MANIFESTAÇÕES A CERCA DO GENOCÍDIO ARMÊNIO

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SYSTEM OF A DOWN: MANIFESTAÇÕES A CERCA DO GENOCÍDIO ARMÊNIO
Alessandra de Melo1
Universidade Estadual de Maringá
[email protected]
Rock e comportamento
Introdução
Dentre diferentes atos de massacres ocorridos na história, destacamos o genocídio
armênio, tido por muitos como o primeiro genocídio do século XX, mas ainda assim, não
reconhecido como tal por vários países, cada qual por seus motivos.
Sendo a música um meio de divulgação e propagação de ideais, selecionamos uma
banda de rock reconhecida mundialmente, System of a Down, a qual luta em prol do
reconhecimento do genocídio armênio.
Assim, pretende-se abordar nesse artigo, uma breve explanação acerca do genocídio,
suas principais causas e conseqüências, uma análise sobre a banda System of a Down, seus
motivos e principais manifestações para o reconhecimento do genocídio armênio, onde se
englobam desde músicas abordando a temática, entrevistas, passeatas e participação em
documentário.
Com isto, podemos notar no cenário musical, a importância e influência políticoideológica para a conscientização sobre um tema pouco explorado, resultando não apenas em
conhecimento sobre fatos históricos, como também na tomada de posição política perante a
sociedade.
Genocídio armênio: aspectos históricos
A Armênia, localizada no Cáucaso entre a Turquia, Geórgia e o Azerbaijão, possui
uma área de 29.743 km² e população de aproximadamente 2.969.081 habitantes, segundo o
1
Acadêmica do curso de mestrado em História da Universidade Estadual de Maringá – UEM. Email:
[email protected]
1
The World Bank em 2012. Dada a sua posição geográfica, planícies férteis e reservas
minerais, foi disputada por vários Impérios na antiguidade, como os Persas e Assírios, e caiu
sob o domínio do Império Turco Otomano no século XVI2.
Durante os séculos XIX e XX, os armênios foram vítimas de diversos ataques do
Império Turco Otomano. Sendo uma minoria étnica e religiosa sob o poder dos otomanos, sua
situação se tornou precária com a decadência desse Império.
Contudo, como comenta Alem (1961), as ocorrências dos massacres nem sempre
foram constantes e gerais: houve momentos que os armênios possuíam determinados direitos
reconhecidos, ocupando, até mesmo, cargos do governo.
Por fins do século XIX, os turcos levaram adiante o estabelecimento dos Curdos
nômades nas regiões da Armênia. Além de lhe oferecer abrigo no inverno, os habitantes
deveriam pagar impostos, que se sobrepunham aos pagos para os otomanos. Houve resistência
e revoltas estouraram em Zeitum, Van e Sassun; a repressão otomana iniciou-se a partir de
1894, cessando os massacres em 1895, com a intervenção inglesa, mas recomeçando-os em
1896, nas cidades de Mush, Van e Killis.
Com a queda de Hamid e a ascensão do partido Jovens Turcos, inicialmente houve
certa paz quanto aos massacres, que posteriormente reiniciaram. Em 24 de abril de 1915 (data
reconhecida internacionalmente como o início do genocídio), 600 armênios foram presos e o
plano de extermínio foi posto em ação.
Dentre as estimativas de vítimas no período de 1915 a 1917, “o número mais habitual
é de 1,5 milhão -, que pode figurar como a principal tentativa moderna de eliminar toda uma
população”3, de um total aproximado de 1.900.000 armênios que habitavam o Império
Otomano4. Ainda que muitos tenham sido vitimados, houve resistência, como o caso ocorrido
na montanha costeira de Musa Dagh5, onde aproximadamente, quatro mil armênios resistiram
por quarenta dias aos ataques, até o resgate por parte da França.
2
Concluída no sultanato de Selim II (1524-1574), a anexação teve início no século passado (XV), quando
Mehmed II ofereceu apoio para iniciar o Patriarcado Armênio de Constantinopla. Tal situação perdurou por 300
anos, até o desencadear da guerra russo-turca (1828-1829), onde parte do território foi cedida aos russos.
3
HOBSBAWN, 1997, p. 57.
4
KECHICHIAN, 2000.
