CAPÍTULO VI PROPRIEDADES MECÂNICAS

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CAPÍTULO VI
PROPRIEDADES MECÂNICAS
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo VI: Propriedades Mecânicas
Prof. Angelus G. P. da Silva
PROPRIEDADES MECÂNICAS
6.1. Introdução
Os materiais cerâmicos, assim como outros tipos de materiais, são também utilizados em
atividades que requerem resistência a esforços mecânicos. Portanto devem resistir de modo
confiável a estes esforços. As cerâmicas apresentam propriedades mecânicas bastante diferentes
daquelas exibidas pelos metais. Em geral, as propriedade mecânicas das cerâmicas são inferiores às
propriedades mecânicas dos metais, entretanto sua aplicação em substituição aos metais, em alguns
casos, deve-se a outras propriedades dos materiais cerâmicos que são imbatíveis. Por exemplo, as
cerâmicas possuem alta resistência à oxidação e ao ataque químico por metais e escórias líquidas.
As cerâmicas possuem também, em média, menor densidade que os metais.
Em termos de propriedades mecânicas, a resistência à compressão das cerâmicas é maior que
a dos metais, em face à alta energia das ligações iônicas, entretanto sua resistência à tração é
muitíssimo inferior, devido à enorme sensibilidade que têm os materiais cerâmicos à presença de
defeitos estruturais introduzidos pelas técnicas de produção. Outras grandes desvantagens dos
materiais cerâmicos são que falham por fratura frágil e que as tensões que provocam falhas das
estruturas cerâmicas variam muito em torno de um valor médio. Isto torna esta classe de materiais
pouco confiável.
Neste capítulo veremos as propriedades mecânicas das cerâmicas, como são determinadas e
como explica-las.
6.2. Comportamento tensão – deformação
A figura 6.1 mostra diagramas de tensão deformação para materiais que apresentam
comportamentos distintos quando submetidos a esforços de tração. Os diagramas a e b representam
materiais com comportamento plástico. O diagrama (a) representa um material com comportamento
frágil, típico de cerâmicas. Os diagramas de materiais plásticos são compostos por duas etapas
distintas. A primeira etapa, que ocorre nas tensões mais baixas, é caracterizada por uma reta. A
segunda etapa é caracterizada por um comportamento não linear. Neste, a tensão necessária para a
deformação pode aumentar continuamente, como em (b), ou pode ter apresentar um comportamento
serrilhado, como em (c). A tensão para se continuar a deformação deve ser cada vez maior, até um
máximo. A partir daí, a deformação pode ser continuada com valores de tensão menores.
Figura 6.1: Diagramas típicos de tensão deformação para materiais dúcteis (b,c) e material frágil
(a), como uma cerâmica. Fonte: D. Richerson
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A etapa linear recebe o nome de regime elástico. A parte não linear recebe o nome de regime
plástico. No regime elástico, a deformação sofrida pela estrutura é totalmente recuperada quando a
tensão é desativada. No regime plástico, a deformação permanece após a tensão ser desativada.
Em um ensaio para levantamento do comportamento de tensão e deformação de um material,
a tensão é definida como a razão entre a força (F) aplicada sobre uma dada seção transversal de área
A. A deformação depende de que tipo de ensaio está sendo feito. No caso de um ensaio de tração, a
deformação é definida como a razão entre a elongação sofrida pela peça sendo ensaiada e seu
comprimento inicial (Relação 1). No caso de um ensaio de cisalhamento, a deformação é definida
como a tangente do ângulo de deformação (Relação 2). A figura 6.2 ilustra ambas situações.
Δl
ε=
(1)
l0
ε = tgθ
(2)
Figura 6.2: Deformações do corpo de prova quando submetido à tensão de tração (a) e à tensão de
cisalhamento (b). Fonte: W. Callister.
6.3. Módulo de elasticidade
No regime elástico a tensão e a deformação possuem uma relação linear. A inclinação da reta
tensão versus deformação é definida como o módulo de elasticidade ou o módulo de Young,
σ = Eε
(3)
O módulo de elasticidade é uma propriedade intrínseca do material, estando relacionado a sua
rigidez. Quanto maior E maior é dita a rigidez do material. Ele está também relacionado à energia
de ligação do material. Quanto maior a energia de ligação maior é o módulo de elasticidade. Maior
é também a temperatura de fusão. A tabela 6.1 traz uma lista de diversos materiais metálicos,
cerâmicos e poliméricos para comparação. As unidades de tensão e módulo de elasticidade são
iguais uma vez que a deformação é adimensional.
A figura 6.3 mostra as forças repulsiva e atrativa envolvidas na ligação entre dois átomos. A
posição de equilíbrio de ambos os átomos, que caracteriza a distância interatômica dos átomos
ligados, é o ponto em que as forças atrativa e repulsiva se igualam em módulo, identificado na
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curva de força resultante pelo valor nulo. É visto também que a intensidade da força resultante varia
diferentemente quando a distância é encurtada ou aumentada. A curva se inclina muito mais
rapidamente, aumentando a força repulsiva, quando a distância é encurtada, do que quando a
distância é aumentada. Ou seja, a força atrativa não aumenta tão rapidamente quanto a força
repulsiva. Isto traz conseqüências. Uma força compressiva tende a aproximar os átomos. Esta força
compressiva encontrará uma resistência muito forte oferecida pela força de ligação atômica.
Uma força de tração tende a distanciar os átomos. Haverá uma força atrativa que tenta
aproximar novamente os átomos, entretanto esta força não é tão forte quanto a força repulsiva.
Portanto, em princípio, o módulo de elasticidade para esforços compressivos deve ser maior que o
módulo de elasticidade para esforços de tração. Observe que a força de atração atinge um máximo e
depois diminui assintoticamente. Isto significa que após o ponto de máximo, os átomos podem ser
afastados com emprego de tensões menores. A distância correspondente ao máximo será uma
distância crítica, além da qual a ligação entre os átomos será rompida. É importante ressaltar que as
forças repulsiva e atrativa são restauradoras, ou seja, elas tendem a trazer os átomos para a posição
de equilíbrio. Isto caracteriza a deformação elástica. Medições do módulo de elasticidade para
esforços trativos e compressivos comprovaram o comportamento das forças mostrado na figura 6.3.
Tabela 6.1: Relação de módulo de elasticidade e ponto de fusão de diversos materiais. Note a
relação entre estas propriedades. Quanto maior o módulo de elasticidade maior o ponto de fusão.
Fonte: Van Vlack.
Com o aumento da temperatura, devido à vibração mais intensa dos átomos, a distância média
interatômica aumenta. Isto deve diminuir o módulo de elasticidade. De fato, o módulo de
elasticidade decresce com o aumento da temperatura, conforme comprovado por inúmeros
experimentos.
O módulo de elasticidade também depende da orientação cristalina em que ele é medido, para
o caso de monocristais. Isto porque em monocristais, a distância entre planos paralelos depende da
orientação cristalina. Planos cristalinos mais distanciados possuem ligação mais fraca. Logo, nas
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direções em que os planos cristalinos são mais distantes, o módulo de elasticidade é menor que nas
direções em que os planos cristalinos são mais próximos. Isto é mais um exemplo de anisotropia.
