Terceira Civilização - Edição 463 - 01/03/2007 - pág. 50 - Diálogo Sobre a Filosofia Budista Terceira Civilização - Diálogo Sobre a Filosofia Budista Uma vida embasada na nona consciência CONVIDADOS Valter Takeshi Hada, vice-coordenador da Divisão Sênior da BSGI; Jorge Yukinori Miashiro, vice-coordenador da Cidade de São Paulo; e Ana Paula de Oliveira, vice-coordenadora da Divisão Dai-Gohonzon, estabelecendo de forma prática e acessível a todas as pessoas de seus dias e do futuro atingirem em seu cotidiano a mesma condição de vida iluminada que ele. Ou seja, revelou que todas as pessoas possuem inerentemente o estado de Buda e podem manifestá-lo, a cada instante, recitando a Lei Mística e agindo como budas. dos Estudantes da BSGI. Terceira Civilização: O Budismo de Nitiren Daishonin expõe o conceito das nove consciências, sendo que o objetivo primordial de sua prática é fazer com que as pessoas vivam com base na nona, que representa o estado de Buda. Como as pessoas podem conseguir isso em seu dia-a-dia? Jorge Yukinori Miashiro: Algumas pessoas crêem que o estado de Buda é uma condição de vida atingida somente após a morte. Esse é um ensino do Budismo Hinayana, muito diferente do que praticamos. Nesse ensino, os discípulos veneravam o Buda Sakyamuni ao extremo. Viam-no como uma entidade inatingível e acabavam desistindo da idéia de se tornarem budas em vida. Buscavam uma condição de vida elevada, chamada arhat, diferente do estado de Buda, que só seria atingida no momento da morte. O Buda Nitiren Daishonin revitalizou o Sutra de Lótus de Sakyamuni e revelou sua essência, ou seja, a Lei universal de Nam-myoho-rengue-kyo, e inscreveu o Ana Paula de Oliveira: O Budismo de Nitiren Daishonin expõe que esse estado nada mais é que uma condição de vida em que sentimentos uma profunda alegria pelo simples fato de estarmos vivos. Porém, muitas pessoas crêem que é algo inatingível devido às circunstâncias negativas em que se encontram. Mas quando recitamos o Nam-myoho-rengue-kyo é justamente essa condição de vida que atingimos. Ou seja, elevamos nosso estado e encaramos as circunstâncias com uma visão ampla. Não deixamos de ter problemas ou passamos a fazer de conta que eles não existem, mas não permitimos que eles nos incomodem tanto ou nos façam sofrer, pois compreendemos que o que vivemos hoje é efeito de causas do passado e do presente e que a chave para mudar o futuro encontra-se dentro de nós mesmos. Valter Takeshi Hada: Essa filosofia do Budismo de Nitiren Daishonin de que tudo se encontra dentro de nós é maravilhosa. Aqueles que se baseiam nela deixam de atribuir a responsabilidade dos Giovani Prestes Arduini cavalcante (767742-1) / pág. 1. Terceira Civilização - Edição 463 - 01/03/2007 - pág. 50 - Diálogo Sobre a Filosofia Budista acontecimentos da vida a alguém, compreendem que tudo parte de si mesmos e retorna a eles mesmos. Podemos dizer que isso é viver com base na nona consciência. O Budismo de Nitiren Daishonin é a única religião que elucida sobre essa consciência e como vivenciá-la. Colocando-a em prática, de fato, deixamos de ser influenciados pelas circunstâncias adversas e, então, passamos a viver com base no estado de Buda, que é igual à essência ou pureza da vida, à manifestação do próprio Nam-myoho-rengue-kyo inerente em cada ser humano. Miashiro: A nona consciência é chamada amala, e significa pura, sem mácula, livre de todas as manchas originadas das ações cometidas em existências anteriores. Nitiren Daishonin a identificou como o Nam-myoho-rengue-kyo, a natureza fundamental do Buda que se estende do infinito passado ao infinito futuro.1 Viver com base na nona consciência nos possibilita atingir uma condição insuperável de felicidade. Hada: Isso porque purificamos nossa vida e nossos pensamentos, nossas palavras e ações, que geram nosso carma. Teoricamente, é simples compreender isso, não é? A questão primordial é como colocar em prática em nosso cotidiano, que muitas vezes é repleto de impurezas. Mas, antes de tudo, é importante compreendermos que manifestar a nona consciência não é impossível, visto que ela é uma condição de vida inerente em todos os seres humanos, como revelado pelo Buda Nitiren Daishonin. Nesse sentido, se somos capazes de manifestar constantemente estados de vida inferiores, que nos levam a viver sem esperança, por exemplo, por que não somos capazes de manifestar estados superiores, que nos fazem transformar quaisquer situações? Ana Paula: Talvez isso ocorra pelo fato de, para nos mantermos em estados de vida elevados, precisamos de coragem, persistência, honestidade para não sermos influenciados por tantas incertezas da sociedade. Muitas vezes, é mais fácil seguir o fluxo do que mudar o rumo. Mas, como praticantes budistas, é fundamental não sermos influenciados pelas condições adversas, e sim mudá-las, fazendo brotar a pureza e a força do estado de Buda inerente em nossa vida. Para isso, é necessário uma prática vigorosa, sincera, capaz de purificar nosso próprio coração