O Balanço de Pagamentos: Limite do Crescimento da Economia Mexicana Carlos Eduardo Martins1 Uma das principais descobertas macroeconômicas da teoria da dependência, na versão de Ruy Mauro Marini e Theotônio dos Santos, para a economia política latinoamericana do pós-guerra foi a de que o crescimento sustentado na região exige a produção de superávits comerciais que minorem os resultados negativos de sua balança de serviços e de capitais. Até o início dos anos 80, o México havia sido uma importante exceção a esse esquema, em razão dos fortes superávits que obtinha no segmento não-fatorial da balança de serviços. Esses superávits resultavam de sua atração como centro turístico e da baixa proporção dos pagamentos de fretes, seguros e outros transportes na conta corrente, dada a sua fronteira territorial com os Estados Unidos. Entretanto, a aplicação do ideário neoliberal no México, que desregulamentou o comércio e os fluxos de capitais e apreciou a moeda local, aprofundou a dependência internacional desse país. Ampliaram-se os déficits dos serviços fatoriais (que inclui juros e remessas de lucros) e converteram-se em negativos os resultados não-fatoriais. Em consequência, os movimentos da economia mexicana tornaram-se expressão cada vez maior das leis mais gerais do desenvolvimento dependente. O comportamento macroeconômico do México, em 1999, é uma expressão clara disso. O balanço de pagamentos surge como forte obstáculo à manutenção das taxas de crescimento obtidas após a crise de 1995. As previsões para o PIB mexicano em 1999, indicam uma expansão de 3,5%, reduzindo as taxas de 5,5% alcançadas entre 1996-98. Na base desse recuo esteve o aumento dos déficits em conta corrente, cujo descontrole provocou a crise de 1995. 1 Doutor em Sociologia pela USP. Colaborou a auxiliar de pesquisa Rosane Costa 1 A desregulamentação comercial e financeira da economia mexicana articulou-a fortemente aos mercados internacionais, vinculando a expansão do PIB a importantes deficits comerciais. Em 1994, a balança comercial apresentou um resultado de US$ 18,5 bilhões negativos, elevando o déficit de conta corrente para US$ 29,6 bilhões, apesar do modesto crescimento de 3,7% entre 1991-94. A impossibilidade da conta capital cobrir esse valor implicou a perda de credibilidade dos ativos mexicanos e a fuga de capitais estrangeiros do país. Foi necessário um pacote de emergência liderado pelo governo dos Estados Unidos e apoiado por instituições multilaterais, além de fortes ajustes internos, para reestabelecer o equilíbrio macroeconômico. Em 1995, a desvalorização do peso e a brutal retração de 6,2% do PIB inverteram o resultado negativo da balança comercial, permitindo que ela funcionasse como estabilizadora da conta corrente. A balança comercial alcançou US$ 7,1 bilhões e a conta corrente teve seu déficit reduzido para US$ 1,5 bilhões. Massivas transferências de capitais foram realizadas em 1995 e 1996 para pagar grande parte da ajuda recebida. Entre 1994 e 1996, os salários caíram de um índice de 114.9 para 90.0. A taxa de pobreza aumentou de 36% para 43% da população. O rápido equilíbrio permitido pela profundidade do ajuste e o reingresso dos capitais estrangeiros capacitou a economia a retomar com intensidade o crescimento. Entretanto, uma vez ultrapassados os níveis de produção de 1994, os resultados positivos da balança comercial desapareceram a passos gigantescos. Em 1997, o saldo da balança comercial reduziu-se para US$ 593 milhões e, em 1998, tornou-se um déficit de US$ US$ 8,5 bilhões, produzindo na conta corrente o resultado de US$ 16 bilhões negativos. A projeção futura desse cenário tornou-o insustentável e exigiu a desaceleração do crescimento econômico. Para controlar essa situação, o governo do PRI, de Zedillo, implementou uma política monetária restritiva que elevou as taxas de juros reais para 10% em 1999, frente aos níveis de –5% e 0,5% alcançados em 1997-98. Entretanto, os impactos sobre a balança comercial e a conta corrente foram apenas de contenção de seus déficits, já que a 2 contrapartida da política monetária foi a valorização do peso em 7,3%. As condições restritivas em que passou a operar a economia mexicana provocaram uma expressiva redução do saldo na conta de capitais, tornando-a ligeiramente inferior ao resultado da conta corrente, o que exigiu a queima de US$ 440 milhões em reservas para equilibrar o balanço de pagamentos, segundo estimativas da CEPAL. A presença do investimento direto nos ingressos de capital vêm seguindo no México o mesmo padrão que na América Latina. Entre 1992-97, há um predomínio dos ingressos financeiros de capitais, embora cresça a proporção de investimentos diretos no decorrer do período. A partir de 1998, os investimentos diretos lideram os ingressos de capital. Todavia, isso não tem impedido massivas saídas de capital quando se desequilibra o balanço de pagamentos. O déficit de transações correntes torna-se um fator chave no desencadeamento do ciclo econômico mexicano. Quando não pode ser compensado por um superávit na balança de capitais e ameaça as reservas, coloca em risco a credibilidade dos ativos mexicanos, gerando um movimento de saída de capitais. Dada relativa rigidez do câmbio, a variável de ajuste da conta corrente são os salários. Entre 1996-98, quando se retoma o crescimento, eles permanecem no mesmo nível, chegando ao índice de 91.5, nesse último ano. O cenário que se desenha em 2.000 para o México não parece positivo. Esse é um país que em 1998 tinha 86% de suas exportações dirigidas ao mercado estadunidense. As perspectivas de os Estados Unidos aumentarem suas taxas de juros para reduzir o crescimento e seus déficits comerciais dificultam a recuperação da conta corrente mexicana. Da mesma forma atuam as pressões realizadas pelos Estados Unidos sobre o governo mexicano para aumentar a produção de petróleo e derrubar seus preços de US$ 30 para US$ 25. O secretário de Energia, Luiz Tellez, se pronunciou ante essas pressões, afirmando que o compromisso do México com a OPEP, que restringiu a produção de petróleo para recuperar seus preços, irá apenas até março. 3 Trata-se de um tipo de inserção internacional, cujo o ônus para a população mexicana aumenta sensivelmente. 4