Os materiais policristalinos são isotrópicos. Os grãos estão orientados aleatoriamente. A
tensão externa é aplicada em uma direção. Cada orientação cristalina tem seu próprio módulo de
elasticidade. O módulo resultante é uma média dos módulos de cada grão. Portanto, o valor do
módulo de elasticidade medido em amostras policristalinas é um valor médio. Um material
policristalino sofrendo um carregamento em uma determinada direção vai ser deformado naquela
direção. A deformação é a mesma para todos os grãos, naquela direção, independente de sua
orientação particular. Se pegarmos dois grãos igualmente deformados, mas orientados
diferentemente, um grão terá módulo de elasticidade maior do que o outro. Aquele grão que tiver o
maior módulo de elasticidade será submetido à tensão maior do que o outro. Desta forma, pode-se
deduzir que embora possamos tratar o módulo de elasticidade de um policristalino como um valor
médio, as tensões no seu interior são heterogeneamente distribuídas. Assim, alguns grãos estão
sofrendo tensões muito maiores que outros. Estes grãos podem se romper antes que os demais e
iniciar a falha da peça.
Figura 6.3: Forças que atuam entre dois átomos ligados. O módulo de elasticidade está relacionado
à inclinação da força resultante. O ponto X identifica a distância além da qual a força atrativa
diminui. Este ponto é considerado o ponto de ruptura da ligação. Fonte: Van Vlack.
Em materiais que possuem mais de uma fase, o módulo de elasticidade resultante é um valor
intermediário entre os módulos de elasticidades de cada fase e pode ser estimado pela regra das
misturas. Este valor é uma média ponderada dos módulos de elasticidade de cada fase, tendo a
fração em volume de cada fase como o peso da média
E = EαVα + Eβ Bβ
(4)
onde Eα e Eβ são os módulos de elasticidade das fases α e β e Vα e Vβ são as frações em volume
destas mesmas fases. No caso em que a estrutura policristalina possua poros, os poros podem ser
encarados como uma segunda fase, mas uma fase sem módulo de elasticidade. Neste caso, o
módulo de elasticidade resultante é dado por
E = E0 (1 − 1,9 P + 0,9 P 2 )
(5)
onde E0 é o módulo de elasticidade do material com porosidade nula e P é a fração volumétrica dos
poros na estrutura.
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6.3.1. Medição do módulo de elasticidade
O módulo de elasticidade pode ser medido de duas maneiras distintas. A primeira é pelo
diagrama de tensão versus deformação, determinando-se a inclinação da reta no regime elástico.
Este método é problemático para medição em altas temperaturas, pois a medição da deformação é
feita por um sensor que é acoplado à amostra. Em altas temperaturas isto é problemático e fonte de
erros. A outra forma de medir o módulo de elasticidade é pela medição da freqüência de
ressonância da amostra. Esta freqüência depende do módulo de elasticidade e da forma da amostra.
Cálculos que levam em conta a forma da amostra permitem determinar o módulo de elasticidade
uma vez que se meça a freqüência de ressonância.
6.3.2. Módulo de cisalhamento
Quando um corpo é exigido por uma tensão de cisalhamento, existe também uma relação
linear entre a tensão cisalhante e a deformação que ela provoca. Pode-se então definir uma
constante de proporcionalidade denominada módulo de cisalhamento (G)
τ = Gγ
(6)
onde γ é a tangente do ângulo de formação.
6.3.3. Módulo de Poisson
Quando uma estrutura é exigida por tração, ocorre o alongamento da estrutura na direção do
carregamento, mas também ocorre uma contração na direção ortogonal. A razão entre a deformação
ortogonal e a deformação longitudinal é definida como o módulo de Poisson e também é uma
característica de cada material. Do mesmo modo que o módulo de elasticidade é anisotrópico, assim
também o é o módulo de Poisson. A figura 6.4 esquematiza a situação. O módulo de Poisson é
sempre menor que 0,5. Este valor corresponde aquele para o qual a contração compensa o
alongamento da estrutura de modo que nenhuma variação do volume da amostra acontece. O
módulo de Poisson para estruturas não compactas tende a ser menor que aquela para estruturas
compactas. Para materiais isotrópicos, o módulo de elasticidade e o módulo de cisalhamento estão
relacionados ao módulo de Poisson por
E = 2G (1 + ν )
(8)
Figura 6.4: Relação entre deformações longitudinal de transversal para definição do módulo de
Poisson. Fonte: D. Richerson.
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6.4. Plasticidade de cerâmicas
Suponha um corpo de prova cilíndrico sujeito a uma força de tração F na direção de seu eixo.
F
A área transversal é A. A tensão na direção axial é escrita como σ = . Suponha um plano que
A
corta o cilindro de modo inclinado, como mostra a figura 6.5(a). A normal a este plano faz um
ângulo θ com o eixo da direção do carregamento. A componente da força de carregamento F na
direção normal ao plano inclinado é Fn = F cosθ . Para calcular a tensão de tração que age sobre
A
este plano inclinado dividimos este componente pela área do plano inclinado, que é An =
.A
cosθ
F
F cosθ F
tensão normal é assim. σ n = n =
= cos 2 θ = σ cos 2 θ Existe ainda um componente
A
An
A
cosθ
tangencial da força F, ou seja, uma componente da força paralela ao plano. Seja λ o ângulo entre
uma direção tangente ao plano inclinado e a direção de aplicação da força F. Veja a figura 6.5(b).
Note que o ângulo λ define uma direção no plano inclinado. A componente de F ao longo daquela
direção paralela ao plano inclinado é Fτ = F cos λ . A área da seção sobre a qual essa componente
atua é a área da seção inclinada, já vista. A tensão devido a esta força tangencial atuando sobre o
F
F cos λ F
plano inclinado é τ = τ =
= cos λ cosϑ = σ cos λ cosθ . Esta é a tensão de cisalhamento
A
An
A
cosθ
que atua no plano inclinado e na direção apontada.
(a)
(b)
Figura 6.5: Decomposição da tração F em um plano inclinado (a) e decomposição da tração F em
uma direção no plano inclinado (b).
6.4.1- Plasticidade em monocristais
A tensão tangencial ou de cisalhamento é a responsável pela plasticidade dos materiais,
provocando o movimento das discordâncias (veja figura 6.6). As discordâncias se movem em
determinados planos, em geral naqueles mais compactos, e nestes planos, nas direções de maior
empacotamento (veja figura 6.7). A combinação de plano e direção de deslizamento de discordância
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é denominada de sistema de deslizamento. O número de sistemas de deslizamento da estrutura
cristalina é um dos determinantes de sua plasticidade. A expressão para a tensão de cisalhamento
indica que ela depende da inclinação do plano de deslizamento e da direção de deslizamento neste
plano, em relação à direção de aplicação da tensão externa. Para fazer uma discordância se mover é
necessário que haja uma tensão cujo valor ultrapasse um valor mínimo característico. Pode
acontecer que para uma dada tensão externa aplicada, existam planos e direções para as quais a
tensão de cisalhamento resultante seja superior à tensão crítica para mover discordâncias naqueles
sistemas de deslizamento. Neste caso, o material se deslocará plasticamente.
Figura 6.6: Discordância em cunha movendo-se em resposta a uma tensão de cisalhamento,
provocando deformação plástica. Fonte: W. Callister.
Figura 6.7: Plano de escorregamento de discordância em rede cfc (plano supercompacto) (a) e
direções de escorregamento neste plano (direções supercompactas) (b). Fonte: W. Callister.
Para os materiais cerâmicos, a densidade de discordâncias é muito inferior a dos metais.Isto se
deve ao fato que nos metais, os átomos são do mesmo elemento ou possuem a mesma função
(cátions de tamanhos próximos) na estrutura cristalina, caso sejam de elementos diferentes. No
caso das cerâmicas, temos íons de cargas diferentes e de tamanhos diferentes. A coerência da
estrutura cristalina deve ser mantida. Além do mais, a neutralidade elétrica da estrutura também
deve ser mantida. Isto significa que os primeiros vizinhos de íon não podem ser íons de mesma
carga. As figuras 6.8 (a) e (b) mostram discordâncias em hélice e em cunha para materiais
cerâmicos. Note que estas discordâncias envolvem um plano de ânions e outro de cátions,
diferentemente das discordâncias em metais.
