade avançada, coinfecção com vírus B, ingestão de álcool (>50g dia), obesidade, coinfecção com HIV, genótipo 1 e carga viral elevada são cofatores nessa relação. O tempo de duração da infecção pelo vírus C é relevante, uma vez que é necessário um longo período para ocorrência de cirrose e desenvolvimento do tumor. Na associação do vírus C e CHC, a cirrose está presente na absoluta maioria dos casos. Metanálise realizada por Singal e colaboradores sugeriu que o risco de CHC é menor em pacientes com vírus C que atingiram uma resposta virológica sustentada com terapia antiviral com interferon e ribavirina34. Caso o paciente seja cirrótico, não há evidências conclusivas de que a terapia antiviral possa prevenir ou atrasar o surgimento do tumor35,36. A manutenção da terapia com PEG-interferon em cirróticos não reduziu significativamente a incidência de CHC, de acordo com os estudos HALT-C e EPIC37,38,39. O potencial efeito preventivo dos inibidores de protease (telaprevir e boceprevir) deverá ser testado em futuros estudos. Aflatoxinas são carcinogênios para os seres humanos e animais, sendo produzidas especialmente por Aspergilus flavus. Os alimentos envolvidos são normalmente grãos, tais como trigo, soja, arroz, milho e amendoim. As aflatoxinas são potentes carcinogênios, principalmente a B1 que, ao ser metabolizada em 8,9 epóxido, irá se ligar ao DNA produzindo mutação no gene p53. Achados epidemiológicos que demonstraram a associação entre contaminação e desenvolvimento tumoral, e evidências moleculares, como a capacidade de gerar mutações no gene TP53, inativando o gene supressor tumoral, relacionam a 10 contaminação por aflatoxinas e o desenvolvimento do CHC. Na África e no sudoeste asiático, a mutação no gene TP53 ocorre entre 30% a 60% dos casos de CHC, sendo que nessas regiões existe uma associação entre a contaminação por aflatoxinas e a infecção pelo vírus da hepatite B, aumentando o risco de desenvolvimento tumoral. Em estudos liderados por Nogueira e Carvalho, a mutação do gene TP53 foi encontrada em 24% e 28% dos casos de CHC diagnosticados no Brasil nas cidades de Vitória e São Paulo respectivamente40. O etanol (álcool etílico) não possui ação carcinogênica direta, contudo, sua ingestão excessiva e por tempo prolongado eleva o risco de CHC. A maior prevalência de CHC em etilistas crônicos está associada a alguns cofatores. O etanol eleva a produção e absorção de substâncias potencialmente cancerígenas, facilitando mutações por reduzir o reparo no DNA, ocasionando instabilidade cromossômica, diminuindo a resposta imunológica e causando deficiências nutricionais como vitamina E e retinol, facilitando o desenvolvimento tumoral. Também interage com os vírus das hepatites B e C, elevando o poder carcinogênico desses vírus. A incidência de CHC é maior em alcoolistas HBsAg positivo e anti-HCV positivo, indicando uma carcinogênese mais acelerada. O etanol é uma das principais causas de cirrose, que, por sua vez, é condição pré-neoplásica independente de fator etiológico. O álcool etílico pode ser, portanto, causa primária de CHC, sobretudo em cirróticos, atuando como cofator e elevando o risco do surgimento do tumor em portadores da hepatite crônica pelo vírus B e C41. A esteato-hepatite não alcoólica é uma doença hepática prevalente, sendo causa de cirrose. Possui associação com outras doenças metabólicas como obesidade e diabetes tipo 2. Estudos indicam que a obesidade e a diabetes tipo 2 são fatores de risco para CHC, embora o mecanismo pelo qual essas patologias contribuem para o desenvolvimento desse tumor ainda não esteja totalmente esclarecido42,43. Indivíduos com hemocromatose hereditária possuem elevado risco de desenvolver CHC, principalmente quando se encontram em fase cirrótica. O 11 ferro induz lesão hepatocitária, com necrose e regeneração, levando a dano oxidativo ao DNA. Outras patologias metabólicas como porfiria cutânea tarda, deficiência de alfa-1antitripsina e doença de depósito do glicogênio têm associação com CHC. Na hepatite autoimune, doença de Wilson e cirrose biliar primária, o risco de desenvolvimento de CHC é menor. Achados epidemiológicos ligando o consumo de tabaco e a ocorrência de CHC eram tradicionalmente conflitantes. Contudo, evidências recentes suportam que o fumo é cofator no surgimento desse tumor, estando os tabagistas pesados sobre maior risco quando comparados aos não fumantes44,45. Na população em geral, a incidência de CHC está aumentando entre pacientes HIV positivos quando comparados aos controles, e o HIV parece ser um cofator aditivo, elevando o risco para CHC em pacientes portadores de hepatite viral crônica46. O CHC é uma condição que necessita de rastreamento, sendo pacientes sobre risco facilmente identificados dentre os portadores de doenças hepáticas crônicas e hepatites virais. No mundo ocidental, o CHC surge em fígado cirrótico em cerca de 90% das vezes e a cirrose, por si só, é uma doença progressiva que afeta a sobrevida do paciente. Estudos de custoefetividade indicam que uma incidência de 1,5% por ano ou superior autorizariam a realização de rastreamento em pacientes cirróticos, independente da etiologia47. Também poderia ser possível identificar pacientes cirróticos com baixo risco para desenvolver CHC e excluí-los do rastreamento, reduzindo custos, embora essa conduta ainda não tenha sido provada48,49. Em contrapartida, pacientes com cirrose em estágio avançado (Child-Pugh C) impedem a aplicação de patologias potencialmente curativas e, portanto, o rastreamento, para esses pacientes, não seria custo-efetivo50. Como exceção, pacientes em lista de espera para transplante hepático, independente de seu estado funcional hepático, devem estar sob vigilância para CHC no intuito de detectar lesões tumorais que excedam os padrões convencionais e auxiliar na definição de políticas de priorização ao transplante. 12 Pacientes portadores de hepatite crônica pelo vírus B estão sobre risco de desenvolver CHC mesmo na ausência de cirrose. Nesses casos, o valor de corte recomendado para a taxa de incidência anual, acima do qual o rastreamento deve ser realizado, não se aplica. Infelizmente, existem informações escassas e, em algumas vezes, contraditórias a respeito da incidência de CHC em pacientes não cirróticos com hepatite crônica pelo vírus C. Estudo de Lok e colaboradores51 apontou a ocorrência de CHC em pacientes com hepatite C crônica com fibrose em ponte (F3) sem a presença de cirrose. Uma vez que a transição entre fibrose e cirrose muitas vezes não pode ser definida de maneira acurada, a Associação Europeia para o Estudo do Fígado (EASL) foi levada a recomendar em seus protocolos a vigilância também em pacientes com fibrose em ponte (F3). Informações referentes à incidência de CHC em pacientes não cirróticos portadores de doenças hepáticas não virais, tais como esteato-hepatite alcoólica e não alcoólica, hepatite autoimune, hemocromatose hereditária e doença de Wilson é escassa52,53. Certamente, portadores de doenças hepáticas metabólicas que levam a cirrose devem ficar sob vigilância, embora o risco de desenvolver CHC não esteja estabelecido em não cirróticos54. O CHC muitas vezes é diagnosticado em fase avançada, quando nenhuma terapia é eficaz, aumentando a sobrevida do paciente. Nos últimos 20 anos, com a possibilidade do diagnóstico precoce do CHC, a história natural do tumor passou a ser mais bem conhecida, e conceitos equivocados sobre sua evolução foram abandonados, como, por exemplo, a ideia de que seu crescimento era sempre rápido e que o CHC era sempre fatal. De fato, seu crescimento é lento nas fases iniciais. Na verdade, o CHC é uma das neoplasias com crescimento mais lento, com doubling time (tempo para a lesão dobrar seu tamanho) variando de 1 a 19 meses, com média de seis meses. Foi estimado o tempo que o tumor levaria para crescer de 1 a 10 cm, podendo variar de 10 meses a 10 anos. Recentemente, foi estabelecida uma diferenciação entre o CHC muito precoce (very early) e CHC pequeno (small). O CHC 13 muito precoce é normalmente hipovascular, com bordas pouco definidas e sem invasão venosa. É difícil diferenciá-lo de nódulos com displasia de alto grau. Nódulos neoplásicos pequenos, com menos de 1,5cm, são indistintos, não sendo detectados com lesão hipervascular no exame radiológico contrastado. Por outro lado, o CHC pequeno tem margens definidas, comportamento padrão de CHC na imagem radiológica (hipervascular) e na histologia e, com frequência, apresenta invasão microvascular. O diâmetro tumoral no momento do diagnóstico não indica obrigatoriamente sua evolução55,21. Quando em estágio precoce, o tumor pode ser tratado de maneira efetiva, modificando a história natural da patologia. A importante evolução dos métodos de imagem permite o diagnóstico de lesões pequenas, estimulando a implantação de programas de detecção precoce utilizados universalmente17. O CHC, por ser uma patologia frequente, ter prognóstico ruim quando diagnosticado de forma tardia e, por outro lado, por ser tratado efetivamente quando detectado precocemente, apresentar uma população de risco conhecida, possuir tratamento eficaz que pode modificar a história natural do tumor e por seus exames de rastreamento serem de baixo custo e não invasivos, justificam, plenamente, os programas de detecção precoce55,21. O principal objetivo do rastreamento, mais do que o diagnóstico precoce, é a redução da mortalidade por CHC. Os testes que podem ser aplicados nesse rastreamento são exames sorológicos e de imagem. O exame de imagem mais difundido e utilizado no rastreamento é a ultrassonografia (US). A US possui uma acurácia diagnóstica aceitável quando aplicada como teste de rastreamento, com sensibilidade variando de 58% a 89% e especificidade maior do que 90%56,57. Metanálise recente incluindo 19 estudos demonstrou que o rastreamento com US detecta a maioria dos CHC antes de se apresentarem clinicamente, com sensibilidade de 94%. Contudo, a US foi menos efetiva na detecção de lesões em estágios precoces, com sensibilidade de 63%58. Em contrapartida, uma coorte japonesa, liderada por Sato et al.59, 14 incluindo 1.432 pacientes, demonstrou que uma US realizada por médico treinado resultou em detecção de lesões com tamanho médio de 1,6 ± 0,6 cm, com menos de 2% dos casos excedendo 3 cm. A performance da US no diagnóstico de lesões precoces é altamente dependente da habilidade do operador e da qualidade do equipamento. A recente introdução da US com contraste não pode provar, até o momento, a melhoria na capacidade da US em detectar tumores pequenos60. Testes sorológicos foram analisados no diagnóstico de CHC em estágios iniciais, incluindo a AFP, des-gamma-carboxi protrombina (dcp), a razão da AFP glicosilada e AFP total, alfa-fucosidase e glipican 3. A AFP é o marcador mais utilizado para o CHC. Sabe-se que níveis persistentemente elevados de AFP é fator de risco para o desenvolvimento de CHC e podem auxiliar a definir populações de risco61. Sua performance como teste diagnóstico não deve ser extrapolada para o cenário do rastreamento. Como teste sorológico para rastreamento a AFP tem uma atuação insatisfatória. Razões são apontadas para essa participação subótima. Níveis flutuantes de AFP em cirróticos podem representar flares das infecções por vírus B e C, exacerbação da hepatopatia de base ou progressão do CHC. Apenas uma pequena parcela dos tumores precoces apresenta-se com níveis de AFP alterada. Quando utilizada para diagnóstico, níveis de AFP de 20 ng/ml demonstraram boa sensibilidade, mas baixa especificidade, ao passo que, para níveis superiores a 200 ng/ml, a sensibilidade cai para 22% e a especificidade se eleva62. Assim, a US é o método mais apropriado para ser aplicado no rastreamento. A combinação com AFP não é recomendada, uma vez que um ganho de 6% a 8% na detecção não contrabalança a elevação nos resultados falsos positivos63. Todos os outros marcadores foram avaliados como teste diagnóstico e não como de rastreamento. Até o presente, nenhum desses demais testes pode ser recomendado para o rastreamento de pacientes com risco de apresentar CHC. 15 Em relação ao tempo de intervalo do rastreamento, baseado no conhecimento acerca do tempo médio de duplicação do volume do CHC, seis meses representa uma escolha adequada64. Pelo fato de ocorrer uma variação entre diferentes pacientes, um intervalo de 3 meses no rastreamento foi proposto por protocolo japonês65. Contudo, o único estudo randomizado comparando 3 vs. 6 meses não demonstrou diferença66. Estudos