5
Deste fato, resultou a publicação de um livro chamado “Os 40 dias de Musa Dagh”, do autor Franz Werfel,
publicado em 1933.
2
No entanto, os massacres não se encerraram em 1917, mas estenderam-se até 1923,
com o desenrolar de fatos abrangendo os países envolvidos. Com o advento da revolução
bolchevista na Rússia em 1917, o novo governo fez acordos com a Turquia quanto à questão
fronteiriça do Cáucaso. As duas forças que influenciavam a região, visando administrar
melhor a situação, criaram o Comitê Transcaucasiano, formado por georgianos, azeris (turcos
azerbaijanos) e armênios. Em 1918, Rússia Soviética e as Potências Centrais (Turquia,
Alemanha, Áustria-Hungria e Bulgária) assinaram o tratado de paz de Brest-Litovsk, o que
colocaria a questão Armênia em péssimas condições, já que o Art. 4° deixa claro que, a
Rússia faria tudo possível para a evacuação das regiões da Anatólia Oriental e sua restituição
à Turquia, incluindo também, as localidades de Ardahan, Batum e Kars. Para deixar claro seu
descontentamento quanto à atitude russa, o Comitê se reuniu, ainda em 1918, declarando a
República Democrática Federativa da Transcaucásia (Armênia, Azerbaijão e Geórgia). Com o
afastamento da Geórgia que se colocou sob proteção alemã, e o Azerbaijão sob protetorado
turco, a República Transcaucasiana foi dissolvida e a Armênia declara sua independência em
30 de maio de 1918, desmantelando-se em 1920 e anexada a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas em 1923.
Calcula-se que “cerca de 30 mil armênios morreram entre 1918 e 1920 e outros 100
mil fugiram até 1923”6. Mesmo com a repercussão internacional, onde as notícias dos
massacres se espalharam pelo globo, causando estímulo às autoridades e representantes a se
posicionar (como o caso de Gladstone, Primeiro-Ministro do Reino Unido, ainda no século
XIX, com discursos de condenação aos fatos ocorridos e atitudes tomadas pelo Sultão Abdul
Hamid II), não houve atitudes mais drásticas e firmes para cessar os massacres.
Além da grande quantidade de vítimas, o massacre contribuiu para a defasagem do
patrimônio histórico-cultural armênio, além de estimular a diáspora. Assim, devido não
somente aos massacres, mas também por questões de trabalho, muitos armênios imigraram
para outros países, como Síria e Líbano, além da América. O Brasil também foi alvo destes
imigrantes, recebendo-os em dois momentos, ao final do século XIX (cujo objetivo era o
trabalho) e no início do século XX (sendo os sobreviventes dos massacres).
6
BERTONHA, 2011, p. 301.
3
Breve pontuação sobre a história política
A partir de 1945, a história política foi alvo de críticas por diversas correntes teóricometodológicas, acusada de ser factual, convergindo numa tentativa de desqualificar qualquer
pretensão cientifica que pudesse haver.
A terceira geração da Annales buscou modelos e sustentação teórica para repensar as
relações Estado-sociedade, imposto pelo seu interesse em renovar o estudo do político,
possibilitando assim, novas concepções sobre temas pouco freqüentados pela historiografia:
os poderes, os saberes enquanto poderes, as instituições supostamente não-políticas, as
práticas discursivas, etc.
O estudo do político vai compreender a partir daí não mais apenas a política em seu
sentido tradicional mas, em nível das representações sociais ou coletivas, os
imaginários sociais, a memória ou memórias coletivas, as mentalidades, bem como
as diversas praticas discursivas associadas ao poder.7
Assim, com a interdisciplinaridade que trazia contribuições metodológicas, novos
objetos, problemas e abordagens passaram a entrar em foco. A história política é chave mestra
para entendimento de determinadas atitudes da população.
Um grupo que detém determinado poder acaba por exteriorizar seus pensamentos,
idéias e lutas, através de meios de comunicação (jornais e músicas, por exemplo), o que tende
a influenciar os interesses particulares da massa seguidora do grupo, que passa a dar maior
ênfase a determinado acontecimento, e conseqüentemente, pode manifestar-se na opinião
pública.
