CURSO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA NATUREZA LICENCIATURA EM FÍSICA PATRÍCIA REIS CHAGAS UMA PROPOSTA DIDÁTICA DIFERENCIADA E A ATITUDE DOS ALUNOS FRENTE AO ENSINO DE ASTRONOMIA Campos dos Goytacazes/ RJ 2012 2 PATRÍCIA REIS CHAGAS UMA PROPOSTA DIDÁTICA DIFERENCIADA E A ATITUDE DOS ALUNOS FRENTE AO ENSINO DE ASTRONOMIA Monografia apresentada ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense Campus Campos-Centro como requisito parcial para conclusão do Curso Superior de Ciências da Natureza Licenciatura em Física. Orientador: Prof. Pierre Schwartz Augé Campos dos Goytacazes/ RJ 2012 – 3 PATRÍCIA REIS CHAGAS UMA PROPOSTA DIDÁTICA DIFERENCIADA E A ATITUDE DOS ALUNOS FRENTE AO ENSINO DE ASTRONOMIA Monografia apresentada ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense Campus Campos-Centro como requisito parcial para conclusão do Curso Superior de Ciências da Natureza Licenciatura em Física. Aprovada em _____ de __________________ de 2012. Banca Avaliadora: .............................................................................................................. Prof. Pierre Schwartz Augé (orientador) Mestre em Educação / UFF IF Fluminense Campus Campos-Centro .............................................................................................................. Prof. Wander Gomes Ney Pós-doutor em Física / The Abdus Salam ICTP IF Fluminense Campus Campos-Centro .............................................................................................................. Prof. Renata Lacerda Caldas Martins Doutora em Ciências Naturais / UENF IF Fluminense Campus Campos-Centro – 4 AGRADECIMENTOS Primeiramente a DEUS pelo dom da vida e por ter colocado pessoas tão especiais em meu caminho. Aos meus pais Adecivaldo e Eliana que, com muito carinho e apoio, não mediram esforços para que eu chegasse até esta etapa da minha vida. Ao meu amor David, pela dedicação, compreensão e presença constante durante toda essa etapa da minha vida, me ouvindo e me ajudando sempre. A minha irmã Tamires, que mesmo inconscientemente me incentivou a correr atrás dos meus objetivos, sendo além de irmã, uma amiga. Ao meu professor e orientador Pierre, pelo apoio e por ter auxiliado na execução deste trabalho. A todos os professores do curso, que foram tão importantes para minha vida acadêmica e de alguma forma contribuíram para o desenvolvimento deste trabalho. A todos os meus amigos e colegas que acreditaram e contribuíram, mesmo que indiretamente, para a conclusão deste curso. 5 “Subitamente me dei conta de que aquela pequena ervilha, bela e azul, era a Terra. Estiquei meu polegar e fechei um olho. E meu polegar tampou completamente o planeta Terra. Eu não me senti um gigante, mas muito, muito pequeno.” Neil Armstrong (1930-2012) Astronauta americano 6 RESUMO A astronomia é considerada a mais antiga das ciências, porém, vem sofrendo com a crescente especialização do conhecimento humano, uma vez que o assunto é discutido em diferentes disciplinas escolares e o efeito é uma aparente perda de sua importância. Como conseqüência, muitos alunos se sentem desmotivados com o atual modelo de ensino. Na busca pela superação desse obstáculo, este trabalho tem como objetivo investigar uma possível mudança atitudinal dos alunos com a aplicação de uma proposta de ensino diferenciada. Foi possível encontrar evidências de um engajamento atitudinal significativo, ou seja, é possível oferecer subsídios à superação do problema da atitude discente frente ao ensino de ciências mediante uma intervenção didática estruturada em ambiente educacional formal. Palavras-Chaves: Astronomia. Mudança atitudinal. Didática da física 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO....................................................................................................8 Capítulo 1: Referencias Teóricos......................................................................12 1.1. Teorias de Aprendizagem e o Ensino de Ciências........................12 1.1.1. Epistemologia Construtivista........................................................12 1.1.2. Aprendizagem Significativa..........................................................14 1.2. História da Ciência..........................................................................16 1.3. Atitude.............................................................................................18 