de coorte comparando 6 e 12 meses demonstraram resultados semelhantes, enquanto estudos retrospectivos identificaram melhor resultado no rastreamento de 6 meses, principalmente em relação a progressão da lesão e sobrevida67,68. Metanálises de estudos prospectivos evidenciaram que a sensibilidade do rastreamento baseado na US diminuiu de 70% com intervalo de 6 meses para 50% com intervalo de 12 meses59. Atualmente, o diagnóstico de lesões precoces ocorre em torno de 30% a 60% dos casos em países desenvolvidos, permitindo a aplicação de terapias curativas. De fato, enquanto tumores com menos de 2 cm de diâmetro representavam menos de 5% dos casos no início da década de 1990 na Europa, representam, atualmente, mais de 30% dos casos no Japão. Essa tendência deve continuar a ocorrer em paralelo à implementação de novas políticas de rastreamento em países desenvolvidos69. Em 2005, a EASL e a Associação Americana para o Estudo do Fígado (AASLD) adotaram um novo padrão radiológico para o diagnóstico do CHC. Nódulos com características hipervasculares na fase arterial, achado radiológico tecnicamente chamado de enchimento rápido (wash in) e esvaziamento rápido (wash out) na fase venosa e tardia eram definidos como CHC70. Diagnóstico não invasivo era estabelecido por uma técnica radiológica para lesões acima de 2 cm que demonstravam padrão típico à imagem ou duas técnicas coincidentes para lesões entre 1 cm e 2 cm de diâmetro (tomografia computadorizada (CT) e ressonância magnética (RNM) com contraste ou US com contraste). A AFP foi abandonada como ferramenta no diagnóstico do CHC. Recente atualização do protocolo da AASLD, em 2012, propôs que uma técnica radiológica 16 (CT ou RNM) com achado típico do CHC é suficiente para o diagnóstico de lesões de 1 cm a 2 cm71. O diâmetro do nódulo é importante na prática clínica. Aproximadamente metade das lesões com menos de 1 cm não são malignas e a maioria dos nódulos acima de 2 cm já são CHC. A AASLD e a EASL sugerem, em seus protocolos, que nódulos menores de 1 cm sejam acompanhados por US a cada 3 a 4 meses. Ocorrendo crescimento ou modificação de características, essas lesões devem ser investigadas de acordo com seu diâmetro. Nódulos entre 1 e 2 cm devem prosseguir na avaliação, realizando uma ou duas técnicas radiológicas contratadas (CT ou RNM). Uma técnica radiológica é recomendada apenas em centros de excelência que utilizem equipamentos de última geração. Havendo achados radiológicos típicos (hipervascularização arterial e wash out na fase venosa/tardia) é feita a confirmação do CHC. Caso os achados não forem característicos ou coincidentes, o nódulo deve ser biopsiado. Se houver lesões maiores de 2 cm com padrão radiológico típico, o diagnóstico está confirmado, bastando uma imagem típica, não sendo necessária biópsia, reservada apenas para alterações radiológicas atípicas70,71. A classificação e estadiamento de tumores procuram estabelecer prognóstico e orientar o tratamento ideal para os pacientes. Inúmeros sistemas de estadiamento surgiram no intuito de fornecer uma classificação adequada ao CHC. A classificação padrão em oncologia, o estágio TNM, obtido da análise de uma série de pacientes submetidos à ressecção cirúrgica, possui limitações. Primeiramente, informações anatomopatológicas são necessárias para avaliar invasão microvascular, disponível somente nos pacientes tratados pela cirurgia (~20%). Além disso, não fornece informações relativas à função hepática ou ao status de saúde do paciente. Sistemas unidimensionais como a Classificação de Okuda e Classificação de Child-Pugh servem a propósitos distintos das classificações preditoras no CHC. As classificações europeias difundidas são a classificação francesa, a italiana CLIP (Cancer of 17 the Liver Italian Program) e a Classificação de Barcelona BCLC (Barcelona-Clínic Liver Cancer). Existem, também, duas classificações asiáticas, destacando-se a CUPI (Chinese University Prognostic Index) e a japonesa JIS (Japan Integrated Staging)72,73. O sistema proposto pelo Grupo de Barcelona (BCLC) tem sido muito aceito e utilizado por diferentes sociedades médicas no mundo. As razões que levam a essa ótima aceitação estão relacionadas às características dessa classificação. Inclui variáveis prognósticas relacionadas ao status tumoral, função hepática e performance status de saúde (ECOG), além de variáveis associadas ao tratamento obtidas de estudos de coorte e ensaios clínicos randomizados. A classificação BCLC é subdividida em 5 estágios (0, A, B, C, D) de acordo com variáveis prognósticas pré-estabelecidas e terapias alocadas de acordo com o estágio. Portanto, fornece informações relativas aos preditores prognósticos e alternativas terapêuticas72,74,75. O estágio muito precoce do CHC (BCLC estágio 0) é definido pela presença de tumor único<2 cm de diâmetro sem invasão vascular ou satélite em pacientes com uma boa performance status (ECOG-0) e função hepática preservada (Child-Pugh A). Atualmente, 5% a 10% dos pacientes no mundo ocidental são diagnosticados neste estágio, enquanto no Japão o nível é de 30%, devido à disseminação de programas de rastreamento76. Estudos recentes demonstraram que a sobrevida em 5 anos é de 80 a 90% em pacientes submetidos à ressecção cirúrgica ou transplante hepático, e 70% com tratamento ablativo local dessas lesões77,78. Até o presente momento, nenhum ensaio clínico randomizado com esse desenho foi descrito e estudos de coorte sofrem por apresentar viés de seleção. O estágio precoce do CHC (BCLC estágio A) é definido pela apresentação de lesão tumoral única > 2 cm ou 3 nódulos < 3 cm de diâmetro, ECOG-0 e Child-Pugh A ou B. A sobrevida média é de 50 a 75% cinco anos após a resseção, transplante ou terapia ablativa local em candidatos selecionados. Variáveis relacionadas à função hepática são relevantes aos 18 candidatos à ressecção tumoral. Ausência de evidência clínica de hipertensão portal e bilirrubinas normais são preditores chave para a sobrevida de pacientes com tumores únicos que vão à ressecção. Da mesma forma, a classificação Child-Pugh A é a variável prognóstica mais importante em pacientes submetidos à ablação local, juntamente com o diâmetro tumoral e a resposta ao tratamento. Uma vez que o transplante hepático pode potencialmente curar a lesão tumoral e, simultaneamente, a cirrose, as variáveis relativas ao CHC tornaram-se fatores prognósticos bem estabelecidos (tumor único ≤ 5 cm ou 3 nódulos ≤ 3 cm) e definem o chamado critério de Milão79,80. O estágio intermediário do CHC (BCLC estágio B) é caracterizado pela presença de tumores multinodulares assintomáticos sem invasão vascular ou metástases, apresenta sobrevida média de 16 meses ou 49% aos 2 anos81. A quimioembolização prorroga a sobrevida desses pacientes para 19 a 20 meses, de acordo com ensaios clínicos randomizados e metanálises. No entanto, os preditores de desfecho são heterogêneos na subclassificação BCLC estágio B, com variações de sobrevida de 36 a 45 meses para os melhores respondedores à quimioembolização em séries recentes, a 11 meses nos cenários mais negativos em indivíduos não tratados (braço placebo do estudo SHARP pacientes BCLC estágio B).80 Metanálise recente de ensaios clínicos randomizados analisando desfecho de pacientes no braço controle sugerem que ascite, que é contraindicação a quimioembolização, é o pior fator prognóstico para essa subclasse81. O estágio avançado do CHC (BCLC estágio C) é composto por pacientes com sintomas clínicos relacionados ao tumor (ECOG 1-2), invasão macrovascular segmentar ou portal, disseminação extra-hepática, seja por envolvimento de linfonodos ou metástases à distância e apresentam um prognóstico negativo, com sobrevida média de seis meses ou 25% em 1 ano80,81. Obviamente, esses desfechos variam de acordo com a função hepática e outras variáveis. Pacientes com função hepática preservada (Child-Pugh A) possuem uma sobrevida 19 média de 7 meses, enquanto indivíduos com função hepática comprometida (Child-Pugh B) apresentam sobrevida média de 5 meses. Até meados dessa década, não havia tratamentos aprovados de primeira linha para pacientes com CHC avançado. Esse cenário mudou com a publicação dos resultados do estudo SHARP, que demonstrou benefícios na sobrevida de pacientes com CHC avançado que receberam Sorafenib, um inibidor multiquinase, significando os resultados deste ensaio clínico randomizado uma verdadeira quebra de paradigma no manejo do CHC. A sobrevida média no braço Sorafenib foi de 10,7 meses, com variação de 14,7 meses nos pacientes BCLC classe B e 9,5 meses nos BCLC classe C.82 O estágio terminal do CHC (BCLC estágio D) é representado por pacientes com lesão tumoral avançada e de grande volume, uma performance status pobre (ECOG 3-4) e um comprometimento importante da função hepática (Child-Pugh C). A sobrevida média é de 3 a 4 meses ou 11% em um ano72,81. Vários fatores modificam o prognóstico do CHC. O diâmetro do tumor ao diagnóstico, o padrão de crescimento, o tipo macroscópico (encapsulado ou infiltrativo), o tipo histológico, a localização, a idade e o estado clínico do paciente, e a função hepática. Pacientes não cirróticos tem uma evolução, teoricamente, mais favorável, embora o diagnóstico ocorra, muitas vezes, em fase avançada, reduzindo as chances de um tratamento efetivo. A influência do padrão histológico bem e mal diferenciado é questionável. Contudo, sabe-se que o tumor do tipo histológico fibrolamelar possui um prognóstico melhor quando comparado ao CHC típico. Pacientes clinicamente sintomáticos apresentam prognóstico negativo, evoluindo para o óbito em média três meses após sua detecção e com sobrevida em 5 anos extremamente baixa (2% a 6%)49. No CHC, nenhuma subclasse molecular foi descrita como resposta a uma terapia especificamente direcionada. Contudo, importantes avanços ocorreram no entendimento da patogênese e das subclasses moleculares envolvidas nessa patologia no decorrer da última 20 década. Do ponto de vista biológico, diferentes classes tumorais foram caracterizadas, incluindo a subclasse Wnt, uma classe proliferativa, com duas subclasses (S1-TGF-beta e S2EpCAM positivo) e uma classe inflamatória. Amostras obtidas de diferentes partes de um nódulo tumoral demonstraram classes idênticas de estratificação em 95% dos casos. Igualmente relevante, o perfil genético do tecido não tumoral adjacente à lesão define dois subgrupos de desfecho favorável ou não favorável. Estudos futuros são necessários para confirmar a importância prognóstica dessas subclasses83,84. Historicamente, o diagnóstico do CHC ocorria quando a patologia já estava avançada e o paciente sintomático apresentado disfunção hepática. Neste estágio avançado, praticamente nenhum tratamento apresentava chance de ser efetivo ou de elevar, significativamente, a sobrevida. Além disso, a morbidade associada à terapia, usualmente limitada à ressecção cirúrgica e quimioterapia sistêmica, era inaceitável. Atualmente, muitos pacientes são diagnosticados em estágios iniciais, quando a função hepática está preservada e não existem sintomas associados ao CHC. No cenário atual, existem diversas opções terapêuticas que impactam positivamente na sobrevida dos pacientes. Contudo, para se atingir os melhores resultados, exige-se uma cuidadosa seleção de pacientes para cada uma das opções terapêuticas e uma aplicação adequada das mesmas85,86. Em oncologia, os benefícios terapêuticos devem, idealmente, ser alcançados por meio de ensaios clínicos randomizados e metanálises. Poucas intervenções médicas foram testadas exaustivamente no tratamento do CHC em comparação com outras neoplasias de prevalência mundial. Assim, a força das evidências da maioria das intervenções no CHC está muito aquém dos demais tumores mais prevalentes no mundo. É importante destacar que o nível de evidência dessas alternativas terapêuticas está limitado a estudos de coorte e alguns ensaios clínicos randomizados, a maioria dos quais estão associados ao tratamento da doença avançada. Não existem estudos grandes e robustos que comparem tratamentos considerados 21 efetivos para doença em estágio inicial (ressecção cirúrgica, transplante, ablação percutânea), assim como não há estudos comparando esses métodos a nenhum tratamento. Portanto, o grau de evidência de qualquer intervenção no CHC deve ser avaliado com cautela87. A cirurgia é base do tratamento do CHC. A ressecção cirúrgica e o transplante hepático atingem os melhores resultados em candidatos selecionados adequadamente (sobrevida em 5 