Anuário da Produção Acadêmica Docente Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 Luciano Júlio Chingui Faculdades Anhanguera de Campinas unidade 3 [email protected] Maria Theresa Munhoz Severi Faculdade Anhanguera de Piracicaba [email protected] Mariana de A. dos Santos Reis Faculdades Anhanguera de Campinas unidade 3 [email protected] Matheus Caiche Guedes Faculdades Anhanguera de Campinas unidade 3 PERFIL METABÓLICO DO MÚSCULO TIBIAL ANTERIOR DURANTE TRATAMENTO COM DEXAMETASONA RESUMO O objetivo desse estudo foi avaliar o perfil quimio-fisiológico do músculo Tibial anterior durante 5 dias de tratamento com o glicocorticóide Dexamentasona. Foram utilizados 12 ratos Wistar divididos em dois grupos experimentais (n=6 cada): controle (C) e tratado com Dexametasona por 5 dias (D5). Após o período experimental, foi realizado o (ITT) teste de tolerância à insulina e o músculo Tibial anterior foi retirado para a mensuração do peso muscular seco. Os dados foram submetidos à análise estatística por meio do teste de normalidade seguido de ANOVA e teste Tukey, com nível de significância fixado em p<0,05. Os resultados revelam a implantação de um status de resistência insulínica no grupo D5, onde teve redução de 46,92% na velocidade de decaimento da glicose, além de redução de 22,38% do peso muscular. Esses dados evidenciam que o tratamento com Dexametasona promove alterações quimio-fisiológicas que culminam com o quadro de hipotrofia muscular. Palavras-Chave: Atrofia muscular, músculo esquelético/metabolismo, Dexametasona. [email protected] ABSTRACT Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP. 13.278-181 [email protected] Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE The purpose of this study was to outline a chemo-Physiologic profile of the anterior tibial muscle for 5 days of treatment with the glucocorticoid dexamethasone. 12 Wistar rats were used divided in two experimental groups (n = 6 each): it controls (C) and treaty with Dexamethasone for 5 days (D5). After the trial period, was the accomplished (ITT) test of tolerance to the insulin and the muscle was anterior tibial was obtained for the measurement of the dry muscle weight. The data were submitted to the statistical analysis through the following Normality test by ANOVA and Tukey test, with significance level fastened in 0.05. The results reveal the implantation of the status of insulin resistance in the D5 grup, where he/she had reduction of 46.92% in the speed of the decline of glucose, besides reduction of 22.38% of the muscle weight. Those date evidence that the treatment with Dexamethasone promotes chemo-Physiologic alterations that you/they culminate with the picture of muscle hypotrophy. Keywords: Muscular atrophy, muscle skeletal/metabolism, dexamethasone. Artigo Original Recebido em: 2/10/2008 Avaliado em: 9/12/2008 Publicação: 19 de dezembro de 2008 267 268 Perfil metabólico do músculo Tibial anterior durante tratamento com Dexametasona 1. INTRODUÇÃO A musculatura esquelética é um tecido de muita importância para as atividades da vida diária, além disso, constitui-se como o principal tecido responsável pela homeostasia glicêmica e a sua manutenção é dependente dos mecanismos desencadeados pela insulina. Já se tem clareza de que a insulina exerce efeitos importantes no metabolismo muscular, pois por meio da sua via de sinalização que envolve ativação das proteínas IRS, proteína G, fosfolipase C, via fosfatidilinositol-3–quinase (PI-3-K) modula mecanismos de transporte de glicose, formação de reservas de glicogênio, além de modulação de DNA/RNA e síntese protéica (TAYLOR, 1991; RICHARSON et al. 1991; THOMAS et al. 2005). A hipotrofia muscular é uma condição muito comum na atualidade, e pode ser deflagrada em diferentes situações. Conhecidamente condições de trauma músculoesquelético, envelhecimento, distúrbios neuromusculares, desuso muscular decorrentes de imobilização ou permanência por longos períodos no leito induzem alterações homeostásicas no tecido muscular, e conseqüentemente provocam redução da síntese de proteínas contráteis e não contráteis e assim predispõem o músculo ao quadro de hipotrofia (BOONYAROM; INUI, 2006; LYNCH; SCHERTZER; RYALL, 2007; UDAKA et al. 2008; YAO et al. 2008). Diversos pesquisadores têm estudado a hipotrofia na atualidade. Entre os principais objetivos das pesquisas desenvolvidas estão: a compreensão dos mecanismos intrínsecos que promovem a perda de massa nas diferentes situações geradoras de hipotrofia, bem como o desenvolvimento de estratégias terapêuticas que possam se contrapor a esses mecanismos. Nesse sentido, trabalhos recentes têm postulado sobre as principais mudanças celulares que culminam com a perda de massa. Assim, pode-se destacar a dissolução de sarcômeros, degradação endotelial, redução drástica do número de mitocôndrias, acúmulo de tecido conjuntivo, redução na densidade capilar, redução da área de secção transversa e hiperplasia de fibras colágenas no músculo (BOONYAROM; INUI, 2006, SHEN et al., 2008). A terapia por glicocorticóides é muito comum nos dias atuais uma vez que essas substâncias atenuam processos inflamatórios e influenciam respostas imunológicas. A corticoterapia tem sido utilizada nos casos de insuficiência adrenocortical, no diag- Anuário da Produção Acadêmica Docente • Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 • p. 267-273 Luciano Júlio Chingui, Maria Theresa Munhoz Severi, Mariana de Almeida dos Santos Reis, Matheus Caiche Guedes nóstico de doenças como a síndrome de Cushing, tratamento agudo da hipoglicemia ou da hipercalcemia, além de tratamento de tumores (LONGUI, 2007). Em 2001, Kanda et al. ponderaram sobre o potencial que os glicocorticóides têm em alterar a homeostasia do tecido muscular, esses autores postularam que a Dexametasona promove alterações no perfil quimiometabólico do tecido muscular a ponto de comprometer os mecanismos de síntese protéica. Diante dessas considerações, o objetivo do presente trabalho foi avaliar por meio do teste de tolerância à insulina (ITT), e pelo peso muscular as alterações homeostásicas causadas pelo tratamento com Dexametasona no período de 5 dias. 2. METODOLOGIA Foram utilizados ratos albinos Wistar com 3 meses de idade, alimentados com ração (Purina® para roedores) e água ad libitum, submetidos a ciclos foto periódicos de 12h claro/escuro e distribuídos em 2 grupos experimentais com n=6, a saber: controle (C) e tratado com Dexametasona durante 5 dias (D5). Para a realização do ITT os animais foram anestesiados com pentobarbital sódico (50 mg/Kg de peso). 15 minutos após a anestesia foi feito um corte na cauda de cada animal por onde foram coletadas amostras de sangue. Após a primeira coleta (tempo zero, T0) foi injetado insulina regular Biobrás® 1U/Kg de peso (1U/ml) e outras amostras foram coletadas nos tempos 2,5, 5, 10 e 20 min. A glicemia foi avaliada por meio de glicosímetro (ACCU-CHEK). Após o ITT, com os animais sob o efeito da anestesia os mesmos foram sacrificados por deslocamento cervical e o músculo tibial anterior (TA) foi retirado e encaminhado para a determinação do peso seco. Os valores estão representados pelas médias ± erro padrão da média (média±epm). Para a obtenção do peso seco muscular, imediatamente após a retirada do músculo, o mesmo foi pesado em balança semi-analítica e em seguida colocado em uma estufa a 60°C. O músculo permaneceu na estufa por 3 horas. Foi considerado peso seco muscular o valor obtido após as 3 horas de desidratação, os valores estão expressos em miligramas (mg). Anuário da Produção Acadêmica Docente • Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 • p. 267-273 269 Perfil metabólico do músculo Tibial anterior durante tratamento com Dexametasona Para a análise estatística foi inicialmente aplicado o teste de normalidade (Kolmogorov-Smirnov), seguido da análise variância (ANOVA) e do teste de Tukey, com nível de significância de 5% (p< 0,05). 