Adicionalmente, o movimento de discordâncias é também dificultado pelas cargas diferentes
dos íons. As figuras 6.9 (a) e (b) mostram uma discordância em cunha com possibilidade de
movimento em duas direções. No caso da figura (a), o movimento na direção especificada colocaria
íons de cargas iguais como vizinhos mais próximos, o que criaria uma barreira de energia contra
este movimento. Isto não ocorre para a possibilidade mostrada pela figura (b). Neste caso, íons de
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mesma carga não seriam primeiros vizinhos. Logo, a barreira de energia contra o movimento da
discordância seria menor.
Figura 6.8: Discordâncias em hélice (a) e em cunha ou aresta (b) para materiais cerâmicos. Note que
a deformação envolve dois planos atômicos, ao invés de um, para que seja mantida a neutralidade
eletrostática. Fonte: Van Vlack.
Mesmo para os casos em que o movimento de discordância é possível, este não é tão simples
quanto o dos metais que se dá com o simples salto dos átomos de uma posição para outra. No caso
das cerâmicas, o movimento dos íons pode ocorrer através de uma seqüência de etapas e em
temperaturas elevadas, pois a distância interatômica aumenta e a força de ligação entre átomos
diminui, diminuindo também as barreiras de energia que impedem o movimento das discordâncias.
Figura 6.9: Uma discordância em cunha e duas possibilidades de movimento. No caso (a) o
movimento colocaria íons de cargas semelhantes como vizinhos próximos. No caso (b) isto não
ocorreria. A direção de movimento do caso (b) é possível.
Monocristais com a estrutura do sal de rocha (NaCl, KCl, KBr, LiF, MgO) e da fluorita (CaF2,
UO2) podem apresentar plasticidade. A figura 6.10 mostra diagramas tensão deformação para o KBr
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e o MgO. Da mesma forma que nos metais, soluções sólidas destes compostos iônicos podem elevar
o limite de escoamento, como é o caso de MgO dopado com NiO.
Figura 6.10: Diagrama tensão-deformação para monocristais de KBr e MgO. O comportamento é
típico de metais. Fonte: D. Richerson.
Assim como para os metais, para as cerâmicas monocristalinas serem deformadas
plasticamente é necessário que haja uma densidade de discordância inicial razoável, que haja
mecanismos que multipliquem estas discordâncias e que seu movimento seja possível.
6.4.2. Plasticidade em policristais
Materiais policristalinos sejam metálicos ou cerâmicos são mais difíceis de serem deformados
que os monocristalinos. Um material policristalino é constituído por monocristais aleatoriamente
orientados. Como já visto anteriormente, o módulo de elasticidade depende da direção cristalina, ou
seja, da direção cristalina em que a tensão atua. Se uma tensão atua em uma dada direção no
material e este, em conseqüência, sofre uma dada deformação, todos os grãos (monocristais) devem
sofrer a mesma deformação.
Em vista da anisotropia do módulo de elasticidade, alguns grãos, aqueles que são exigidos nas
direções de maior módulo de elasticidade, sofrem maiores tensões. Deste modo, alguns grãos
podem iniciar um processo de deformação plástica, pois a tensão sobre estes já pode ser suficiente
para mover as discordâncias, enquanto outros tenderão a se romper, podendo levar o corpo inteiro a
fraturar. Para aqueles grãos que admitem deformação plástica, as discordâncias caminharão e
chegarão ao contorno de grão. As discordâncias só cruzarão o contorno, penetrando no grão
vizinho, se houver um sistema de deslizamento no grão vizinho convenientemente orientado que
permita o movimento das discordâncias.
É reconhecido que materiais policristalinos apresentam plasticidade se possuírem um mínimo
de cinco sistemas de deslizamento independentes. No caso dos metais, isto é comum, mas na
maioria das cerâmicas, em temperatura ambiente, há no máximo três sistemas de deslizamento.
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Portanto, a deformação plástica não se propaga em grãos adjacentes, proibindo a estrutura de se
deformar por inteira. Como conseqüência, a tensão aumentará até que a estrutura seja rompida.
6.4.3. Plasticidade em vidros
Materiais vítreos não possuem ordem cristalina, portanto, não existem planos cristalinos,
discordâncias, sistemas de escorregamento e grãos. Em conseqüência estas estruturas tendem a ser
isotrópicas e possuem um mecanismo de deformação plástica diferente dos sólidos cristalinos.
Na estrutura vítrea, a distância interatômica varia dentro de um certo intervalo, portanto, a
energia de ligação entre átomos vizinhos também varia. Quando uma tensão externa é aplicada ao
material em dada direção, forças de tração e cisalhamento já descritas na seção 6.4 existem em
planos e direções distintos. A tensão máxima de tração está na direção da própria tração externa
(θ=0°), portanto, a fratura da estrutura vítrea por tração ocorrerá em um plano ortogonal à direção
de aplicação da tensão, salvo se existirem defeitos orientados em outras direções ou se houver
tensões residuais na estrutura. No caso das tensões de cisalhamento, poderá haver deformação do
corpo na direção em que a tensão de cisalhamento for máxima. Para que isto ocorra é necessário
que a tensão seja alta o suficiente para quebrar as ligações entre os átomos mais distanciados. Ao
serem quebradas estas ligações, os átomos cujas ligações se romperam se reorganizam segundo a
tensão e novas ligações entre átomos mais distanciados são rompidas e o processo se repete. Isto
provoca a deformação da estrutura. Esta deformação é denominada de viscosa. A resistência à
deformação viscosa é representada pela viscosidade do material, definida como
η=
τ
(9)
dv
dx
onde τ é a tensão de cisalhamento de dv/dx é o gradiente da taxa de deformação do material.
Quanto mais viscosos forem os materiais mais difíceis de serem deformados por este mecanismo.
Atomisticamente significa que tão mais fortes serão as ligações entre os átomos. O aumento da
temperatura diminui a viscosidade porque aumenta a distância média entre os átomos, diminuindo
ainda mais a energia da ligação entre eles. A ocorrência de deformação viscosa depende fortemente
da velocidade de deformação utilizada. A deformação deve ser lenta, pois deformação rápida leva
ao rompimento de um grande número de ligações, provocando a ruptura do material.
6.5. Resistência mecânica das cerâmicas
Vimos que quando uma tensão externa (tração, por exemplo) é aplicada em certa direção em
um material policristalino (suposto não conter falhas estruturais como poros e trincas), esta tensão
pode ser decomposta em componentes de tração em outras direções e em componentes de
cisalhamento. Além disso, estas tensões são distribuídas diferentemente em cada grão em face da
anisotropia do módulo de elasticidade, como já discutido. Como a deformação plástica é muito
difícil para materiais cerâmicos, com o aumento da tensão externa, ocorre o rompimento de grãos.
Primeiramente rompem-se aqueles grãos que estão orientados de modo que sofrem tensões maiores
que a tensão máxima que poderiam suportar. Esta tensão máxima depende do número de ligações
que devem ser rompidas e do afastamento entre átomos cujas ligações serão rompidas. Em outras
palavras, esta tensão depende da direção cristalina. Uma vez que estes grãos se rompem, a tensão é
redistribuída entre os demais grãos íntegros, que assim devem suportar níveis ainda mais altos de
tensão. Quanto maior o tamanho médio de grão da estrutura menor sua resistência mecânica, pois
mais heterogênea é a distribuição de tensão entre os grãos. Em outras palavras, grãos grandes são
submetidos a tensões além de seu limite e fraturam. Isto torna o restante da estrutura menos
resistente.
