Artigo Completo

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ANÍSIO TEIXEIRA E OS TESTES PSICOLÓGICOS
Karen Fernanda da Silva Bortoloti
Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP
[email protected]
Palavras-chave: Educação Brasileira; Escola Nova; Psicologia
Eixo Temático: Impressos, Intelectuais e História da Educação
Introdução
O movimento de renovação educacional denominado Escola Nova foi composto
por elaborações discursivas e proposições práticas muito diversas. No escolanovismo
brasileiro, difundiram-se muitas concepções relativas ao uso da Psicologia como ciência
fundamental na educação escolar. A historiografia registra como hegemônica a
tendência de considerar as técnicas e os conceitos psicológicos como meios para obter a
sujeição dos indivíduos à ordem social, sendo os testes instrumentos privilegiados para
o cumprimento dessa meta.
O presente estudo decorre de pesquisa em andamento cujo objetivo é discutir
essa caracterização por meio da análise do discurso de Anísio Teixeira, cujos
posicionamentos filosóficos e educacionais enfatizavam a necessidade de equilibrar o
respeito ao indivíduo, preservando as particularidades psicológicas e as aptidões
naturais de cada aluno, com os requisitos de uma ordem social democrática a ser
instituída. Examinando a obra de Teixeira, é possível notar três momentos
determinantes de suas concepções psicológicas. O primeiro data de seu contato, no final
da década de 1920, com as ideias John Dewey, William H. Kilpatrick e outros
pensadores pragmatistas, defensores de uma Psicologia empírica, não introspeccionista,
como se encontra, por exemplo, no livro The human nature and conduct de Dewey.
Esse contato foi propiciado por sua visita aos Estados Unidos e aos estudos que realizou
na Columbia University. O segundo momento foi marcado pela convivência de Teixeira
com um dos responsáveis pela difusão da Psicanálise no Brasil, o médico Arthur
Ramos, que dirigiu a seção de Ortofrenia e Higiene Mental do Instituto de Pesquisas
Educacionais durante a reforma da instrução pública comanda por Anísio no Distrito
Federal entre 1931 e 1935. O terceiro momento foi constituído pelas relações de Anísio
Teixeira com Lourenço Filho e Isaías Alves, ambos defensores da aplicação de testes
psicológicos na educação.
Neste trabalho será focalizado especificamente esse último tema, buscando
compreender os posicionamentos de Teixeira acerca do movimento dos testes, tanto em
âmbito nacional quanto internacional. Para isso, serão apresentados os posicionamentos
do autor expressos em textos produzidos entre a sua volta dos Estados Unidos e o
término de sua gestão no Distrito Federal. São eles: “Manuscrito sobre a escola, o
conhecimento e a aprendizagem” de 1929; Aspectos americanos de educação de 1930;
“Quociente de inteligência de alunos” de 1930; “O problema da assistência à infância e
à criança pré-escolar” de 1933; “Texto sobre a educação infantil” de 1936. Além disso,
serão considerados também os comentários do autor aos livros Introdução ao estudo da
Escola Nova de Lourenço Filho e Os testes e a reorganização escolar de Isaías Alves,
publicados em 1930.
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A Psicologia no Brasil
Desde o final do Segundo Império e início do período republicano, o debate
sobre a transformação do país foi uma constante entre os intelectuais brasileiros, o que
se pode observar na atuação dos positivistas, nas reformas realizadas por Benjamin
Constant, no “entusiasmo pela educação” e no “otimismo pedagógico”. Buscava-se
elaborar uma resposta para os obstáculos políticos, sociais e culturais da sociedade
brasileira a partir de projetos político-educativos que traziam em seu bojo concepções
acerca do povo brasileiro; desejava-se instaurar a modernidade, isto é, a “civilidade, a
racionalidade, a urbanidade, a disciplina de uma sociedade capitalista” (NUNES, 2000,
p. 11).
Quando o início da república brasileira trouxe crises econômicas permeadas por
inflação, desemprego, superprodução de café, expansão desordenada dos centros
urbanos, aumento da pobreza em decorrência do abandono em que passou a viver
grande parte dos escravos recém-libertos e a ausência de um sistema educacional
abrangente, alguns membros da intelectualidade brasileira do período perceberam a
necessidade de transformação da sociedade e o rompimento com a grande influência das
ideias positivistas que predominavam no pensamento educacional e na organização
escolar. Os educadores passaram a ocupar um lugar diferente diante da possibilidade de
legitimar sua esfera de atuação a partir da valorização da escola; mesmo sendo
partidários de diferentes correntes político-ideológicas, começaram partilhar a crença de
que seria possível transformar a sociedade pela reforma do ensino, desenvolveram a
auto-atribuição de liderança moral da sociedade, expressando os anseios, as intenções,
as propostas e as intervenções sociais que vinham ocorrendo isoladamente (XAVIER,
1999, p.26).
