A FILOSOFIA HIGH-POP: algumas reflexões sobre o papel

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 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 1
A FILOSOFIA HIGH-POP: algumas reflexões sobre o papel da filosofia na atualidade
Tatiana Amendola Sanches2
Doutoranda em Ciências Sociais, Unicamp
Resumo
Este artigo procura apresentar alguns questionamentos sobre o crescente mercado de consumo de produtos
ligados à filosofia, denominada aqui de high-pop. A partir da relação entre a obra O que é Filosofia?
(DELEUZE E GUATARRI, 1992) e o livro Consolações da Filosofia, bem como suas adaptações para
série de televisão e DVD (BOTTON, 2001), procura-se apresentar algumas indagações sobre o papel da
filosofia e sobre a contradição apresentada no termo high-pop: como se articulam por um lado a filosofia
erudita, antiga e consagrada e, por outro lado, a filosofia atual, divertida e fácil? Tais questionamentos
podem suscitar o debate sobre consumo, entretenimento e memória já que o crescimento do mercado de
filosofia pop pode ser pensado como a banalização e a distorção do pensamento filosófico high, erudito e
antigo (e portanto lugar de memória), ao transformá-lo em diversão e consumo. Espera-se apresentar o
debate sobre as implicações deste fenômeno.
Palavras-chave: high-pop, filosofia, consumo, entretenimento.
Introdução
O movimento geral que substituiu a Crítica pela promoção
comercial não deixou de afetar a filosofia. O simulacro, a
simulação de um pacote de macarrão tornou-se o
verdadeiro conceito, e o apresentador-expositor do
produto, mercadoria ou obra de arte, tornou-se o filósofo,
o personagem conceitual ou o artista.
Deleuze & Guatarri3
O movimento high-pop (COLLINS, 2002) é caracterizado como a transformação da cultura
em entretenimento popular. Há hoje um duplo movimento no mundo do consumo cultural,
aparentemente contraditório: ao mesmo tempo em que presenciamos o aumento de produtos que
enaltecem a violência, sexo e culto às celebridades; presenciamos também o crescimento de
1
Trabalho apresentado no Grupo de Trabalho 09 Comunicação, Consumo e Memória, do 2º Encontro de GTs Comunicon, realizado nos dias 15 e 16 de outubro de 2012.
2
Doutoranda em Ciências Sociais pela UNICAMP, Mestre em Comunicação, Cultura e Sociedade pela University of
London e Bacharel em Ciências Sociais pela USP. Professora da Faculdade de Comunicação e Marketing da FAAP. Email: [email protected].
3
DELEUZE & GUATARRI, O que é filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992, p. 17.
PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 produtos que dialogam com o universo erudito. O movimento high-pop se refere a vários produtos
de consumo que seguem o caminho contrário ao do movimento da Pop Art. Enquanto o último
levava ao status de erudito produtos de consumo cotidiano, o high-pop leva obras eruditas de uma
elite cultural tradicionalmente autoconsiderada detentora do “bom-gosto” para o universo do
consumo cotidiano.
O conceito high-pop pode ser exemplificado (in Collins, op. cit.) a partir da análise de, por
exemplo, adaptações de peças de Shakespeare para o cinema Hollywoodiano ou da crescente
aproximação entre Museus e lojas de departamentos. No Brasil podemos pensar este movimento ao
olhar para prateleiras das lojas fast-fashion que trazem marcas e estilistas consagrados como Maria
Filó e Stela McCartney a preços populares; nas coleções que procuram divulgar a musica clássica a
assinantes de jornais; nos novos empreendimentos imobiliários inspirados em movimentos
artísticos, ou mesmo em lojas de azulejo que trazem o universo de Van Gogh para as paredes das
casas dos consumidores. O consumo atual é largamente marcado por esse diálogo com o universo
do elitismo cultural.
Há um fenômeno, no entanto, que parece ser especialmente abrangente e significativo, e que
implica em novas formas de subjetividade: o crescente mercado voltado para o consumo de livros e
outros produtos de filosofia no Brasil e no mundo. Este movimento parece estar parcialmente
relacionado ao que Collins chama de high-pop e portanto estaria ligado a uma necessidade de
adquirir alguma espécie de educação cultural no mercado, fora dos meios acadêmicos (2002, p.
16).