para, então, evidenciar esse estado e iluminar nossa mente com a consciência amala. Miashiro: Em um de seus escritos, Nitiren Daishonin declarou: “O corpo é o palácio da nona consciência, a realidade imutável que domina todas as funções da vida”.2 Escreveu também: “Os cinco caracteres do Nam-myoho-rengue-kyo representam a nona consciência”.3 O presidente Ikeda explana: “O Sutra de Lótus ensina que, ao ativar a nona consciência, que está nas profundezas de nosso ser e é fundamentalmente livre de impurezas, podemos transformar de uma vez tanto a energia cármica positiva quanto a negativa em nossa vida numa energia ‘soberbamente positiva’. A nona consciência é a vida universal subjacente à oitava consciência e a todas as outras facetas de nosso ser”.4 Giovani Prestes Arduini cavalcante (767742-1) / pág. 2. Terceira Civilização - Edição 463 - 01/03/2007 - pág. 50 - Diálogo Sobre a Filosofia Budista Hada: Apenas para referenciar o leitor, mas sem nos aprofundar muito, pois o princípio das nove consciências já foi amplamente estudado em outra ocasião nesta mesma seção,5 a oitava consciência, citada nessa maravilhosa explanação do mestre comentada pelo Miashiro, é chamada de alaya, que significa repositório, ou seja, é onde todas as experiências, atuais e anteriores, ficam depositadas, e exerce uma influência sobre as funções da sétima consciência, chamada de mano, que corresponde ao poder do pensamento e da meditação.6 A oitava consciência forma a estrutura de cada existência, pois é a que influencia as ações da mente. Essa consciência contém impurezas cármicas. Sobre isso, o presidente Ikeda diz: “A ‘forma’ atual de nossa vida é determinada por um equilíbrio de energias positivas e negativas. A oitava consciência assegura a continuidade do carma de uma existência a outra. (...) Todo o nosso carma acumula-se na consciência alaya como se fosse um depósito. Tanto o bom carma quanto o mau carma são armazenados lá como sementes num celeiro. O termo ‘depósito’ evoca imagens de uma estrutura real na qual coisas materiais podem ser colocadas. Mas de fato pode ser mais exato dizer que a própria corrente vital de energia cármica constitui a oitava consciência. Além disso, a oitava consciência transcende os limites do indivíduo e interage com a energia cármica dos outros. Numa dimensão interior de vida, essa energia cármica latente funde-se à energia latente da família desse indivíduo, do grupo étnico e da humanidade, da mesma forma que dos animais e das plantas. Há métodos para transformar a energia cármica da vida de alguém da ‘negativa’ para a ‘positiva’ por meio do acúmulo de boas causas. Mas, na realidade, isso não é prático; cedo ou tarde estamos sujeitos a fazer algo que apaga as boas causas que fizemos, assim como ao empilhar pedras, podemos fazê-lo até certa altura, antes de derrubar o que trabalhamos para criar. Isso é particularmente verdadeiro numa sociedade que está presa num redemoinho de energia negativa até suas profundezas”.7 É justamente por isso que precisamos nos elevar à nona consciência, que é pura, como dito anteriormente, para mudar o rumo de nossa vida e de toda a sociedade. Ana Paula: Dentre as virtudes de uma pessoa que embasa sua vida na nona consciência, está a benevolência. Mesmo que ela esteja enfrentando diversos problemas, jamais deixa de agir para contribuir pela felicidade de outras pessoas. Está livre de egoísmo, orgulho, arrogância, preconceito e diversas outras características de uma pessoa dominada pela escuridão fundamental ou ilusão. Isso, nada mais é, que a própria iluminação. Muitas vezes, entendemos iluminação como uma condição atingida, em que nos tornaremos intocáveis e adornados por luzes. Porém, a iluminação está justamente em não ser dominado por essas características negativas que geram o mau carma. “Iluminação não é algo distante ou estranho à existência comum”,8 diz o presidente Ikeda. Ou seja, pode ser manifestada na vida diária justamente quando não somos influenciados por nada que tenta nos impedir de avançar em nossa revolução humana. Giovani Prestes Arduini cavalcante (767742-1) / pág. 3. Terceira Civilização - Edição 463 - 01/03/2007 - pág. 50 - Diálogo Sobre a Filosofia Budista Notas 1. Cf. Fundamentos do Budismo, Editora Brasil Seikyo, pág. 74. 2. The Writings of Nichiren Daishonin, pág. 832. 3. Gosho Zenshu, pág. 794. 4. Brasil Seikyo, edição nº 1.520, 21 de agosto de 1999, pág. 3. 5. Leia em Terceira Civilização, edições n 420, 421 e 422, de agosto, setembro e outubro de 2003. 6. As demais consciências, que também correspondem às funções espirituais da percepção ou discernimento, são: as primeiras cinco correspondem aos cinco órgãos do sentido — visão, audição, olfato, paladar e tato. A sexta integra as percepções dos cinco sentidos em imagens coerentes e faz julgamentos a respeito do mundo exterior. 7. Brasil Seikyo, edição nº 1.520, 21 de agosto de 1999, pág. 3. 8. O Buda Vivo, Editora Record, pág. 70. Giovani Prestes Arduini cavalcante (767742-1) / pág. 4.