A escola brasileira, especialmente a partir da segunda década do século XX,
anunciava problemas urbanos, como habitação, saneamento e trabalho, além de
questões étnicas e higiênicas. As escolas, antes isoladas, agora atendiam aos interesses
dos governos municiais e estaduais, pois a escola contribuiria para a construção do
espaço de formação do espírito moderno (NUNES, 2007, p.374). Deste modo, a nova
sociedade que então se arquitetava exigia a elaboração de um novo espaço escolar e de
materiais pertinentes aos novos objetivos educacionais, demandando uma modificação
da linguagem escolar e a ampliação dos espaços de aprendizagem.
Os ditos “males nacionais” que, segundo o pensamento vigente, impediam a
modernização do país, eram metaforicamente apresentados na figura de um povo
doente, cuja cura cabia não apenas à higienização, a cargo da medicina, mas também à
educação. A ignorância do povo era realçada pelos índices de analfabetismo e pelas
endemias, que constituíam os símbolos da resistência da sociedade frente à
modernização. Um bom exemplo da “doença” que impregnava o homem brasileiro pode
ser observado na caracterização do sertanejo apresentada por Euclydes da Cunha, em
1902, em Os sertões, em que o homem rude e carente de civilização era dado como
responsável pelo atraso da nação, a qual, inevitavelmente, deveria modernizar-se para
ser preservada como tali (CARVALHO, 2000).
A figura do Jeca Tatu, criada pelo escritor paulista Monteiro Lobato, também
caracteriza essa “doença” que dificultava o avanço nacional. O homem simples e
“ignorante” era incompatível com a sociedade moderna que se pretendia para o Brasil e,
para tanto, deveria ser “curado”. Gilberto Freyre, no prefácio da primeira edição de
Casa-grande e senzala (1933), também alerta para a “enfermidade” na qual estava
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mergulhado o país e, conseqüentemente, o povo, cuja cura não estaria no
“branqueamento” do país, como afirmavam os eugenistasii.
Alguns grupos, ligados ao movimento higienista acreditavam que a “limpeza” do
país, a partir das camadas menos abastadas, seria o mais significativo para a ansiada
modernização nacional. Os preconceitos do período, agravados pela abolição, fizeramse latentes na atuação higienista que pregava a ação das escolas na difusão de novos
hábitos higiênicos e controle da saúde pública, vacinação em massa e transformação do
espaço familiar. A higiene e a educação, mutuamente solidárias, seriam, para os
partidários dessas ideias, a verdadeira fonte da civilização e do bem estar.
De forma pouco diversa, os adeptos das teses eugênicas de “branqueamento” e
de “sobrevivência do mais forte”, pregavam que as denominadas “raças inferiores”,
como eram pejorativamente chamados os negros e mestiços, não sobreviveriam às
dificuldades impostas pela pobreza e assim, consequentemente, seria promovida a
“limpeza” necessária ao desenvolvimento, à modernização e ao revigoramento da raça
do país.
As teses eugênicas e higienistas previam, assim, a profilaxia da “raça” com a
propaganda do branqueamento e limpeza da população a partir do controle da
miscigenação, com a obrigatoriedade de exames pré-nupciais e da esterilização dos
indivíduos portadores de males hereditários, que poderiam contribuir para o “atraso” do
país, além da imposição de maus hábitos de higiene (MARQUES, 2002). Tratava-se de
dar uma boa forma a um país até então amorfo, modificar substancialmente o povo,
viabilizar a construção de uma verdadeira nação. E qual a melhor forma de alcançar tais
objetivos?
O grupo formado por médicos e educadores acreditava que a escola deveria
fundir práticas educativas e médicas para a formação de homens inteligentes e sadios
(GONDRA, 2002, p. 315). O homem brasileiro bronco e doente poderia ser recuperado,
se retirado do abandono em que se encontrava e “curado” das doenças que o
paralisavam. A educação, apoiada na Medicina e na nascente Psicologia que então
chegava ao país, poderia auxiliar na formação e colocação desses trabalhadores, de
maneira a que pudessem efetivamente contribuir para o progresso nacional,
representado pela modernização da sociedade brasileira, incutindo-lhes hábitos de
trabalho adequados às necessidades do país.
A ânsia modernizadora influenciou diretamente o pensamento e a ação dos
intelectuais e educadores brasileiros que concebiam, mesmo com algumas disparidades,
a transformação da educação nacional como importante instrumento para a construção
de uma nova coletividade. Associada ao desejo de modernização social, forjou-se no
país a idéia de que a introdução de hábitos mais corretos e saudáveis, condizentes com
uma sociedade “civilizada”, era de extrema importância para a modificação almejada.
O campo aberto pela nova noção de infância, traçada mundialmente, bem como
pelo movimento médico higienista dentro das escolas, favoreceu, já nas primeiras
décadas do século XX, a institucionalização da Psicologia no Brasil. A grande
contribuição para a autonomia da Psicologia como ciência veio justamente da educação,
campo em que encontrou seus principais divulgadores (ANTUNES, 2005; NUNES,
1998). A nova ciência fortaleceu-se a partir das escolas normais, primeiro como uma
seção específica de outras disciplinas e, posteriormente, como disciplina autônoma.
Com o progresso das escolas normais, firmou-se a ligação entre pedagogia e estudos
psicológicos; autores como H. Spencer, que colocava o desenvolvimento infantil no
cerne da evolução da espécie, e P. Compayré, que enfatizava a cientificidade da
Psicologia, passaram a integrar os manuais de pedagogia (MASSIMI, 1990).