A música entra nesse contexto, a banda selecionada para análise, detém o poder de
informação, atingindo milhões de pessoas no mundo, sendo capazes de informar e modificar o
comportamento político dos indivíduos, antes desconhecedores do que foi o genocídio
armênio. Obviamente, as manifestações de tais indivíduos são demonstradas de forma a
encorpar as passeatas em prol do reconhecimento do genocídio, participar de reuniões
públicas e passar a conhecerem um tema pouco abordado pela mídia tradicional.
7
FALCON, 1997, p. 76.
4
System of a Down: a música com cunho político
A banda de rock, System of a Down, iniciou seus trabalhos em Los Angeles (EUA),
no ano de 1992. Composta por descendentes de armênios, inicialmente formada por Serj
Adam Tankian, Daron Vartan Malakian, Dave Hakopyan e Domingo Laranio, intitulada
“Soil”, teve Shavarsh (Shavo) Robert Odadjian como empresário. Algum tempo depois, Dave
e Domingo saíram da banda, Shavo assumiu o baixo e Andy Khachaturian a bateria, com
David “Beno” Benveniste como empresário.
Após Daron mostrar aos amigos seu poema “Victims of a Down”, o grupo modificou
e adotou o nome de System of a Down. Se apresentando inicialmente em clubes e bares de
Los Angeles, e graças à repercussão positiva de suas “demos”, a banda passou a se apresentar
em lugares mais conceituados e conquistar um pequeno, mas fiel público.
Em 1997, Andy sofre uma lesão na mão, ocasionando sua saída da banda, sendo
substituído por John Willian Dolmayan. Tal formação perdura até hoje.
Propor um estudo detalhado acerca de toda a manifestação sugerida é demasiado
longo e infelizmente, impossível em um pequeno artigo. Assim, destacamos P.L.U.C.K.
(música), o documentário Screamers, e duas matérias publicadas em grandes jornais
internacionais.
P.L.U.C.K (Politically Lying, Unholy, Cowardly Killers) é uma das faixas do álbum
“System of a Down” lançado em junho de 1998, produzido pela banda e por Rick Rubin. A
música é uma das mais notáveis quanto ao seu conteúdo explícito sobre o genocídio armênio.
Não obstante, foi visivelmente aguardada no show em Yerevan (Armênia) da turnê “Wake up
to the Souls” (2015).
Podemos fazer uma breve e singela análise do conteúdo da música, relacionando aos
fatos do genocídio.
Elimination, Elimination, Elimination
Die, Why, Walk Down, Walk Down8
8
Tradução livre: Eliminação, eliminação, eliminação / Morra, Por que? Afunde, afunde.
5
Havia um plano de eliminação em massa da população armênia9, os motivos para os
massacres ainda são delicados, não podemos determinar um único e exclusivo motivo para tal
ato, mas sim, uma associação de fatos que levaram a ele, desde fatores culturais, religiosos e
econômicos, por exemplo.
No que tange à Documentação do Genocídio de 1915 uma série de telegramas do
então Ministro do Interior Talaat Pashá, ordenando exterminar inteiramente os
Armênios e prometendo castigar os funcionários da Administração que não
cumprissem cegamente esta ordem, [...] telegramas estes cifrados e reconhecidos,
[...] atestam a barbárie das deportações e dos massacres.”10
A seguir, em outro trecho, vemos:
A whole race Genocide,
Taken away all of our pride,
A whole race Genocide,
Taken away, watch them all fall down11
Há vários debates acerca da utilização, ou não, do termo “genocídio” para os
massacres ocorridos, posto que o termo foi cunhado por Raphael Lemkin (judeu polaco) em
1944, mas incorporado em leis internacionais apenas em 1951, com a Convenção para a
preservação e repressão do crime de genocídio. Há a alegação de que tais massacres não
poderiam ser considerados por tal termo, já que este não estava tipificado. No entanto, se
olharmos o Art.2° desta Convenção, que entende por genocídio os atos abaixo indicados,
cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo
nacional, étnico, racial ou religioso, tais como: a) Assassinato de membros do
grupo; b) Atentado grave à integridade física e mental de membros do grupo;
c) Submissão deliberada do grupo a condições de existência que acarretarão a
sua destruição física, total ou parcial.12
9
Para mais informações a cerca do plano de extermínio, recomendamos a obra KERIMIAN, Nubar. Massacres
armênios e memórias de Naim Bey para Aram Andonian. São Paulo, 1981. Tal obra traz cópia dos telegramas
(tanto originais quanto traduzidos) onde são expressas as ordens e recomendações das formas de prosseguir com
o intento do governo otomano.