anos de 60-80%). A ressecção hepática é o tratamento de escolha para o CHC em pacientes não cirróticos (5% dos casos no Ocidente e 40% na Ásia) e cirróticos com lesão tumoral única sem hipertensão portal, quando grandes ressecções podem ser realizadas com baixo risco de complicações fatais e com desfechos aceitáveis (sobrevida em cinco anos 30 a 50%). O painel atual associado à ressecção de CHC em pacientes cirróticos tem se mostrado favorável. Uma taxa de sobrevida em cinco anos de 60%, uma mortalidade perioperatória de 2-3% e uma necessidade de hemoderivados abaixo dos 10%.82,78 A ressecção anatômica objetivando uma margem de segurança de 2 cm proporciona um resultado de sobrevida superior quando comparado a margens inferiores à 1 cm88,89. A seleção dos candidatos ideais envolve uma adequada avaliação da reserva funcional hepática, da extensão tumoral e da presença de hipertensão portal (gradiente de pressão portal ≥10 mmHg) por meio de critérios clínicos ou cateterização venosa hepática. O conceito de hipertensão portal como fator prognóstico em pacientes submetidos à ressecção foi recentemente validado na Ásia. A medida alternativa de hipertensão portal inclui duas variáveis. A contagem de plaquetas abaixo de 100.000/mm3 está associada à esplenomegalia. A contagem de plaquetas foi recentemente confirmada como preditor independente de sobrevida em casos de ressecção de CHC. Na prática, a seleção de pacientes com gradiente de pressão portal <10 mmHg, ou ausência de medida alternativa indicativa de hipertensão portal (varizes esofágicas, esplenomegalia com plaquetas abaixo de 100.000/mm3) acarreta em uma taxa de ressecção menor do que 10%. Estudos recentes demonstram que uma concentração de 22 normal de bilirrubinas e ausência de hipertensão portal clinicamente significativa são os melhores preditores de desfecho favorável após a cirurgia com praticamente nenhum risco de disfunção hepática no pós-operatório. Esses pacientes não irão descompensar após a cirurgia e podem atingir uma sobrevida em cinco anos de até 70%. Em contraste, a maioria dos indivíduos com hipertensão portal significativa irá descompensar no pós-operatório, com uma sobrevida em cinco anos menor que 50%90. Alguns grupos sugerem a realização de embolização pré-operatória da veia porta nos ramos que abastecem a porção do fígado que será ressecada, no intuito de aumentar o volume hepático residual caso uma ressecção maior esteja prevista. Essa conduta está associada a uma taxa de complicação de 10-20% e ocorrência de hipertensão portal severa em 1% dos pacientes cirróticos. Contudo, a eficácia da embolização pré-operatória dos ramos portais em pacientes cirróticos portadores de CHC ainda não foi adequadamente testada em grandes estudos controlados. Em pacientes devidamente selecionados de acordo com o status da função hepática, os principais preditores de sobrevida são o diâmetro tumoral, o número de lesões, a presença de lesões satélites e a invasão vascular. A ultrassonografia intraoperatória permite a detecção de nódulos entre 0,5 cm e 1 cm, sendo considerada o padrão para descartar a presença de nódulos adicionais e guiar a ressecção anatômica. Após a ressecção, a taxa de recorrência é de 70% em cinco anos, incluindo recorrência por disseminação e tumores de novo. O principal preditor de recorrência é a presença de invasão microvascular e a presença de tumores adicionais à lesão primária. Não há terapia adjuvante efetiva que possa reduzir as taxas de recorrência. Uma vez que os preditores mais acurados de recorrência tumoral (invasão microvascular e lesões satélites) são identificados na patologia e que o resultado do transplante nesses pacientes é bom, alguns autores sugerem que esses pacientes sejam imediatamente listados após a ressecção tumoral91,92. 23 Algumas estratégias foram desenvolvidas em estudos randomizados na tentativa de prevenir e tratar a recorrência tumoral pós-ressecção cirúrgica. O Interferon é a droga mais frequentemente analisada até o momento. Diferentes metanálises avaliaram o efeito adjuvante do tratamento com Interferon93. Em análise incluindo 13 estudos (9 pequenos ensaios clínicos randomizados) houve uma melhora significativa no intervalo livre de doença com uso de Interferon (54% versus 30% placebo em 3 anos). Em ensaio clínico randomizado liderado por Mazzaferro, utilizando Alfainterferona em 150 pacientes, resultados negativos foram obtidos. Considerando a informação disponível, não é recomendada a terapia adjuvante com Interferon devido à ausência de um número significativo de pacientes e a resultados parcialmente conflitantes94. Outras estratégias envolvendo quimioterapia, quimioembolização, radioterapia, terapias imunológicas e retinoides não trouxeram benefício na prevenção da recidiva tumoral. Embora a ressecção cirúrgica seja o tratamento curativo de escolha, menos de 20% dos pacientes são candidatos a essa técnica, reservada para pacientes com lesão tumoral única, ausência de hipertensão portal e nível normal de bilirrubinas. Caso esses critérios não sejam preenchidos, o paciente é considerado para o transplante hepático ou terapias ablativas locais. As terapias ablativas locais não apresentam efeito ou tem efeito negativo na função hepática. Como não existe tratamento clínico efetivo para o CHC, a ressecção tumoral ou sua destruição é a única chance de cura95. O transplante hepático é o tratamento de escolha para pacientes com pequenos tumores multinodulares (≤ 3 nódulos ≤ 3 cm) ou com tumores únicos≤5 cm e doença hepática avançada. Em teoria, o transplante pode curar simultaneamente o tumor e a doença de base (cirrose). O amplo critério de seleção adotado há duas décadas apresentava resultados negativos com recorrência de 32-54% em 5 anos e sobrevida em 5 anos menor que 40%, mas permitiu identificar os melhores candidatos para o procedimento96. Seguindo este conceito e os melhores candidatos selecionados apresentavam sobrevida em 5 anos de 70% com recidiva 24 abaixo de 15%. Um divisor de águas foi o estudo de Mazzaferro e colaboradores, em 1996,97 que definiu o transplante hepático como alternativa para o tratamento do CHC. Foi demonstrado que quando o transplante era restrito a pacientes com CHC precoce (um tumor ≤ 5 cm ou até 3 tumores todos ≤ 3 cm, sem invasão vascular ou metástases) a sobrevida em 5 anos era de 75%, semelhante a dos pacientes cirróticos sem CHC. O critério criado por Mazzaferro e colegas98 tornou-se o critério de Milão e tem sido aplicado mundialmente para seleção de pacientes com CHC para o transplante hepático. Uma análise sistemática incluindo 90 estudos compreendendo um total de 17.780 pacientes ao longo de 15 anos, identificou o critério de Milão como fator prognóstico independente para desfecho em transplante hepático. A sobrevida em cinco anos dos pacientes que estão dentro do critério de Milão (65-78%) foi semelhante se comparada a pacientes cirróticos sem CHC, de acordo com os dados dos registros europeus e americanos (65-78%).98 Como consequência de seu sucesso, o critério de Milão passou a integrar o sistema de estadiamento BCLC e pré-transplante da UNOS para alocação de órgãos nos EUA, e permanece como exemplo a ser seguido para todos os outros critérios prognósticos propostos para expansão das indicações de transplante hepático em cirróticos com CHC99. O grande obstáculo ao transplante hepático no tratamento dos indivíduos com CHC é a escassez de órgãos. O longo tempo de espera em lista acarreta maiores taxas de retirada de lista (dropout), seja por progressão tumoral, piora clínica do paciente ou óbito. Na análise de intenção de tratamento, o aumento do tempo em lista resulta na retirada de lista de, aproximadamente, 20% dos candidatos ao transplante. Caso o tempo de espera seja de dois meses, a sobrevida em dois anos é de 84% no grupo submetido ao transplante, contudo, se for superior a cinco meses, a sobrevida reduz para 54% mesmo entre os indivíduos que se enquadram no critério de Milão100,73. O aumento no número de doadores, a utilização de terapias locorregionais para o controle tumoral, a criação de políticas de prioridade para 25 pacientes com CHC, a expansão dos critérios de indicação de transplante, o downstaging das lesões tumorais e a utilização de doadores vivos no transplante hepático são esforços com objetivo de melhorar as taxas de sobrevida dos pacientes com CHC em lista de transplante e reduzir o dropout. O longo tempo de espera e as elevadas taxas de dropout levaram os centros transplantadores a desenvolver condutas orientadas para o tratamento do CHC em pacientes listados, procurando, dessa forma, impedir a progressão tumoral. Terapias neoadjuvantes para pacientes incluídos no critério de Milão em lista de transplante hepático são utilizadas neste sentido. As modalidades mais aplicadas atualmente são a ablação por radiofrequência, a injeção percutânea de etanol (PEI) e a quimioembolização arterial (TACE). Existe falta de informações consistentes provenientes de ensaios clínicos randomizados e o potencial benefício decorrente de ablação local ou quimioembolização é oriundo de estudos observacionais e análises de custo-efetividade. Os principais estudos analisando tratamentos neoadjuvantes são séries de casos, caso-controle e estudos de coorte que demonstraram que a ablação por radiofrequência atinge melhores níveis de necrose completa (12-55%) quando comparada com quimioembolização (22-29%)101,102. O impacto dessas terapias na taxa de retirada de lista (dropout), recorrência e sobrevida é apenas estimado a partir de estudos não randomizados. Estudos iniciais descreviam uma taxa de dropout em um ano de 15-30%100,79. As séries de caso e estudos de coorte apontaram um impacto favorável do tratamento neoadjuvante em reduzir o dropout para níveis que variavam de 0-25%102. Majno e colaboradores101 publicaram estudo seminal de caso-controle incluindo casos tratados e controles pareados que indicou uma taxa de sobrevida similar aos indivíduos não tratados. Análise de custo-efetividade baseado no modelo de Markov apontou benefícios para a terapia neo-adujante quando o tempo de espera em lista ultrapassasse seis meses103. O real efeito da terapia locorregional no desfecho e sobrevida dos pacientes é incerto. Portanto, considerando- 26 se as evidências disponíveis, é recomendado o tratamento de pacientes em lista com ablação local e como segunda opção a utilização da quimioembolização quando o tempo de espera está estimado em mais de seis meses104. A UNOS desenvolveu, em 2002, um sistema de priorização para administrar a lista de espera para o transplante hepático utilizando com base o escore MELD, que originalmente foi desenvolvido para predizer a sobrevida em três meses de pacientes com doença hepática em estágio terminal105. Uma vez que o MELD é incapaz de predizer a de taxa dropout em pacientes com CHC, escores de prioridade foram atribuídos a esses pacientes. Estudos que analisaram o risco de progressão do CHC demonstraram que em pacientes com tumor único < 3 cm, é baixa a probabilidade de evoluir para além do critério de Milão em um ano, enquanto sujeitos com mais de um nódulo ou tumor de 3 a 5 cm possuem um índice de progressão de 50% em um ano106. Esses achados, associados ao longo tempo de espera em lista e a taxa de progressão tumoral, resultaram em modificação nos critérios de alocação de órgãos no Brasil em maio de 2006, país que, até então, considerava além da compatibilidade do sistema ABO a data de inscrição em lista, passou a utilizar o critério de gravidade. A pontuação MELD, um instrumento útil para se estimar a mortalidade em pacientes com cirrose, surgiu como ferramenta eficaz na alocação de órgãos. Uma das limitações do MELD é o fato de muitos pacientes com CHC apresentarem um escore baixo ao diagnóstico. Com objetivo de solucionar esse problema, os pacientes portadores de CHC passaram a receber, de forma arbitrária, uma pontuação MELD, com intenção de lhes proporcionar uma espera adequada para o transplante hepático. Assim, pacientes com CHC estágio T2 (um nódulo ≥ 2 cm ou três lesões ≤ 3 cm ), ao serem colocadas em lista, recebem uma pontuação de 20. Após três meses, caso estejam ainda em lista de espera do transplante, sobem para 24 e, em seis meses, para 29 pontos. Os pacientes colocados em lista que apresentarem CHC devem ser reavaliados a 27 intervalos de três meses, com US ou tomografia computadorizada, para avaliar possíveis alterações dos nódulos, metástases e considerar, eventualmente, a exclusão da lista de