TÓPICOS AVANÇADOS EM EDUCAÇÃO FINANCEIRA VOLUME 4 UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM PROF. ELISSON DE ANDRADE WWW.PROFELISSON.COM.BR VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM DIREITOS AUTORAIS Copyright© by Elisson Augusto Pires de Andrade Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1988. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito do autor, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Autor: Professor Elisson de Andrade Site: www.profelisson.com.br Design e revisão de texto: Phillip Souza (www.criterionconsultoria.com.br/) Andrade, Elisson de Uma análise sobre como os consumidores decidem. [recurso eletrônico]. In: Tópicos Avançados em Educação Financeira. Vol 4 / Elisson de Andrade. -Piracicaba: O Autor, 2013. 59 p. Modo de acesso: World Wide Web Disponível em: http://profelisson.com.br/e-books/ ISBN: 1. Análise de decisão 2. Consumidores 3. Educação Financeira 1 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM SOBRE O AUTOR O Professor Elisson de Andrade é Mestre e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo (ESALQ-USP), professor de ensino superior em cursos de graduação e pós-graduação, nas áreas de matemática financeira, mercado de capitais, derivativos e finanças pessoais. Blog: www.profelisson.com.br Twitter: @Prof_Elisson APOIO 2 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM PREFÁCIO: VOLUME 4 3 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM 4 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM SUMÁRIO INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 6 POR QUE CONSUMIDORES FALHAM AO DECIDIR?........................................................... 10 CONSUMIDORES E VIESES COGNITIVOS............................................................................ 22 RAZÃO versus INTUIÇÃO ................................................................................................... 36 NEUROECONOMIA ............................................................................................................ 46 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 54 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................ 56 5 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM INTRODUÇÃO 6 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM A análise de decisões é um vasto e fascinante campo de pesquisa, que se concentra em compreender como os seres humanos fazem suas escolhas, em diversos contextos da vida cotidiana. Especificamente, neste Volume 4, será realizada uma revisão de literatura com o intuito de descrever alguns elementos auxiliem a desvendar os mistérios do comportamento humano enquanto consumidores. Para tal, é importante uma breve descrição sobre o conceito de racionalidade, que assume papel central nas teorias econômicas que buscam descrever/prever o comportamento humano. Segundo Bazerman (p. 6, 2004) a racionalidade pode ser vista como um “processo de tomada de decisão que esperamos que leve ao resultado ótimo, dada uma avaliação precisa dos valores e preferências de risco do tomador de decisão”. Isso significa que, ao decidir racionalmente, a teoria presume que os consumidores alocariam seu dinheiro de forma a maximizar seu próprio bem estar. Entretanto, o conceito de racionalidade baseia-se em como uma decisão deveria ser tomada, e não como ela 7 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM realmente é (Bazerman, 2004). Na vida real, diversos estudos demonstram uma destacada incapacidade dos agentes econômicos em tomar boas decisões, em diversas situações. Bazerman (2004) apresenta uma série de argumentos importantes para explicar os motivos pelos quais as pessoas pecam em suas escolhas: São incapazes de processar todas as informações disponíveis; Não conseguem, muitas vezes, eleger quais os critérios mais relevantes a serem considerados; Possuem restrições de tempo e custo, diminuindo a quantidade e qualidade das informações a serem coletadas; Sua capacidade de memória é finita; Verifica-se uma série de limitações de inteligência e percepções, que restringem a aptidão de descobrir a melhor solução. 8 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Portanto, é possível concluir que por mais racional que se busque ser, muitas vezes não escolhemos as soluções ótimas, simplesmente pela nossa incapacidade de lidar com as informações existentes de maneira adequada. Toda essa discussão é bastante rica na literatura, sendo que neste eBook o conteúdo a ser abordado permitirá uma melhor compreensão sobre os fatores que influenciam as tomadas de decisão, de forma a contribuir com a melhoria do bem estar financeiro dos consumidores. Para finalizar esta introdução, é importante deixar claro que tomar boas decisões financeiras não é condição suficiente para se alcançar a felicidade. Isso porque, como alertado por Mihaly (1990), apesar de nos últimos séculos a racionalidade econômica ter logrado êxito, chegando ao ponto de considerar que todo esforço humano pode ser mensurado em termos monetários, uma análise apenas econômica da vida é profundamente irracional. Isso porque o verdadeiro ponto de partida consiste na qualidade e complexidade das experiências vividas, e não no dinheiro. 9 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM POR QUE CONSUMIDORES FALHAM AO DECIDIR? 