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Uma estrutura é rompida quando uma superfície é criada na estrutura, separando o material
em partes, ou seja, uma certa quantidade de ligações entre seus átomos é rompida. Para que isto
ocorra, a tensão sendo aplicada deve fornecer energia tal que supere a energia das ligações a serem
rompidas. Teoricamente, a tensão necessária para isto pode ser calculada por
1
⎛ Eγ ⎞ 2
⎟⎟
σ T = ⎜⎜
(10)
a
⎝ 0 ⎠
onde E é o módulo de elasticidade, a0 é o espaço entre os átomos que têm ligações rompidas e γ é a
energia interfacial do material.
Na prática, verifica-se que as estruturas cerâmicas se rompem sujeitas a tensões da ordem de
apenas 1% do valor teórico. Veja na tabela 6.2 valores teóricos e medidos para a resistência
mecânica de fibras e peças policristalinas para a alumina e o carbeto de silício. A resposta para isto
é a impossibilidade de deformação plástica combinada à existência de defeitos na estrutura, tais
como poros e trincas, que funcionam como amplificadores de tensão. Estes defeitos têm a
capacidade de aumentar a tensão externa aplicada para valores que excedem o limite teórico,
fazendo com que a estrutura se rompa em tensões externas bastante inferiores ao valor teórico. Estes
defeitos estruturais existem naturalmente no material, sendo resultado da técnica utilizada para
produzi-lo. Como muitas cerâmicas são consolidadas por sinterização, poros podem não ser
completamente fechados. Trincas podem aparecer como resultado de tensões térmicas.
Irregularidades na superfície dos materiais, como um arranhão ou um canto vivo, também
amplificam a tensão externa.
Foi Griffith, em 1921, quem primeiro propôs serem os defeitos estruturais os responsáveis
pela baixa resistência mecânica dos materiais frágeis, em comparação ao valor teórico. Ele
relacionou o tamanho e geometria dos defeitos a um fator de amplificação da tensão. Quanto maior
este fator de ampliação mais efetivo seria este defeito para provocar a fratura do material. Então
propôs que a resistência do material frágil seria dependente da probabilidade de existir defeitos
estruturais com altos fatores de amplificação da tensão. Por esta razão, corpos cerâmicos grandes
exibem, em média, resistência mecânica inferior a corpos cerâmicos menores. Para corpos mais
volumosos, a probabilidade de se encontrar defeitos mais críticos (com maior fator de ampliação de
tensão) é maior.
Tabela 6.2: Módulo de elasticidade, resistência mecânica teórica, resistência mecânica medida de
fibras e resistência mecânica de policristais. Note que a resistência de policristalinos é muito
inferior à resistência teórica estimada e também à resistência das fibras. Fonte: D. Richerson.
A relação existente entre a presença de defeitos estruturais e as falhas por ruptura explica
porquê as tensões de ruptura de peças idênticas variam tanto. As peças são apenas aparentemente
idênticas, os defeitos que elas contêm podem diferir bastante em tamanho e forma. Assim, os
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valores de tensão de ruptura podem ser bastante diferentes. Desta forma, pode-se concluir que
quanto mais densa for a estrutura cerâmica, menos trincas ela tiver e quanto mais regular e polida
for sua superfície mais resistente ela será, assim como menor será a dispersão das medições de
resistência mecânica feitas em peças que possuem estruturas deste tipo. Fibras de materiais
cerâmicos são, em geral, usados como fase de reforço em compósitos por possuírem alta resistência
mecânica. Isto se deve ao fato que fibras são tão finas que a probabilidade de apresentarem trincas,
poros ou falhas de superfície é pequena. A tabela 6.2 mostra como a resistência mecânica das fibras
é bem maior que a resistência das peças policristalinas. Quando produzidas, as fibras devem ser
usadas o mais breve possível para que sua superfície não seja degradada. Muitas fibras são
protegidas por camadas de verniz ou cera para impedir o contato com a umidade ou o oxigênio da
atmosfera.
Existem corpos cerâmicos que têm uma fase vítrea como componente estrutural. São os
chamados corpos vidrados. A cerâmica estrutural (telha e tijolos) é um exemplo. A fase vítrea
aumenta a resistência mecânica da estrutura se presente em certas quantidades. A fase vítrea
aparece em alta temperatura, durante a queima do material. Ela tem a função de ligar as partículas
sólidas e de preencher os espaços vazios, quando flui no espaço entre as partículas sólidas. Isto
diminui a porosidade, aumentando a resistência do material. Entretanto, quando usada em excesso,
diminui a resistência do material por ser uma fase menos resistente, podendo até provocar o colapso
da forma da peça por torna-la muito fluida durante a queima.
6.5.1. Defeitos como amplificadores de tensão
Trincas ou poros são eficientes amplificadores de tensões. Nas proximidades dos poros e
trincas, principalmente nas partes mais encurvadas destes defeitos, como as pontas das trincas, a
tensão pode alcançar valores várias vezes superiores ao valor da tensão externa aplicada. Para uma
trinca de formato elíptico que tem seu eixo maior orientado perpendicularmente à direção de
aplicação da tensão externa, supondo que seu eixo maior seja muito mais longo que seu eixo menor,
a tensão na ponta da trinca é dada por
1
2
⎛ a ⎞
⎟⎟
(11)
⎝ ρe ⎠
onde σ0 é a tensão externa aplicada, a é o comprimento da trinca, se ela for superficial, ou metade
do comprimento da trinca, caso ela seja interna. ρe é o raio de curvatura da extremidade da trinca. A
ampliação da tensão ocorre porque as paredes da trinca agem como alavancas, de forma que no
ponto de encontro das paredes da trinca (na ponta da trinca) a tensão é muito elevada. A Figura 6.11
(a) ilustra o caso de uma trinca superficial e uma trinca interna. A Figura 6.11 (b) mostra um gráfico
esquematizado do valor da tensão nas proximidades da ponta da trinca, na linha X-X’. Veja que a
tensão na ponta da trinca é bem maior que a tensão nominal aplicada externamente. O fator de
concentração de tensão é definido como a razão entre a tensão amplificada e a tensão nominal,
σ M = 2σ 0 ⎜⎜
1
⎛ a ⎞2
σ
K C = M = 2⎜⎜ ⎟⎟
σ0
⎝ ρe ⎠
(12)
só para exemplo, trincas típicas que aparecem na estrutura de nitreto de silício consolidado por
reação têm comprimento de 170μm e raio da ponta nas dimensões do espaçamento interatômico
(∼2Å). Se tal estrutura se rompe em uma tensão de 150MPa devido a esta trinca. Aplicando estes
valores na fórmula, chegamos a um valor de KC de 1840.
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Figura 6.11: Trinca elíptica na superfície e no interior de um corpo sob tração. Comprimento e raio
de curvatura são parâmetros de interesse (a). A ponta da trinca é um grande concentração de tensão.
Fonte: W. Callister.
6.5.2. Fratura frágil e tenacidade à fratura
Quando uma tensão atua sobre uma estrutura que contem uma trinca, a tensão contribuirá para
tornar a trinca maior. Isto pode ser feito de três modos diferentes descritos nas Figuras 6.12 (a,b,c).
O modo I é característico de tensões de tração. Vamos nos ater a este modo para analisar a fratura
dos materiais cerâmicos.