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Educadores e médicos foram decisivos para a penetração da disciplina no pensamento
brasileiro de então, cuja meta era eliminar o discurso metafísico em prol de uma
abordagem científica (CUNHA, 1995).
Contudo, foi a sistematização proposta pelo movimento denominado Escola
Nova que forneceu as bases sobre as quais a Psicologia obteve seu maior
desenvolvimento (ANTUNES, 2005). A partir da penetração do ideário reformador da
educação, nos anos 1920, evidenciou-se uma tendência que conduziu muitos de seus
partidários a se ocuparem com “os resultados observáveis do processo de ensino, o que
se materializou no grande incentivo à utilização de técnicas de medida e controle do
trabalho docente e do rendimento escolar” (CUNHA, 1995, p. 81). A Psicologia
contribuiu para “libertar a tarefa educativa de uma concepção que a ligava a atributos
subjetivos”, afastando a intuição do âmbito da prática educativa e atribuindo
características científicas à educação (CUNHA, 1994, p. 65).
O grupo que ficou genericamente conhecido como escolanovista almejava levar
para dentro das escolas as descobertas da Psicologia, especialmente no que diz respeito
ao desenvolvimento infantil. A Psicologia forneceu os meios para que a escola
investigasse as características infantis e almejasse realizar plenamente os atributos de
cada indivíduo (CUNHA, 1994, p. 69). A nova ciência responderia, então, por diversas
contribuições para a renovação das escolas brasileiras, como a descrição das variações
psicológicas e a organização de classes segundo as capacidades das crianças para a
aprendizagem, com base em seu nível mental, contribuindo para a elaboração de
métodos de ensino adequados aos processos de desenvolvimento intelectual infantil.
Amparado nas orientações fornecidas pela Psicologia, o mestre devia conceber
os alunos como indivíduos dotados de personalidade, conceito definido em relação às
condições sociais, culturais e políticas (CUNHA, 1995, p. 63). Ganhando relevância no
interior das salas de aula, a Psicologia passou a compor o currículo dos cursos de
formação de professores a partir dos anos 1930, o que constituiu uma vitória do grupo
dos renovadores da educação.
Os testes psicológicos adquiriram destaque no movimento escolanovista, o que
se evidencia pelo fato de que os principais responsáveis pela introdução da psicometria
no país, bem como por sua aplicação, aprimoramento e divulgação, estavam, de alguma
forma, ligados ao grupo dos renovadores. Para esses educadores partidários da
psicometria, a escola deveria despertar o interesse dos alunos por meio da experiência,
fazendo com que os alunos aprendessem aquilo que lhes interessasse, respeitando
sempre os estágios diferentes na configuração dos interesses infantis. O mestre, por sua
vez, deveria conhecer esses estágios para intervir propondo atividades adequadas às
condições naturais de cada criança. Para obter o conhecimento individual da criança e,
assim, alcançar o sucesso do processo de ensino e aprendizagem, os testes psicológicos
cumpriam papel decisivo, pois apresentavam dados precisos sobre a criança, permitindo
enquadrar os alunos como deficientes físicos, mentais, emocionais, viabilizando a
classificação em “normais” e “anormais”, o estabelecimento de graus de maturidade
para a aprendizagem e a identificação dos desvios ou distúrbios de caráter: rebeldes,
violentos, ladrões, mentirosos, anti-sociais. (CARVALHO, 1989, p. 6; NUNES, 2000,
p. 352)
A psicometria ganhou destaque no Brasil com a criação do Laboratório de
Psicologia Experimental do Pedagogium, órgão criado em 1890 que objetivava nortear
as reformas educacionais exigidas pela república, e com a instalação, na Escola Normal
de São Paulo, do Gabinete de Psicologia e Antropologia pedagógica (VEIGA, 2007,
p.274), cujo objetivo era produzir informações acerca das características individuais das
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crianças para que o trabalho dos educadores fosse feito de forma menos subjetiva. O
laboratório criado em 1914, na gestão de Oscar Thompson, foi dirigido pelo psicólogo
italiano Ugo Pizzoli, que valorizou a psicologia experimental, vinculada essencialmente
à medida das funções psicológicas, e divulgou as teorias psicológicas em voga na
Europa e nos Estado Unidos (ANTUNES, 2005, p. 78-79). A psicometria passava,
assim, a constituir um dos pilares científicos da transformação educacional do país.
Dando continuidade à expansão dos testes aplicados à educação com o objetivo
de diagnosticar os problemas que dificultavam a aprendizagem e a permanência dos
alunos nas escolas, Ulysses Pernambucano fundou em 1925 o Instituto de Psicologia de
Pernambuco, onde realizou testes psicológicos de nível mental, aptidão, e preparou
pesquisadores que o auxiliaram na padronização de tais instrumentos para a realidade
brasileira (ANTUNES, 2005, p. 71).