10 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Atualmente, existe um vasto campo de estudo sobre tomadas de decisão, em que economistas se valem de ferramentas e teorias elaboradas por outras áreas do conhecimento, como psicologia, neurociência, sociologia, etc., de forma a melhorarem sua compreensão acerca do comportamento dos consumidores1. Esses estudos, além da importância econômica que lhes é peculiar, se mostram como uma forma muito útil de entendimento da própria natureza humana (Baumeister et al., 2008). Segundo Kennings e Plassmann (2006), tais pesquisas buscam investigar como os consumidores decidem, o que suas atitudes representam, quando eles desejam comprar e por qual motivo consomem. Os autores citam que o objetivo é analisar o processo de tomada de decisão, tanto de indivíduos como de famílias, auxiliando na melhoria de seu bem estar. Acrescentando argumentos a tal ponto de vista, Lusardi (2008) expõe que os estudos nessa área tornam-se cada vez mais relevantes, à medida que nas últimas décadas os 1 As discussões deste Volume 4 se relacionam a decisões de consumo. Todavia, em alguns momentos, também serão abordadas decisões sobre investimentos, que nada mais são do que escolher qual produto financeiro escolher. 11 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM indivíduos estão tendo que arcar com responsabilidades crescentes. A autora cita dois exemplos: 1) É preciso planejar a própria aposentadoria complementar, implicando em decisões financeiras com reflexos no longo prazo; 2) Do lado do crédito, devido à sua crescente disponibilidade, os consumidores se veem no papel de administrar de maneira coerente seu nível de endividamento. Esses exemplos (dentre vários existentes) demonstram que existem enormes desafios a serem enfrentados pelos consumidores, no tocante a alocação de seus recursos financeiros. Dentro desse contexto, Lusardi (2008) lança a seguinte pergunta: será que os consumidores estão preparados para tomar boas decisões financeiras? Responder a essa 12 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM questão tangencia tanto a questão psicológica, como seus níveis de educação financeira. Dessa forma, ao longo dos próximos parágrafos serão descritas diversas características, baseadas em trabalhos de diferentes autores, com o objetivo de demonstrar as dificuldades implícitas em um processo decisório. Para iniciar essa exposição, vejamos alguns pontos apresentados por Bettman et al. (1991): Consumidores, geralmente, se deparam com inúmeras alternativas, que estão constantemente mudando devido a novas tecnologias e pressões competitivas; Existem diferentes informações disponíveis, de várias fontes, dificultando as escolhas a serem feitas; 13 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Dificilmente consegue-se ter a total certeza sobre como certo produto vai funcionar ou como determinado serviço será oferecido; Clemen (1996) é outro pesquisador que buscou identificar os fatores que dificultam as tomadas de decisões dos agentes econômicos, apresentando quatro argumentos: a) o problema pode ser bastante complexo, dificultando sua análise; b) muitas vezes existe um alto grau de incerteza quanto aos possíveis resultados a serem verificados; c) a pessoa talvez possua múltiplos objetivos para utilização de seu dinheiro, sendo que seguir certo caminho pode impedir progressos em outro; 14 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM d) pode haver diferentes perspectivas em se olhar o problema, levando a julgamentos distintos. Com o objetivo de extrapolar tais dificuldades apresentadas por Clemen (1996) para decisões de consumo usuais, serão apresentados alguns exemplos para cada um dos quatro itens citados: a) Plano de previdência privada é um caso bem ilustrativo sobre decisões financeiras complexas. Um dos primeiros desafios é definir se essa é realmente a melhor alternativa, quando comparada à possibilidade de gerenciar, por conta própria, os investimentos de longo prazo. No caso de se optar pela previdência privada, será necessário escolher entre PGBL ou VGBL, se o fundo será de renda fixa ou permitirá aplicações em renda variável, o regime tributário para recebimento dos benefícios, se 15 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM estes planos serão recebidos de forma vitalícia ou temporária, quanto deverá poupar mensalmente, dentre outras decisões que tornam tal escolha bastante complicada; b) Quando o assunto é incerteza, tomemos por base a decisão entre comprar uma casa financiada ou alugá-la. O sucesso de tal decisão, dentre outros fatores, está associado a como irão se comportar os preços dos imóveis no futuro. Se fosse sabido, de antemão, que o preço dos imóveis iria subir, o financiamento seria a melhor opção, enquanto no cenário de queda de preços, talvez fosse interessante adiar a compra, alugando uma casa até que melhores condições aparecessem. c) Os múltiplos objetivos podem ser exemplificados na seguinte situação: um jovem gostaria de adquirir seu próprio carro, estudar no exterior e se casar; todos esses objetivos requerem um volume de recursos financeiros considerável, que 16 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM provavelmente o jovem não possua condições de atingi-los ao mesmo tempo; nesse caso, seria necessário analisar as prioridades e escolher apenas uma dessas opções no momento da tomada de decisão. d) Por fim, a questão de diferentes perspectivas é possível de ser compreendida ao se considerar um casal que está decidindo pela aquisição ou não de um pacote de viagens, para suas férias. Um dos cônjuges poderá ter um olhar negativo sobre o assunto, dando um peso maior à questão financeira, em que tal viagem os faria gastar toda sua poupança; já o outro talvez olhasse a decisão como uma boa oportunidade de enriquecimento cultural, descanso ou de fortalecimento da relação amorosa. 