10
MARTINS, 2007, p. 4.
11
Tradução livre: Genocídio de uma raça inteira / Levou embora todo o nosso orgulho / Genocídio de uma raça
inteira / Levada embora, Assista a eles todos desmoronarem.
12
Convenção para a prevenção e repressão do crime de genocídio - http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-econteudos-de-apoio/legislacao/segurancapublica/convenca....crime_genocidio.pdf
6
Notamos a complexidade de refutar a utilização do termo, uma vez que os massacres
se enquadram nas características abordadas no artigo de tal Convenção.
Prosseguindo, podemos pontuar o seguinte trecho:
The plan was mastered and called Genocide
(Never want to see you around)
Took all the children and then we died,
(Never want to see you around)
The few that remained were never found,
(Never want to see you around)13
Em meados de 1894, ocorreram os primeiros massacres, como pretexto para uma
repressão devido à revolta dos moradores de Sassun, pois se recusaram a pagar o imposto
curdo. Nota-se extrema violência, por exemplo, “em Urfa, onde, na semana de Natal, 3.000
armênios foram queimados vivos na capital onde haviam procurado refúgio”14. Os relatos de
barbárie estão disponíveis em diversas obras que tratam do assunto, bem como em fotografias
registradas por oficiais e jornalistas que serviam na região durante os massacres.
Igrejas superlotadas [...] e incendiadas por grupos de vândalos, [...] o povo
conduzido ao deserto e assassinado; também morrendo de fome, sede frio e tortura.
[...] muitos eram queimados vivos nas aldeias e cidades, outras vezes a tortura
consistia em enterrar a vitima ate o pescoço para [...] cobrir o rosto com cal virgem
ou sal. Jovens armênios foram massacrados em grupos após trabalhos forçados, os
velhos e doentes eram amarrados vivos às dezenas e atirados no Lago Van. [...] as
crianças eram encaixotadas vivas e atiradas ao Mar Negro, outras vezes eram
seguradas pelos pés, giradas ao ar e arremessadas contra as rochas, penduradas pelos
cabelos e decepadas. Fetos eram arrancados dos ventres das mães, jogados ao ar e
aparados na espada.”15
Em seguida, destacamos duas matérias a respeito da banda e de seus álbuns, uma do
jornal The New York Times e do jornal The Guardian.
13
Tradução livre: O plano foi dominado e chamado de Genocídio / (Nunca quero ver você por perto) / Levaram
todas as crianças e então nós morremos / (Nunca quero ver você por perto) / O poucos que restaram nunca foram
encontrados / (Nunca quero ver você por perto).
14
ALEM, 1961, p. 53.
15
KERIMIAN, 1981, p. 23.
7
The New York Times, jornal fundado em 1851 por Henry Jarvis Raymond e George
Jones, nos Estados Unidos, é um dos mais influentes o mundo. Em 2005, publicou uma
matéria a cerca da crítica ao álbum Hypnotize. Comentando que a banda aborda temas
políticos, por exemplo, globalização e matanças de inocentes em guerras, ressalta que
Hypnotize é o melhor álbum da banda até o momento da matéria.
And in ''Holy Mountains,'' an anthem about the Armenian genocide invoking
murders by the Aras River, the tone is consistently serious. Nobody pauses to be
16
flippant.
No trecho acima, extraído da matéria, o colunista comenta acerca da música Holy
Mountains, que aborda as vítimas assassinadas durante o genocídio, citando o Rio Aras
(fronteira entre Turquia e Armênia) e pontuando a seriedade assumida pelos integrantes da
banda. O massacre de milhares de pessoas marcou definitivamente esta etnia, sendo o tema
sempre abordado com respeito pelos seus descendentes e sobreviventes. O genocídio acabou
por fortalecer a identidade armênia, com a diáspora dos sobreviventes e a nova instalação em
outros países, os indivíduos precisavam se fortalecer para não perderem toda a sua tradição,
que, diga-se de passagem, é milenar17.
