m O PREDICADO DAS SMALL CLAUSES ADJETIVAIS Andréia de Fátima Rutiquewiski Gomes (UNICENTRO), e-mail: [email protected] Universidade Estadual do Centro-Oeste/Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes/Departamento de Letras Palavras-chave: análise semântica, predicado individual level, predicado stage level, small clauses adjetivais. Resumo: Esta pesquisa realiza reflexões sobre a interpretação dos predicados adjetivais das small clauses complementos de verbos como considerar. Uma análise mostra que essas estruturas permitem não apenas predicados com interpretação individual level, mas também stage level. Introdução Diferentes construções podem ser compreendidas como small clauses. É por isso que, inicialmente, precisamos esclarecer que as estruturas focalizadas neste estudo são as small clauses complementos de verbos do tipo de considerar (verbos judicativos), como exemplifica a sentença em (1): (1) Eu considero [o Pedro inteligente]SC. A estrutura entre colchetes em (1) caracteriza-se como uma small clause. O sujeito desta construção - o Pedro - não é subcategorizado pelo verbo da sentença matriz (considerar), porque este seleciona todo o complemento o Pedro inteligente ao qual atribui papel temático interno. Isso faz com que o NP (sintagma nominal) o Pedro receba apenas marcação temática de inteligente. Como não há flexão verbal dentro da small clause, seu sujeito recebe Caso Acusativo, via ECM (Exceptional Case Marking Marcação Excepcional de Caso), do verbo principal. É importante destacar ainda que a small clause em (1) é adjetival, ou seja, apresenta um adjetivo na posição de predicado [NP AP]SC. Materiais e Métodos Esta pesquisa é de cunho bibliográfico e baseia-se em materiais linguísticos construídos pela intuição de falante nativo. Não é utilizado, portanto, nenhum banco de dados. Anais da SIEPE – Semana de Integração Ensino, Pesquisa e Extensão 26 a 30 de outubro de 2009 m Resultados e Discussão Segundo Carlson (1977), há predicados que são considerados tipicamente individual level, como é o caso de gostar, saber, inteligente, alto, e predicados que são concebidos genericamente como stage level, como por exemplo escrever, contente, bêbado, tonto. Entretanto, muitos autores já observaram que esta divisão não é tão simples quanto parece, pois o contexto sintático pode interferir na interpretação do predicado. Existem situações em que um predicado individual level funciona como stage level. Isto é o que acontece, por exemplo, com os predicados adjetivos inteligente e bonito nas sentenças abaixo: (2) a. João é inteligente. b. João é inteligente em algumas áreas do conhecimento. (3) a. João é bonito. b. João é bonito perto do Pedro. Pelos exemplos (2) e (3) é possível verificar que os adjetivos inteligente e bonito podem ter interpretações individual level (2a e 3a) e stage level (2b e 3b). Vejamos agora como se comportam adjetivos como doente (concebidos, em geral, como predicados temporários) nas sentenças em (4): (4) a. João está doente. b. João parece doente. c. João é doente. Nos exemplos em (4), o adjetivo doente pode ter diferentes leituras. Em (4a) e (4b), doente não pode ser considerado uma propriedade individual level de João, mas stage level. Já em (4c), doente precisa ser compreendido como uma propriedade necessariamente inerente (individual level) de João. Estas interpretações estão diretamente relacionadas aos verbos copulares ser (individual level) e estar (stage level) que, no português, apresentam particularidades bem definidas. Os exemplos em (5) sugerem, no entanto, que nem sempre um predicado pode receber as duas interpretações em questão: (5) a. João chegou cansado. b. João está cansado. c. João parece cansado. d. Este trabalho deixa João cansado. e. *João é cansado. O adjetivo cansado em (5a-d) é interpretado como propriedade stage level do indivíduo João, pois a tentativa de forçar uma interpretação Anais da SIEPE – Semana de Integração Ensino, Pesquisa e Extensão 26 a 30 de outubro de 2009 m individual level para cansado torna a sentença agramatical (5e). Esta agramaticalidade ocorre porque há uma combinação de cansado com o verbo ser, que é genuinamente