Capítulo 2: Metodologia....................................................................................26 2.1. O Ensino..........................................................................................26 2.1.1. O Material Didático.......................................................................26 2.1.2. A Sala de Aula..............................................................................30 2.2. A Pesquisa......................................................................................31 2.2.1. Os Sujeitos...................................................................................32 2.2.2. Os Instrumentos...........................................................................33 Capítulo 3: Análise dos Dados..........................................................................36 3.1. Análise dos questionários................................................................36 3.2. Análise das entrevistas por aluno....................................................37 3.3. Análise das entrevistas por questão................................................46 3.4. Dialogando com os referencias teóricos.........................................48 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................53 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................55 ANEXOS...........................................................................................................59 ANEXO I: Material didático.....................................................................60 ANEXO II: Questionário..........................................................................87 ANEXO III: Roteiro de entrevistas..........................................................89 ANEXO IV: Currículo mínimo Estado do Rio de Janeiro........................91 8 INTRODUÇÃO A astronomia, ou seja, o estudo dos astros, é considerada a mais antiga das ciências, pois, ainda na pré-história, os primeiros homens e mulheres perceberam a existência de mecanismos e ciclos específicos que se refletiam em suas atividades terrenas e eram marcados pela posição das estrelas. O Sol criava a clara distinção entre períodos de claridade e escuridão (dia e noite). A Lua, a cada volta dada ao redor da Terra, marcava o período conhecido como mês. A posição de determinadas constelações pareciam marcar os melhores períodos para plantio e colheita, já na revolução agrícola. Além disso, havia alguns astros que não se movimentavam como os demais, pois surgiam nas mais distintas posições durante algumas noites e depois pareciam seguir sua trajetória normal. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (2002, p.235): física percebida enquanto construção histórica, como atividade social humana, emerge da cultura e leva à compreensão de que modelos explicativos não são únicos nem finais, tendo se sucedido ao longo dos tempos, como o modelo geocêntrico, substituído pelo heliocêntrico [...]. Fica evidente que o uso da história da ciência, especificamente da história da física, se faz necessário para a plena compreensão da mutabilidade da ciência e apropriação dos conhecimentos, leis e princípios que regem essa ciência. O céu era – e é – bem movimentado, mas ainda assim, inspirava certa noção de ordem. A partir daí, surgiu a percepção que o mundo seguia algumas regras – leis da natureza por assim dizer. Partindo dessa premissa, os povos antigos puderam ter seu primeiro contato com a noção de ciência, ainda que de maneira incipiente. Esse processo exigia a combinação de observação e criação de hipóteses, que foi a base para o desenvolvimento científico moderno. 9 A astronomia está na base da ciência e sua influência pode ser percebida em praticamente todos os ramos do conhecimento científico. Mas com a crescente repartição do conhecimento humano, as noções de astronomia também foram diluídas e sua importância no ensino, aparentemente, decresceu de forma extremada. Os efeitos desse processo são facilmente detectados: as noções básicas de sistema solar são lecionadas na disciplina de geografia, as leis do movimento dos planetas estão no curso de física, a corrida espacial no século XX na disciplina de história e as descobertas mais recentes e sofisticadas não estão em lugar algum. Com essa diluição, não só perde o ensino da astronomia, mas também o próprio professor, que se vê sem uma poderosa ferramenta de ensino. Muitos alunos se sentem desmotivados com o modelo atual de ensino, pois são transferidas indiscriminadamente imensas doses de conhecimento, mas pouco se fala sobre o porquê de tudo aquilo. O que motivou uma considerável parcela das pessoas mais curiosas e produtivas do mundo a desenvolver aquelas idéias, hoje transmitidas de maneira pouco atraente? Em muitos casos, aquele saber é resultado de uma busca ancestral de entender nossa posição no universo. O velho clichê “de onde viemos e para onde vamos?”