espera. A necessidade de otimizar um número limitado de órgãos disponível impulsionou a manutenção de um critério de seleção estrito, e, deste modo, apenas listar os pacientes com lesões iniciais com maior probabilidade de sobrevida após o transplante. Contudo, isto significa que alguns pacientes com lesões um pouco mais avançadas, nas quais o transplante poderia oferecer um resultado aceitável, mas não excelente, estão excluídos da lista. A análise da expansão dos critérios além de Milão e a redução (downstaging) para dentro dos limites do critério de Milão foi muito discutida. Para que um novo critério seja estabelecido, é fundamental que surjam informações embasadas relativas à nova categoria de pacientes a ser incluída, e que o impacto da expansão nos indivíduos não portadores de CHC, em lista de transplante, também seja considerado. O entendimento atual é que a expansão para o critério da Universidade de São Francisco (nódulo único ≤ 6,5 cm ou 2-3 nódulos ≤ 4,5 cm e diâmetro total do tumor ≤ 8 cm), que engloba cerca de 5-10% dos pacientes listados, já foi avaliado do ponto de vista patológico107. A principal preocupação relativa à proposta de expansão é o fato de haver falta de informações a respeito de sobrevida e de taxa de dropout da lista de espera dos pacientes fora do critério atual, mas que preenchem o critério expandido. Marcadores pré-operatórios de invasão vascular devem ser exigidos antes que seja adotado um novo critério. Em metanálise que avaliou o tamanho do tumor e número de nódulos, o limite da soma dos diâmetros superior a 10 cm foi considerado como fator que elevou em 4 vezes o risco de morte, enquanto uma combinação de volume tumoral e AFP foi considerada a melhor estratégia em outros estudos108. Considerando a evidência atual, é recomendado não permitir a expansão dos critérios de elegibilidade para transplante, exceto no contexto de protocolos de pesquisa. 28 Em relação ao downstaging, não existem ensaios clínicos randomizados, grandes estudos de caso-controle ou estudos de coorte bem desenhados disponíveis e que envolvam pacientes tratados de forma consistente e seguidos adequadamente. Pequenos estudos prospectivos sugerem que o downstaging para o critério de Milão de pacientes que possuam apenas doença hepática, quando tratados com radiofrequência ou quimioembolização, apresentam resultados de sobrevida em cinco anos semelhante àqueles dentro do critério de Milão109. Não há um limite superior para que um CHC seja elegível para o downstaging110. Considerando-se os dados atuais, o downstaging de pacientes diagnosticados com CHC além do critério de Milão não deve ser utilizada como ferramenta para melhorar a seleção dos mesmos. Contudo, a EASL considera que uma política especial deva ser adotada para pacientes já listados para transplante hepático com tumores que ultrapassem o critério de Milão e que possuam apenas doença no fígado. Nessa circunstância especial, sugere-se que o paciente seja colocado em espera até que o downstaging por meio de ablação ou quimioembolização ocorra e seja mantido por período mínimo de três meses. O transplante hepático com doador vivo utilizando-se o lobo direito de fígado saudável surgiu como alternativa ao transplante com doador cadáver111. Infelizmente, o risco de morte associado (0,3%) e de complicações graves (2%) para o doador saudável, diminuiu o interesse da comunidade científica. Devido à complexidade do procedimento, o transplante hepático com doador vivo deve ser realizado apenas em centros de excelência na realização de cirurgias hepáticas e transplantes. Os resultados do transplante com doador vivo, quando comparado ao transplante com doador cadáver, são controversos. Embora alguns estudos sugiram que o transplante com doador vivo esteja relacionado a um maior risco de recidiva, esses dados não foram confirmados92. Levando-se em conta o risco de dropout (4% ao mês), a expectativa de vida do receptor (70% em 5 anos) e o risco do doador (0,3% de mortalidade), 29 esse procedimento é considerado custo-efetivo quando o tempo de espera em lista exceder 7 meses112. A ablação local do CHC é considerada a primeira linha no tratamento de pacientes com lesões em estágio inicial, não elegíveis para terapia cirúrgica. A injeção percutânea de etanol (PEI) induz necrose da lesão por meio da desidratação celular, desnaturação proteica e oclusão química dos vasos tumorais. É uma técnica bem estabelecida no tratamento do CHC, atingindo necrose completa em 90% dos tumores < 2 cm, 70% naqueles entre 2-3 cm e 50% naqueles entre 3-5 cm113. Em pacientes cirróticos Child-Pugh A portadores de CHC em estágio inicial, o tratamento com PEI resultou em uma taxa de sobrevida em 5 anos de 4753%. A grande limitação dessa técnica é a alta taxa de recorrência local, podendo atingir 43% em lesões maiores de 3 cm114. A ablação por radiofrequência (RFA) produz energia térmica que acarreta necrose tumoral, levando ao surgimento de um anel de segurança no tecido peritumoral, podendo eliminar lesões satélites não detectadas. A RFA necessita de um menor número de sessões para ocasionar seu efeito antitumoral. Cinco ensaios clínicos randomizados compararam RFA versus PEI para o tratamento do CHC em estágio inicial. Esses trabalhos demonstraram que a RFA possui um maior efeito antitumoral quando comparada a PEI, levando a um melhor controle local da doença (recorrência local em 2 anos: 2-18% versus 11-45%)115. Em relação à sobrevida, os resultados são controversos. Uma vantagem na sobrevida favorável a RFA versus PEI foi demonstrada em estudo de Shiina e colaboradores115 que incluiu 232 pacientes, mas nenhuma diferença na sobrevida foi detectada em dois ensaios clínicos randomizados Europeus116. Três metanálises incluindo apenas ensaios clínicos randomizados confirmaram que o tratamento com RFA oferece um benefício na sobrevida quando comparado à PEI em tumores maiores que 2 cm. A grande deficiência da RFA é a maior taxa de complicações importantes (4%; 95%, CI, 1,8-6,4%) comparado à PEI (2,7%; 95% CI, 0,4-5,1%). 30 Analisando os dados da literatura, os melhores resultados obtidos com a RFA na sobrevida em 5 anos é de 40-70%117. Os melhores resultados foram obtidos em pacientes cirróticos ChildPugh A, com lesões tumorais únicas e pequenas, normalmente<2 cm. Pacientes Child-Pugh A com tumores pequenos não cirúrgicos, com expectativa de atingir uma resposta completa ao tratamento, são os candidatos ideais para RFA. Embora os tratamentos percutâneos possam promover bons resultados, eles não são capazes de atingir taxas de resposta comparáveis ao tratamento cirúrgico, mesmo quando aplicados como primeira opção terapêutica. Uma questão que persiste é se a RFA pode competir com a ressecção cirúrgica como tratamento de primeira linha em pacientes com CHC únicos e pequenos. Dois ensaios clínicos randomizados apresentaram resultados opostos118,119. Enquanto o estudo de Chen e colaboradores não identificou diferenças nos desfechos analisados, o estudo de Huang e colaboradores sugeriu uma vantagem na sobrevida dos pacientes submetidos à cirurgia. Estudos não controlados obtiveram os mesmos achados para ressecção e RFA em pacientes BCLC 0.77 Portanto, até o presente momento, não há dados que sustentem a RFA como substituta da ressecção cirúrgica como primeira linha no tratamento de pacientes com CHC em estágio inicial (estágio BCLC A). A quimioembolização (TACE) é o tratamento primário mais utilizado em CHC irressecável e recomendado como terapia de primeira linha para pacientes em estágio intermediário da doença120,82. O racional que justifica a TACE é o fato de a infusão intraarterial de agente citotóxico seguido por embolização do vaso sanguíneo alimentador do tumor resultar em efeito citotóxico e isquêmico intenso. Benefícios na sobrevida de pacientes foram obtidos em dois estudos, um dos quais identificou a resposta ao tratamento como preditor independente de sobrevida121,122. Uma metanálise incluindo sete ensaios clínicos randomizados, envolvendo um total de 516 pacientes, demonstrou um efeito benéfico na sobrevida na TACE em comparação ao grupo controle85. Análise de quatro estudos 31 evidenciou um efeito benéfico significativo da quimioembolização com cisplatina ou doxirubicina85. A sobrevida média de casos de CHC em estágio intermediário é de 16 meses, ao passo que, após TACE, a média é de 20 meses. Como resultado dessas avaliações, a TACE foi estabelecida como terapia padrão para pacientes portadores de CHC em estágio intermediário (BCLC B) e àqueles com CHC multinodular, com ausência de sintomas relacionados ao tumor e sem evidência de invasão vascular ou disseminação extra-hepática. Morte associada à TACE é esperada em menos de 2% dos casos adequadamente selecionados. Os melhores candidatos são pacientes com função hepática preservada e com CHC multinodular assintomático, sem invasão vascular ou disseminação extra-hepática122,123. Invasão vascular macroscópica, implantes extra-hepáticos e doença hepática descompensada são contraindicações definitivas para TACE. Estratégias que melhoram a atividade antitumoral e os benefícios clínicos com a quimioembolização estão sendo lançadas. Uma TACE ideal deve permitir uma concentração intratumoral sustentada do quimioterápico com menor exposição sistêmica, associado com obstrução vascular tumoral. A embolização com microesferas (TACE-DEB) tem a capacidade de concentrar agentes quimioterápicos e liberá-los de forma gradual em um período de sete dias. Esta estratégia demonstrou aumento da concentração local da droga com efeitos tóxicos sistêmicos mínimos124. Um estudo randomizado de fase II comparando TACE e TACE-DEB demonstrou uma redução significativa da toxicidade hepática e de efeitos adversos relacionados à droga no braço TACE-DEB, associado a um melhor efeito antitumoral não significativo125. Recentemente, o Sorafenib demonstrou benefício na sobrevida de pacientes com CHC avançado126. Sua molécula é um inibidor de multicinase que bloqueia diferentes vias de sinalização associadas à hepatocarcinogênese, principalmente a via Raf/MEK/ERK, por meio da inibição da Raf cinase e outras tirosinocinases, inibindo a angiogênse e proliferação 32 celular. Esse avanço denota uma quebra de paradigma no tratamento desta doença tão complexa, e comprova que terapias moleculares podem ser efetivas no tratamento desse tumor. O Sorafenib surge como o primeiro tratamento sistêmico efetivo do CHC em 30 anos de pesquisas e, atualmente, é a terapia de escolha para indivíduos com tumores avançados. Um inibidor multitirosina quinase de uso oral, sendo a primeira, e, até o momento, a única droga que demonstrou benefícios na sobrevida de pacientes com CHC avançado. Um grande estudo duplo-cego, placebo controlado, de fase III, foi conduzido, levando a resultados de sobrevida positivos126. Neste estudo, o benefício do Sorafenib foi elevar a média de sobrevida de 7,9 meses no grupo placebo para 10,7 meses no grupo Sorafenib (HR=0,69; 95% CI, 0,550,87, P = 0,00058), que representa uma queda de 31% no risco relativo de morte. Além disso, o Sorafenib demonstrou um benefício significativo em termos de tempo para progressão de doença, com média de 5,5 meses para Sorafenib e 2,8 meses para o placebo. A magnitude dos benefícios na sobrevida foi semelhante aos evidenciados no estudo de fase III da região ÁsiaPacífico127. É recomendado o uso de Sorafenib como terapia padrão no CHC avançado. Indicado para pacientes com função hepática preservada (Child-Pugh A) e com tumor avançado (BCLC C). Não há recomendação clara relativa a pacientes Child-Pugh B, embora estudos de coorte demonstrem um perfil de segurança semelhante em pacientes dessa classe sem descompensação128,129. O Sorafenib vem sendo testado em um cenário adjuvante após ressecção ou ablação local completa para lesões em estágios iniciais, e em associação com TACE para lesões em estágio intermediário. Dados preliminares de estudo de fase III sugerem um efeito aditivo potencial em combinação com doxirubicina130. Inúmeros avanços nas áreas da epidemiologia, diagnóstico e terapia do CHC foram conquistados nas últimas décadas. O melhor entendimento de sua hepatocarcinogênese possibilitou o reconhecimento de um grupo de indivíduos sobre risco de desenvolvimento dessa patologia e a criação de programas de rastreamento para seu diagnóstico precoce, 33 permitindo inúmeros avanços em sua terapia. A identificação de novos biomarcadores que possibilitem estabelecer o risco de câncer e sua detecção em estágios precoces