17 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM De forma a contribuir com o entendimento sobre as principais características de uma decisão de consumo, Bettman et al. (1991) apresentam três elementos básicos que compõem as escolhas dos indivíduos: alternativas, atributos de valor e incertezas. Para ilustrar suas aplicações, os autores apresentam como exemplo a decisão pela compra de um carro usado: Existe uma série de alternativas disponíveis, sendo que cada veículo apresenta diferentes quilômetros rodados, opcionais, capacidade de número de pessoas, consumo de combustível etc; Alguns desses atributos podem ser medidos com facilidade, porém, para outros, como os futuros gastos de manutenção a serem observados, os resultados são bastante incertos; 18 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Muitas vezes os atributos são comparáveis (um carro é flex e outro não), mas existem casos em que é preciso analisar diferentes atributos em alternativas distintas (não seria melhor utilizar o dinheiro do carro para fazer uma viagem?). De forma resumida, Bettman et al. (1991) explicam que tais características implicam que as decisões serão mais complicadas conforme i) o número de alternativas e atributos aumenta, ii) se algum atributo específico é difícil de ser verificado, iii) se há uma grande incerteza acerca dos valores dos atributos e iv) quando os números de atributos em comum das alternativas são pequenos. Entretanto, completam os autores, as dificuldades dos consumidores não se restringem apenas aos elementos que a compõem, mas também devem ser levadas em consideração: as informações já disponíveis na memória ou aquelas encontradas no ambiente (preço, tipo de loja etc). 19 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Mas, infelizmente, os problemas não param por aí. Bettman et al. (1991) também citam fatores adicionais que afetam as escolhas dos consumidores: a) importância da decisão (que depende do nível de consequência que ela gera); b) pressão por rapidez (quando a decisão possui um espaço curto de tempo para ser tomada); c) características das próprias alternativas, que pode significar a importância que se dá a cada atributo (exemplo: não abro mão de comprar um carro quatro portas); d) diferenças dos próprios indivíduos acerca do nível de conhecimento e habilidades, implicando que uns podem ter maior “facilidade” em tomar certas decisões que outros; 20 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM e) fatores sociais que afetam as escolhas dos indivíduos (meus filhos irão estudar na escola mais cara da cidade, pois todos os meus amigos assim o fazem). Para concluir este capítulo, como bem exposto por Baumeister et al. (2008), o mercado produz para todos e as pessoas são livres para escolherem o que consumir. Nesse contexto, é preciso que, dentro de um complexo sistema social, em que as informações são muitas e não disponíveis a todos, os consumidores desenvolvam sua competência financeira para superar esses obstáculos. Conhecer (e reconhecer) as características e dificuldades sobre tomadas de decisão em relação ao consumo, certamente é o primeiro passo para uma boa gestão das finanças pessoais. A seguir, serão focados aspectos relacionados à psicologia humana, descrevendo como algumas “armadilhas” de nosso modo de pensar podem influenciar negativamente as decisões a serem tomadas. 21 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM CONSUMIDORES E VIESES COGNITIVOS 22 23 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Apresentadas as características e dificuldades em relação às tomadas de decisão financeiras, mostra-se importante discutir por que os consumidores falham, sistematicamente, em suas escolhas. Hammond et al. (1998) explicam que há duas origens básicas para que os erros de avaliação aconteçam. A primeira surge através do modo pelo qual as decisões são tomadas: alternativas não são definidas claramente, são coletadas informações incorretas, ou os custos e benefícios não são adequadamente avaliados. Já a segunda fonte de erro, que será explorada mais profundamente neste tópico, não possui relação com o processo de tomada de decisão em si, mas tem sua origem na mente dos indivíduos, em que o cérebro age de maneira a sabotar bons resultados. Hammond et al. (1998) explica que usamos certas rotinas para lidar com problemas envolvendo decisões, denominadas heurísticas. Elas nos são úteis em diversas situações como, por exemplo, julgar a qual distância se está de um objeto: quanto mais nítido, mais próximo. Esse tipo de atalho permite tomar decisões de forma rápida e frequentemente VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM apresenta bons resultados. Porém, tais heurísticas não são infalíveis e podem levar a erros de julgamento (Bazerman, 2004). Essas falhas nas tomadas de decisões baseadas em heurísticas, de acordo com Hammond et al. (1998), são denominadas vieses cognitivos, que nada mais são do que armadilhas escondidas em nosso cérebro e que, poucas vezes, nos damos conta delas. Na literatura sobre o assunto, existem diversos vieses documentados e nos próximos parágrafos serão apresentados alguns deles2, buscando associá-los a situações relativas às finanças pessoais: Ancoragem: quando um indivíduo toma uma decisão, é comum se ancorar em uma informação previamente recebida. Pessoas fazem avaliações partindo de um valor inicial e ajustando-o, até que tomem sua decisão final. Essa âncora pode surgir de dados 2 Os vieses cognitivos foram extraídos de Hammond et al. (1998), Bazerman (2004), sendo os exemplos uma criação do autor deste Volume 4. 