Consequentemente, dentro de uma possível comparação com a análise de Collins sobre
outros nichos de mercado, o consumo de produtos relacionados à filosofia estaria associado, entre
outras coisas, à aquisição de uma educação informal:
(…) knowledge has to be found elsewhere, specifically from various forms of popular
culture which provide the goods and, just as crucially, the information needed to translate
consumer decisions into the expression of one’s inner being. The notion that popular culture
has offered not just the prospect of entertainment but some sort of life lessons is, of course,
hardly new. As I have argued elsewhere, popular texts in a wide variety of media have
presumed to provide a kind of ad hoc, alternative education, epitomized by Bruce
Springsteen’s lyric, ‘We learned more form a three minute record, baby, than we ever
learned in school.’ (pp. 16, 17)
2 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 Embora a análise de Collins esteja centrada na questão da educação do “gosto” (taste),
podemos pensar o mercado da filosofia high-pop como um processo parcialmente resultante desse
movimento que une, ao mesmo tempo, uma sedução pela filosofia associada a certos valores
consagrados como “high” – erudição, antiguidade, nobreza, inteligência – e elementos associados
ao mundo “pop” – entretenimento, diversão, atualidade, facilidade, comunicação de massa.
A editora Madras é um exemplo interessante no Brasil, que mantém uma linha editorial
exclusiva destinada à “Filosofia pop”. A Madras publicou títulos como Harry Potter e a filosofia,
Os Simpsons e a filosofia, U2 e a filosofia: como decifrar uma banda atômica, House e a filosofia:
todo mundo mente, Crepúsculo e a filosofia: vampiros, vegetarianos e a busca pela imortalidade e
Batman e a filosofia: o cavalheiro das trevas da alma. Percebe-se aí uma clara fusão entre
elementos aparentemente contraditórios: o high, ou o erudito da filosofia; e o pop, ou os elementos
da cultura popular. Ou seja, o erudito se une ao mundo do entretenimento.
Desde autores como Gaarder (1991), que publicou o hoje mundialmente conhecido O
mundo de Sofia e despertou a atenção de muitos estudantes e adolescentes para um tema antes
considerado erudito e de difícil acesso, até Alain de Botton, que publicou livros como Consolações
da filosofia (2001), parece haver um movimento high-pop na filosofia também. A filosofia highpop pode ser definida portanto, como uma tentativa de oferecer um pensamento filosófico erudito e
consagrado a partir do uso de uma linguagem fácil e conteúdo divertido. A filosofia high-pop leva
ao consumidor pontuações da filosofia de modo a relacioná-la ao dia a dia dos seus leitores, como
algo que pode ajudar a resolver problemas cotidianos de modo “nobre”, ou seja, a partir do
pensamento de filósofos antigos, consagrados e famosos por seus ensinamentos4.
Tendo em vista o crescente mercado editorial voltado para essa filosofia que pode ser
enquadrada no movimento high-pop, deve-se questionar qual o papel da filosofia no consumo
desses produtos. De que forma podemos pensar as relações entre o high e o pop dentro deste
movimento de consumo caracterizado por Collins (2003) como high-pop?
4
Este artigo está relacionado com o projeto de doutorado que estou desenvolvendo na Unicamp. Minha pesquisa busca
evidenciar principalmente as causas da busca de saídas filosóficas para a vida cotidiana, que embora seja um dos
questionamentos mais importantes da pesquisa, não está presente neste artigo. Aqui procuro tratar apenas da relação
entre o high e o pop e as implicações do consumo destes produtos culturais para a noção de filosofia em Deleuze &
Guatarri. Não tenho como intuito aqui discutir as causas deste fenômeno, cuja abordagem é parte de um projeto ainda
em andamento.
3 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 Pretendo questionar aqui que elementos da filosofia, pensada a partir da obra O que é
Filosofia? (DELEUZE & GUATARRI, 1992) se mantém e se perdem nos produtos de filosofia
high-pop comercializados hoje? Mais especificamente, a partir da obra Consolações da Filosofia
(BOTTON, 2001) que foi vendida no Brasil como livro e como encarte da Revista Simples em sua
versão para DVD (Filosofia para o dia a dia, 2007), pretendo apresentar algumas indagações acerca
da contradição apresentada no termo high-pop. De modo geral, procuro indagar, como se articulam
por um lado a filosofia tradicional, erudita e consagrada e, por outro lado, a filosofia pop, divertida
e fácil.
Tais questionamentos nos colocam diante da necessidade de pensar as relações entre
consumo, comunicação e memória, já que o crescimento do mercado de filosofia pop pode ser
pensado como a banalização e a distorção do pensamento filosófico high, ao transformá-lo em
objeto de consumo.
Consolações
O livro Consolações da Filosofia (BOTTON, 2001) está estruturado em seis
capítulos/consolações: consolação para falta de popularidade, consolação para não ter dinheiro
suficiente, consolação para frustração, consolação para inadequação, consolação para coração
partido e, por último, consolação para dificuldades. Cada um destes capítulos apresenta um filósofo
principal: para os problemas de popularidade, Sócrates; para consolar aqueles sem muito dinheiro,
Epicuro; já os que se sentem frustrados e raivosos devem consultar Sêneca; os inadequados devem
se consolar com a filosofia de Montaigne; os que sofreram com a perda de um grande amor devem
buscar consolação em Schopenhauer; e, finalmente, aqueles que tem dificuldades na vida devem
se inspirar em Nietzsche.