é necessária. O transplante hepático, que permite o tratamento simultâneo da doença de base e do tumor, além da ressecção cirúrgica, permanecem como as principais alternativas terapêuticas para pacientes selecionados. Medidas que busquem reduzir a escassez de órgãos e a progressão tumoral são necessárias. Terapias ablativas percutâneas e quimioembolização consolidam-se como ferramentas terapêuticas que permitem a criação de uma ponte para o transplante, buscando reduzir o dropout da lista de espera. Terapias moleculares para tumores em estágio avançado emergem como alternativa efetiva no arsenal terapêutico desta patologia. Programas de incentivo à doação de órgãos, transplante intervivos e uso de fígados marginais são alternativas para tentar driblar a limitação de órgãos no Brasil. A prevenção e o tratamento precoce das doenças hepáticas crônicas (como infecção pelo vírus da hepatite B, infecção pelo vírus da hepatite C, doença hepática alcoólica e doença hepática gordurosa não alcoólica), reduzirão o risco de desenvolvimento de cirrose e, consequentemente, de CHC, diminuindo a necessidade de transplante hepático e também o impacto econômico e social dessas doenças. A cirrose é prevalente em nosso meio, tendo sido responsável por aproximadamente 128 mil mortes no Brasil no período de 2001 a 2010. Cabe destacar que 30% dos pacientes cirróticos serão diagnosticados com CHC ao longo de sua doença e que a maioria desses indivíduos terá um desfecho negativo. O transplante hepático, em pacientes selecionados, segue sendo a principal alternativa terapêutica, tratando simultaneamente o tumor e a cirrose. Compreender a evolução dos pacientes cirróticos portadores de CHC em lista de espera para TOF e analisar as possíveis diferenças existentes entre aqueles que evoluem para o dropout e os que são submetidos ao TOF é importante para o melhor entendimento dessa patologia. Este estudo tem por objetivo avaliar a frequência de dropout, assim como estabelecer fatores 34 preditivos de dropout entre os pacientes cirróticos portadores de CHC em lista de espera para transplante hepático. 35 36 2 JUSTIFICATIVA A prevalência de pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular é alta em nosso meio. Entender como esses pacientes evoluem enquanto aguardam em lista de espera para o transplante hepático e analisar as possíveis diferenças existentes entre os indivíduos submetidos ao TOF e os retirados de lista é importante para compreendermos a evolução e o tratamento desses pacientes. Esse estudo busca beneficiar os pacientes hepatopatas crônicos portadores de CHC em lista de transplante hepático na medida em que procura estabelecer preditores de melhor evolução desses indivíduos. 37 38 3 OBJETIVO Em pacientes cirróticos portadores de CHC em lista de espera para o transplante hepático: -Descrever a frequência de retirada de lista de espera (dropout). -Avaliar os fatores preditivos de retirada de lista de espera (dropout). 39 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Melato M, Sasso F, Zanconati F. Liver cirrhosis and liver cancer. A study of their relantionship in 2563 autopsies. Zentralbl Pathol. 1993;139:25–30. 2. Nader LA. Impacto das doenças hepáticas nas internações hospitalares e na mortalidade do Sistema Único de Saúde do Brasil no período de 2001 a 2010. [tese]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre; 2012. 3. Brasil. Ministério da Saúde. [Internet]. Departamento de Informática do SUS. 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Pacientes e Métodos: Estudo observacional, retrospectivo, de coorte histórica, em hospital geral no sul do Brasil de maio de 2006 a dezembro de 2010, de pacientes até a realização do transplante ou dropout. Análise por modelo de Regressão de Cox e curvas de Kaplan-Meier com comparação pelo teste de Log-rank. Resultados: De 148 pacientes, 70,9% foram transplantados e 29,1% foram excluídos da lista por progressão do tumor e ou morte, estando 79,1% dentro do critério de Milão. Fatores preditivos de dropout na análise univariada com significância estatística (p<0,05): nível de Alfafetoproteína > 20 ng/ml [Hazard ratio (HR), 2,4; 95% intervalo de confiança (IC), 1,3-4,4] e tumor fora do critério de Milão (HR, 3.4; 95% IC 1.8-6.2); em análise multivariável com significância estatística (p<0,05): classificação de Child-Pugh B e C (HR, 2,1; 95% IC 1,1-4,2) e tumor fora do critério de Milão (HR, 2,9; 95% IC 1,4-6,0). Fatores independentes de dropout da lista para TOF: tumor fora do critério de Milão (HR, 2,9; 95% IC 1,4-6,0) e possuir classificação de Child-Pugh B ou C (HR 2,1; 95% IC 1,1-4,2). Conclusão: O critério de 51 Milão, assim como o nível da Alfafetoproteína e a classificação de Child-Pugh identificaram indivíduos com maior risco de saída de lista durante espera por órgão. Palavras-chave: Cirrose hepática. Transplante de fígado. Carcinoma hepatocelular. Dropout. INTRODUÇÃO O carcinoma hepatocelular (CHC) é o quinto tumor em prevalente e o terceiro em mortalidade no mundo. Sua incidência vem aumentando nos Estados Unidos, projetando-se um incremento dessa patologia nas próximas duas décadas1,2. No Brasil, o CHC é a segunda causa de morte por doenças hepáticas e foi o responsável por 52.560 óbitos no período de 2001 a 201042. Possui uma incidência global de um milhão de casos novos ao ano sendo a principal causa de morte em pacientes cirróticos3,4,5. Os cirróticos possuem maior risco de desenvolver CHC, sendo a hepatite crônica pelo vírus C seu principal fator etiológico no mundo ocidental. Os programas de detecção de CHC em hepatopatas crônicos são uma importante ferramenta no diagnóstico de lesões precoces passíveis de tratamento curativo. O diagnóstico do tumor em estágio inicial permite a utilização de métodos terapêuticos mais eficazes e agressivos, como a ressecção cirúrgica e o transplante hepático6,7. Em pacientes com CHC selecionados adequadamente, o transplante ortotópico de fígado (TOF) tem se mostrado uma excelente opção terapêutica, sendo a única capaz de tratar simultaneamente o câncer e a disfunção hepática8,9. O grupo de Milão, liderados pelo Dr. Mazzafero, definiu em 1996 critérios de elegibilidade para o transplante hepático, que envolvem o número e o tamanho dos tumores hepáticos, determinando qual paciente portador de CHC teria a melhor evolução e seria o melhor candidato ao transplante.2,10De acordo com o critério de Milão, quando o transplante hepático é realizado em pacientes com tumores 52 solitários com diâmetro menor ou igual a 5cm ou até 3 lesões com diâmetro menor ou igual a 3cm, sem evidência de invasão vascular ou disseminação extra-hepática, a recorrência é desprezível e os índices de sobrevida semelhantes aos encontrados em pacientes sem CHC11,12. Consequentemente, o TOF é o tratamento de eleição para pacientes cirróticos portadores de CHC que preencham os critérios de Milão13,14,15. Atualmente, o sistema MELD (Model for End-StageLiverDisease) é o principal critério utilizado na alocação de órgão para paciente em lista de espera para TOF16,17. Em decorrência do aumento na incidência do CHC e, em contrapartida, uma diminuição no número de doadores em nosso meio, a tendência é ocorrer uma elevação gradual do tempo de espera em lista para pacientes portadores de hepatopatia crônica e CHC.18,19,20 A taxa de remoção da lista de espera de cirróticos portadores de CHC, decorrente da progressão do tumor ou óbito, é fator importante a ser avaliado quando discutimos a política de alocação de órgãos, estando estimada em aproximadamente 25% dos casos21,22,23. A implantação do sistema MELD como forma de criar um sistema de alocação prioritária, tem como objetivo atingir a difícil meta de manter uma equidade entre pacientes com diferentes etiologias e estágios de doença hepática, tendo de levar em conta a necessidade de subgrupos específicos como os portadores de CHC24,25. A escassez de órgãos é um sério problema a ser enfrentado quando se indica o transplante hepático em portadores de CHC26,27. Como o tempo necessário para o CHC dobrar de tamanho é algo em torno de 6 meses, os pacientes que aguardam em lista correm o risco de progressão do tumor para um estágio onde o TOF seja inviável28-30. Para superar esses obstáculos, diferentes estratégias são utilizadas na tentativa de detectar o CHC em estágios precoces, quando o TOF pode ser utilizado como alternativa terapêutica.31,32Neste sentido, a utilização de fígados marginais, o transplante intervivos e o transplante dominó são estratégias para driblar a escassez de órgãos alocados para o transplante hepático.33,34 Terapias adjuvantes como a quimioembolização do CHC, e ablativas 53 como radiofrequência e a alcoolização, tem sido aplicadas como ferramentas na busca por desacelerar a evolução das lesões tumorais35-37. A definição de fatores relacionados ao CHC que possam predizer o risco de exclusão da lista de espera para TOF é fundamental para o entendimento da evolução desses pacientes38-41. OBJETIVOS Em pacientes cirróticos portadores de CHC em lista de espera para o transplante hepático: -Descrever a frequência de retirada de lista de espera (dropout). -Avaliar os fatores preditivos de retirada de lista de espera (dropout). INDIVÍDUOS E MÉTODOS Delineamento: Estudo observacional, retrospectivo, coorte histórica, no qual o desfecho é a retirada de lista de espera do transplante hepático (dropout). Procedimentos: Foi avaliado um banco de dados populacional contendo informações de 156 pacientes com cirrose e portadores de carcinoma hepatocelular com 18 anos ou mais, listados para transplante hepático, no período de maio de 2006 a dezembro de 2010, acompanhados em hospital geral no sul do Brasil. Foram analisadas as seguintes variáveis independentes: Dados demográficos, fator etiológico da cirrose, tipo sanguíneo, nível de Alfa-fetoproteína (AFP), escore de MELD, classificação de Child-Pugh, realização de tratamento prévio ao transplante hepático, tempo de espera em lista até o transplante ou até a retirada de lista e características tumorais (número, diâmetro máximo do tumor, presença de trombose porta e se o tumor se enquadra 54 nos critérios de Milão). Os desfechos avaliados foram: realização de transplante hepático e retirada de lista de espera(dropout). Definição de retirada de lista de espera do transplante hepático (Dropout) Remoção do paciente listado devido à progressão tumoral ou óbito1. Definição de tempo de dropout Tempo desde a listagem inicial até a retirada de lista devido à progressão tumoral ou óbito. Definição de tempo de espera em lista Tempo desde a listagem inicial até a retirada de lista devido à realização do transplante, seja por doador vivo ou cadáver1. Critérios de Inclusão Pacientes maiores de 18 anos portadores de cirrose e carcinoma hepatocelular em lista de espera do transplante hepático. Critérios de Exclusão Pacientes com tumores incidentais foram excluídos devido ao fato do diagnóstico do carcinoma hepatocelular ser desconhecido até após a realização do transplante hepático. Análise Estatística Foram digitados os dados no programa Excel e posteriormente exportados para o programa SPSS versão 18.0 para análise estatística. 