3. RESULTADOS Os resultados desse estudo revelam que o tratamento com dexametasona no período de 5 dias, compromete significativamente o metabolismo muscular. O ITT revela um estado de resistência insulínica no grupo D5, em comparação ao grupo C. O índice de decaimento da glicemia foi de (Média±epm C: 2,025±0,09 e D5: 1.075±0,07, *p<0,05), a velocidade de decaimento da glicose foi 46,92% menor no grupo D5, figura 1. A avaliação do peso do músculo ratifica o comprometimento da homeostasia muscular. O tratamento com Dexametasona provocou redução de 22,38% do peso do músculo TA (Média±epm C: 223,33 ±13,66 e D5: 173,33±13,66, *p<0,05), figura 2. D5* C 100 Constante de decaimento da glicose 270 95 90 85 80 75 0 5 10 15 20 Tempo (mim) Figura 1. Avaliação da taxa de remoção da glicose durante o teste de tolerância à insulina (ITT) de ratos do grupo (D5) em preto, e do grupo (C) em vermelho, *p<0,05 comparado ao controle (C). Anuário da Produção Acadêmica Docente • Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 • p. 267-273 Peso muscular (mg) Luciano Júlio Chingui, Maria Theresa Munhoz Severi, Mariana de Almeida dos Santos Reis, Matheus Caiche Guedes 250 * 200 150 100 50 0 C D5 Grupos experimentais Figura 2. Peso muscular (mg) nos grupos controle (C), e tratado com Dexametasona por 5 dias (D5). Os valores representam as médias±epm, n=5. *p<0,05 comparado ao controle (C). 4. DISCUSSÃO No ano de 2004, Carvalho, Soares Dias e Carneiro, ponderaram que a miopatia pode ocorrer em pacientes em uso de glicocorticóides por longos períodos, por outro lado, Santos, Rafacho e Bosqueiro, (2007), observaram que em curtos períodos de tratamento com Dexametasona já há comprometimento na sinalização insulínica, esses autores estudaram os efeitos gerados por glicocorticóide nos períodos de 24, 72 e 120h e concluíram que a resistência insulínica é tempo-dependente. Os resultados desse estudo mostram a presença de resistência insulínica no quinto dia de tratamento com dexametasona, além de comprometimento severo na massa do músculo tibial anterior. Esses resultados acompanham publicações recentes que avaliaram o comprometimento fisiológico provocado pela terapia com glicocorticóides. Vale evidenciar que em 2006, Salehian et al. estudaram os efeitos da dexametasona no período de 5 dias, sobre o peso de ratos e sobre o peso do músculo gastrocnêmio desses animais, foi observado aumento da expressão da miostatina muscular, associado à redução da massa muscular. Já Brown et al. (2007) avaliaram o conteúdo de IRS-1, os níveis de tirosina, serina, GLUT-1 e GLUT4 em músculos de ratos tratados com dexametasona, esse estudo permitiu concluir que o tratamento com dexametasona promove prejuízos na sinalização insulínica por um mecanismo desconhecido que independe da fosforilação de serina, depleção de IRS-1 ou redução da expressão de GLUT-1. Anuário da Produção Acadêmica Docente • Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 • p. 267-273 271 272 Perfil metabólico do músculo Tibial anterior durante tratamento com Dexametasona Nessa mesma linha de análise, Codere et al. (2007), estudaram em ratos a resistência à insulina, concentração de glicogênio e atividade da enzima glicogênio sintase no músculo gastrocnêmio, os autores aplicaram 3 diferentes modelos que induzem resistência insulínica, os resultados mostraram que o tratamento com dexametasona gerou hiperinsulinemia, além de redução do número de fibras dos músculos estudados. Na tentativa de entender o mecanismo pelo qual os glicocorticóides promovem hipotrofia muscular, trabalhos recentes têm observado mecanismos muito interessantes. Nesse sentido, Schakman et al. (2005) postularam que glicocorticóides induzem hipotrofia muscular principalmente devido à estimulação de proteólise e inibição da síntese protéica. Outro trabalho realizado em 2006 observou que a dexametasona deprime a síntese protéica muscular por meio da inibição da mTOR. A proteína Kinase mTOR regula entre outros mecanismos, a tradução de mRNA muscular. Assim, a repressão da mTOR promove inibição dos mecanismos de síntese protéica muscular, e conseqüentemente redução da massa muscular (WANG et al., 2006). Em um estudo bem mais recente, realizado por Zhao et al. (2008) onde a dexametasona foi aplicada em ratos de forma prolongada, foi observado que esse glicocorticóide aumenta a expressão da proteína ubiquitina, e assim acelera o catabolismo protéico responsável pelas perdas de massa muscular que deflagram o estado hipotrófico. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante dos resultados encontrados, bem como das ponderações presentes na literatura científica, conclui-se que o glicocorticóide dexametasona compromete os mecanismos de sinalização insulínica e desencadeia alterações metabólicas que culminam com a hipotrofia muscular. REFERÊNCIAS BOONYAROM, O.; INUI, K. Atrophy and hypertrophy of skeletal muscles: structural and functional aspects. Acta Physiol. n.188, 2006, p. 77-89. BROWN, P. D.; BADAL, S.; MORRISON, S.; RAGOOBIRSINGH, D. Acute impairment of insulin signalling by dexamethasone in primary cultured rat skeletal myocytes. Mol Cell Biochem. v.297, n.1-2, 2007, p.171-7. Anuário da Produção Acadêmica Docente • Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 • p. 267-273 Luciano Júlio Chingui, Maria Theresa Munhoz Severi, Mariana de Almeida dos Santos Reis, Matheus Caiche Guedes CARVALHO, F. N.; SOARES DIAS, R. J.; CARNEIRO, A. P. Miopatia por corticosteróide. Acta fisiátr. v.11, n.1, 2004, p.39-42. CODERRE, L.; VALLEGA, G. A.; PILCH, P. F. CHIPKIN, S. R. Regulation of glycogen concentration and glycogen synthase activity in skeletal muscle of insulin-resistant rats. Arch Biochem Biophys. v.464, n.1, 2007, p.144-50. HILDER, T. L.; BAER, L. A.; FULLER, P. M.; FULLER, C. A.; GRINDELAND, R. E.; WADE, C. E. et al. Insulin-independent pathways mediating glucose uptake in hindlimb-suspended skeletal muscle. J Appl Physiol. v.9, n.6, 2005, p. 2181-8. KANDA, F.; OKUDA, S.; MATSUSHITA ,T.; TAKATANI, K.; KIMURA, K.I.; CHIHARA K. Steroid myopathy: pathogenesis and effects of growth hormone and insulin-like growth factor-I administration. Horm Res. v.56, n.1, 2001, p.24-8. LONGUI, C. A. Corticoterapia: minimizando efeitos colaterais. J Pediatr (Rio J). v.83, n.5 (Supl.), 2007, p.S 163-171. LYNCH G. S.; SCHERTZER, J. D.; RYALL, J. G. Therapeutic approaches for muscle wasting disorders. Pharmacol Ther. n.113, 2007, p.461-487. RICHARDSON, J. M.; BALON, T. W.; TREADWAY, J. L.; PESSIN, J. E. Differential regulation of glucose transport activity and expression in red and write skeletal muscle. J. Biol. Chem. n.266, 1991, p. 2690-12694. SALEHIAN, B.; MAHABADI, V.; BILAS, J.; TAYLOR, W. E.; MA, K. The effect of glutamine on prevention of glucocorticoid-induced skeletal muscle atrophy is associated with myostatin suppression. Metabolism. v.55, n.9, 2006, p.1239-47. SANTOS, C. L.; RAFACHO, A.; BOSQUEIRO, J. R. Efeitos da administração de dexametasona in vivo sobre Glicemia, insulinemia e substratos circulantes são Dependentes do tempo de tratamento. Biosci. J. v.23, n.3, 2007, p.101-110. SCHAKMAN, H. O.; GILSON, V.; DE CONINCK, G. V.; LAUSE, P.; VERNIERS, J.; X. HAVAUX, X. et al. Insulin-Like Growth Factor-I Gene Transfer by Electroporation Prevents Skeletal Muscle Atrophy in Glucocorticoid-Treated Rats. Endocrinology. v.146, n.4, 2005, p.1789-1797. SHEN, Y.; XU, J.; XU, W.; XU, L.; LU, J.; GU, Y. Experimental study on neural stem cell transplantation delaying denervated muscle atrophy. Zhongguo Xiu Fu Chong Jian Wai Ke Za Zhi. v.22, n.9, 2008, p.1051-5. TAYLOR, R. Insulin action. Clin. Endocrin. n.34, 1991, p.159-171. UDAKA, J.; OHMORI, S.; TERUI, T.; OHTSUKI, I; ISHIWATA, S. KURIHARA, S. et al. Disuseinduced preferential loss of the giant protein titin depresses muscle performance via abnormal sarcomeric organization. J Gen Physiol. v.131, n.1, 2008, p.33-41. WANG, H.; KUBICA, N.; ELLISEN, L. W.; JEFFERSON, L. S.; SCOT R. KIMBALL, S. R. Dexamethasone Represses Signaling through the Mammalian Target of Rapamycin in Muscle Cells by Enhancing Expression of REDD1. The journal of biological chemistry. v.281, n.51, 2006, p.39128-39134. YAO, J.; LIN, X.; TIAN, H.; SHI, W.; JIAO, H.; WANG, X. Time limit of repairing old sciatic nerve defect in rats. Zhongguo Xiu Fu Chong Jian Wai Ke Za Zhi. v.22, n.9, 2008, p.1068-72. ZHAO, W.; PAN, J. ZHAO, Z.; WU, Y.; BAUMAN, W. A.; CARDOSO, C. P. Testosterone protects against dexamethasone-induced muscle atrophy, protein degradation and MAFbx upregulation. J Sterid Biochem Mol Biol. v.110, n.1-2, 2008, p.125-9. Anuário da Produção Acadêmica Docente • Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 • p. 267-273 273