Griffith desenvolveu um critério para a propagação de uma trinca no formato elíptico, como a
exibida na Figura 6.11(a). Para materiais frágeis, que não sofrem qualquer deformação plástica, a
tensão crítica de tração, acima da qual haverá propagação da trinca e subseqüente falha do material,
é escrita como
1
⎛ 2 Eγ S ⎞ 2
σC = ⎜
(13)
⎟
⎝ πa ⎠
onde E é o módulo de elasticidade, a é o comprimento da trinca e γS a tensão superficial do material,
ou seja, a energia para se criar uma superfície de área unitária do material.
Figura 6.12: Diferentes modos de propagação de uma trinca. O modo I é o de tração pura. O modo
II de escorregamento e o modo II de rasgamento. Fonte: D. Richerson.
155
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Para deduzir esta expressão, foi levado em conta que antes da trinca abrir, a tensão na frente
da trinca deforma elasticamente o material, portanto o material acumula energia elástica,
aumentando sua energia total. Quando a trinca se propaga, a energia elástica é liberada, pois a
deformação elástica é recuperada. Porém, a criação da superfície da trinca aumenta a energia do
sistema devido ao aumento da energia superficial. A propagação da trinca só é energeticamente
favorável, se o aumento da energia pela criação da superfície for menor que o aumento da energia
pela deformação elástica. Para o caso de materiais que se deformam plasticamente o critério de
propagação da trinca deveria considerar também a energia de deformação plástica. Deve ser
salientado que quando o material pode ser deformado plasticamente, a tensão na ponta da trinca
excede a tensão crítica para provocar a deformação plástica e esta deformação alivia a tensão
naquela região.
A figura 6.13 mostra a situação em que tensões atuam sobre uma peça que contem uma trinca
de geometria conhecida. Segundo a teoria elástica, a distribuição de tensão em torno da ponta da
trinca é dada por
K
σX =
f x (θ )
(14)
2πr
K
σy =
f y (θ )
(15)
2πr
K
τ xy =
f xy (θ )
(16)
2πr
onde f(θ) é uma função do ângulo mostrado na figura, r é a distância desde a ponta da trinca, como
mostrado na figura e K é denomina fator de intensidade de tensão. Este fator depende do valor
nominal da tração externa aplicada, da geometria e do tamanho da trinca e ainda da geometria da
amostra. O fator de intensidade de tensão não deve ser confundido com o fator de concentração de
tensão apresentado anteriormente. Este fator é escrito como
K = Yσ πa
(17)
onde σ é a tensão externa, a é o comprimento da trinca e Y é uma função do tamanho e geometria
da trinca e da amostra e é adimensional. K tem dimensão MPa(m)1/2.
O fator de intensidade representa melhor a ocorrência de propagação de uma trinca que a
expressão (13), pois aquela é uma expressão geral, que não leva em consideração a realidade da
distribuição de tensão em torno da trinca, enquanto que o fator de intensidade leva em consideração
a geometria da peça e da trinca, as quais efetivamente influenciam sua propagação. Para uma peça
de forma e dimensões conhecidas que fratura sob uma determinada tensão externa σC, como
resultado de uma trinca de dimensões e forma conhecidas, a intensidade crítica, denominada de
tenacidade à fratura, é escrita como
K IC = Yσ C πa
(18)
onde o subscrito I significa que este é o fator de intensidade para o modo I de fratura. A tenacidade
expressa a condição crítica para a propagação de uma trinca em uma estrutura que já possui uma
trinca. È uma propriedade intrínseca da estrutura do material, ou seja, independe da amostra sendo
medida e da forma do defeito.
156
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Figura 6.13: Modelo de trinca na superfície de peça semi-infinita submetida a campo de tensões. A
tensão nas proximidades da ponta da trinca varia com a distância e o ângulo. Fonte: W. Callister.
Para materiais frágeis, a tenacidade à fratura depende da temperatura (diminui quando a
temperatura diminui), da velocidade de deformação da amostra (diminui quando a velocidade de
deformação aumenta) e do tamanho médio de grão (aumenta quando o tamanho de grão diminui).
Para materiais dúcteis, além das observações anteriores serem válidas, a tenacidade é maior, em
comparação aos materiais frágeis, e diminui com o aumento a tensão limite de escoamento.
6.5.3. Medição de resistência mecânica
Materiais cerâmicos respondem diferentemente quando submetidos a diversos tipos de tensão,
portanto a resistência mecânica deve ser medida para os diversos tipos de tensão e os valores
medidos devem expressar o tipo de tensão usado para obtê-los. Os testes de medição de resistência
são descritos a seguir.
6.5.3.1. Resistência à tração
Este tipo de medição é raro em materiais cerâmicos e comum em materiais metálicos. São
duas as razões principais para isso: dificuldade de fabricação da amostra no formato padrão e
necessidade de grande alinhamento da amostra no momento de acopla-la à máquina de ensaios.
Os métodos de conformação mais comuns usados na preparação e acabamento das amostras
para ensaios de tração não podem ser aplicados a materiais cerâmicos. O alinhamento deve ser
preciso para evitar a introdução de tensões de dobramento na peça. Uma vez que estas tensões
tenham sido introduzidas, defeitos na superfície podem provocar a falha do material, distorcendo o
resultado medido. Para medições precisas de resistência à tração, tensões de dobramento devem ser
estimadas e consideradas em uma análise das tensões que agem sobre a peça, para que se tenha uma
idéia de sua influência sobre a medida de resistência mecânica. Em adição a estes fatores, até
mesmo o encaixe da amostra na máquina é difícil, pois produz tensões sobre a peça que podem
provocar sua falha.
As figuras 6.14 (a,b,c) exibem exemplos de amostras usadas em medição de resistência à
tração. A peça da figura (a) é a mais comum. A peça da figura (b) é um cilindro oco de paredes
157
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finas. Um fluido é injetado em seu interior e exerce pressão sobre suas paredes. Este tipo de teste
apresenta problemas tais como de vedar as estremidaddes para evitar o vazamento do fluido,
problemas de fazer ensaios em alta temperatura e dificuldade em se dar acabamento das
extremidades do cilindro, sem introduzir trincas ou quebras. O corpo de prova da figura (c) é mais
engenhoso, porém ainda mais difícil de ser preparado. Uma força compressiva sobre as hastes
laterais induz uma força de tração sobre a haste do meio.
Figura 6.14: Exemplos de corpos de prova que podem ser usados para ensaio de tração. Fonte: D.
Richerson.
6.5.3.2. Resistência à compressão
O ensaio de compressão é muito mais comum em cerâmicas do que em metais, especialmente
naquelas cerâmicas usadas em aplicações sujeitas a cargas compressivas, como tijolos e cimento.
As figuras 6.15 (a,b) mostram dois corpos usados em ensaios de resistência à compressão. Em um
dos casos (a) compressão é feita sobre a secção plana da amostra. No outro caso (b), a compressão é
exercida diametralmente. Em ambos os casos, a compressão é uniaxial.
Figura 6.15: Corpos de prova usados para ensaios de compressão. Fonte: D. Richerson.
A resistência à compressão das cerâmicas é geralmente muito superior à resistência à tração.
Isto se deve a duas razões. Em primeiro lugar, como já discutido na seção 6.3, o módulo de
elasticidade na compressão é maior que o módulo de elasticidade na tração. A razão mais
importante, todavia, vem do fato que os defeitos estruturais são muito mais efetivos em provocar a
falha quando tensões de tração são empregadas do que quando tensões compressivas são usadas. A
tração tende a usar as paredes das trincas e poros como alavancas e abrir ainda mais a trinca. A
compressão não exerce este efeito, na verdade tende a fechar o poro ou trinca. Tanto é assim que o
corpo de prova mostrado na figura 6.15(b) rompe por tração. A fratura ocorre em um plano com a
mesma direção da aplicação da compressão.