Na sua primeira adaptação (2000) o livro foi transformado em série televisiva, produzida
pela A Diverse Production e exibida pela Channel Four Television Corporation na Inglaterra, com
o nome de Philosophy: a guide to happiness. O livro foi transformado e comercializado como
DVD vendido pela Revista Simples no Brasil com o nome de Filosofia para o dia a dia (2007). As
fotos da capa, criadas por Marcelo Breyne e André Spinola e Castro, mostram como a filosofia
pode ser associada às coisas mais simples do cotidiano, como arroz e feijão:
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No DVD, as mesmas seis consolações estão presentes em seis diferentes episódios.
As experiências de leitura do livro e o contato com a série original sugerem alguns
apontamentos pertinentes para o entendimento do consumo do mercado high-pop - mais
especificamente da filosofia high-pop - a partir das colocações de Deleuze & Guatarri (1992)
sobre o papel da filosofia.
A seguir, apresentarei algumas dessas questões. Tratarei aqui da adaptação do livro para a
televisão em sua versão original e vendida no Brasil, já que foi comercializado por uma revista de
alta circulação no Brasil.
Sócrates: Consolação para a Falta de Confiança
O primeiro episódio do DVD é chamado de Sócrates e a autoconfiança, e se inicia com
Alain de Botton dirigindo uma lambreta em Atenas enquanto pergunta se a antiga civilização grega
teria algo a dizer às pessoas hoje em dia. Ele mesmo conclui que é possível captar algumas lições
deixadas pelos filósofos antigos, especialmente se lembrarmos de Sócrates. O primeiro episódio
tem como intuito mostrar que, de acordo com o pensamento de Sócrates, pensar logicamente sobre
nossas vidas pode nos ajudar a ter mais segurança sobre nós mesmos. A filosofia pode nos libertar.
5
Fonte: Portfólio de Priscilla Santos, disponível em <http://portfoliopriscillasantos.wordpress.com/2010/01/26/dvds-
vida-simples/>, acesso em 25 de agosto de 2012.
5 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 Alain de Botton salienta dois fatos sobre Sócrates. Em primeiro lugar, afirma que Sócrates
era o mais famoso filósofo de sua época; e que isso poderia ser comprovado por ter sido o único
filósofo que foi transformado em imã de geladeira. A imagem que vemos é a de uma lojinha que
vende imãs com o rosto de Sócrates. O segundo fato notável sobre Sócrates é sua feiúra. Botton
comenta como isso era fofoca inclusive na época em que o filósofo viveu.
Na sequência, observamos um rebanho de ovelhas e Alain nos pergunta por que razão
seguimos as opiniões e comportamentos dos outros ao invés de criarmos nossas próprias opiniões e
comportamentos. Segundo Botton, a primeira consolação de Sócrates vem para inspirar as pessoas
a desenvolver uma certa confiança nas suas próprias ideias; ao invés de se prenderem às dos outros.
Para o narrador, uma das lições que Sócrates nos deixa é a de enfrentar o horror em sair do
rebanho.
E assim, o apresentador se pergunta: Por que seguimos os outros? E a resposta, a partir do
pensamento de Sócrates, é por que achamos que os outros sabem das coisas, principalmente se são
pessoas importantes.
O que se segue é a apresentação de algo parecido com um estudo de caso para elucidar o
pensamento de Sócrates.
Um gerente financeiro de uma empresa é convidado a dar um
depoimento de como a vida dele na empresa foi prejudicada por defender uma ideia diferente da
opinião da maioria.
Em seguida, Botton mostra que se questionamos pessoas que tem muita certeza sobre suas
opiniões, veremos que, frequentemente, elas não tem fundamento. Assim, o apresentador aparece
fazendo perguntas para as pessoas que passam nas ruas de Atenas e mostra como estar ciente do
fato de como as opiniões dos outros não são sempre fundamentadas pode nos ajudar a superar
nossa timidez e conformismo. Para Botton, Sócrates nos consola ao ensinar a filosofar, já que a
filosofia é um convite à inteligência e ao não conformismo. A filosofia pode nos ajudar a ter
confiança para criticar ideologias, tradições e desenvolver crenças próprias, saindo do rebanho.
Botton ainda vai comparar a prática da filosofia à prática da cerâmica e tentar mostrar que a
fundamentação de opiniões tem certas regras que todos seriam capazes de seguir. Ou seja, somos
todos possíveis filósofos. O vídeo mostra também uma experiência de grupo focal. Botton coloca
que Sócrates desaprovaria essas práticas hoje em dia pois para ele seria mais importante usar um
6 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 argumento lógico e razoável do que seguir a opinião da maioria.
