Trabalho - SOVERGS

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METÁSTASE INTRAOCULAR DE TUMOR VENÉREO TRANSMISSÍVEL EM CÃO –
RELATO DE CASO
INTRAOCULAR METASTASIS OF TRANSMISSIBLE VENEREAL TUMOR IN A DOG –
CASE REPORT
Fernando Yoiti Kitamura Kawamoto1; Gabriela Rodrigues Sampaio2; Luciane dos Reis Mesquita3;
Lenara Gonçalves e Souza4; Flademir Wouters5; Filipe Curti1; Rodrigo Barros1; Luís Guilherme de
Faria1
Resumo:
O tumor venéreo transmissível acomete primariamente as células redondas da mucosa genital externa
de cães de ambos os sexos. As metástases desse tipo de tumor são raras, principalmente nos olhos e
estruturas anexas. A implantação das células vivas ocorre por contato direto e o tratamento é realizado
por meio de quimioterapia e/ou excisão cirúrgica.
Palavras-chave: tumor venéreo transmissível, metástase, intraocular, cães.
Abstract:
The transmissible venereal tumor affects primarily the round cells of the mucosa of external genital in
dogs of both sexes. The metastasis of this type of tumor is rare, especially in the eye and associated
structures. The implantation of living cells occurs by direct contact and treatment is accomplished by
chemotherapy and/or surgical excision.
Keywords: transmissible venereal tumor, metastasis, intraocular, dogs.
As neoplasias, tanto primárias quanto secundárias, podem afetar as túnicas oculares, anexos e
outras estruturas do olho. Os sinais clínicos variam consideravelmente de acordo com a localização e
natureza das anormalidades desenvolvidas, sendo o glaucoma e a inflamação, as alterações
secundárias mais graves que podem levar à perda do olho (CONCEIÇÃO et al., 2010).
O tumor venéreo transmissível (TVT) é um tipo de neoplasia indiferenciada que acomete
primariamente as células redondas da mucosa genital externa de cães de ambos os sexos. A
transmissão ocorre pela implantação direta de células tumorais durante o coito, brigas ou contatos
entre animais portadores. Os animais jovens apresentam maior risco de contrair essa neoplasia, pois
são mais ativos sexualmente (FERREIRA et al., 2000; RODRIGUES et al., 2001; SANTOS et al.,
2005; DUARTE et al., 2006; PARK et al., 2006). Existem relatos de maior suscetibilidade nos machos
(MOUTINHO et al., 1995).
O TVT é transmitido por células vivas, não requerendo a transformação das células do hospedeiro.
Para que haja seu desenvolvimento é necessário que a pele ou a mucosa apresente escoriações ou
soluções de continuidade (SANTOS et al., 2005; PARK et al., 2006). Após serem implantadas, as
células neoplásicas crescem como um enxerto. As metástases são raras e representam menos de 5%
dos casos, sendo relatadas em linfonodos, rim, pulmão, baço, pele, tecido subcutâneo, hipófise,
peritônio, musculatura, cérebro, fígado, pâncreas, cavidade oral, seios nasais, tonsilas e nervos
(MOUTINHO et al., 1995; FERREIRA et al., 2000; RODRIGUES et al., 2001; SANTOS et al., 2005;
DUARTE et al., 2006; PARK et al., 2006).
_______________________
1
Médico Veterinário Residente em Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais – Universidade Federal de Lavras UFLA, Lavras (MG);
2
MV, MSc, DSc - Professora Adjunta – Departamento de Medicina Veterinária – Universidade Federal de
Lavras - UFLA, Lavras (MG);
3
MV, Mestranda em Ciências Veterinárias – Universidade Federal de Lavras - UFLA, Lavras (MG);
4
Médica Veterinária Autônoma, Florianópolis (SC);
5
MV, MSc – Professor Assistente - Departamento de Medicina Veterinária – Universidade Federal de Lavras UFLA, Lavras (MG).
Fernando Yoiti Kitamura Kawamoto1 – Av. Trevo de Santa Maria, 538 – Parque Guarani, São Paulo (SP) – CEP
08235-560 / [email protected]
Em casos raros, o TVT pode causar metástase nos olhos e em estruturas anexas, sendo que o
envolvimento da câmara anterior, originado da íris e corpo ciliar, é decorrente de metástase via
hematógena (SANTOS et al., 2005).