Trincas, poros, inclusões, maclação e anisotropia do módulo de elasticidade são fatores que
reduzem a resistência à compressão. A resistência à compressão aumenta quando o tamanho de grão
diminui.
158
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6.5.3.3. Resistência à flexão
As Figuras 6.16 (a,b) exibem amostras e aparatos usados para a realização de ensaios de
flexão. O ensaio de flexão é muito comum em materiais cerâmicos dado à facilidade de preparação
das amostras e de realização da medida. A amostra de formato simples, que pode ter seção
quadrada, retangular ou circular, é apoiada sobre dois suportes eqüidistantes de suas extremidades.
A carga é exercida na parte superior da amostra ou por um suporte colocado bem no centro da
amostra, como mostrado na figura 6.16(a), ou por dois suportes colocados eqüidistantes das
extremidades da amostra, como mostrado pela Figura 6.16(b). Estas variantes são chamadas de
flexão de três pontos e flexão de quatro pontos, respectivamente. A pressão é exercida até que a
amostra se rompe. A resistência à flexão da amostra ou Módulo de Ruptura é definida como a
tração máxima na amostra no momento da fratura. Esta tensão é calculada por
Mc
S=
(19)
l
onde M é o momento, c é a distância entre o eixo neutro e a superfície de máxima tração e l é o
momento de inércia do corpo. As Figuras 6.17(a,b) ilustram detalhadamente os casos de flexão a
três e quatro pontos, respectivamente.
Figura 6.16: Corpo de prova usado para ensaios de flexão a três (a) e quatro pontos (b). Fonte: D.
Richerson.
Figura 6.17: Expressões para a resistência à flexão nos ensaios de três (a) e quatro pontos (b).
Fonte: D. Richerson.
Este tipo de teste coloca a amostra sob dois tipos de tensões: tração e compressão. Da
superfície superior até o plano paralelo a esta superfície situado a meia espessura atua a
compressão. Deste plano médio até a superfície inferior atua a tração. A tração e compressão
máximas ocorrem justamente nas superfícies inferior e superior, respectivamente. A figura 6.18
ilustra este caso para o ensaio de três pontos, mas o mesmo ocorre para o ensaio de quatro pontos. O
plano médio que separa a região sob compressão da região sob tração é chamado de plano neutro.
159
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Tensão e compressão são atenuadas à medida que se penetra no corpo de modo que se anulam no
plano médio.
Figura 6.18: Distribuição de tensão de um corpo submetido a um teste de flexão. A metade de cima
está sob compressão e a metade de baixo sob tração.
Como visto nas seções anteriores, o corpo cerâmico é muito mais sensível a esforços de tração
do que a de compressão. Sendo assim, a amostra deve falhar devido à tração atuando na metade
inferior da peça, principalmente na superfície inferior, onde a tração atinge valores máximos.
Os testes de três e quatro pontos fornecem valores diferentes quando realizados com amostras
semelhantes. O teste de três pontos fornece valores superiores aos valores do teste de quatro pontos.
A justificativa para isto está na distribuição de tensões e de defeitos que iniciam a ruptura ao longo
da estrutura da amostra. As Figuras 6.19(a,b) ilustram a distribuição de tração na superfície inferior
da amostra para testes de três e quatro pontos. Supondo que o valor de tração máxima é o mesmo
em ambos os casos, nota-se que no caso de três pontos, este valor máximo ocorre no centro da
amostra e cai à medida que se aproxima das extremidades, chegando a zero nos pontos de apoio
inferiores (Figura 6.19(a)). No caso de quatro pontos, o valor máximo mantém-se por toda a
extensão entre os pontos superiores de aplicação da carga e cai entre estes pontos e os pontos
inferiores de apoio (Figura 6.19(b)).
Figura 6.19: Distribuição de tração nos corpos de prova em ensaios de flexão de três pontos (a), de
quatro pontos (b) e em ensaio de tração puro (c). Fonte: D. Richerson.
Como foi discutido anteriormente, a fratura da estrutura depende do nível de tração aplicado e
da existência de um defeito estrutural de tamanho suficiente para se propagar com aquele nível de
tração. Quanto menor o nível de tração local maior terá que ser o defeito crítico que poderá se
propagar e provocar a fratura. Inversamente, quanto maior o nível de tração menor pode ser o
tamanho do defeito crítico que poderá se propagar. Desta forma, como no teste de flexão com
quatro pontos a área do material exposta a altos níveis de tração é maior de que para o teste de três
pontos, é mais provável que haja um defeito de tamanho crítico na área maior do que na área menor.
Assim, a amostra testada pelo ensaio de quatro pontos tende a falhar quando submetida a tensões
menores que as tensões que provocam falhas em uma amostra semelhante ensaiada por três pontos.
Para tornar isto mais claro, suponha duas amostras A e B semelhantes que serão submetidas a testes
de flexão a quatro e três pontos, respectivamente. Um defeito de tamanho L foi criada nas duas
160
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amostras exatamente na superfície inferior a uma certa distância do extremo da amostra (ponto X
nas figuras 6.19(a,b). Em comparação aos outros defeitos existentes na estrutura das amostras,
pode-se dizer que o defeito introduzido é tal que provocará a fratura do material quando a tensão
local atingir certo nível. No ensaio de três pontos, a tensão máxima existe bem no centro da
superfície inferior. Esta tensão vai caindo em direção às extremidades da peça. Isto significa que
mesmo se a tensão máxima no centro exceder à tensão crítica de falha, a tensão no local do defeito
pode ser inferior à tensão crítica e a peça não fratura. No caso do ensaio de quatro pontos, a tensão
no local do defeito é igual ao valor máximo da tensão, deste modo, tão logo o valor máximo de
tensão atinja o valor crítico de falha, a fratura ocorre.
Só para comparação, a Figura 6.19(c) exibe a distribuição de tração em um corpo de prova
usado em testes de tração. Todo o volume útil do corpo, e não somente sua superfície, é submetido
ao valor máximo de tração. Neste tipo de ensaio, a amostra falha em tensões ainda mais baixas do
que aquelas medidas em ensaios de três e quatro pontos. Como a tensão é bem mais uniformemente
distribuída pela estrutura da amostra, a probabilidade de haver um defeito de tamanho crítico na
região é maior. Os valores medidos nestes testes tendem a convergir quando a distribuição espacial
de defeitos na estrutura for homogênea.
A tabela 6.3 traz medidas de resistência à tração e resistência à flexão para diversos materiais
cerâmicos. Note a diferença entre os valores de resistência à flexão e de tração.
O tratamento matemático introduzido aqui sobre resistência mecânica e tenacidade à fratura
diz respeito somente a trincas de formato bastante simples (elíptico) e de dimensões perfeitamente
conhecidas. Na prática, os defeitos presentes em estruturas reais são de tipo bem mais complicado e
desconhecido. Os poros existentes raramente têm forma esférica e estão isolados. Veja o exemplo
de um poro situado próximo à superfície. Quando a região é submetida à tensão pode haver o
rompimento da parede entre o poro e o exterior. Outro caso é o de um aglomerado de poros
isolados, porém próximos. As paredes que separam os poros podem se romper, interligando os
poros. Em ambos os casos, o tamanho dos defeitos estruturais aumenta. Isto diminui a resistência à
fratura. Portanto, o não conhecimento do tipo e tamanho das trincas impossibilita a previsão da
resistência mecânica dos corpos, porém mesmo se forem usadas técnicas de medição de tamanho de
defeito (ultra-som, raio x, etc) a previsão é difícil, pois os defeitos podem se modificar, aumentando
de tamanho.