A Escola de Aperfeiçoamento Pedagógico de Belo Horizonte, criada após a
reforma do ensino de Minas Gerais concretizada por Francisco Campos, foi igualmente
capital para a difusão da psicometria no país, especialmente depois que Helena
Antipoff, que fora assistente de Claparède, criou ali um laboratório de psicologia com o
intuito de subsidiar a educação de Minas Gerais. Na cidade de Belo Horizonte, a
psicometria foi amplamente utilizada para a coleta de dados sobre os alunos das escolas
públicas, dados que não se restringiram apenas às características individuais, mas
estenderam-se às condições de vida dos sujeitos, permitindo uma visão mais
totalizadora das funções psicológicas estudadas. “É possível até dizer que Antipoff
avançou a partir do ponto em que Pernambucano parou, dando continuidade a suas
preocupações” (ANTUNES, 2005, p.75).
Outro pesquisador fundamental para a difusão da psicometria no Brasil foi o
baiano Isaías Alves que, após especializar-se em testes na Universidade de Columbia,
aplicou, revisou e adaptou testes psicológicos e pedagógicos. Parceiro nas primeiras
experiências de Lourenço Filho, Alves foi responsável, quando ocupava cargos de
direção na educação baiana, pela instalação do Instituto Normal, que contribuiu para a
expansão da denominada psicologia científica.
Da mesma forma que a escola normal de Salvador contou com a colaboração de
Isaías Alves, a Escola Normal do Rio de Janeiro teve em Manuel Bonfim um dos
principais responsáveis pela pesquisa educacional amparada na psicometria e na
compreensão de determinados fenômenos sociais, auxiliando os professores a
atenderem as necessidades dos alunos, ao analisarem os aspectos psíquicos — que se
refletiriam tanto nas idéias quanto nas atitudes humanas — e seus sentimentos
(GONTIJO, 2003, p. 131).
Foi nesse contexto que Lourenço Filho, um dos mais destacados elos entre o
movimento renovador e a Psicologia, voltou sua atenção para a educação popular e a
alfabetização, que deveria ocorrer no momento em que o aluno alcançasse determinado
nível de maturidade. Surgem, assim, na obra do educador, as noções de diferenças
individuais, graus de maturidade, ou seja, a ideia de diferentes velocidades de
aprendizado, que deveriam ser detectadas e trabalhadas adequadamente.
Lourenço Filho tornou-se um dos mais destacados representantes do movimento
dos testes, ao promover a sua aplicação na escola modelo anexa à Escola Normal de
Piracicaba, no estado de São Paulo; posteriormente os testes foram aplicados em escolas
da capital paulista e, em 1928, chegaram às escolas cariocas. Os testes elaborados por
Lourenço Filho aferiam a maturidade para a leitura e a escrita, aplicados em alunos dos
anos iniciais da escola básica, e forneciam o retrato inicial de cada grupo de alunos e
das unidades escolares. Além de medir a maturidade dos alunos, os Testes ABC
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permitiam a organização das classes escolares, o que facilitaria a motivação da
aprendizagem e solucionaria, segundo o autor, o novo problema surgido com o
crescimento do número de alunos matriculados na escola básica.
Lourenço Filho parece ter uma abordagem individualista, cujo indivíduo deve
enquadrar-se em um determinado padrão. Assim, de acordo com padrões
cuidadosamente determinados, os testes, seriam, portanto, um instrumento de apreensão
do que não se enquadrava nessa padronização, nessa “normalidade”. A aptidão e a
capacidade determinariam a que tipo de escola e turma o estudante deveria ser
encaminhado.
Como resultado de sua crença no valor das informações fornecidas pelos testes
para o aprimoramento da educação, Lourenço Filho publicou, em 1932, a obra Testes
ABC para a verificação da maturidade necessária à aprendizagem da leitura e da
escrita; livro passou a nortear a aplicação dos testes no Brasil e também em países da
América Latina.
Entre o final dos anos 1920 e início dos anos 1930 os testes passaram a integrar
a cultura escolar brasileira, especialmente para promover a homogeneização dos alunos,
cujo número de matrículas crescia significativamente, exigindo dos intelectuais e
educadores novas formas de garantir o sucesso de todos (NUNES, 2000).
Anísio Teixeira e os Testes Psicológicos
Como assinala Cunha (2006), a obra e a atuação de Anísio Teixeira devem ser
compreendidas perante o momento em que foram compostas, pois os posicionamentos
do educador trazem as marcas das polêmicas em que esteve envolvido e das respostas
dadas por ele aos desafios de sua época. Portanto, ao adotar e militar a favor da
estatística e da Psicologia aplicada, Teixeira traz uma resposta à necessidade de
elaboração científica de um diagnóstico escolar preciso (PAGNI, 2008, p.32),
especialmente porque nesse período, era forte o empenho do Ministro da Educação e
Saúde em adotar um único sistema de categorização do universo escolar “as estatísticas
registraram as suas deficiências, tanto em termos qualitativos como quantitativos,
reforçando a ideia de necessidade da emergência dos poderes públicos na sua
organização” (NUNES, 2000, p.352)
Não foi durante a gestão da educação carioca que Teixeira estreitou o contato
com a psicologia experimental, ao contrário do que foi divulgado pela historiografia da
educação (NUNES, 2000, p. 257), provavelmente em virtude da carência de pesquisas
documentais mais detalhadas. Anísio Teixeira aproximou-se da psicologia e de sua
vertente experimental, como veremos, por ser um dos modos de garantir a aplicação da
ciência à educação ampliando, dessa forma, suas possibilidades de sucesso. Teixeira não
direcionou seu pensamento e sua ação apenas para os domínios coletivos, mas também
para as esferas individuais da vida humana, respeitando a personalidade de cada um,
sem sua descaracterização diante da totalidade social.