individual level. Vejamos agora como se comportam os predicados adjetivos nas small clauses complementos de verbos como considerar : (6) a. Considero o Carlos insuportável. b. Considero o Carlos, às vezes, insuportável. (7) a. Acho o Carlos esperto. b. Acho o Carlos raramente esperto. Os mesmos fenômenos linguísticos aparecem quando são aplicados estes testes na estrutura de uma small clause complemento, pois adjetivos como insuportável e esperto podem receber, dependendo do contexto sintático em que estão inseridos, interpretações individual level (6a e 7a) ou stage level (6b e 7b). Fato este que não ocorre quando há small clauses complementos com adjetivos como doente (8) ou cansado (9) na posição de predicado: (8) a. Considero o João doente. b. Considero o João sempre doente. c. Considero o João, às vezes, doente. O adjetivo doente não pode ser considerado como uma propriedade inerentemente individual level em nenhuma das estruturas em (8). Nem mesmo com a inserção do advérbio sempre, pois João pode sempre estar doente e não ser uma pessoa doente. O mesmo comportamento apresenta o adjetivo angustiado, já que as sentenças em (9) podem ser compreendidas como considero que o João está angustiado/Considero que o João está sempre angustiado. (9) a. Considero o João angustiado. b. Considero o João sempre angustiado. Angustiado até pode ter uma interpretação individual level, dependendo do contexto situacional, quando enfatizamos o verbo ser, em sentenças como O João é uma pessoa angustiada. Contudo, nas small clauses complementos de verbos como considerar, adjetivos como angustiado, resolvido, cansado, doente, bêbado não são, necessariamente, interpretados como individual level, como também mostram as sentenças em (10): (10) a. Considero o problema resolvido. b. Considero estar resolvido o problema. c. *Considero ser resolvido o problema. Anais da SIEPE – Semana de Integração Ensino, Pesquisa e Extensão 26 a 30 de outubro de 2009 m d. ? Considero o problema sempre resolvido. Resolvido não pode receber interpretação individual level em (10a) e nem mesmo a cópula ser é aceita na sentença (10c). Estes fatos mostram que os adjetivos do tipo de bonito, alto, inteligente (e todos aqueles que segundo a distinção clássica são individual level) podem com mais facilidade ser empregados como individual level e stage level. Já adjetivos como cansado, bêbado, tonto, doente, resolvido e enfermo (tipicamente considerados stage level) não permitem interpretações individual level, sobretudo em estruturas de small clauses de verbos como considerar. Autores como Rothstein (1995), Foltran (1999, 2001) e Gomes (2006) defendem que o contexto sintático de uma small clause de verbo como considerar parece conduzir a leituras individual level dos predicados. No entanto, a análise que desenvolvemos nesta pesquisa contradiz a hipótese da literatura acerca do fato de que as small clauses determinam leituras individual level de seus predicados, pois mostramos que os predicados de categoria adjetival encaixados nestas estruturas não recebem apenas interpretação individual level, mas também stage level. Conclusões Discutimos neste estudo a questão do predicado adjetival das small clauses complementos de verbos como considerar. Os resultados indicam que essas construções permitem leituras individual level e stage level e, desse modo, ao contrário do que afirma a literatura, não determinam apenas interpretações inerentes (individual level). Referências CARLSON, G. Reference to kind in English. PH Dissertation. UMass. Amherst, 1977. FOLTRAN, M. J. As construções de predicação secundária no português do Brasil: aspectos sintáticos e semânticos. São Paulo, 1999. Tese de doutorado – Universidade de São Paulo. ________. Predicados complexos. Revista Letras. Curitiba, n.53, p. 127-139, 2001. GOMES, A. R. G. As small clauses complementos no português do Brasil. Curitiba, 2006. Tese de Doutorado – Universidade Federal do Paraná. ROTHSTEIN, S. Small Clauses e Copular Constructions. In: CARDINALETTI, A.; GUASTI, M. T. Sintax e Semantics: Small Clauses. Vol. 28. Califórnia: Academic Press, 1995. 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