O diagnóstico é realizado por meio de ultrassonografia, citologia e biópsia. Histologicamente
não são observadas diferenças qualitativas quando se comparam tumores de localização genital e
extragenital; porém, dependendo do estágio de evolução observam-se alterações qualitativas
(SANTOS et al., 2005; CONCEIÇÃO et al., 2010). Mas, independentemente da localização
anatômica, existe a indicação de excisão de todo tecido neoplásico, o que muitas vezes é curativo
(CONCEIÇÃO et al., 2010). Outras formas de tratamento incluem radioterapia, imunoterapia e
quimioterapia (VALLADÃO et al., 2010).
Pretende-se, com o presente trabalho, relatar um caso de TVT intraocular em uma cadela.
Uma cadela da raça Poodle, com seis anos de idade, foi atendida no Hospital Veterinário para
avaliação oftálmica. O proprietário relatou que o animal já havia apresentado uma massa vaginal
semelhante à couve-flor, friável e hemorrágica há aproximadamente oito meses antes desse novo
atendimento, a qual foi diagnosticada como TVT. O tratamento quimioterápico apropriado havia sido
realizado com sucesso. Porém, relatou que há um mês antes desse atendimento notou dificuldade
visual e vermelhidão no olho direito do animal.
Ao exame físico, o animal apresentava os parâmetros vitais dentro da normalidade para a
espécie e intensa ixodidose. Ao exame oftálmico, observou-se hifema acentuado, vasos episclerais
ingurgitados, conjuntiva hiperêmica e aumento de sensibilidade dolorosa no olho direito. Havia a
presença de um nódulo encapsulado, róseo, de superfície lisa e de consistência firme na região
temporal da conjuntiva bulbar desse olho, parecendo se originar da esclera. O teste de produção
lacrimal de Schirmer evidenciou uma diminuição na produção lacrimal dos dois olhos (12
mm/minuto) e a coloração pela fluoresceína sódica 2% corou discretamente a córnea do olho
esquerdo. O exame de fundo do olho direito não foi possível devido ao hifema.
Realizou-se exame hematológico, constatando-se trombocitopenia (52.000 plaquetas/mm3).
De acordo com os achados, atribuiu-se ao quadro hematológico uma possível hemoparasitose, tendo a
uveíte como consequência, indicada pela presença do hifema. Instituiu-se tratamento para
hemoparasitose com 10mg/kg de doxiciclina, uma vez ao dia por trinta dias, no intuito de realizar o
diagnóstico terapêutico. Prescreveu-se, também, medicação oftálmica tópica com colírio de
ciprofloxacina/dexametasona, três vezes ao dia até novas recomendações no olho direito, e colírio de
ciprofloxacina e sulfato de condroitina A associado à pomada oftálmica, três vezes ao dia até novas
recomendações em ambos os olhos.
O retorno da paciente foi realizado em 15 dias, já apresentando normalização da contagem de
plaquetas. À avaliação oftálmica notou-se significativa diminuição do hifema do olho direito, mas a
câmara anterior se apresentava repleta por conteúdo opaco. Observou-se que o nódulo encapsulado na
conjuntiva/esclera, além de extenso, causou intensa deformidade intraocular, indicando-se, então, a
cirurgia de enucleação.
O olho e anexos excisados foram enviados para exame histopatológico, que confirmou o
diagnóstico de TVT, caracterizado como uma massa tumoral composta por células redondas de núcleo
volumoso e citoplasma escasso com moderado número de mitoses, sustentadas por estroma
fibrovascular delicado e presença de múltiplos focos de linfócitos em meio às células neoplásicas. A
neoplasia ocupava toda a câmara vítrea do bulbo ocular e apenas formava uma saliência sob a esclera
e a conjuntiva bulbar, sem envolvimento dessas camadas, o que causou a aparência do nódulo
observado ao exame oftálmico externo.
Recomendaram-se cinco sessões de quimioterapia com sulfato de vincristina (0,5mg/m2) por
via intravenosa, com intervalo de sete dias entre cada sessão. É importante salientar que no momento
do diagnóstico do TVT intraocular não havia sua presença genital, chamando a atenção para o
desenvolvimento tardio da massa intraocular, a qual não apresentava as características clássicas dessa
neoplasia.
Após dez dias da cirurgia, a ferida cirúrgica encontrava-se cicatrizada e sem qualquer sinal de
recidiva da massa tumoral. O animal foi acompanhado, após o término da quimioterapia, por um
período de um ano e não se observou outro foco metastático.