. Ignorando o fato de ser uma frase batida, não podemos negar o fato de que nela está embutida uma das principais características humanas: a curiosidade. Quando um professor fala de espaço, novos mundos e vida extraterrestre, ele invoca a curiosidade inata do ser humano. Ou seja, é uma excelente forma de motivar o interesse pelos avanços científicos – pré-requisito indispensável para o desenvolvimento da cidadania nos dias de hoje – e, mais que isso, motivá-los ao estudo. Uma idéia muito comum entre os professores é que falar de astronomia acaba sendo complexo demais. Mas posso afirmar que essa complexidade é, em parte, lendária; em segundo lugar, administrável; e em terceiro lugar, desejável, pois estimula os alunos a desenvolverem raciocínios mais amplos e idéias mais distantes, que a princípio parecerão não ter nenhuma ligação. Campos e Nigro (2009, p.24) afirmam que: 10 o ensino de ciências realizado apenas com o objetivo de provocar uma mudança conceitual acabou apresentando a falha de não estimular os alunos a investigar de fato. No desejo de alcançar a tal mudança conceitual, sempre que os alunos davam sua explicação para algum fato proposto pelo professor, vinha a contrapartida: “A coisa não é bem assim”, ou “Você deve fazer isso ou aquilo, e obterá dados inconsistentes com suas idéias”. Tornava-se evidente que o ensino de ciências não deveria objetivar apenas uma mudança conceitual, mas considerar que os conhecimentos prévios apresentados pelos alunos estão associados a uma forma peculiar de lidar com fatos da natureza. De acordo com Campos e Nigro (2009, p.24) as características básicas dessa maneira de pensar seriam: • Tendência a generalizar acriticamente, com base nas observações; • Realizar observações geralmente não controladas; • Elaborar respostas rápidas e seguras, baseadas em evidências do senso comum; • Raciocinar numa sequência causal e linear. Esse modo de pensar, de acordo com Campos e Nigro (2009), leva o aluno ao senso comum e a aprendizagem de conceitos científicos só ocorrerá se houver uma mudança e superação da metodologia da superficialidade por parte dos alunos. Portanto, acredita-se atualmente que o objetivo do ensino de ciências não se pode limitar à promoção de mudanças conceituais ou ao aprendizado do conhecimento científico. É necessário também buscar uma mudança atitudinal nos alunos. Para alcançar tal objetivo, um material didático diferenciado sobre astronomia foi desenvolvido com o objetivo de amenizar a problemática apresentada anteriormente. Tal material objetiva motivar o aluno para o aprendizado e construção de importantes conceitos físicos. Nesta perspectiva, a presente investigação pretende fazer apreensões sobre a atitude dos alunos frente ao ensino de física, em particular a astronomia, diante de uma intervenção didática diferenciada. 11 No primeiro capítulo serão expostos os referencias teóricos que servirão de base para a interpretação dos dados da pesquisa. Neste capítulo, serão discutidas algumas teorias da aprendizagem com viés construtivista, em particular a Aprendizagem Significativa de Ausubel, aplicadas ao ensino de ciências com ênfase na história da ciência. Também serão apresentados aportes teóricos sobre a atitude, de uma maneira geral, e relacionada ao ensino de ciências, em particular. No segundo capítulo haverá uma exposição detalhada da experiência didática, a partir da qual foram obtidos os dados para a pesquisa e, após, tratar-se-á da investigação, que versa sobre a relação entre a experiência didática citada e o problema da atitude dos alunos frente ao ensino de ciências, especialmente a física. O terceiro capítulo é dedicado a análise dos dados da pesquisa. Primeiramente serão expostos os dados obtidos com as entrevistas com os alunos selecionados e, após, haverá uma análise das mesmas com o objetivo de avaliar categorias pertinentes ao tema da investigação. Por fim, após a seleção das categorias de análise, haverá o confronto entre a fala dos alunos e o referencial teórico. Para finalizar, apresenta-se a conclusão. 