55 As variáveis quantitativas quando a sua distribuição foi simétrica foram descritas pela média e o desvio padrão e quando assimétricas pela mediana (mínimo e máximo). As variáveis categóricas foram descritas por frequências e percentuais. Foi realizado um modelo de Regressão de Cox para calcular as razões de azares proporcionais (hazardratio, HR) dos diferentes fatores em relação ao desfecho dropout. Aqueles fatores que se associaram com o desfecho com valores de significância abaixo de 0,20 foram introduzidos em um modelo de Regressão multivariável de Cox e calculados os HR ajustados e os seus respectivos intervalos de 95% de confiança. Foram realizadas curvas de Kaplan-Meier e comparados os pacientes dentro e fora do critério de Milão pelo teste do Log-rank. Foi considerado um nível de significância de 5%. RESULTADOS Característica dos pacientes Durante o período do estudo, um total de 156 pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular foram listados para TOF. Oito pacientes foram excluídos da análise devido à perda de dados do prontuário. As características desses pacientes, no momento da entrada em lista, estão demonstradas na Tabela 1. A maioria dos indivíduos eram homens (66,9%) e brancos (86,9%), com uma mediana de idade de 58 anos (37-72). A infecção pelo vírus da Hepatite C foi a principal etiologia da doença hepática crônica, com 66,2% e associada ao consumo de álcool chegando a 78,4% dos pacientes. A mediana da AFP foi 12,9 (0,73-6780,32) e a mediana do Escore MELD foi 11 (6-24). A maioria dos pacientes foi classificada como Child-Pugh A (52%). O número de indivíduos que foi submetido a tratamento ablativo do CHC enquanto em lista de espera para o transplante hepático foi 76 56 (51,4%), com a quimioembolização transarterial sendo a terapia mais comum (45 procedimentos). Os pacientes podem ter realizado mais de um procedimento. Tabela 1 – Características clínicas e demográficas de 148 pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular ao entrar em lista de transplante hepático no Hospital Dom Vicente Scherer. Período de maio de 2006 a dezembro de 2010. Características Medidas descritivas Idade, anos [mediana (variação)] Gênero, masculino[n (%)] Raça[n (%)] branca Não branca 58 (37-72) 99 (66,9) Etiologia cirrose[n (%)] Hepatite C Álcool Hepatite C e álcool Hepatite B Outros Tipo sanguíneo (A%,B%,AB%,O%) AFP ng/ml** [mediana (variação)] Escore MELD***[mediana (variação)] Classificação Child (A%/B%/C%) Terapia prévia ao transplante hepático[n (%)] Alcoolização Quimioembolização Radiofrequência Mais de uma terapia Tempo lista espera, dias [mediana (variação)] Pacientes transplantados[n (%)] Pacientes dropout Pacientes dropoutpor progressão tumoral Pacientes dropout por morte 119 (87,0) 18(13,0) 98 (66,2) 13 (8,8) 18 (12,2) 9 (6,1) 10 (6,8) 53.3/6.8/3.5/36.4 12.9 (0,736780,32) 11 (6-24) 52,0/35,8/12,2 76 (51,4) 40 (27,0) 45 (30,4) 3 (2,0) 12 (15,7) 180 (6-2160) 105 (70,9) 43 (29,1) 26 (60,5) 17 (39) *Raça documentada em 137 de 148 pacientes **AFP: Alfa-fetoproteína ***MELD: Model for End-Stage Liver Disease Dos 148 pacientes listados, 70,9% (n=105) foram transplantados e 29,1% (n=43) foram excluídos da lista por progressão do tumor (n=26) e ou morte (n=17). A Figura 1 retrata o número de pacientes listados portadores de CHC e aqueles submetidos ao transplante hepático por ano. 57 Figura 1 – Número de pacientes CHC listados para o transplante hepático e o número de pacientes CHC submetidos ao transplante de 2006 a 2010. Característica Tumoral As informações acerca do CHC estão na Tabela 2. A mediana do diâmetro máximo do tumor foi 2.5cm (1-8), 90 (60,8%) pacientes tinham um nódulo único e 25 (16,9%) possuíam ≥3 nódulos. Apenas 13,5% (n=20) apresentavam trombose porta em imagem radiológica no momento da entrada em lista de espera. Estavam dentro do critério de Milão 117 (79,1%) indivíduos, estando a maioria (78,4%) abaixo do estágio T2. Um total de 31 (20,9%) portadores de CHC estavam fora do critério de Milão, com um aumento progressivo de pacientes portadores de tumor com essa particularidade desde o ano de 2006, Figura 2. 58 Tabela 2 – Características macroscópicas do carcinoma hepatocelular no momento da entrada em lista de espera para o transplante hepático. Variáveis Diâmetro máximo [mediana(variação)] do CHC, cm Medidas Descritivas 2.5 (1-8) Nº de nódulos CHC [mediana(variação)] 1 2 >=3 1(1-5) 90 (60,8%) 33 (22,3%) 25 (16,9%) Estágio TNM >T2 <T2 32 (21,6%) 116(78,4%) Trombose porta 20 (13,5%) Critério Milão 117(79,1%) Figura 2 – Número de pacientes CHC listados entre 2006 e 2010 que não preencheram o critério de Milão. Dropout da lista de espera para transplante hepático A mediana do tempo de espera em lista para o transplante hepático foi 180 dias (62160) e a mediana de tempo para dropout da lista de espera para TOF por progressão tumoral ou morte foi 120 dias (6-1170). Para todos os candidatos portadores de CHC a probabilidade 59 de dropout por evolução do tumor e ou morte em 1 e 3 anos foi 32% e 60% respectivamente, demonstrada na Figura 3. Em comparação com sujeitos que preenchiam o critério de Milão (n=117), candidatos com lesões tumorais que excediam o critério de Milão (n=31) tinham uma probabilidade significativamente maior de serem excluídos da lista de espera para transplante hepático (21,4% x 58,15%;P <0,001), Figura 4. De 31 pacientes fora do critério de Milão, 18 tiveram dropout (58,1%) enquanto dos 117 que preenchiam o critério de Milão, apenas 25 (21,4%) tiveram dropout (p< 0,001), Tabela 3. Figura 3 – Probabilidade de dropout em pacientes portadores de CHC em lista de transplante hepático. 60 Figura 4 – Sobrevida acumulada de dropout da lista em pacientes que preencheram e não preencheram o critério de Milão. Fatores que puderam predizer a ocorrência de dropout na análise univariada com significância estatística (P< 0,05) foi o nível de Alfa-fetoproteína> 20 ng/ml [Hazardhatio (HR), 2.4; 95% intervalo de confiança (IC), 1.3-4.4] e o tumor estar fora do critério de Milão (HR, 3.4; 95% IC 1.8-6.2). Fatores preditores de dropout baseados em uma análise multivariável com significância estatística (P< 0,05) foram a Classificação de Child-Pugh B e C (HR, 2.1; 95% IC 1.1-4.2) e o tumor estar fora do critério de Milão (HR, 2.9; 95% IC 1.46.0). Os fatores preditivos independentes de dropout da lista de espera para TOF foramo tumor estar fora do critério de Milão (HR, 2.9; 95% IC 1.4-6.0) e possuir Classificação de Child-Pugh B ou C (HR 2.1; 95% IC 1,1-4,2), Tabela 3. 61 Tabela 3 – Análise univariada e multivariável de preditores de dropout de lista de espera de candidatos a transplante hepático portadores de carcinoma hepatocelular. Variáveis % HR P HR ajustado P dropout bruto (IC95%) (IC95%) Idade <55 anos 33,3 2,0 (0,9-4,4) 0,110 1,7 (0,8-4,0) 0,193 >55 anos 17,5 1 1 Tipo sanguíneo O 33,3 1,2 (0,7-2,2) 0,545 Outros 26,6 1 Etiologia Viral 28,0 1 Não viral 34,8 1,3 (0,6-2,8) 0,515 1,7 (0,9-3,3) 0,114 AFP >20ng/mL 39,3 2,4 (1,3-4,4) 1 0,007 <20ng/mL 22,8 1 0,5 (0,3-1,1) 0,093 MELD >10 26,9 0,6 (0,3-1,2) 0,138 1 <10 35,0 1 Child A 22,1 1 0,074 1 0,028 B ou C 33,6 1,8 (0,9-3,2) 2,1 (1,1-4,2) Tamanho do tumor >2,5 cm 35,4 1,7 (0,9-3,2) 0,096 1,0 (0,5-2,1) 0,905 <2,5 cm 21,7 1 1 Trombose porta Sim 25,0 0,7 (0,3-1,9) 0,499 Não 29,7 1 Critério de Milão Sim 21,4 1 1 <0,001 0,003 Não 58,1 3,4 (1,8-6,2) 2,9 (1,4-6,0) Terapia previa Sim 31,6 1,4 (0,7-2,5) 0,336 Não 26,4 1 Abreviações: AF, Alfa-fetoproteina; IC, intervalo de confiança; HR, Hazardratio; MELD, Model for End-StageLiverDisease. DISCUSSÃO Antes da criação e da utilização do critério de Milão na prática médica cotidiana, o transplante hepático em pacientes portadores de carcinoma hepatocelular estava associado a resultados desapontadores, que incluíam uma taxa de sobrevida em cinco anos de 36% ou menos e uma recorrência tumoral de até 54%18,22,24. Em 1996, Mazzaferro e colaboradores publicaram o critério de Milão, que permitiu a identificação de um grupo de pacientes com diagnóstico de CHC que apresentou uma associação fraca em desenvolver recorrência tumoral e uma taxa de sobrevida aceitável pós-transplante2. No estudo de Mazzaferro, a sobrevida em quatro anos chegou a 85% entre 35 pacientes diagnosticados com CHC e que foram submetidos ao transplante hepático com nódulo tumoral único ≤ 5cm ou 3 ou menos lesões tumorais com 3cm ou menos cada. Outros estudos demonstraram resultados semelhantes, com destaque para o desenvolvido por Llovet e colaboradores, onde os melhores resultados a longo prazo e a menor taxa de recidiva eram alcançados quando o 62 transplante hepático ocorria em indivíduos com CHC em estágios iniciais (estágio T2).24Em maio de 2006, o Brasil adota o critério de Milão na tentativa de maximizar a eficácia de uma terapia que é limitada à viabilidade e ocorrência de doações de órgãos14. O presente estudo retrospectivo utilizou registros de prontuários de pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular para analisar o desfecho dos indivíduos colocados em lista de transplante hepático em um período de cinco anos. A população do estudo foi alocada já em vigência do sistema MELD, sendo que a grande maioria (79,1%) estava dentro do critério de Milão quando listada. A mediana do tempo de espera em lista foi 180 dias com uma probabilidade de dropout em um ano de 32%. Uma análise univariada inicial demonstrou que o nível sanguíneo de AFP maior que 20ng/ml estava associado a um maior risco de dropout quando comparado a um nível inferior a 20ng/ml (HR, 2.4; P = 0,007). Este resultado é corroborado pelo trabalho de Shawn e colaboradores que evidenciou em um estudo multicêntrico utilizando dados do UNOS de 4482 pacientes a associação do mesmo nível de AFP e o maior risco de dropout (HR, 1.1; P = 0,0003).1Diferentemente, um estudo liderado por Schwartz evidenciou que o maior risco de saída da lista de TOF ocorria a partir de níveis de AFP superiores a 200ng/ml.4 Pacientes com níveis inferiores a 200ng/ml apresentavam resultado favorável em sua evolução (OR, 0,27; P = 0,017). Em estudo de Yamashiki e colaboradores o nível de AFP > 100ng/ml estava relacionado a um maior risco de dropout (HR, 1,9; P<0,007) 5. Em nosso estudo, após a realização de uma análise multivariável, o valor do nível de AFP de 20ng/ml não apresentou diferença estatisticamente significativa para o desfecho em estudo, provavelmente devido à perda de poder na análise multivariável (HR, 1.7;P = 0,114). Quando avaliada a Classificação de Child-Pughcomo preditor de saída de lista de espera para o transplante hepático em uma análise univariada, não houve diferença estatisticamente significativa nos sujeitos verificados (HR, 1.8; P = 0,074). De outra forma, 63 quando os dados do estudo referentes à classificação de Child-Pugh foram avaliados em uma análise multivariada, pacientes classificados como Child-Pugh B e C apresentaram um maior risco de dropout da lista de espera para TOF quando comparados a indivíduos Child-Pugh A (HR, 2,1; P = 0,028). Esse achado ocorre quando ajustamos para outros potenciais fatores de confusão, e assim, a Classificação de Child-Pugha parece como uma variável estatisticamente significativa (HR, 2.1; P = 0,028). Estudo de Pelletier e colaboradores envolvendo mais de 4000 indivíduos (1) também aponta para a Classificação de Child-Pugh B e C como preditor de dropout (HR, 3.9; P<0,0001). Nessa mesma direção, Yamashiki e colaboradores demonstraram o maior risco de saída de lista em pacientes Child-Pugh B e C em um grupo de 458 pacientes (17) (HR, 3.7; P< 0,001) 1,5. Quando analisamos o critério de Milão como uma variável do estudo, fica evidente a importância dessa informação como preditor de desfecho dos indivíduos avaliados. Tanto na análise univariada (HR, 3.4; P = <0,0001) como na multivariável (HR, 2.9; P = 0,003) existe um maior risco de dropout para pacientes que estão fora dos critérios de Milão. Dos 31 sujeitos que não preenchiam o critério de Milão na entrada em lista para TOF, 58% (n=18) tiveram dropout. Dos 117 que preenchiam os critérios, 21,4% (n=25) foram retirados de lista, sendo esta diferença entre os grupos estatisticamente significativa (P<0,001). Trabalhos da literatura reforçam esse achado ficando clara a associação do preenchimento do critério de Milão com a maior probabilidade de um desfecho positivo para os pacientes2,13,16. Para Pelletier e colaboradores os indivíduos com CHC que estavam inseridas dentro dos parâmetros do critério de Milão tinham uma evolução favorável e apresentavam menor risco de dropout (HR, 0.32; P < 0,0001). Ferrelle colaboradores publicaram sua experiência com dropout da lista de espera para TOF e demonstraram também um maior risco para aqueles indivíduos fora do critério de Milão1,2. 