No final do episódio acompanhamos um relato dramático da morte de Sócrates, que morreu
por defender suas crenças, e não a opinião da maioria.
Epicuro: consolação para a falta de dinheiro
Neste episódio Botton busca reunir a reflexão acerca da felicidade e exemplos cotidianos,
traduzidos na forma de entrevistas com pessoas comuns, e exemplos vindos do mundo da
publicidade. Botton começa contando a história de Epicuro. para quem a felicidade seria algo
simples de ser conquistado pois se constrói a partir da junção de três elementos: amizade, liberdade
e tempo para refletir. Botton argumenta essa é uma das grandes consolações do pensamento de
Epicuro: não é preciso dinheiro para ser feliz. Aos poucos, o filósofo high-pop6 vai mostrando que
a publicidade hoje tenta lucrar com anúncios de diversos produtos caros e desejados mas, no fim
das contas, o apelo sedutor dos produtos sempre recai no oferecimento dos ingredientes da
felicidade que Epicuro já havia identificado muito anteriormente. Ou seja, para Botton, o que faz os
homens felizes hoje é o mesmo que fazia os homens felizes na época de Epicuro. No entanto, hoje,
mais do que nunca, somos iludidos pelas propagandas e levados a acreditar que o que nos fará
felizes é o produto, e não os elementos apontados por Epicuro, de modo ilusório. Neste episódio
Botton nos convida a voltar a olhar para os elementos epicuristas se quisermos ser mais felizes.
Para Botton, as pessoas sempre buscaram a filosofia como algo que pode ajudar na
felicidade, mas poucos filósofos falaram sobre o assunto. Epicuro acreditava que todos podem
encontrar o caminho para a felicidade. O problema é que procuramos nos lugares errados, ou seja,
no mundo do consumo. Botton afirma: “a filosofia pode ajudar mais e melhor do que um cartão de
crédito”. Precisaríamos sair da vida do consumo para sermos realmente felizes. Enquanto rascunha
um gráfico, o apresentador afirma que podemos ser felizes se não tivermos dinheiro, mas tivermos
os três elementos de felicidade apontados por Epicuro. No entanto, se não tivermos os elementos,
mas tivermos apenas dinheiro, nunca seremos felizes. A culpa de não sermos felizes seria da
propaganda, que associa os três elementos que realmente trazem felicidade com produtos. Assim,
ficamos confusos em relação ao que queremos.
6
Estou chamando.... 7 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 O episódio continua com uma visita a uma comunidade Epicurista em Oenoanda. Botton
entrevista um especialista e comenta sobre um famoso seguidor de Epicuro, Diógenes, que
escreveu um mural dizendo às pessoas que o consumo não traria felicidade. Ambos vasculham as
ruínas do mural e Botton tem a ideia de fazer o mesmo hoje, usando um outdoor em um Shopping
Center. Botton procura uma agência de publicidade e participa de um processo de criação que
culmina na criação e exposição do outdoor abaixo:
7
Assim, é criado, nas palavras do apresentador, um “lembrete moderno de como podemos
viver sabiamente” nos moldes do que Diógenes nos ensinou.
Sêneca: Consolação para as Frustrações e a Raiva
Seguindo com a proposta dos outros episódios, este também propõe ver na filosofia um
caminho para aprender a ser feliz. A raiva é vista como um dos problemas que a filosofia pode
ajudar a resolver. Botton explica que Sêneca queria acalmar as pessoas, pois tinha livros que
buscavam dar conselhos práticos para as pessoas.
Neste episódio um dos entrevistados é um motorista de empresa de delivery em Roma. Ao
ser questionado sobre como controla sua raiva no trânsito, o motorista responde que não há nada a
fazer para controlar. Botton consola: para Sêneca, a raiva é um problema filosófico que pode ser
resolvido com o auxílio do pensamento filosófico, já que as pessoas ficam com raiva por que são
7
Fonte: Blog Cultura do Controle, disponível em <http://culturadocontrole.blogspot.com.br/2010/07/felicidade-versus-
consumo.html>, acesso em 25 de agosto de 2012.
8 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 muito otimistas. A saída seria tentar ser filosoficamente mais pessimista.
Em seguida visualizamos uma comparação metafórica. Enquanto Botton anda em círculos
de bicicleta com um cachorro amarrado ao guidão, nos diz que somos como o cachorro. Devemos
olhar para o que está ao nosso redor e enxergarmos a vida dentro dos limites reais de possibilidade
e necessidade. A frustração e a raiva surgem das altas expectativas que criamos.