24 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM históricos, pela maneira como algo é apresentado ou por informações recebidas. Exemplo: ao negociar um produto, o vendedor apresenta um preço inicial muito acima do que deseja receber; tal procedimento tem o intuito de ancorar a mente do consumidor a um preço alto, deixando-o satisfeito ao conseguir um desconto que, na verdade, significa pagar o preço justo do produto; se outro vendedor oferecer o preço justo desde o início da negociação, não se fazendo valer da ancoragem, poderá perder a venda, dado que o consumidor se sentirá frustrado por não conseguir desconto algum. Veja que o preço a ser pago, em ambos os casos, é o mesmo, mas a depender do preço inicial fixado, os resultados podem ser diferentes, devido ao viés cognitivo do consumidor. Status-quo: muitas pessoas tendem a escolher alternativas que as façam permanecer no estado atual (status quo). São relutantes a mudanças e frequentemente postergam suas ações (como consequência, nunca agem e pouco fazem para gerar mudanças). Tal viés 25 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM mostra-se como uma proteção contra os próprios atos, evitando cometer erros em uma situação que está, sob certa ótica, tranquila. Exemplo: filhos herdam imóvel de seus pais e, mesmo sendo uma boa oportunidade vendê-lo para pagar dívidas a juros altos, eles não o fazem; contentam-se em dividir o baixo aluguel recebido, adiando qualquer tomada de decisão devido ao medo de realizar um mal negócio. Custos irrecuperáveis: acontece quando a decisão é tomada de forma a justificar uma escolha passada, mesmo que os argumentos anteriores não se mostrem mais válidos. Para uma boa escolha, não importa se determinada decisão passada consumiu tempo e/ou dinheiro: por serem irrecuperáveis, tais custos devem ser considerados irrelevantes, pois influenciarão negativamente no processo. Exemplo: um jovem inicia uma faculdade e a faz durante dois anos; ao ter a certeza que a carreira não é aquela que realmente deseja, os pais aconselham-no terminar o curso para não “perder” os dois anos que já foram 26 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM concluídos/pagos; o que se verifica, nesse caso, é que o erro do passado está sendo usado como principal parâmetro para a tomada de decisão atual; o que de fato ocorrerá é que esse jovem perderá um bom tempo estudando algo que não gosta, além de mais dois anos de despesas com um curso que provavelmente não será levado adiante, em termos profissionais. Confirmação da evidência: ocorre quando são consideradas apenas informações que reafirmem a decisão que se está querendo tomar. As informações que colhemos e como as interpretamos acabam sendo tendenciosas, e levando a erros de julgamento. Além disso, não levamos em consideração informações que vão contra o que pensamos ser correto. Exemplo: ao decidir comprar um carro novo, apenas aceitamos os conselhos que corroboram com a ideia da compra, ignorando todas as opiniões que afirmam ser um gasto excessivo no orçamento fazer a aquisição naquele momento. 27 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Confiança excessiva: apesar de, em geral, não sermos tão bons em fazer estimativas ou previsões, geralmente tendemos a ser muito confiantes em nossa precisão. Isso pode levar a erros de julgamentos e, consequentemente, a más decisões. Exemplo: uma pessoa, após ler dois livros sobre mercado de capitais, investe em ações com excessiva confiança de ganhos extraordinários, mas passado um tempo, percebe que seus rendimentos foram modestos ou que, na verdade, perdeu dinheiro. Disponibilidade: indivíduos avaliam a probabilidade de algo acontecer pelo grau de exemplos que estejam prontamente disponíveis em sua memória. Na maioria das vezes, um acontecimento que tenha provocado muita emoção torna-se mais fácil de relembrar que um evento mais brando. Exemplo: devido aos diversos planos econômicos frustrantes da década de 1980, algumas pessoas que viveram essa época superestimam os riscos existentes nos investimentos financeiros atuais; devido ao viés da 28 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM disponibilidade, consideram mais seguro investir em imóveis, por exemplo, que em títulos do governo que seguem a Taxa SELIC; ignoram as mudanças verificadas nos últimos anos e acabam por desconsiderar boas oportunidades de investimento. Ao se aprofundar na literatura econômica comportamental, é possível encontrar a descrição de diversos outros vieses cognitivos, sendo que descrevê-los em sua totalidade vai além do escopo do presente Volume. Mas é possível perceber que tais vieses possuem importante impacto nas tomadas de decisões dos consumidores, devido às seguintes razões (Milkman et al., 2009): 1) Erros são dispendiosos: erros induzidos por vieses cognitivos fazem com que pessoas guardem pouco dinheiro para a aposentadoria, escolham os trabalhos errados, etc., e isso causa um impacto social enorme. É preciso traçar estratégias para minimizá-los. 29 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM 2) Erros ficarão cada vez mais caros: ao passar de uma sociedade agrícola para industrial, os custos de decisões equivocadas ficaram cada vez maiores; atualmente, com a economia baseada na informação, bons profissionais são aqueles que decidem bem, pois más escolhas causam podem causar danos gigantescos e irreparáveis. Compreendido o que são vieses cognitivos e sua importância, a pergunta que surge é: como tomar boas decisões e superar tais problemas? Clemen (1996) explica que apesar de existirem muitas ferramentas que utilizam critérios objetivos para melhorar as tomadas de decisão, toda escolha requer a inclusão do caráter subjetivo, ou seja, do julgamento pessoal do tomador de decisão. De acordo com o autor, é preciso compreender que os seres humanos são processadores imperfeitos de informação e isso os faz errar. 30 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Mesmo assim, Milkman et al. (2009) oferecem algumas alternativas para minimizar os erros causados pelos vieses cognitivos. Para tal, dividem as funções cognitivas em dois sistemas. Sistema 1: baseia-se na intuição, que é geralmente rápida, automática, exige pouco esforço, sendo implícita e emocional. Sistema 2: é a própria razão, que se configura como um processo mais lento, consciente, necessita de boa dose de esforço, sendo explícita e lógica. Utilizando-se desses dois sistemas, Milkman et al. (2009) reconhecem que decisões baseadas na intuição (Sistema 1) nem sempre levam a maus resultados. Porém, afirmam que em situações mais técnicas e complexas, confiar somente na intuição pode ser perigoso, 31 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM pois os vieses cognitivos podem levar a sérios erros de julgamento. Dessa forma, os autores sugerem que nos casos em que o Sistema 1 se mostre suscetível aos vieses cognitivos, o consumidor deve mudar seu modo de decidir para o Sistema 2. De forma a suportar os benefícios de tal estratégia, Milkman et al. (2009) apresentam resultados de diversos estudos que demonstraram uma melhora nas tomadas de decisão, quando elas se basearam em um critério mais racional (uso de modelos matemáticos, decisões em grupo, olhar o problema como se fosse uma parte não envolvida na decisão, dentre outras técnicas). Portanto, no intuito de sugerir um processo mais racional de escolha, Bazerman (2004) apresenta seis passos importantes, que serão exemplificados com um exemplo de decisão de compra de um carro. Veja as etapas, a seguir: 1) Defina claramente sua questão (problema): meu carro está dando um alto custo de manutenção e está na hora de trocá-lo. 32 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM 2) Identifique os critérios: o novo carro deverá atender a quais características? Podemos pensar, por exemplo, em maximizar o conforto, minimizar os custos com gasolina e IPVA etc. 3) Pondere os critérios: cada critério terá uma importância diferente, a depender do tomador de decisão. Qual a importância do custo com combustível versus conforto do carro? 4) Gere alternativas: quais são todas as alternativas possíveis? Ou seja, quais marcas, por exemplo, são passíveis de serem analisadas? Será que não poderia substituir o carro por uma motocicleta? 33 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM 5) Classifique cada alternativa segundo cada critério: essa é, geralmente, a etapa mais difícil, pois significa saber quão bem cada uma das soluções atende a cada critério, mesmo não sendo possível controlar as incertezas futuras (será que tal carro apresentará uma perda considerável de valor no futuro? Será que virá com problema de fábrica?). Mostra-se necessário, neste passo, avaliar as consequências de cada escolha, além de gerar soluções alternativas, segundo cada critério analisado. 6) Identifique a solução ótima: depois de completada as cinco etapas anteriores, chega-se à etapa de escolher a solução cuja a classificação mostrou-se a mais benéfica. Como se pode notar, a solução para inibir os malefícios causados pelos vieses cognitivos não é tão simples quanto parece. Isso significa que ser racional requer alguns métodos relativamente sofisticados, quando comparados a decisões intuitivas. 34 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Para um mergulho ainda mais profundo sobre decisões intuitivas versus racionais, o próximo capítulo apresentará um resumo de dois livros interessantíssimos sobre o tema, de forma a ilustrar ainda melhor a diferenças entre os Sistemas 1 e 2. 