161
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Tabela 6.3: Valores de resistência à flexão e à tração para diversas cerâmicas em temperatura
ambiente. Fonte: D. Richerson.
6.5.3.4. Tenacidade à fratura
A medição da tenacidade à fratura é complicada porque ela deve ser feita conhecendo-se
informações sobre uma trinca existente na estrutura. Na verdade, a trinca de forma e dimensões
determinadas deve ser introduzida na estrutura. Em materiais cerâmicos isto não é uma tarefa
simples. O desconhecimento das dimensões exatas do tamanho da trinca acarreta em erro na
determinação da tenacidade à fratura.
Na prática, uma trinca é produzida em uma peça de forma e dimensões que se encaixem no
modelo matemático desenvolvido para tenacidade à fratura através do corte parcial da peça por um
fino disco de diamante. Isto produz um entalhe na peça. Uma trinca deve ser nucleada na cabeça do
entalhe. Isto pode ser feito através de um choque térmico ou através de ultra-som. A forma da trinca
também deve estar de acordo com o modelo mencionado. A Figura 6.20 exibe uma possibilidade
para a forma da amostra a ser usada na medição da tenacidade à fratura. No gráfico ao lado, há uma
curva de calibração que mostra como KC depende das dimensões da peça. KC também depende da
162
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espessura B da peça. Porém a dependência é com o inverso da espessura. Isto significa que a partir
de uma certa espessura crítica, KC poderá ser considerada insensível a variações da espessura. Este
valor será considerado com a verdadeira tenacidade à fratura do material. Obviamente, a espessura
da amostra deve estar neste intervalo de valor. Na figura, a espessura da trinca está exageradamente
grande. No caso real, a espessura é muito menor que seu comprimento. A amostra será então
tracionada até que seja rompida.
Figura 6.20: Amostra usada em ensaio de tenacidade à fratura. O valor de KC depende das
dimensões da peça e da trinca. Fonte: W. Callister.
6.6. Tratamento estatístico de medições de propriedades mecânicas de cerâmicas
Quando um determinado componente está sendo projetado como uma parte estrutural, seu
projeto deve responder a diversas questões. Entre elas: que tipos de tensões atuam no componente e
quais seus valores máximos. Estas informações devem ser respondidas para que seja escolhido o
material de que deve ser construído o componente. Para uma determinada tensão máxima estimada
pelo projeto, o material a ser escolhido deve ter sua resistência mecânica ao tipo de tensão
correspondente superior ao valor máximo encontrado pelo projeto, respeitando-se uma margem de
segurança.
Os valores de resistência mecânica, apresentados em tabelas, que serão usados para a escolha
do material são na verdade valores médios de uma série de medições individuais. Os valores desta
série apresentam sempre uma dispersão. Esta dispersão deve ser considerada ao se escolher o
material a ser usado para confecção do componente. Para metais, a dispersão dos valores é pequena
e não é problema para o projetista, mas para os materiais cerâmicos a dispersão é muito maior e
constitui um problema para a escolha do material. As Figuras 6.21(a,b) mostram curvas típicas de
ocorrência de falhas de materiais em função da tensão aplicada. Elas são curvas de freqüência de
falhas. São construídas ordenando as tensões de ruptura de cada amostra ensaiada por valor
crescente e dividindo o intervalo entre o menor e o maior valores em classes. Em seguida, conta-se
quantas amostras falharam em cada classe de tensão. Estes valores são as freqüências de falha de
cada classe. Como visto nas figuras, a curva de freqüência para os metais é bem mais estreita que a
curva para as cerâmicas. Isto é uma conseqüência da maior dispersão dos valores de resistência para
as cerâmicas.
163
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(b)
(a)
Figura 6.21: Curvas típicas de freqüência de falhas de corpos sob tensão para metais (a) e para
cerâmicas (b). Fonte: D. Richerson.
No caso dos metais, nenhuma peça se rompe com menos de 900MPa e nenhuma se rompe
com mais de 1100MPa. A média situa-se em cerca de 1000MPa. No caso da cerâmica, a média está
por volta de 900MPa, mas peças se rompem em tensões tão baixas quanto 600MPa e em tão altas
quanto 1050MPa. Isto traz problemas para a escolha do material a partir do valor médio da
resistência. Para as cerâmicas, a dispersão dos valores deve ser também considerada.
O tratamento estatístico dos valores medidos é feito com base na distribuição estatística de
Weibull, que descreve a probabilidade do material falhar quando submetido a um dado nível de
tensão. A probabilidade do material falhar se submetido à tensão σ é dada pela função densidade de
probabilidade de Weibull
m −1
⎧⎪ ⎛ σ − σ ⎞ m ⎫⎪
m ⎛σ −σ0 ⎞
0
⎜⎜
⎟⎟ exp⎨− ⎜⎜
⎟⎟ ⎬
(20)
f (σ ) =
σR ⎝ σR ⎠
⎪⎩ ⎝ σ R ⎠ ⎪⎭
onde σ0 é a tensão antes da qual o material não falhará, σR é um valor referencial de tensão,
correspondente a 0,632 de probabilidade de falha do material e m é o módulo de Weibull,
relacionado à dispersão das medidas. A distribuição acumulada de probabilidade F(σ) é a
probabilidade de ocorrer uma falha em tensões menores ou igual a σ e é dada por
⎧⎪ ⎛ σ − σ ⎞ m ⎫⎪
0
⎟⎟ ⎬
(21)
F (σ ) = 1 − exp⎨− ⎜⎜
σ
⎪⎩ ⎝
R
⎠ ⎪⎭
A distribuição de Weibull descreve bem o comportamento de fratura dos materiais cerâmicos.
Ela está ligada à falha do material devido à presença de defeitos que o fragilizam.
Para aplicar a distribuição de Weibull às medidas de propriedades de materiais cerâmicos,
acompanhemos o exemplo seguinte. Nove amostras cerâmicas tiveram medidas suas resistências à
tração. Os valores são dados na tabela 6.4, já colocados em ordem crescente e numerados por um
índice. A coluna mais à direita representa a probabilidade do material falhar naquele valor de
tensão. Esta probabilidade é calculada como
i − 0,3
Pi =
(22)
N + 0,4
onde i é o índice da amostra medida e N é o número total de amostras medidas. Neste caso, N=9.
164
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Tabela 6.4: medidas de tensão de ruptura e probabilidade de ruptura na tensão para um material
cerâmico. Exemplo.
Índice da Medida
Tensão de Ruptura (Mpa)
Probabilidade de Ruptura
1
178
0,07
2
210
0,18
3
235
0,29
4
248
0,39
5
262
0,50
6
276
0,61
7
296
0,71
8
318
0,83
9
345
0,93
A Figura 6.22 mostra a distribuição de probabilidade de falha até a tensão. Veja que existe um
limiar σ0, abaixo do qual a probabilidade de falha é nula. O valor de referência σR, para o qual a
probabilidade de falha é 0,632, está também apontado no gráfico.
Manipulando adequadamente a expressão (21), consegue-se
⎛ ⎛
⎞⎞
1
⎟⎟ ⎟⎟ = mLn(σ − σ 0 ) − mLn(σ R )
Ln⎜⎜ Ln⎜⎜
(23)
−
F
σ
1
(
)
⎠⎠
⎝ ⎝
que é a equação de uma reta, se uma variável for o termo da esquerda e a outra variável for Ln(σσ0). O módulo de Weibull é a inclinação da reta. Fazendo o gráfico de acordo com esta equação de
reta, nós podemos determinar o módulo de Weibull. A figura 6.23 traz este gráfico com o valor de
m.