Já o The Guardian, jornal britânico fundado em 1821, publicou em 2009, uma matéria
questionando a possibilidade do melhor lugar a se discutir sobre o genocídio armênio. O local
questionado pelo referido jornal, seria o “Eurovision”, um concurso de músicas anualmente
transmitido pela televisão/rádio.
A matéria questiona se em um festival desse porte, seria o melhor local para se abordar
o tema do genocídio armênio, relatando que o vocalista pensava em uma apresentação no
festival. Notamos que a posição do jornal não é muito favorável a tal ação, citando até mesmo
outros casos de bandas que buscaram ênfase em fatos políticos e não foram vencedoras do
concurso.
O documentário Screamers foi produzido em 2006 por Carla Garapedian, abordando
os genocídios que ocorreram, bem como a negação do genocídio armênio por parte da
16
http://query.nytimes.com/gst/fullpage.html?res=9901E4DC1F3EF932A15752C1A9639C8B63
Para mais informações, ver: ALEM, Jean Pierre. A Armênia. São Paulo, Difusão Européia do Livro. Tradução
de Arakcy Kafejian Martins Rodrigues, 1961. Capitulo I – A Armênia Antiga.
17
8
Turquia, tendo participação especial da banda System of a Down, durante um show
beneficente. Screamers ainda conta com a participação de Maritza Ohanesian, sobrevivente do
genocídio e Stepan Haytayan, avô do vocalista da banda.
De maneira geral, notamos ações políticas tanto por parte dos integrantes da banda,
quanto do público, envoltos na tentativa de divulgação e reconhecimento dos genocídios
ocorridos no século XX e XXI, tais como os massacres armênios (1915-1917), de Ruanda
(1994) e Darfur (iniciado em 2003, perdura até atualmente no Sudão).
Essas ações se caracterizam, por exemplo, no envio de cartas para o congresso
americano, solicitando o reconhecimento do genocídio, apresentação de livros, revistas e
cartazes.
O público que assistiu ao show do System of a Down (não generalizando,
obviamente), compreende o caráter político-ideológico da banda, estando conscientes do
dever de mostrar esse lado da história, que muitas vezes não se aprende nas escolas.
O documentário também aborda o desconhecimento da população turca sobre o
ocorrido, mostrando a tentativa de ocultação de parte da história.
Os próprios integrantes da banda comentam sua posição acerca do genocídio, Serj
Tankian, menciona sua conexão com o tema ressaltando suas raízes familiares, principalmente
seu avô, que lhe contava o que ocorria e como sobreviveu. Comenta também, as tentativas de
mostrar ao mundo o que ocorria na época, mesmo com a ocultação promovida pelo governo
otomano, em meios de comunicação, por parte de nomes importantes da política
internacional, como Henry Morgenthau18.
John Dolmayan comenta o mal-estar espiritual vivido, o genocídio incutiu uma marca
na etnia que acaba por se sobrepor a outras questões, como a cultura. Relata que, como
descendente, é seu dever mostrar o que houve, tanto fora do grupo, quanto dentro. Demonstra
certa insatisfação quando acusados de mentirosos por pessoas que dizem não ter ocorrido um
genocídio, questionando o ensino turco a respeito do fato.
Shavo Odadjian, relata sua satisfação em poder mostrar ao mundo sobre seu povo,
divulgando um país milenar, mas pouco conhecido. Levanta ainda, uma questão polêmica,
18
Embaixador americano em Constantinopla, Turquia, entre 1913 e 1916, procurou denunciar as atitudes do
Sultão para com o povo armênio.
9
caso a opinião pública tivesse se manifestado e agido, talvez Hitler ponderasse mais em
cometer o Holocausto Judeu.
Daron Malakian comenta o fato de não irem a Turquia fazer shows, segundo ele,
incorporaram essa pauta em seu grupo, mesmo possuindo muitos fãs no país, principalmente
jovens, espera que, futuramente, algo aconteça sobre o reconhecimento.
O documentário também mostra o outro lado da história, a opinião turca. Em uma
manifestação, há o negacionismo do genocídio pela população turca e o receio da divisão do
país, caso haja o reconhecimento.