A segunda pessoa entrevistada é uma editora que vive frustrada, pois sempre se atrasa para o
trabalho e não termina as coisas que tem que terminar a tempo. Botton propõe um mini reality
show à entrevistada. Ela deverá gravar depoimentos sobre a semana com base na ideia filosófica
extraída do pensamento de Sêneca de ser mais pessimista. O episódio reproduz esse mini reality. A
conclusão é a de que o famoso jargão “tudo vai dar certo” deve realmente ser pensado de forma
oposta pois assim seremos mais felizes.
Botton concluí o episódio mostrando como nunca estamos imunes à fortuna. As forças da
natureza são um exemplo disso. Não devemos dar uma resposta não filosófica, como a raiva e a
frustração, mas sim estarmos psicologicamente e filosoficamente preparados.
Montaigne: Consolação para a Baixa Autoestima
O episódio sobre Montaigne se inicia com imagens de uma festa de graduação da
Universidade de Cambridge. Botton comenta que a graduação é um momento marcante, mas que
ao mesmo tempo nos coloca diante de um marco para uma nova fase da vida onde o sentimento de
falta de autoestima, depressão e inadequação crescem. Os sentimentos de inadequação ao mundo
são, seguindo o pensamento de Montaigne, três principais: a inadequação em relação ao corpo, em
relação ao julgamento dos outros (especialmente o de desaprovação), e a inadequação intelectual.
O episódio busca consolar as três inadequações.
Para consolar a inadequação corporal, Botton nos apresenta o pensamento de Montaigne a
partir de seu livro Essays, chamando a atenção para o capítulo que fala sobre o pênis, coisas que
segundo ele não são normalmente faladas nos livros de filosofia. Para Botton, algumas consolações
que podemos ter em relação ao nosso sentimento de inadequação corporal vem do fato de que
desprezamos quem somos ao sermos muito razoáveis com nós mesmos e desenvolvermos uma
9 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 vergonha de falar sobre nossos próprios corpos, aceitando que somos meio animais8.
Para a segunda inadequação, a relacionada ao julgamento dos outros, Botton faz um
experimento. Visita um pub e oferece comidas “exóticas” para os freqüentadores do local, ao
mesmo tempo em que começa um novo debate sobre o que é normal e anormal e sobre como as
pessoas se comportam em relação àqueles que não compartilham seus costumes. A solução para a
inadequação é, neste caso, viajar e perceber que a normalidade e adequação são questões relativas,
que podemos ser normais em outras culturas. Enquanto isso vemos um desfile de personagens de
vários países do mundo vestidos de forma típica.
Para a última inadequação, a intelectual, Botton coloca que as pessoas podem ser
inteligentes sem nunca ter ido a universidades: as pessoas precisam de humildade, modéstia e
aceitação de suas próprias limitações inteligências para serem inteligentes. O episódio nos mostra
alunos de Cambridge fazendo uma prova sobre questões de sabedoria e não conhecimento.
Concluímos: é possível ter muito conhecimento e não ser sábio, e é possível ser sábio e não ter
conhecimento. Assim, Botton afirma que a partir do pensamento de Montaigne devemos perceber
que a vida acadêmica não é necessariamente fonte de sabedoria. E conclui: a vida mais feliz é
aquela que é vivida sem pensar.
Schopenhauer: Consolações para as Desilusões Amorosas
A filosofia silencia sobre o amor. Com essa constatação se inicia o penúltimo episódio da
série Philosophy: a guide to happiness. Botton questiona: se o amor é parte tão importante da nossa
vida, deveria ter sido levada mais a sério pelos filósofos. E Schopenhauer foi um dos poucos que
acreditava ser o amor algo sobre o que certamente devêssemos apoiar nossa vida. A consolação é
que ele não achava que felicidade teria a ver com isso.
Botton logo nos apresenta sua primeira entrevistada deste episódio, uma moça que acabou
de levar um fora do namorado e que compartilha a leitura da “carta-fora” com Botton. Para o
apresentador, Shopenhauer era o “Doctor Love” da filosofia e talvez possa ajudar e consolar
pessoas desiludidas em seus relacionamentos amorosos. Assim, segue nos falando dos amores de
Schopenhauer.
8
Neste momento observamos a cena de um porco urinando e outro bebendo a urina.
10 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 Seguindo com a apresentação do pensamento do “Doutor Amor” da filosofia, Botton diz que
para Schopenhauer o amor tem a ver, primordialmente, com a sobrevivência da espécie. Tem a ver
com o desejo de preservação da vida, com o fato de que somos escravos da sobrevivência e da
continuidade da vida, com o desejo cego e biológico de reproduzir. Mas não tem a ver com a
felicidade.
Acompanhamos a visita de Botton a um pub, onde ele passa a perguntar para as pessoas se
elas foram lá para propagar a espécie. O episódio também apresenta várias imagens que, imitando o
mundo das HQs, sugerem diálogos românticos a partir de balões de frases apaixonadas e imagens
de casais apaixonados. Botton continua argumentando e diz que o desejo de reproduzir não é
consciente, e por isso tantas evidências da relação entre amor e felicidade. Mas o fato é que nos
apaixonamos pelas pessoas que nos apaixonamos pelo desejo de procriação. Schopenhauer
afirmava que os opostos se atraem para que haja uma compensação biológica na procriação.