O valor de m está relacionado à dispersão das medidas. Quanto maior m menos dispersas são
as medidas. A determinação de m com precisão exige o uso de um grande número de amostras. 60
amostras são necessárias para a determinação com 90% de confiança.
1,0
Probabilidade de Ruptura
Distribuição de Probabilidade acumulada
0,8
0,6
0,4
0,2
σ0
0,0
0
60
120
σR
180
240
300
360
Tensão de ruptura (MPa)
Figura 6.22: Distribuição de probabilidade acumulada de ruptura.
A curva da Figura 6.23 é muito útil para se comparar o comportamento mecânico de
diferentes materiais. A Figura 6.24 mostra as curvas para três tipos de alumina: alumina pura,
165
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alumina reforçada com 15% de carbeto de silício e alumina reforçada com 25% de carbeto de
silício. Note que a inclinação da reta (o valor de m) aumenta conforme aumenta o teor de carbeto de
silício. Isto significa que diminui a dispersão dos valores medidos. Aumenta também, da mesma
forma, o valor de referência σR.
1,0
0,5
Ln(Ln(1/(1-P)))
0,0
pontos da probabilidade
acumulada
Linearização
Módulo de Weibull=5,3
-0,5
-1,0
-1,5
-2,0
-2,5
-3,0
5,0
5,1
5,2
5,3
5,4
5,5
5,6
5,7
5,8
5,9
Ln(σ)
Figura 6.23: Determinação do módulo de Weibull.
Veja a Figura 6.25, ela mostra o tratamento de Weibull para o nitreto de silício consolidado
por reação. Note que os dados parecem não pertencer à mesma reta. O melhor parece usar uma reta
para os quatro pontos de baixo e outra reta para os demais pontos. Quando isto ocorre, diz-se que a
distribuição de Weibull é bimodal ou multimodal. A razão para isto é a existência de duas ou mais
categorias de defeitos estruturais que causam a falha da estrutura. Como já foi dito, a distribuição de
Weibull está ligada à falha causada por uma distribuição de defeitos na estrutura. Caso existam duas
categorias de defeitos, cada categoria possui sua capacidade específica de provocar a falha e a cada
tipo de defeito uma distribuição de Weibull está relacionada. No caso da figura 6.25, melhor que
calcular um valor geral de m é calcular um valor para cada tipo de defeito. Verifica-se que um dos
tipos de defeito possui m inferior, o que prejudica as propriedades da peça. Foi verificado que este
tipo de defeito estava relacionado à matéria prima utilizada para fabricar a peça. Quando este
problema foi solucionado, os quatro pontos inferiores desapareceram e a estrutura se tornou mais
confiável.
166
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Figura 6.24: Diagrama de Weibull para três tipos de cerâmicas com base em alumínio. A inclinação
das retas está relacionada ao módulo de Weibull e este com a dispersão dos valores de tensão de
ruptura. Fonte: D. Richerson.
Figura 6.25: Diagrama de Weibull para o nitreto de silício consolidado por reação. Há dois
conjuntos lineares de pontos, caracterizando uma distribuição bimodal de Weibull. Fonte: D.
Richerson.
167
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6.7. Exercícios
1- Ensaios de flexão em peças de um material cerâmico produziram os resultados listados abaixo.
Construa o gráfico de probabilidade acumulada de falha e o diagrama de Weibull. Com estes
gráficos, determine o módulo de Weibull, a tensão mínima para causar falha no material e a
tensão de referência.
263 – 109 – 434 – 177 – 171 – 166 – 269 – 204 – 459 – 241 – 221 – 244 – 411 – 345 – 674 –
571 – 233 – 165 – 108 – 85 – 171 – 214 – 208 – 130 – 143 – 231 – 150 – 201 – 104.
2- Uma tensão de tração de 200Mpa é aplicada na direção cristalina [001] de uma rede cúbica.
Veja a figura abaixo. Determine:
a) a tensão de tração perpendicular ao plano (111).
b) A tensão de cisalhamento neste plano e na direção 1 01 .
[ ]
3- Uma peça falhou devido a uma trinca de comprimento 100μm com raio de curvatura de 15μm,
quando estava submetida a uma tração de 30Mpa. Qual era a tensão na cabeça da trinca?
4- Em um ensaio de flexão de três pontos feitos com uma amostra que mede 8mm de altura, 24mm
de largura e 100mm de comprimento. Os suportes inferiores foram colocados a 10mm de cada
extremidade. A carga para romper a amostra foi de 4800N. Determine o módulo de ruptura em
três pontos. Em um ensaio de flexão a quatro pontos, os dois pontos de carga estão localizados a
20mm de cada extremidade. Se o módulo de ruptura medido foi de 250MPa, qual foi a carga
usada para romper a amostra?
5- Demonstre que o módulo de Poisson deve ser 0,5 para que não haja variação de volume. Use a
figura 6.4 da apostilha para o cálculo.
6- O vidro de cal e soda possui tenacidade à fratura entre 0,7 a 0,8MPam1/2. Qual deve ser a força
aplicada para que seja rompida uma amostra deste material da forma mostrada na figura a seguir,
onde a=18,75mm, W=50mm, B=5mm?
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Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo VI: Propriedades Mecânicas
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7- A plasticidade dos materiais cristalinos está relacionada às discordâncias. Como você explica a
menor plasticidade das cerâmicas em comparação aos metais?
8- A resistência à fratura das cerâmicas é muito inferior a sua estimativa teórica. Além disso, sua
resistência à tração é inferior à resistência à compressão.
a) Como você explica isto?
b) Como defeitos estruturais tais como poros e trincas agem para provocar a falha precoce do
material?
c) Medições de resistência à ruptura são dependentes do tamanho da peça e do modo com o qual
a tensão é aplicada nesta peça. Veja, por exemplo, a flexão em 3 e 4 pontos. Como você
explica isto?
9- Qual a propriedade do material que representa sua resistência à ruptura devido à presença de
trincas e como ela depende da temperatura e do tamanho de grão?
10- Um determinado material pode ser processado por três técnicas diferentes para produzir peças.
Cada técnica produz um tipo diferente de defeito estrutural. Amostras foram fabricadas deste
material por estas três técnicas e testes de ruptura foram realizados com elas. As curvas de
probabilidade acumulada de falha e os diagramas de Weibull estão mostrados abaixo para as
amostras fabricadas por cada tipo de técnica. Responda:
a) Quais os valores aproximados da tensão de referência para cada caso?
b) Com base nos diagramas de Weibull e sabendo que os módulos de Weibull são 2, 3.5 e 5.2
para as técnicas A, B e C, identifique no diagrama qual a curva correspondente a cada
técnica. O que isto significa em termos de dispersão de valores medidos de tensão de ruptura
e de uso prático das peças?
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Probabilidade acumulada de falha
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1,0
0,8
Classe A
Classe B
Classe C
0,6
0,4
0,2
0,0
0
100
200
300
400
500
600
700
Tensão de Ruptura (MPa)
4
Ln(Ln(1/(1-F(σ)))
2
0
-2
-4
-6
Série __
Série __
Série __
-8
-10
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
5,0
5,5
6,0
6,5
7,0
Ln(σ-σ0)
170
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Capítulo VI: Propriedades Mecânicas
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6.8. Referências
W.D. CALLISTER Jr., Materials Science & Engineering. An Introduction. Third Edition. Editora
John Wiley & Sons, 1994.
L.H. VAN VLACK, Propriedades dos Materiais Cerâmicos. Editora da Universidade de São
Paulo, 1973.
D.W. RICHERSON, Modern Ceramic Engineering. Properties, Processing and Use in Design.
Segunda Edição. Editora Marcel Dekker. 1992.
171
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