2
A patogênese do TVT é diferente dos outros tipos de neoplasia, uma vez que não se trata de
células hospedeiras que se tornaram neoplásicas, e sim de células neoplásicas vivas que são
transmitidas entre os indivíduos (FERREIRA et al., 2000; PAI et al., 2011).
Estudos demonstraram que a incidência e a progressão desse tumor dependem da
imunocompetência do animal, ou seja, apresenta um comportamento benigno em cães com boa
condição geral, havendo a possibilidade de regressão, ou crescem progressivamente em animais
imunodeprimidos (FERREIRA et al., 2000; PARK et al., 2006). No caso relatado, a presença de uma
hemoparasitose pode ter influenciado no crescimento do TVT intraocular, já que esta enfermidade
compromete o sistema imune do animal.
A maioria dos casos de TVT extragenital em cães é resultante de heteroimplantação ou
autoimplantação. As metástases por via hematógena ou linfática são incomuns (FERREIRA et al.,
2000; PARK et al., 2006). Neste relato, o tratamento realizado anteriormente para o TVT vaginal
obteve resultado satisfatório, com total regressão da massa. Entretanto, o surgimento do TVT
intraocular oito meses depois, apresentando o envolvimento de toda câmara vítrea sem o
comprometimento da túnica externa (esclera) ou da conjuntiva bulbar, sugere se tratar de uma
metástase. Apesar de a transmissão por implantação direta nessa área também ser possível, segundo
Rodrigues et al. (2001) o crescimento tumoral, nesse caso, seria na face externa do bulbo e com as
características clássicas do TVT.
Mesmo sendo raro, o TVT intraocular metastático deve ser considerado no diagnóstico
diferencial das neoplasias oculares. Nesse caso, o crescimento do tumor leva ao comprometimento das
estruturas internas do olho, o que normalmente resulta na perda do mesmo, culminando no
procedimento de enucleação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. CONCEIÇÃO, L.F.; RIBEIRO, A.P.; PISO, D.Y.T.; LAUS, J.L. Considerations about ocular
neoplasia of dogs and cats. Ciência Rural, v. 40, p. 2235-2242, 2010
2. DUARTE, R.; NIERO, R.; DORETTO, J.S.; MANZAN, R.M.; KOGIKA, M.M. Eritrocitose
associada a tumor venéreo transmissível em cão: relato de caso. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec.,
v. 58, p.1018-1023, 2006.
3. FERREIRA, A.J.A.; JAGGY, A.; VAREJÃO, A.P.; FERREIRA, M.L.P.; CORREIA, J.M.J.;
MULAS, J.M.; ALMEIDA, O.; OLIVEIRA, P.; PRADA, J. Brain and ocular metástases from
a transmissible veneral tumour in a dog. Journal of Small Animal Practice, v.41, p. 165-168,
2000.
4. MOUTINHO, F.Q.; SAMPAIO, G.R.; TEIXEIRA, C.R.; SEQUEIRA, J.L.; LAUFER, R.
Tumor venéreo transmissível com metástases cutâneas em um cão. Ciência Rural, v. 25, p.
469-471, 1995.
5. PAI, C.; KUO, T.; MAO, S.J.T.; CHUANG, T.; LIN, C.; CHU, R. Immunopathogenic
behaviors of canine transmissible venereal tumor in dogs following an immunotherapy using
dendritic/tumor cell hybrid. Veterinary Immunology and Immunopathology, v. 139, p. 187–
199, 2011.
6. PARK, M.; KIM, Y.; KANG, M.; OH, S.; CHO. D.; SHIN, N.; KIM, D. Disseminated
transmissible veneral tumor in a dog. J Vet Diagn Invest, v. 18, p. 130–133, 2006.
7. RODRIGUES, G.N.; ALESSI, A.C.; LAUS, J.L. Intraocular transmissible veneral tumor in a
dog. Ciência Rural, v. 31, p. 141-143, 2001.
8. SANTOS, F.G.A.; VASCONCELOS, A.C.; NUNES, J.E.S.; CASSALI, G.D.; PAIXÃO,
T.A.; MORO, L. O tumor venéreo transmissível canino – aspectos gerais e abordagens
moleculares (Revisão de literatura). Biosci. J., v. 21, p. 41-53, 2005.
9. VALLADÃO, M.L.; SCARPELLI, K.C.; METZE, K. Clinical utility of a life quality score in
dogs with canine transmissible venereal tumor treated by vincristine chemotherapy. Arq. Bras.
Med. Vet. Zootec., v. 62, p. 1086-1093, 2010.
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