64 Alguns centros reportaram a evolução de pacientes portadores de CHC e que possuíam lesões tumorais que estavam além dos critérios de Milão. O grupo da universidade de São Francisco (UCSF), liderados por Yao e colaboradores, registrou pacientes com CHC com lesão única ≤ 6.5 cm ou até 3lesões ≤ 4.5 cm com um diâmetro total das lesões menor que 8 cm.16,41Esse grupo de pacientes apresentou uma sobrevida livre de doença a uma taxa comparável a pacientes que possuíssem o critério de Milão. Uma diferença é que no estudo de Milão foram utilizadas imagens radiológicas para definir as características tumorais de número e tamanho, enquanto o grupo da Califórnia fez a sua avaliação em peças do explante hepático. Estudos que avaliaram os dados da UNOS,17,18 demonstraram que aproximadamente um terço das lesões são sub estagiados quando utilizado informações envolvendo somente imagens quando comparados a análise de explantes. Entretanto, estudo liderado por Schwartz examinou um conjunto de pacientes composto por 353 indivíduos portadores de CHC e que foram a transplante hepático4. Destes, 221 preenchiam o critério de Milão, 37 o critério da UCSF, mas não Milão e 95 nenhum dos dois em questão. A sobrevida foi semelhante nos grupos de Milão e UCSF e significativamente diferente entre aqueles que não possuíam nenhum critério, com uma evolução negativa. Contudo, ao analisar a recorrência tumoral, os pacientes que possuíam o critério de UCSF apresentaram uma taxa de recorrência significativamente maior quando comparada ao grupo que possuía apenas o critério de Milão (P< 0,0001). Uma possível explicação para essa evolução se deve ao fato de que os indivíduos que preenchiam o critério da UCSF, mas não o Milão, eram transplantados, invariavelmente, devido aos achados de suas lesões tumorais, apesar de apresentarem uma função hepática relativamente preservada, levando a uma sobrevida precoce no póstransplante elevada e, posteriormente, a morte por recorrência tumoral41. O escore MELD não se destacou como fator preditivo da evolução dos pacientes listados portadores de CHC. Em nosso estudo não houve diferença no risco de dropout 65 quando o valor do escore MELD está acima de 10 pontos. Da mesma forma, o tamanho tumoral, a presença de trombose portal e a realização de terapia ablativa prévia ao TOF não se constituíram em bons preditores de risco para dropout13. Em conclusão, o CHC é uma patologia frequente e determinante na evolução dos pacientes cirróticos. Sua detecção precoce, quando ainda dentro de características radiológicas favoráveis, permite optarmos por variações terapêuticas definitivas. Nesse sentido, o critério de Milão se destaca como importante preditor de risco para dropout de lista de espera para o transplante hepático, tornando-se uma ferramenta fundamental para guiar a melhor alternativa para esses pacientes. Este estudo pode concluir que o critério de Milão, assim como o nível da Alfa-fetoproteína e a Classificação de Chil-Pugh podem identificar indivíduos portadores de CHC em lista de espera para TOF que apresentarão um maior risco de saída de lista durante sua espera por um órgão. O atual critério para o TOF de portadores de CHC permite minimizar o dropout desses indivíduos seja por progressão tumoral ou morte. A expansão do critério radiológico para o transplante de CHC exige uma consideração cautelosa devido ao risco em potencial de recorrência tumoral e redução de sobrevida, assim como o provável impacto nos muitos outros pacientes cirróticos não portadores de CHC. REFERÊNCIAS 1. Shawn J, Pelletier F, Veena T. An intention-to-treat analysis of liver transplantation for hepatocellular carcinoma using organ procurement transplant network data. L Transpl. 2009;15:859-868. 2. Mazzaferro V et al. 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Subjects and Methods: An observational, retrospective historical cohort study was conducted in a general hospital in the south of Brazil from May 2006 to December 2010 with patients up to the time of transplant or dropout. Analysis was performed using the Cox Regression model and Kaplan-Meier curves and comparison, by the Log-rank test. Results: Of the 148 patients evaluated, 70.9% underwent OLT and 29.1% were dropped out due to tumor progression or death; 79.1% were within the Milan criteria. Predictive factors for dropout at univariate analysis that presented statistic significance (p<0.05) were alphafetoprotein level > 20 ng/ml [Hazard Ratio (HR), 2.4; 95% confidence interval (CI), 1.3-4.4] and tumor outside Milan criteria (HR, 3.4; 95% CI 1.8-6.2); and in multivariate analysis with statistic significance (p<0.05) were Child-Pugh B and C (HR, 2.1; 95% IC 1.1-4.2). Factors independent from OLT waiting list dropout were tumor outside the Milan criteria (HR, 2.9; 95% CI 1.4-6.0) and Child-Pugh B or C (HR 2.1; 95% CI 1.1-4.2). Conclusion: Milan criteria, alpha-fetoprotein, and Child-Pugh classification were able to identify individuals at higher risk of dropout from liver transplant waiting list. Keywords: Hepatic cirrhosis. Liver transplantation. Hepatocellular carcinoma. Dropout. 70 INTRODUCTION Hepatocelular carcinoma (HCC) is the fifth tumor in prevalence and the third in mortality in the world. Its incidence has increased in the United States, an increase that is likely to be greater in the next two decades1,2. In Brazil, HCC is the second cause of death among liver diseases and was responsible for 52,560 deaths in the period ranging from 2001 to 201042. It shows a global incidence of a million new cases per year, constituting the main cause of death among patients with cirrhosis3,4,5. Cirrhotic patients are in greater risk of developing HCC. Chronic Hepatitis C Virus is its main etiological factor in the Western world. Programs for the detection of HCC in chronic hepatopaths are an important tool in diagnosing early lesions liable to curative treatment. The diagnosis of tumor in the initial stages allows the use of more effective and aggressive therapeutic methods such as surgical resection and hepatic transplantation6,7. In HCC patients properly selected, orthotopic liver transplantation (OLT) has proven an excellent therapeutic option, the only one capable of treating both cancer and hepatic dysfunction simultaneously8,9. The Milan Group, led by Dr. Mazzaferro, defined in 1996 criteria of eligibility for hepatic transplantation, involving the number and size of hepatic tumors, determining which HCC patients will have the best evolution and be the best candidate for transplantation.2,10 According to the Milan criterion, when an hepatic transplantation is performed in patients with single tumors with a diameter lower or equal to 5 cm or up to 3 lesions with diameter lower than or equal to 3 cm, without evidence of vascular invasion and extra-hepatic dissemination, the occurrence can be ignored and the survival rates are similar to those found in patients without HCC.11,12 As a result, OLT is the 71 preferential treatment for cirrhotic patients carrying HCC not conforming Milan criteria13,14,15. Currently the Model for End-Stage Liver Disease (MELD) system is the main criterion used in locating the organ for OLT candidates16,17. Due to the increase in HCC incidence and, on the other hand, a decrease in the number of donors in our milieu, the tendency is a gradual increase in waiting time for patients carrying chronic hepatitis and HCC18,19,20. The rates of exclusion from the waiting list of cirrhotic patients with HCC, resulting from tumor progression or death, is the important factor to be assessed in discussing the policies of organ location, estimated in approximately 25% of the cases21,22,23. The implementation of MELD system for creating a system of priority location is aimed at reaching the difficult target of maintaining equity between patients with different etiologies and in distinct stages of hepatic disease, wherein the need of specific subgroups as HCC carriers should be counted in24,25. The scarcity of organs is a serious problem when hepatic transplantation is recommended26,27. Since the necessary time for HCC to double in size is around 6 months, the patients in waiting list run the risk of the tumor progressing to a stage in which OLT is unviable28-30. To overcome these obstacles, different strategies are used to detect HCC in early stages, when OLT can be used as a therapeutic alternative31,32. In this sense, the use of marginal livers, living-donor transplantation and domino transplantation are strategies to bypass the scarcity of organs located for hepatic transplantation33,34. Adjuvant therapies such as HCC chemoembolization and ablative therapies such as radiofrequency and alcoholization have been applied as tools to slow down the evolution of tumor lesions.35-37 The definition of factors related to HCC that may predict the risk of exclusion from the waiting list for OLT is fundamental for understanding the evolution of these patients38-41. 72 OBJECTIVES In cirrhotic patients with HCC in waiting list for hepatic transplantation: -To describe the frequency of removal from waiting list (dropout). -To assess predictive factors for the removal of the waiting list (dropout). SUBJECTS AND METHODS Design: Observational retrospective study with historical cohort, in which the outcome is the removal from the waiting list for hepatic transplantation (dropout). Procedures: A bank of population data containing information on 156 18-year-old or older cirrhotic HCC patients in waiting list for hepatic transplantation was evaluated in the period ranging from May 2006 to December 2010, followed up in a general hospital in south of Brazil. The following independent variables were analyzed: Demographic data, cirrhosis etiological factor, blood type, alpha-fetoprotein (AFP) level, MELD Score, Child-Pugh classification, previous treatment to hepatic transplantation, time in the waiting list up to the transplantation or dropout, and tumor characteristics (number, maximum diameter, presence of portal vein thrombosis, and the tumor being within the Milan criteria). The outcomes assessed were performance of hepatic transplantation and dropout. Dropout Definition Patient removal from the waiting list due to tumor progression or death1. 73 Dropout time definition Time period ranging from the initial list to the removal from the list due to tumor progression or death. Waiting time definition Time period ranging from the initial list to the removal from the list due to transplantation, whether by a living or a dead donor1. Inclusion criteria Patients over 18 years old carrying cirrhosis and hepatocelular carcinoma in waiting list for hepatic transplantation. Exclusion criteria Patients with incidental tumors were excluded since the unknown diagnosis of hepatocelular carcinoma from the performance of hepatic transplantation. Statistic Analysis Data were inserted in Microsoft Office Excel and then exported to the SPSS program version 18.0 for statistic analysis. When the distribution of quantitative variables was symmetrical, they were described by mean and standard deviation; when it was asymmetrical, they were described by the median (minimum and maximum). Categorical variables were described by frequencies and percentages. A Cox Regression model was performed to calculate proportional hazard ratio (HR) 74 of the different factors concerning the dropout outcome. Factors associated to this outcome with significance values below 0.20 were introduced in a Cox multivariate regression model. Thereafter, adjusted HRs with their respective 95% confidence interval were calculated. Kaplan-Meier curves were performed and then compared to both patients conforming or not Milan criterion by the Log-rank test. A 5% significance level was considered. RESULTS Characteristics of the patients During the study period, a total of 156 cirrhotic patients carrying hepatocelular carcinoma were listed for OLT. Eight patients were excluded from the study due to the loss of medical data. The characteristics of these patients, at entry, are displayed in Table 1. Most individuals were men (66.9%) and white (86.9%), with a median of age of 58 years (37-72 years). The infection by hepatitis C virus was the main etiology of the chronic hepatic disease, with 66.2%, and associated to the consumption of alcohol at 78.4% of patients. The AFP median was 12.9 (0.73-6780.32) and the MELD Score median was 11 (6-24). Most patients were classified as Child-Pugh A (52%). The number of individuals submitted to ablative treatment of HCC while in waiting list for hepatic transplantation was 76 (51.4%) with transarterial chemoembolization being the most common therapy (45 procedures). Patients may have undergone more than one procedure. 75 Table 1 – Clinical and demographic characteristics of 148 cirrhotic patients carrying HCC in waiting list for hepatic transplantation at Hospital in south of Brazil. May 2006-December 2010. Characteristics Descriptive measures Age, years [median (variation)] 58 (37-72) Gender, male [n (%)] 99 (66.9) Race [n (%)] White 119 (87.0) Non white 18(13.0) Cirrhosis Etiology [n (%)] Hepatitis C 98 (66.2) Alcohol 13 (8.8) Hepatitis C and alcohol 18 (12.2) Hepatitis B 9 (6.1) Others 10 (6.8) Blood type (A%,B%,AB%,O%) 53.3/6.8/3.5/36.4 AFP ng/ml** [median (variation)] 12,9 (0.736780.32) MELD Score***[median (variation)] 11 (6-24) Child Classification (A%/B%/C%) 52.0/35.8/12.2 Previous Therapy for hepatic transplantation [n (%)] 76 (51.4) Alcoholization 40 (27.0) Chemoembolization 45 (30.4) Radiofrequency 3 (2.0) More than one therapy 12 (15.7) Tine in waiting list, days [median (variation)] 180 (6-2160) Transplanted patients[n (%)] 105 (70.9) Dropout patients 43 (29.1) Dropout patients for tumor progression 26 (60.5) Dropout patients for death 17 (39) *Race documented in 137 out of 148 patients **AFP: Alpha-fetoprotein ***MELD: Model for End-Stage Liver Disease Of the 148 patients listed, 70.9% (n=105) were transplanted and 29.1% (n=43) were excluded from the waiting list because of the tumor progression (n=26) and/or death (n=17). Figure 1 depicts the number of listed patients carrying HCC and those submitted to hepatic transplantation per year. 76 Figure 1 – Number of HCC patients listed for hepatic transplantation with and number of HCC patients who underwent transplantation. 