Segundo Botton, o pensamento de Schopenhauer pode soar estranho hoje, mas devemos
contextualizar. Ele viveu antes de Darwin e Freud. Pode nos ensinar, mesmo com certa estranheza,
que ser feliz e ter uma relação amorosa são coisas diferentes e que tentar juntar as duas coisas é
tarefa impossível: ou vence a procriação ou o desejo do indivíduo.
A seguir, as consolações são resumidas pelo apresentador:
Schopenhauer diz que não temos escolha senão nos apaixonarmos: a biologia é mais forte
que a razão. Não somos infelizes por acidente. Somos como todas as outras criaturas. Temos que
nos devotar à reprodução sem achar que temos que ser felizes, mas sim porque temos um dever
com a propagação da espécie. Ainda: quando alguém nos dá o fora temos que nos consolar ao
estarmos cientes de que não levamos o fora exatamente por ser quem somos , mas por que a
procriação pode ser melhor com outra pessoas. A natureza é mais forte. Não é o eu psicológico,
mas o eu biológico que leva as pessoas a darem o fora. Há uma consolação em ser consciente das
forças trágicas da natureza.
Para finalizar o episódio, acompanhamos cenas de um casamento. Botton nos coloca que
embora a maior parte das pessoas veja o casamento como um momento de felicidade,
Schopenhauer nos diria exatamente o contrário: que a felicidade não está em jogo. Por fim, Botton
convida sua entrevistada desiludida para jantar.
11 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 Nietzsche: Consolação para as Dificuldades da Vida
O episódio começa com uma reflexão do filósofo high-pop: todos temos momentos difíceis,
e a maioria dos filósofos querem nos ajudar a fazer a dor passar. Mas há um filósofo que pensa
diferente: segundo Nietzsche, para encontrarmos a felicidade devemos passar pela dor e
sofrimento. Alain de Botton aparece escalando uma das montanhas preferidas de Nietzsche e
filosofa: é do topo que temos as melhores vistas, mas o topo é também o lugar onde temos mais
trabalho e dor para chegar. Seguindo sua análise, Nietzsche afirma que para tudo que valha a pena,
na vida, temos que passar, na vida, por um esforço extraordinário.
Neste momento uma breve apresentação da vida de Nietzsche se inicia, e acompanhamos
Botton comentar sobre suas doenças e dificuldades9, ao mesmo tempo em que alguns pensamentos
seus são expostos, como por exemplo o de que a filosofia é como viver voluntariamente em
montanhas geladas e altas.
Segue-se a apresentação de um case explicativo sobre o pensamento do último filósofo do
DVD. Uma bailarina é apresentada como metáfora para o fato de que o sucesso vem de muito
esforço e que a dor é parte integrante deste sucesso: sentimos dor por conta da distancia entre quem
somos e quem queremos ser. O desafio que Nietzsche apresenta sob a análise de Botton é
responder bem ao sofrimento, como faz por exemplo a bailarina ao criar algo belo a partir da dor.
A análise continua: todos podemos tirar vantagem das nossas falhas, mas vivemos numa cultura
que não gosta de falar de falhas, apensas de sucessos. Botton fala sobre as vantagens das falhas,
mas aponta que a consolação não é apenas o reconhecimento da importância das falhas, mas
aprender a lidar bem com elas, como os jardineiros fazem ao construir algo belo de algo feio.
Botton argumenta que para termos felicidade na vida temos que viver em perigo e relembra clichês:
“life is a risky business”, “no pain no gain”.
Duas últimas aproximações com o dia a dia são apresentadas para fechar o DVD: a bebida e
a religião. Em primeiro lugar, para Nietzsche beber seria algo condenável, não uma consolação.
Beber é escapar. A felicidade vem em encarar o sofrimento. Em segundo lugar, para Nietzsche a
9
Cabe lembrar que um outro filósofo high-pop também usou a vida de Nietzsche como insipiração para uma autoajuda:
Em seu livro Quando Nietzsche Chorou, Irvin D. Yalom mostra como a vida do filósofo pode ajudar a transformar a
vida de uma pessoa em crise.
12 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 religião também, como a bebida, nos faz sentir bem, mas a longo prazo afasta a dor e
consequentemente a energia para superar os problemas e chegar à verdadeira felicidade. Daí
seguem as consolações de Nietzsche rapidamente resumidas numa última frase: o que não nos mata
nos deixa mais fortes.