Desde sua primeira viagem aos Estados Unidos da América no final dos anos
1920, momento em que já se encontrava impregnado pelas ponderações acerca da
educação e quando tomara contato com a obra de Kilpatrick e, especialmente, John
Dewey, Anísio Teixeira aproximou-se da psicologia, da mesma forma como o fez da
sociologia e da filosofia, como fundamental para as transformações educacionais que
ambicionava para a estruturação de uma sociedade democrática.
Ao deparar-se com a educação que então era oferecida nos Estados Unidos,
Teixeira maravilhou-se com os caminhos que conduziam à civilização moderna, que
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seus contemporâneos cobiçavam para o Brasil. Percebeu, nesse momento, que o espaço
da criança nessa escola era outro, diverso do que reservava a escola tradicional, à qual,
já nesse período, fazia ferrenha oposição, bastando lembrar da reforma educacional que
havia liderado na Bahia, quando à frente da cadeira de ensino desse estado.
Entregue a si, a criança poderia participar de um desses grupos e a sua
incompreensão dos demais facilitaria possíveis conflitos sociais. A
escola deve prover a um meio em que a experiência infantil se realize
no circulo mais amplo possível, a fim de cooperar para um
progressivo equilíbrio e harmonia sociais. [...] Educar é, assim, uma
função social que controla, guia e dirige a atividade infantil. Mas,
sendo uma função perfeitamente vital e natural, ela se deve exercer em
perfeita concordância com as tendências das crianças às que apenas
oferece as adequadas condições de desenvolvimento e crescimento
(TEIXEIRA, 2006, p.34)
Após retornar de sua viagem aos Estados Unidos, Anísio Teixeira fez questão de
registrar suas impressões sobre a “civilização” norte-americana na obra Aspectos
Americanos de Educação, publicada em 1930. No livro, o educador traz a exaltação da
Psicologia como ciência capaz de auxiliar a transformação necessária para a real
democratização da educação, uma vez que seria capaz de determinar as capacidades
individuais e, assim, fazer com que cada indivíduo recebesse a educação que melhor
aprimorasse tais capacidades. Educar, portanto, seria “dirigir o educando com o seu
pleno assentimento e a sua plena participação mental, para o exercício adequado de suas
próprias tendências e atividades” (TEIXEIRA, 2006, p. 36)
Anísio Teixeira esclarece na obra que nos Estados Unidos, desde o início do
século XX, houve um extenso movimento de reforma educacional que, apesar de as
duas primeiras décadas terem sido de experiências subjetivas em virtude da ausência de
métodos objetivos de investigação, os pesquisadores aos poucos adentraram as escolas
e, a partir disso, tudo foi avaliado, balizado, medido através de processos técnicos
(TEIXEIRA, 2006).
Aquele, portanto, seria o momento propício para que o mesmo ocorresse no
Brasil, pois o país começava uma etapa de profundas transformações econômicas,
favorável à fermentação das ideias que irradiavam dos principais centros europeus e,
especialmente, dos Estados Unidos; era o momento de eliminar o divórcio existente
entre as atividades escolares e a realidade e suas exigências, que fazia com que
predominasse uma mentalidade formal e subjetiva (TEIXEIRA, 2006). Assim, o jovem
educador baiano deixava para traz seu lado latinista, humanista, defensor do dualismo
aristocratizante, e passava a preconizar a escola primária como pedra fundamental de
toda a educação, num verdadeiro espírito democrático. “É a semente que irá frutificar
em contato com a teoria de Dewey e com a educação norte-americana” (GERIBELLO,
1977, p.49).