Mostra também, a tentativa dos membros da banda de instigar o governo norteamericano em reconhecer o genocídio, onde Tankian entrega uma carta solicitando tal ação a
um porta-voz do presidente da Câmara dos Representantes, durante uma manifestação e em
outra ocasião, conversa pessoalmente com Dennis Hastert19.
Com a abertura do leque de possibilidades de estudos proporcionado pela renovação
da história política, abordar determinados temas ajudaram a compreender as relações de poder
dentro de uma sociedade. No caso abordado no presente artigo, podemos notar a utilização da
música para a divulgação de uma posição político-ideológica envolvendo um tema marcante
na vida dos seus enunciadores.
Seja através de suas letras, de suas participações em entrevistas e documentários, ou
até mesmo em manifestações em praça pública em prol do reconhecimento do genocídio, tais
atitudes incentivam os indivíduos a participarem mais ativamente da vida política do seu país,
cobrando respostas a temas de repercussão.
Comumente, nos grupamentos humanos hierarquizados, tanto por parte dos setores
hegemônicos quanto pelo lado daqueles que se lhes opõem, a música tem uso
político. De um lado, como elemento de distinção e identidade classista, servindo
aos processos de dominação ideológica, de outro, como contestação destas e/ou
como motivação para ações que visam a transformação da sociedade e também
como forma de identidade e resistência, ou, ainda, apenas para o desvelamento da
realidade. IKEDA, 2007, pg. 05.
No caso do System of a Down, a música serve para contestar as atitudes e posições
assumidas dos governos perante os temas abordados em suas letras. Como se sabe, o não
19
Presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos de 1999 a 2007.
10
reconhecimento do genocídio armênio, bem como de outros massacres ocorridos, não tem
fundamento apenas em questões éticas, mas em políticas e econômicas, uma vez que vários
países mantêm relações estreitas com os governos opressores.
Considerações finais
Devemos destacar um ponto importante quando trabalhamos com o tema proposto
nesse artigo. A banda em questão luta pelo reconhecimento do genocídio e utiliza suas
músicas para isso, contudo, suas músicas não tratam exclusivamente do tema. É necessária a
consciência de que a música atrai e quando possui esse poder, pode introduzir questões
políticas, como ocorre com o System of a Down.
Sem dúvidas, a banda é um meio importante de divulgação sobre o tema mundo afora,
já que notamos ainda existir certo receio em abordá-lo publicamente devido às relações
internacionais. Contudo, sem dúvidas, é um passo importante ao menos a conscientização de
que ocorreu um genocídio, pois assim, a população sai de sua zona de ignorância de fatos, e
passa a questionar as atitudes de seus respectivos governos. Portanto, a música e o fazer música
estão, sempre envoltos do político, mesmo que nem sempre seja perceptível.
REFERÊNCIAS
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Kafejian Martins Rodrigues, 1961.
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(1914/1918) / João Fábio Bertonha ; prefácio Antônio Carlos Lessa. – Maringá : Ediuem,
2011.
FALCON, F. & MOURA, G. A formação do mundo contemporâneo; a fase de formação da
sociedade liberal. 14. Ed. RJ, Campus, 1989.
GRÜN, Roberto. Negócios & famílias: armênios em São Paulo / Roberto Grün. – São Paulo:
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11
HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos: o breve século XX : 1914-1991. São Paulo: Cia. das
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IKEDA, A. T. Música, política e ideologia: algumas considerações. Revista @rquivo@
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KECHICHIAN, Hagop. Os Sobreviventes do Genocídio: Imigração e Integração Armênia no
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Is Eurovision really the best place to discuss Armenian genocide? - Priya Elan http://www.theguardian.com/music/musicblog/2009/jan/06/eurovision-system-downarmenian - Último acesso 15/05/2015.
Convenção
para
a
prevenção
e
repressão
do
crime
de
genocídio
-
http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-deapoio/legislacao/segurancapublica/convenca....crime_genocidio.pdf
-
Último
acesso
10/05/2015.
Critics'
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Ben
Ratliff
-
http://query.nytimes.com/gst/fullpage.html?res=9901E4DC1F3EF932A15752C1A9639C8B6
3 - Último acesso 15/05/2015.
Site of a Down - http://siteofadown.com/ - Último acesso 10/05/2015.
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