Filosofia, Autoajuda, Comunicação e Consumo
A edição do caderno Ilustríssima da Folha de São Paulo de 26 de agosto de 2012 traz um
artigo Raul Juste Lores, intitulado Autoajuda high-class, que parece reforçar a relevância de
discutirmos a questão da crescente venda de produtos associados ao mundo erudito de forma
simplificada e divertida. O artigo aponta para o desdobramento da autoajuda clássica e a onda de
livros que popularizam o conhecimento com fins pragmáticos. Há, de fato, um movimento geral
que perpassa várias áreas do conhecimento além da filosofia. Estudar especificamente este nicho de
mercado associado à filosofia pode nos trazer elucidações ao debate como um todo. Por isso é
fundamental questionar quais as implicações da simplificação e da transformação da filosofia em
algo que busca combinar conhecimento, filosofia, entretenimento e a busca de soluções para a vida
cotidiana (autoajuda)? A obra de Deleuze & Guatarri (op. cit.) pode sugerir algumas respostas.
Se, para Deleuze (1988), o filósofo é aquele que busca a criação de problemas, de que
forma pensar a filosofia da forma como é apresentada por Alain de Botton, que busca trazer
soluções para problemas emergenciais cotidianos? Seria a “filosofia high-pop” filosofia ou apenas
auto ajuda? Até que ponto essa filosofia high-pop embora não seja criadora no sentido pensado por
Deleuze & Guattari (op. cit.), pode ser pensada como conhecimento, e não apenas diversão?
Em primeiro lugar deve-se pensar a relação entre filosofia e comunicação.
Para Deleuze & Guatarri, filosofia não tem nada a ver com comunicação. O pensamento
não se inicia com a comunicação, mas com a falta dela, com o choque, a partir de uma violência,
algo que force o pensar, um acontecimento. A filosofia não seria a solução dos problemas ou suas
consolações, mas, ao contrário, algo como a arte dos problemas:
Vemos ao menos o que a filosofia não é: ela não é contemplação, nem reflexão, nem
comunicação, mesmo se ela pôde acreditar ser ora uma, ora outra coisa, em razão da
capacidade que toda disciplina tem de engendrar suas próprias ilusões, e de se
esconder atrás de uma névoa que ela emite especialmente. (...) E a filosofia não
13 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 encontra nenhum refúgio último na comunicação, que não trabalha em potencia a não
ser de opiniões, para criar o “consenso” e não o conceito. (DELEUZE &
GUATARRI, 1992, p. 12)
O debate e a opinião são inferiores ao que o pensamento pode produzir. Neste sentido, a
simplificação do pensamento filosófico apresentada com a filosofia high-pop de Botton não seria
um ato de filosofar. Seria comunicar, resolver problemas:
Pedimos somente um pouco de ordem para nos proteger do caos. Nada é mais
doloroso, mais angustiante do que um pensamento que escapa a si mesmo, ideias que
fogem, que desaparecem apenas esboçadas, já corroídas pelo esquecimento ou
precipitadas em outras, que também não dominamos. São variabilidades infinitas
cuja desaparição e aparição coincidem. São velocidades infinitas, que se confundem
com a imobilidade do nada incolor e silencioso que percorrem, sem natureza nem
pensamento. É o instante que não sabemos se é longo demais ou curto demais para o
tempo. Recebemos chicotadas que latem como artérias. Perdemos sem cessar nossas
ideias. E por isso queremos tanto agarrarmo-nos a opiniões prontas. Pedimos
somente que nossas ideias se encadeiem segundo um mínimo de regras constantes, e
a associação de ideias jamais teve outro sentido: fornecer-nos regras protetoras,
semelhança, contigüidade, causalidade, que nos permitem colocar um pouco de
ordem nas ideias, passar de uma a outra segundo uma ordem do espaço e do tempo,
impedindo nossa ‘fantasia’(o delírio, a loucura) de percorrer o universo no instante,
para engendrar nele cavalos alados e dragões de fogo.” (p. 237)
Essa confortadora busca de regras, opiniões prontas e ordem é oferecida pela filosofia highpop. A filosofia para Deleuze & Guatarri, no entanto, tanto como a arte e ciência, “querem que
rasguemos o firmamento e mergulhemos no caos. Só o venceremos a este preço.” (op. cit., p. 260).
A filosofia deve levar a um encontro com a realidade que ultrapassa as regras, assumindo outra
intensidade, um alargamento dos sentidos. Deve-se inserir caos na criação dos conceitos, que é o
que é a arte da filosofia. Deve-se evitar a petrificação dos conceitos.
Em segundo lugar, decorrente do citado acima, outra questão que surge é a sobre o lugar da
filosofia, a partir da sua inserção no mercado. A quem ela se destina? Por um lado, se ela
provém do choque, é destinada aos não-filósofos, já que é muitas vezes em um meio não filosófico
que temos o choque que nos leva ao ato de filosofar.