35 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM RAZÃO versus INTUIÇÃO 36 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Gladwell (2005) escreveu toda uma obra dedicando-se a defender os benefícios das decisões intuitivas, tomadas em “um piscar de olhos” (Blink, em inglês). Segundo o autor, nosso cérebro possui duas diferentes estratégias ao tomar decisões, bastante similares aos Sistemas 1 e 2 apresentados no tópico anterior. Explica que a estratégia intuitiva opera de maneira inconsciente, tendo se desenvolvido nos seres humanos ao longo de sua história e sendo grande responsável pela sobrevivência da espécie: em tempos remotos mostrou-se crucial decidir rapidamente, baseando-se em pouquíssimas informações. Dessa forma, o denominado Blink seria algo como “a primeira impressão”. Para exemplificar tais situações, quando decidiu ler este eBook, quanto tempo você demorou para tomar essa decisão? Dois segundos? Saiba que nessa pequena fração de tempo o seu cérebro levou em consideração diversos aspectos, como por exemplo, a capa, o título, o meu nome, etc. E diversas vezes decidimos assim, como se não soubéssemos direito o que estamos fazendo, sendo que na maioria das vezes dá certo. De acordo com Gladwell (2005) 37 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM existe uma visão errônea que boas decisões devem ser diretamente ligadas a uma grande reflexão, demorando tempo e demandando esforço. Tendemos a acreditar apenas que decisões conscientes são boas. Todavia, escolhas pautadas em feeling podem ser tão boas quanto as que são meticulosamente construídas. Apesar de, ao longo de seu livro, o autor demonstrar alguns possíveis erros que o julgamento instantâneo pode levar, explica ser possível educar e controlar as decisões inconscientes. Para isso, explica que todas as situações de decisão que nos deparamos podem ser divididas em pequenas fatias de forma a associá-las com os padrões baseados em nossa experiência. Portanto, se nossas primeiras impressões são geradas por nossas experiências e pelo ambiente em que vivemos, isso significa que podemos mudar nossas primeiras impressões, mudando a maneira como fatiamos os eventos. Se você quer bater o olho em algo e decidir rapidamente (com bons resultados), é preciso que mude sua visão em relação àquele assunto, expondo-se a informações que possam auxiliar seu inconsciente. 38 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Resumidamente, isso significa criar as condições para decidir espontaneamente com sucesso. Obviamente as argumentações de Gladwell (2005) superam, e muito, o breve resumo de seu pensamento, aqui exposto. Mas em síntese, este autor é um grande defensor das decisões tomadas pela intuição, desde que devidamente “treinadas”. No entanto, outros dois grandes pesquisadores, Chabris e Simons (2010), em seu excelente livro sobre o funcionamento da mente humana, discordam de alguns pontos de vista de Gladwell (2005) acerca dos benefícios da intuição. Segundo os autores, possuímos, em diversas situações, intuições extremamente equivocadas e que “mascaram limitações crucialmente importantes de nossas habilidades cognitivas” (p. 7). Ao invés de denominar as falhas intuitivas como vieses cognitivos, os autores apresentam ao longo de seu livro seis ilusões que atrapalham nossa mente. Veja a seguir: 39 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Ilusão da atenção: pensamos que conseguimos fazer duas atividades ao mesmo tempo tão bem quanto faríamos duas separadamente. Entretanto, somos bastante ignorantes sobre aspectos de nosso mundo que estão fora de nosso foco de atenção. Criamos expectativas que determinam como enxergamos algo (e obviamente, o que deixamos de ver), ou seja, nossas experiências externas do passado são o alicerce de nossa percepção. Tal ilusão influencia nossos pensamentos, decisões e ações, levando a decisões desprovidas de cautela ou superconfiantes. Ilusão da memória: tendemos a achar que lembramos alguns eventos de maneira mais vívida do que de fato ocorre. Na verdade, geralmente as pessoas se lembram de algo da maneira que esperam ver. Portanto, o que fica armazenado na memória pode ser visto não como um espelho da realidade, mas uma recriação dela. 40 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Ilusão da confiança: parte-se de uma citação associada a Charles Darwin: “a ignorância gera mais confiança que o conhecimento”. Isso significa que tendemos a pensar que nosso bom desempenho baseia-se em possuirmos qualidades superiores aos demais e que nossos erros são acidentais. Em geral, pessoas pouco hábeis tendem a ser mais confiantes, relativamente, àquelas que são competentes e compreendem melhor suas limitações. Logo, é importante ressaltar que confiança não é sinônimo de capacidade, e isso pode levar a erros desastrosos. Ilusão do saber: implica em acreditar que sabemos algo em nível mais profundo do que realmente o entendemos. Tal ilusão origina-se da crença de que ao sabermos o que acontece, nos habilitamos a dizer que sabemos por que acontece, e isso muitas vezes não é verdade. Os autores utilizam o termo familiaridade como sendo algo perigoso, pois tomar contato com algo não significa dominar o assunto. É preciso resistir à tentação de 41 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM mergulhar de cabeça em projetos e sair fazendo, antes mesmo de analisar o adequado entendimento sobre a questão e seus requisitos. Não é difícil encontrar pessoas que fazem orçamento de obras e ela sai muito mais caras do que se pensou anteriormente, e isso ocorre porque em nossa mente as coisas parecem mais simples do que na realidade se apresentam. Os autores afirmam que investidores que possuem mais informações acreditam que também têm mais conhecimento. Mas quando essa informação, na verdade, desinforma, ela apenas alimenta a ilusão do saber. Ilusão da causa: nosso cérebro busca sempre detectar significado em padrões, e muitas vezes presume encontrar relações