2006-2010. Tumor Characteristics Information on HCC is displayed in Table 2. The median of maximum diameter of the tumor was 2.5 cm (1-8), 90 (60.8%) patients carried a single nodule and 25 (16.9%) had ≥ 3 nodules. Only 13.5% (n=20) presented portal vein thrombosis in radiological image at entry in the waiting list. A total of 117 patients conforming Milan criterion (79.1%), most (78.4%) below T2 stage. A total of 31 (20.9%) patients carrying HCC not conforming Milan criterion, with a progressive increase in patients carrying the tumor with this particular feature since 2006, as displayed in Figure 2. 77 Table 2 – Macroscopic features of HCC at entry in waiting list for hepatic transplantation. Variables Descriptive Measures HCC maximum diameter, cm 2.5 (1-8) [median(variation)] N. of nodules [median(variation)] 1 2 ≥3 CHC 1 (1-5) 90 (60.8%) 33 (22.3%) 25 (16.9%) TNM stage >T2 <T2 32 (21.6%) 116 (78.4%) Portal thrombosis 20 (13.5%) Milan criterion 117 (79.1%) Figure 2 – Number of CHC patients listed between 2006 and 2010 not conforming Milan criterion. Dropout from Hepatic Transplantation Waiting List The median of waiting time for orthotopic liver transplantation (OLT) was 180 days (6-2,160) and the median of time for dropout of OLT waiting list for tumor progression or death was 120 days (6-1,170). For all the candidates carrying HCC, dropout probability for 78 tumor evolution, death or both within 1-3 years was 32% and 60% respectively, displayed in Figure 3. In comparison to subjects not conforming Milan criterion (n=117), candidates with tumor lesions exceeding the Milan criterion (n=31) had a significantly higher probability of being excluded from waiting list for hepatic transplantation (21.4% x 58.15%; p< 0.001), as displayed in Figure 4. Of 31 patients not conforming Milan criterion, 18 had dropout (58.1%) whereas out of 117 not conforming Milan criterion, only 25 (21.4%) had dropout (p<0.001), Table 3. Figure 3 – Dropout probability in patients carrying HCC in waiting list for hepatic transplantation. 79 Figure 4 – Accumulated survival after dropout from list in patients conforming and not conforming Milan criterion. Predictive factors for dropout in univariate analysis with statistic significance (p< 0.05) was Alpha-fetoprotein level > 20 ng/ml [Hazard ratio (HR), 2.4; 95% confidence interval (CI), 1.3-4.4] and tumor not conforming Milan criterion (HR, 3,4; 95% CI 1.8-6.2). Predictive factors for dropout based on multivariate analysis with statistic significance (p< 0.05) were Child-Pugh classification B and C (HR, 2.1; 95% CI 1.1-4.2) and tumor not conforming Milan criterion (HR, 2.9; 95% CI 1.4-6.0). Independent predictive factors for dropout from waiting list for OLT were tumor not conforming Milan criterion (HR, 2.9; 95% CI 1.4-6.0) and Child-Pugh Classification B or C (HR 2.1; 95% CI 1,1-4,2), as displayed in Table 3. 80 Table 3 – Univariate and multivariate analysis of waiting list dropout predictors for candidates to hepatic transplantation carrying HCC. Variables % Raw HR P Adjusted HR P dropout (CI95%) (CI95%) Age <55 years 33.3 2.0 (0.9-4.4) 0.110 1.7 (0.8-4.0) 0.193 >55 years 17.5 1 1 Blood type O 33.3 1.2 (0.7-2.2) 0.545 Others 26.6 1 Etiology Viral 28.0 1 Non viral 34.8 1.3 (0.6-2.8) 0.515 1.7 (0.9-3.3) 0.114 AFP >20 ng/mL 39.3 2.4 (1.3-4.4) 1 0.007 <20 ng/mL 22.8 1 0.5 (0.3-1.1) 0.093 MELD >10 26.9 0.6 (0.3-1.2) 0.138 1 <10 35.0 1 Child A 22.1 1 0.074 1 0.028 B or C 33.6 1.8 (0.9-3.2) 2.1 (1.1-4.2) Tumor size >2,5 cm 35.4 1.7 (0.9-3.2) 0.096 1.0 (0.5-2.1) 0.905 <2,5 cm 21.7 1 1 Portal thrombosis Yes 25.0 0.7 (0.3-1.9) 0.499 No 29.7 1 Milan criterion Yes 21.4 1 1 <0.001 0.003 No 58.1 3.4 (1.8-6.2) 2.9 (1.4-6.0) Previous therapy Yes 31.6 1.4 (0.7-2.5) 0.336 No 26.4 1 Abbreviations: AFP, Alpha-fetoprotein; CI, confidence interval; HR, hazard ration, MELD, Model for End-Stage Liver Disease. DISCUSSION Before the establishment and introduction of the Milan criterion in quotidian medical practice, the use of hepatic transplantation in patients carrying hepatocelular carcinoma was associated with disappointing results, including a five-year survival rate of 36% or less and tumor occurrence up to 54%18,22,24. In 1996, Mazzaferro et al. published the Milan criterion, which allowed the identification of a group of patients with HCC diagnosis who presented a weak association with the development of tumor occurrence and an acceptable survival rate after transplantation2. In Mazzaferro’s study, four-year survival rates reached 85% within the 35 patients diagnosed with HCC who were submitted to hepatic transplantation with single tumor nodule ≤ 5 or 3 or less lesions of 3 cm or less each. Other studies showed similar results, including the one developed by Llovet et al., wherein the best long term results and the lowest relapse rate were reached when hepatic transplantation occurred in individuals 81 who had HCC in initial stages (T2 stage).24 In May 2006, Brazil adopted the Milan criterion in an attempt to maximize the efficacy of a therapy still limited to viability and occurrence of organ donation14. This retrospective study used medical files of cirrhotic patients carrying HCC to analyze the outcome of individuals in waiting list for hepatic transplantation in a five-year period. The population studied was already under vigilance of the MELD system, the great majority (79.1%) conforming Milan criterion at listing. The median of waiting time was 180 days with dropout probability in one year of 32%. An initial univariate analysis showed that AFP blood level higher than 20ng/ml was associated to a higher dropout risk when compared to a lower level (HR, 2.4; p=0.007). This result is corroborated by Shawn et al., who evidenced in a multicentric study using UNOS data of 4,482 patients the association between the same AFP level and a higher dropout risk (HR, 1.1; p=0.0003)1. On the other hand, a study by Schwartz evidenced that the greater risk of dropout from OLT waiting list occurred in AFP levels > 200ng/ml.4 Patients with lower levels presented favorable results in their evolution (OR, 0.27; p=0.017). In a study by Yamashiki et al., AFP level > 100ng/ml was related to a higher dropout risk (HR, 1.9; p<0.007).5 In our study, after a multivariate analysis, AFP levels of 20ng/ml did not present any statistically significant difference for the outcome, probably due to the loss of strength in multivariate analysis (HR, 1.7; p= 0.114). The Child-Pugh classification was assessed as a predictor of dropout from waiting list for hepatic transplantation in a univariate analysis, showing no statistically significant difference in the subjects (HR, 1.8; p=0.074). On the other hand, when data referring to the Child-Pugh classification were assessed in a multivariate analysis, patients classified as Child-Pugh B and C showed a greater risk of dropout from OLT waiting list when compared to Child-Pugh A individuals (HR, 2,1; p=0.028). This finding occurs when adjusted to other potential confusing factors and, then, the Child-Pugh Classification appears as a statistically 82 significant variable (HR, 2.1; p=0.028). A study by Shawn et al. involving more than 400 individuals also points to Child-Pugh classification B and C as a predictive factor for dropout (HR, 3.9; p<0.0001). In this sense, Yamashiki et al. showed a greater dropout risk in ChildPugh B and C patients in a group of 458 subjects (HR, 3.7; p<0.001)1,5. When the Milan criterion is analyzed as a variable of the study, the importance of this information as outcome predictor for assessed individuals is evidenced. Both in univariate (HR, 3.4; p<0.0001) and multivariate (HR, 2.9; p=0.003) analysis, there is a greater dropout risk for patients not conforming Milan criterion. Of the 31 subjects who did not fulfill this criterion in entering OLT list, 58% (n=18) had dropout. Of the 117 who fulfilled the criteria, 21.4% (n=25) were removed from the list. This difference between groups proves statistically significant (p<0.001). Studies found in the literature reinforced this finding, clarifying the association between Milan criterion fulfillment and a greater probability of a positive outcome for the patients.2,13,16 In Shawn et al., HCC patients not conforming Milan criteria showed a favorable evolution and presented lower dropout risk (HR, 0.32; p<0.0001). Fisher et al. published their experience with dropout from OLT list and also observed a greater risk for those who are not with Milan criterion6. Some centers reported an evolution of HCC patients presenting tumor lesions who were beyond the Milan criterion. The group from the University de São Francisco (UCSF), led by Yao et al. registered HCC patients with single lesion ≤ 6.5 cm or up to 3 lesions ≤ 4.5 cm with lesions showing a total diameter lower than 8 cm16,41. This group of patients presented disease-free survival and a rate comparable to that of patients not conforming Milan criterion. The Milan study differed from that by the California group in using radiological images to define tumor characteristics of number and size, whereas the latter based its evaluation in pieces of the hepatic explants. Studies evaluating UNOS data17,18, showed that approximately one third of lesions are sub-staged when information involving 83 only images are used, in comparison to explants analysis. However, a study conducted by Schwartz examining 353 subjects carrying HCC who underwent hepatic transplantation4 found out that 221 not conforming Milan criterion; 37 were conforming UCSF but not with Milan criterion; and 95 were not conforming any of the criteria. The survival rate was similar in both groups and significantly different among those who did not show any of the criteria with negative evolution. Notwithstanding, in an analysis of tumor recurrence, patients with UCSF criterion showed a recurrence rate significantly higher when compared to the group only with Milan criterion (p<0.0001). A possible explanation for this evolution is the fact that individuals who were conforming UCSF but not with Milan criterion were invariably transplanted due to the findings of their tumor lesions, despite not presenting relatively preserved hepatic function, leading to a high post-transplantation early survival and, afterward, death due to tumor recurrence41. The MELD score was not a predictive factor for the evolution of HCC patients. In our study no difference in dropout risk was observed in relation to MELD score over 10 points. Similarly, tumor size, the presence of portal thrombosis and previous ablative therapy to OLT were not good predictive factors of dropout risk13. HCC is a frequent pathology with a determining role in the evolution of cirrhotic patients. Its early detection, when still within favorable radiological features, allows us to choose among variations of definitive therapies. In this sense, the Milan criterion stands out as an important predictive factor of dropout risk from hepatic transplantation waiting list. It is, thus, a crucial tool for choosing the best option for these patients. This study concludes that the Milan criterion, as well as the Alpha-fetoprotein level and Child-Pugh classification, can identify individuals carrying HCC in OLT waiting list who will show a greater dropout risk in waiting for the organ. The current criterion for OLT for HCC patients allow the minimization of dropout whether by tumor progression or death. The expansion of the 84 radiologic criterion for HCC transplantation demands cautious consideration due to the potential risk of tumor recurrence and survival reduction, as well as a probable impact in many other cirrhotic patients not carrying HCC. REFERENCES 1 Shawn J, Pelletier F, Veena T. 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