E, assim, apresenta a importância da Psicologia experimental, que então
conhecera, para a educação:
Aquele poder com que a educação nos enriquece não é um simples
resultado do nosso desenvolvimento adequado, mas o direto e
consciente fim de toda instrução. Educação é aí constantemente
identificada com o treino do ginasta para adquirir certa e determinada
habilidade. Treinavam-se então as faculdades mentais como se treina
um músculo. Tais faculdades mentais, supostamente originais, são,
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porém, um mito. O que existe é um sem-número de tendências
originais, de modos instintivos de ação baseados em ligações originais
de neurônios do sistema nervoso central. É essa uma conquista
definitiva da psicologia experimental (TEIXEIRA, 2006, p. 43)
Nessa obra, Anísio Teixeira ainda corrobora a ideia de que a cultura da
personalidade e a libertação das capacidades individuais proporcionada pela Psicologia
romperia, como o fizera nos Estados Unidos, as barreiras econômicas ou nacionais,
permitindo a participação mais livre e enriquecedora dos indivíduos nos movimentos
sociais que modificam a sociedade, ou seja, que promoviam a expansão da democracia,
ao oferecer oportunidades para o desenvolvimento das capacidades distintivas e exigir
de todos uma função social (TEIXEIRA, 2006, p. 51; TEIXEIRA, 1924/1936)
Porém, para que a liberação das capacidades individuais fosse satisfatória,
deveria ocorrer a aliança da psicologia experimental com os programas escolares. Na
escola renovada, o programa, a partir das contribuições da psicologia, deveria valorizar
a criança com suas habilidades, necessidades e interesses de uma personalidade em
desenvolvimento. O espírito de inquérito que deveria animar os educadores permitiria o
planejamento racional da ação e a avaliação do trabalho realizado. Os resultados desses
inquéritos congregados aos conhecimentos da infância, proporcionados pela psicologia,
serviriam de base para um programa educacional progressivo, que oferecesse meios
para o enriquecimento da experiência do aluno. Os inquéritos escolares auxiliariam,
portanto, na “reconstrução cientifica do currículo” (TEIXEIRA, 2006, p.77)
Surgiu então todo o movimento de medição na escola, com os testes
em aritmética, soletração, linguagem e álgebra etc., com os estudos
comparativos dos programas de estudo e dos livros escolares, com a
determinação do valor social das habilidades e dos conhecimentos
escolares pelo estudo e classificação das atividades humanas e, mais
tarde, com a cuidadosa determinação das diretrizes do
desenvolvimento da sociedade, das principais instituições e dos
problemas da vida contemporânea, dos critérios de apreciação etc.
(TEIXEIRA, 2006, p.77)
O currículo, assim, deveria ser organizado a partir da análise dos alunos, o que
ocorreria a partir dos dados oferecidos pelos testes que verificariam as habilidades,
necessidades e interesses (TEIXEIRA, 1924/1929). A escola, para uma efetiva
reorganização, procuraria
Investigar os materiais necessários, isto é, as habilidades, os fatos, os
problemas, as instituições, as generalizações e os conceitos precisos
para a compreensão da vida contemporânea; estuda a distribuição
desse material pelos graus escolares; as principais dificuldades do
aprender, apuradas objetivamente, por meio das percentagens de erros
etc; e faz uma análise (job-analyses) das vocações e profissões
(TEIXEIRA, 2006, p.78)
Para atender, então, à demanda imposta pela exigência de uma formação
científica e social das futuras gerações, Anísio Teixeira acreditava, como os demais
partidários do movimento renovador, que a formação de professores seria crucial. Os
futuros mestres deveriam ser capazes de compreender a cultura e a civilização da qual
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faziam parte, refletindo sempre acerca de seus problemas. Somente dessa forma os
professores teriam condições de acompanhar a “evolução humana”, pois os mestres
deveriam ser preparados para observar, questionar, apurar, descrever, contabilizar,
classificar, enfim, controlar e hierarquizar. Para que tais objetivos fossem
satisfatoriamente alcançados, durante sua gestão no Distrito Federal ele fez questão de
levar o espírito de inquérito para a principal instituição responsável pela formação do
professorado.
Corroborando os posicionamentos de Lourenço Filho, que assumia a direção do
Instituto de Educação no momento em que ele estava na direção da Instrução Pública,
entre 1931 e 1935, Teixeira direcionou a formação docente para o “exercício disciplinar
do olhar”, para que os futuros professores aprendessem a olhar para analisar
meticulosamente os alunos e aprimorar sua atuação docente (VIDAL, 1996, p. 239).
Os gestores do sistema educacional procuravam dar à educação um estatuto
cientifico, e uma das maneiras encontradas para viabilizar tal empreitada foi “treinar” os
futuros professores para analisar os diversos aspectos do processo educacional dos
alunos da escola anexa ao Instituto, a escola Laboratório, almejada por Anísio Teixeira
desde seu retorno dos Estados Unidos no final dos anos 1920, onde observou os
resultados da adoção dessa prática na formação de professores.
Além de preparar os acadêmicos para essa nova prática docente na escola
laboratório, havia a prática, realizada de maneira meticulosa e até mesmo ofensiva ao
olhar anacrônico, no intuito de classificar os candidatos ao Instituto, com o objetivo de
melhorar o processo de ensino e aprendizagem e, consequentemente, o produto final,
qual seja, os professores que ocupariam as cadeiras nas escolas primárias, que então se
multiplicavam, não apenas no Distrito Federal.
Para adentrarem ao Instituto, as candidatas deveriam ser aprovadas nos testes de
idade mental adulta e se “não fosse portadoras de moléstias transmissíveis ou defeito
físico incompatível com o exercício do magistério” (VIDAL, 2001, p.105). Anísio
Teixeira, ao contrário do que se pode pensar, apoiava esse tipo de seleção para a Escola
Normal, pois essa escola não seria para qualquer pessoa, mas sim, como destacou
Teixeira, para “a fina flor da população” ( TEIXEIRA, 1935, p. 166).