causais a partir de simples coincidências. Usamos eventos que já ocorreram como causa de um evento posterior, mas, logicamente, nem sempre essa relação é verdadeira. Além disso, não é comum acharmos padrões onde não existem (ou seja, enxergamos padrões em algo que é aleatório) e não percebemos 42 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM quando eles realmente existem. Supomos também que eventos que ocorrem ao mesmo tempo possuem relação causal e isso pode não ser verdade. Ilusão de potencial: os autores explicam que as pessoas pensam ter potenciais ilimitados de cognição. Citam a comum sentença de que “usamos apenas 10% de nosso cérebro” e explicam que tal afirmação não possui evidência científica alguma, mas acabou sendo aceita por tendermos, muitas vezes, a superestimar nosso potencial. Segundo os autores, não é raro se deparar com alguns “magos” alardeando formas milagrosas de maximizar potenciais inexplorados do cérebro e depois a ciência refutar a ideia (mas a crença fica). Chabris e Simons (2010) argumentam que tais alegações funcionam porque todos possuem o desejo de uma solução rápida para sanar todos os problemas, mas ela ainda não existe (é ilusão). Na verdade, deveríamos desconfiar de soluções simples para 43 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM problemas complexos, em que não há a exigência de esforço. O potencial do cérebro é grande, mas exige tempo e muita energia para desenvolvê-lo. Por fim, Chabris e Simons (2010) terminam seu livro com uma conclusão denominada: o mito da intuição. Explicam que todas as seis ilusões apresentadas nos faz crer que nossas capacidades mentais são maiores do que realmente são. A intuição acaba por ter como consequência fazer-nos acreditar que “prestamos atenção a mais coisas do que de fato prestamos, que nossas lembranças são mais detalhadas e resistentes do que são, que as pessoas confiantes são competentes, que sabemos mais do que sabemos realmente, que coincidências e correlações demonstram causação e que nosso cérebro tem grandes reservas de poder, fáceis de liberar” (p. 277). Criticam abertamente a visão de Gladwell (2005) de que métodos intuitivos (Sistema 1) são superiores aos métodos analíticos (Sistema 2). Explicam que a intuição possui papel de 44 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM destaque nas decisões, porém, afirmam que em muitas situações é preciso mais do que intuição para tomar boas decisões, principalmente naquelas suscetíveis às ilusões a que todos estamos sujeitos. 45 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM NEUROECONOMIA 46 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Conforme já abordado anteriormente neste Volume 4, pesquisadores ligados à economia comportamental, cada vez mais têm buscado auxílio em outros ramos da ciência para compreender a forma como os consumidores agem. Um desses encontros bem sucedidos, que vem crescendo de importância nos últimos anos, é a neuroeconomia, que nada mais é que a junção de neurociência e economia. Hubert (2010) ensina que enquanto as ciências econômicas explicam o comportamento, primariamente, através de construções teóricas, a neurociência considera os aspectos psicológicos e as variáveis somáticas3 que afetam as tomadas de decisão. Dessa forma, a neuroeconomia assume que a chave para explicar o comportamento humano significa compreender os processos neurais e psicológicos. Camerer et al. (2004) também citam que a neuroeconomia utiliza conhecimentos sobre mecanismos cerebrais para ajudar a teoria econômica a explicar certos fenômenos 3 Entende-se por somáticas todas as questões relacionadas ao corpo, sendo uma forma de se opor ao que é psíquico. 47 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM comportamentais, abrindo a “caixa preta” do cérebro. De acordo com os mesmos autores a economia sempre encontrou dificuldades em mensurar sentimentos e pensamentos, nas escolhas dos agentes econômicos, e a neurociência vem tornando possível tecer explicações bastante satisfatórias sobre esses aspectos. Nas palavras de Foxall (2008), a neuroeconomia busca compreender o processo de escolha dos consumidores, assumindo que o cérebro, no curso de sua evolução, aprendeu a ordenar suas escolhas, significando uma capacidade única entre os seres vivos de avaliar diferentes alternativas. Dentro desse contexto, em que economistas e neurocientistas buscam desvendar os processos decisórios dos seres humanos, Kennings e Plassmann (2006) apresentam exemplos de três grandes questões que essa nova área de estudo se propõe a analisar, em relação às decisões de consumo: 48 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM 1) Como a marca de um produto induz as preferências de um indivíduo? Quais áreas do cérebro são responsáveis pela decisão de comprar certa marca? 2) Quais são os efeitos da propaganda nas escolhas dos consumidores? Como as emoções são processadas no cérebro logo após ver um anúncio? 