14 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 Para Deleuze & Guatarri há uma distinção entre os pensamentos estabelecidos e os
pensadores que ficam à margem da academia. Estas figuras preservam uma dose de caos em sua
vida, caos que pode ser mais frutífero à criação de conceitos:
O plano da filosofia é pré-filosófico, enquanto o consideramos nele mesmo,
independentemente dos conceitos que vêm ocupá-lo, mas a filosofia encontra-se lá, onde o
plano enfrenta o caos. A filosofia precisa de uma não-filosofia que a compreenda, ela precisa
de uma compreensão não filosófica, como a arte precisa da não-arte e a ciência da nãociência. (DELEUZE & GUATARRI, 1992, pp. 256, 257)
Falta-lhes uma garra, que seria a da necessidade absoluta, isto é, de uma violência original
feita ao pensamento, de uma estranheza, de uma inimizade, a única a tirá-lo de seu estupor
natural ou de sua eterna possibilidade: tanto quanto só há pensamento involuntário,
suscitado, coagido no pensamento, com mais forte razão é absolutamente necessário que ele
nasça, por arrombamento, do fortuito no mundo. O que é primeiro no pensamento é o
arrombamento, a violência, é o inimigo, e nada supõe a Filosofia; tudo parte de uma
misosofia. Não contemos com o pensamento para fundar a necessidade relativa do que ele
pensa; contemos, ao contrário, com a contingência de um encontro com aquilo que força a
pensar, a fim de elevar e instalar a necessidade absoluta de um ato de pensar, de uma paixão
de pensar. As condições de uma verdadeira crítica e de uma verdadeira criação são as
mesmas: destruição da imagem de um pensamento que pressupõe a si própria, gênese do ato
de pensar no próprio pensamento. (DELEUZE, 1988, p. 137)
Por outro lado, estar à margem significa não estar em um meio filosófico como a academia,
mas também não no mercado, embora este último seja um meio não-filosófico. Quando a filosofia
se transforma em mercadoria ela aponta, na visão de Deleuze & Guatarri (p. 19), para um desastre
do pensamento.
Mercadoria ou Meteoro?
Nos apontamentos acima encontramos uma severa crítica de Deleuze & Guatarri sobre a
associação entre consumo, comunicação e filosofia, que implicaria uma banalização e deturpação
associada a forma de conhecimento apresentada por pensadores voltados ao mercado, como Alain
de Botton. Por outro lado, ao sugerir que a filosofia implica uma espécie de experimentação
tateante ou que o não-filosófico está cada vez mais no coração da filosofia que a própria filosofia
(p. 51, 52), devemos repensar o alcance da filosofia que se endereça aos não-filósofos. A que ela
pode levar ao ser consumida? A um lugar de mercadoria, como coitado na epígrafe deste artigo, ou
15 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 de meteorito? Nas palavras de Deleuze& Guatarri, “quanto mais a filosofia tropeça em rivais
imprudentes e simplórios, mais ela os encontra em seu próprio seio, pois ela se sente preparada
para realizar a tarefa, criar conceitos, que são antes meteoritos que mercadorias” (p. 17). Como e
quando essa tarefa se realiza?
A fim de responder a essa pergunta se mostra fundamental um estudo mais acurado sobre a
recepção deste mercado de filosofia, afim de entendermos mais profundamente as dimensões de
choque e violência, bem como as dimensões de solução e autoajuda que esta filosofia high-pop
pode causar aos receptores deste novo e crescente mercado. Essa pesquisa pode significar um
importante debate sobre o papel e implicações do mercado de filosofia high-pop. mercado este que,
em tempos de iPhone e iTaste10, poderia ser chamado de iFilosofia e constitui novas formas de
subjetividade e modos de conhecer.
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Referências
BOTTON, A. As consolações da filosofia. Rio de Janeiro: Rocco, 2001.
COLLINS, J. High-Pop: making culture into popular entertainment. Kindle Edition. Oxford: Blackwell,
2003.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI. Felix. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.
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Nova linha de produtos da marca de cigarros Free.
Foto própria, ilustração de Caco Galhardo. Folha de São Paulo, Ilustríssima, 26 de agosto de 2012.
16 PPGCOM ESPM – ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – SÃO PAULO – 15 E 16 OUTUBRO DE 2012 DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. Tradução: Luiz Orlandi, Roberto Machado. Rio de Janeiro: Graal,
1988.
GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. São Paulo: Companhia das Letras,
1995.
ZOURABICHVILI, François. Vocabulário de Deleuze. Digitalização e disponibilização da versão
eletrônica: Centro Interdisciplinar de Estudo em Novas Tecnologias da Informação IFCH / Unicamp,
Tradução André Telles, Rio de Janeiro, 2004.
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