Foi partir da gestão de Anísio Teixeira que pesquisar, investigar e elaborar
detalhados inquéritos com o objetivo de melhor colocar as crianças dentro da escola
passou a ser um dos fins da Escola Normal. Para o educador baiano, a formação de
professores deveria equilibrar teoria e prática, ocorrendo nos laboratórios para
demonstração das formas de ensino com experimentação de novos métodos e ensino e
na prática de ensino com as classes de aplicação das chamadas escolas laboratórios
(VIDAL, 1996). A ausência de instituições comprometidas com a formação de
professores prejudicava o aproveitamento, por parte dos docentes, a compreensão de
certos aspectos da escola nova. Foi somente com a parceria com Lourenço Filho e a
escola experimental, para ensino e aplicação, que as técnicas propostas pela renovação
educacional foram corretamente ensinadas e buscou-se desfazer os equívocos gerados
até então (TEIXEIRA, 1920/1930).
No Instituto, prevaleceu o caráter experimental do ensino, tamanha a
preocupação com a escola laboratório, as técnicas de aprendizagem e a inquietação em
verificar minuciosamente se eram seguros os princípios do ensino ativo. A partir das
informações colhidas diariamente pelas professorandas, buscavam-se dados sobre o
desenvolvimento mental das crianças que frequentavam a escola laboratório e novos
métodos para atender as necessidades dos que, por ventura, apresentavam algum
“atraso” no desenvolvimento esperado.
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Durante esse período, então, Anísio Teixeira lançou mão da estatística aliada à
Psicologia experimental com o objetivo de unificar a rede de ensino carioca e aferir o
trabalho realizado nas escolas por meio de duas seções, a Divisão de Obrigatoriedade
Escolar e Estatística e a Seção de Medidas de Eficiência Escolar (NUNES, 2000,
p.355). Nesse momento, os testes ganharam mais espaço na atuação do educador, tendo
como principal alvo a identificação e superação das dificuldades de aprendizagem
presentes nas escolas (TEIXEIRA, 1933).
Para corrigir tais erros precisamos de alguma coisa que nos habilite a
interpretar e avaliar os elementos dos sucessos e quedas da criança,
das suas exibições de força e fraqueza, à luz do amplo processo de
crescimento, de que fazem parte (TEIXEIRA,1924/1936)
A partir de 1934, os testes ABC, amplamente divulgados por Lourenço Filho,
passaram a ser aplicados para a organização das salas de leitura e escrita (VIDAL, 1996,
p. 250). Além dos testes, que classificavam as salas em turmas fortes ou fracas, as
crianças recebiam acompanhamento médico e assistência alimentar, com o intuito de
melhorar o rendimento escolar, ou seja, fazer com que todos atingissem os objetivos de
aprendizagem esperados. O desenvolvimento importa em um processo definido, com
leis próprias que só podem ser cumpridas quando forem providas as condições normais
e adequadas(TEIXEIRA,1924/1936).
Nesse período, Anísio Teixeira, visando solucionar os problemas da
heterogeneidade, da diferença e da irregularidade ocasionados pela presença dos alunos
das camadas menos abastadas, adotou também a aplicação dos testes de QI, como uma
forma de aprimorar o rendimento escolar dos alunos a partir de suas reais condições, ou
seja, respeitando as características individuais (TEIXEIRA, 1918/1930).
Como nos achamos estudando os testes aplicados a alunos de primeiro
ano para homogeneização de classes, o fato de haver tantas crianças
de mais de 7 anos, idade correspondente ao 1º ano, deve merecer
especial atenção. [...] Em 7632 alunos, apenas 2715, ou seja, 35% se
acham no ano escolar a que pertence, legalmente, o que significa
estarem 65% dos meninos de 34 escolas, retardados em estudos. [...]
podendo-se supor haver sempre um retardamento de 1 ano para 1365
alunos, 2 anos para 805 alunos e assim por diante (TEIXEIRA,
1918/1930)
Assim, elaborou um projeto que, aliando os resultados dos testes de QI, os
critérios de medida do aproveitamento escolar e a idade cronológica, aspirava
reclassificar os alunos de acordo com as suas capacidades e, simultaneamente, propor
novos programas de estudo de acordo com as características de cada grupo.
Há uma incrível heterogeneidade de alunos nas classes, não só no que
diz respeito à capacidade intelectual ou seja idade mental, mas
também no que se refere ao treino da vida ambiente ou seja idade
cronológica. Isso é a negação do sistema de graduação escolar,
situação que predominava em 1920 nos Estados Unidos. (TEIXEIRA
1918/1930)
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A classificação e a promoção dos alunos em grupos homogêneos, o
tratamento individual do aluno, a organização dos graus escolares de
conformidade com a qualidade das classes, tudo isso abre novas
perspectivas para uma escola eficiente e justa (TEIXEIRA, 1930, p.
IX).
Os resultados que seriam oferecidos pelos testes garantiriam o real
desenvolvimento da educação, por proporcionarem a colocação dos indivíduos em
locais que pudessem atender as suas especificidades, contribuindo para seu real
crescimento.