3) Quais processo cerebrais são os mais importantes durante as decisões de compras? Para que tais perguntas possam ser respondidas, Kennings e Plassmann (2006) expõem que com o recente avanço da tecnologia, tornou-se possível medir as atividades neurais no cérebro em tempo real, antes mesmo da compra, no ato da compra e depois do produto adquirido, ou seja, em todas as etapas de uma tomada de decisão de consumo. E tais pesquisas, complementam Camerer et al. (2004), viabilizou uma melhor descrição sobre o 49 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM funcionamento do cérebro humano, em que é possível dividi-lo em quatro partes (lobos), sendo eles: a) lobo frontal: que possuem forte influência nas áreas de planejamento e controle cognitivo; b) lobo parietal: responsável pelas ações motoras; c) lobo occipital: com forte influência no processamento visual; e d) lobo temporal: que se relaciona a questões ligadas à memória. Apesar de tal separação, na realidade, ao tomar decisões esses quatro lobos interagem entre si. Para exemplificar tal relação complexa de maneira simples, Camerer et al. (2004) sugerem a seguinte ilustração: se um dispositivo automático lhe pergunta “você não gostaria de fazer um seguro contra incêndio? Pressione 1 para mais informações”, o lobo occipital traz a imagem de sua casa ruindo, o temporal sente a emoção negativa, e o lobo frontal recebe os sinais de emoção e faz o balanço com o custo do seguro. Se o lobo frontal “decide” que você deseja mais informações, o lobo parietal dirige seu dedo a pressionar o botão 1. Como é possível notar, nesse exemplo, a neuroeconomia expande uma simples 50 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM análise econômica (teórica) através de uma melhor compreensão sobre como o cérebro funciona, buscando trazer elementos adicionais para estudar como os consumidores decidem. Ainda utilizando-se de analogias para um maior entendimento acerca do funcionamento do cérebro humano, Camerer et al. (2004) o compara com uma empresa, em que áreas são especializadas em diversas funções mas se comunicam entre si, e a intensidade de tal comunicação se torna mais intensa quando importantes decisões são tomadas. Sanfey et al. (2006) são outros autores que comparam o cérebro humano às modernas organizações empresariais, justificando que tais similaridades permitem utilizar-se do arcabouço da teoria econômica para explicar o funcionamento do cérebro. A seguir, veja o paralelo traçado pelos autores sobre cérebro versus empresas: 51 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Ambos podem ser vistos como um complexo sistema que transformam insumos em produtos finais; Ambos envolvem interações entre agentes similares (neurônios são similares uns com os outros e os indivíduos também), os quais, contudo, são especialistas em executar determinadas funções; Nas organizações as unidades tomam formas de departamentos, bem como o cérebro possui sistemas especializados em diferentes funções. Como nas organizações, essas funções podem ser mais ou menos espacialmente segregadas no cérebro, a depender dos processos requeridos para uma específica função e suas interações. Tanto no cérebro quanto nas empresas existe uma estrutura hierárquica; Ambos possuem sistemas “executivos” que fazem julgamentos relativos sobre a importância das tarefas a serem realizadas e decidem como mobilizar as suas; 52 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Da mesma forma que nas organizações, estudos evidenciam que áreas do cérebro envolvidas em funções executivas mostram-se muito ativas quando uma nova tarefa e que demanda muito esforço, aparece. Todavia, essas mesmas áreas mostram-se menos ativas com o passar do tempo, quando tais tarefas se mostram mais automáticas, sendo acompanhado de um aumento da velocidade de sua execução e eficiência. Por fim, Sanfey et al. (2006) argumentam que a neuroeconomia não é consenso entre os pesquisadores, mas acreditam que economia, psicologia e neurociência podem se ajudar mutuamente na compreensão o processo de tomada de decisão humano. 53 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM CONSIDERAÇÕES FINAIS 54 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM Como é possível notar ao longo deste Volume 4, quando o assunto é como os consumidores decidem, existe uma vasta literatura que aborda os diversos problemas “escondidos” em nosso cérebro e possíveis de serem evitados se soubermos de sua existência. E é exatamente esses “mistérios” que este eBook teve como objetivo desvendar. Se entendermos Educação Financeira como um processo que exige uma boa dose de autoconhecimento, ter acesso a pesquisas que tratam sobre como decidimos, tornase fundamental para a boa administração do próprio dinheiro. Portanto, sugiro que o(a) leitor(a) faça uma análise sobre suas escolhas de consumo e busque se precaver contra as armadilhas escondidas dentro de si. Esse exercício contínuo significará um ganho de capital humano essencial para que as finanças pessoais tomem o rumo desejado, não se deixando levar tanto por pressões de consumo que muito atrapalham o bom gerenciamento do orçamento pessoal. 55 VOLUME 4: UMA ANÁLISE SOBRE COMO OS CONSUMIDORES DECIDEM REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAUMEISTER, R. F. et al. Free will in consumer behavior: self-control, ego depletion, and choice. Journal of Consumer Psychology, v. 18, p. 4-13, 2008. BAZERMAN, M. H. Processo decisório: para cursos de administração e economia. 5ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. BETTMAN, J.R., JOHNSON, E.J.; PAYNE, J.W. 1991, Consumer Decision Making. In: Handbook of Consumer Behavior, ROBERTSON, T.S.; KASSARJIAN, H.H. (Eds.), Prentice Hall, p. 50-84, 1991. CAMERER, C. F.; LOEWENSTEIN, G.; PRELEC, D. 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