E a medida consiste em defini-las com tal precisão, que possamos usar
e anotar essas modificações com segurança, para a nossa orientação e
progresso [...]. Notemos, de logo, que a ciência não quer senão tornar
mãos exatas medições que estamos continuamente a fazer, em nossa
linguagem e vida ordinária. [...] E em educação continuaríamos no
regime da adivinhação e da opinião individual se não tivéssemos
instrumentos para medir a capacidade intelectual e o progresso
educativo ou escolar do indivíduo (TEIXEIRA, 1930, p. III-V).
Nas palavras de Anísio Teixeira, a utilização dos testes impediria o desperdício e
evitaria desastres na educação, uma vez que permitiria medir as capacidades e
incapacidades dos alunos, as aptidões e inaptidões, enfim, permitiria uma direção mais
racional dos estudos e orientação geral e precisa dos estudantes. “Pelos testes é, no fim
de contas, a ciência que entra na escola. Mesmo alguns objetivos da educação podem
ser, por eles, senão determinados pelo menos precisados, marcados e medidos”
(TEIXEIRA, 1930, p. IX-XI).
Embora a sua administração possa ser considerada uma vitrine de erros e acertos
no movimento de reforma educacional no Brasil (PAGNI, 2008, p.32), Anísio Teixeira
soube precisar os limites da estatística e da psicologia, não fez dos instrumentos por elas
oferecidos a única forma de nortear a sua atuação na busca por uma escola
verdadeiramente democrática. Anísio Teixeira não desejava que o recurso à psicometria
conduzisse à perda de autonomia didática e à classificação preconceituosa dos alunos, o
que pode ser exemplificado pelo abandono dos testes de QI quando os mesmos,
segundo a sua opinião, ofereceram resultados imprecisos e perigosos (NUNES, 2000, p.
357).
1) O primeiro dos perigos está em usar a escalas de idade ou de grau
escolar, como o ideal a atingir. Isso importa em ignorar o que são
essas “escalas” ou “normas”. Elas são normas, somente no sentido
estatístico. [...] 2) O segundo perigo está em usar o material dos testes
como modelo ou método para o ensino, resultado daí, a “mortal
uniformidade” de que se queixam os opositores aos testes. [...] Os
testes são instrumentos de diagnostico, de exame; 3) Mais real e mais
grave perigo, do que os dois a que já nos referimos, na aplicação dos
testes, é o de limitar a educação aos resultados imediatamente
tangíveis e concretos (TEIXEIRA, 1930, p. XII-XIII).
O educador baiano sempre buscou uma linha de equilíbrio entre os resultados
obtidos pelas diversas formas de aferição e a construção de categorias de ordenação, que
deveriam sempre mobilizar, mesmo diante de todas as diferenças, as capacidades e
habilidades dos sujeitos.
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Corolário desse perigo, é o que apontam os que dizem que os testes
vão dar à escola uma organização mecânica, que a habilitará a
manufaturar, como uma fabrica, produtos eficientes mas vazios de
cultura, entendida essa como o cultivo mais delicado e mais sutil da
inteligência e do coração (TEIXEIRA, 1930, p. XV).
Anísio Teixeira sempre acreditou que seria possível a identificação dos atributos
individuais e seu máximo aproveitamento “em prol do crescimento individual e da
organização social” (NUNES, 2000, p. 358).
Aos que têm medo de medir, porque isso importa em diminuir a
beleza ou a poesia da vida, nada a dizer. Entretanto, coragem, ou
heroísmo, ou espírito de sacrifício não perderão a sua nobreza nem a
sua beleza, o que em que lhe pudermos traçar a gênese orgânica e
medir o grau exato de sua eficiência, do mesmo modo que as flores
não perderam o seu encanto com o desenvolvimento da botânica. Os
testes, como qualquer outra descoberta científica, não podem ser
julgados pelas suas limitações, porém pelos seus usos. E por esse, –
ninguém os pode negar aos novos instrumentos de medida mental e
escolar, – eles podem e devem ser bem julgados (TEIXEIRA, 1930,
p. XV-XVI).
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Diz Euclydes da Cunha (2000, p. 64-65): “Não temos unidade de raça. Não a teremos, talvez,
nunca. Predestinamo-nos à formação de uma raça histórica em futuro remoto, se o permitir
dilatado tempo de vida nacional autônoma. Invertemos, sob este aspecto, a ordem natural dos
fatos. A nossa evolução biológica reclama a garantia da evolução social. Estamos condenados à
civilização. Ou progredimos, ou desaparecemos. A afirmativa é segura”.
i
Diz Gilberto Freyre (2001, p. 45): “Vi uma vez, depois mais de três anos maciços de ausência
do Brasil, um bando de marinheiros nacionais – mulatos e cafuzos – descendo não me lembro se
ii
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do São Paulo ou do Minas pela neve mole de Brooklyn. Deram-me a impressão de caricaturas
de homens. E veio-me a lembrança a frase de um livro de viajante americano que acabara de ler
sobre o Brasil: ‘the fearfully mongrel aspect of most of the population’. A miscigenação resulta
naquilo. Faltou-me quem me dissesse então, como em 1929 Roquette-Pinto aos arianistas do
Congresso Brasileiro de Eugenia, que eram simplesmente mulatos e cafuzos os indivíduos que
eu julgava representarem o Brasil, mas cafuzos e mulatos doentes”.
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