12 CAPÍTULO 1 REFERENCIAIS TEÓRICOS Neste capítulo são expostos os fundamentos teóricos que servirão de subsídio para a interpretação dos dados da pesquisa. Parte desses fundamentos será utilizada de forma mais específica, e parte, de forma mais genérica. Os tópicos são subdivididos de tal maneira a contemplar os pilares teóricos da proposta didática de Augé (1996) com alguns aprofundamentos: construção do conhecimento científico e história da ciência; os estudos sobre atitude, em geral, e sobre atitude para com a ciência e seu ensino, em específico. 1.1 – TEORIAS DE APRENDIZAGEM E O ENSINO DE CIÊNCIAS 1.1.1 – EPISTEMOLOGIA CONSTRUTIVISTA Não é incomum ouvirmos falar sobre o construtivismo, em ensino construtivista, das implicações possíveis para o ensino de ciências e também das várias linhas construtivistas existentes. Neste trabalho, porém, iremos nos ater ao construtivismo no âmbito da psicologia cognitiva, isto é, aquele que se ocupa da cognição ou como se procede à construção do conhecimento no indivíduo (MEES, 2004, p. 28) Piaget é considerado um dos pioneiros no enfoque construtivista associado à cognição humana. Muitas vezes, o construtivismo é associado quase que exclusivamente a Piaget, quando na verdade ele é mais um defensor de que o conhecimento humano é uma construção do próprio homem (Ibid.) Moreira (1999, p. 96) destaca os quatro períodos gerais de desenvolvimento cognitivo presentes na teoria piagetiana: sensório-motor, préoperacional, operacional-concreto e operacional formal. O período sensório-motor acontece desde o nascimento da criança até que ela tenha cerca de dois anos de idade. Nesse período, a criança não 13 diferencia o seu eu do meio que a rodeia. Nota-se um egocentrismo muito marcante nessa fase, pois a criança acredita ser o centro e os objetos existem em função dela. O período pré-operacional costuma durar dos dois aos sete anos, em média. Uma nova etapa no desenvolvimento da criança inicia-se com o uso de imagens, linguagem e símbolos mentais. Nesse estágio a criança começa a organizar seu pensamento. Por exemplo, ao ser apresentada a um copo fino e alto contendo a mesma quantidade de líquido que um copo baixo e largo, ela sempre apostará que o primeiro tem maior conteúdo. O operacional-concreto, que se inicia aproximadamente aos oito anos e costuma se estender aos doze, caracteriza-se por uma maior organização do pensamento por parte da criança e uma significativa diminuição do egocentrismo. Nessa fase a criança já é capaz de fazer distinção entre altura e volume. Ela já consegue entender a conservação da quantidade de liquido com a mudança de recipiente. O período operacional-formal inicia-se por volta dos doze anos e se estende à fase adulta. Nessa fase o raciocínio já acontece em nível abstrato, não mais havendo necessidade de objetos concretos. A assimilação, acomodação e equilibração são consideradas conceitos chaves, pois são nesses conceitos, de acordo com Moreira (1999, p.100), que está o construtivismo da teoria de Piaget. Moreira e Ostermann (1999 apud1 MEES, 2004, p.29) destacam o seguinte: Na assimilação, o organismo (i.e. a mente) não se modifica, pois já tem esquemas de assimilação para incorporar a realidade. Por exemplo, quando se aprende que plantas também são seres vivos, estas são incorporadas ao esquema “ser vivo”. Quando se mede uma distância, usa-se o esquema “medir” para assimilar a situação. Na acomodação, o organismo se desenvolve através da construção de novos esquemas a fim de poder assimilar a situação. A equilibração se refere ao processo auto-regulador da criança pelo qual ela progressivamente atinge níveis mais altos de equilíbrio durante o desenvolvimento. MOREIRA, Marco Antônio; OSTERMANN, Fernanda. Teorias Construtivistas. Porto Alegre: Instituto de Física – UFRGS, 1999. 1 14 Para Moreira (1999, p.102), a acomodação somente acontece quando uma informação ou conhecimento não encontra precedentes para que possa haver assimilação, necessitando de uma nova estrutura. Ao ser atingida a acomodação, haverá novamente um equilíbrio e novas informações poderão ser incorporadas a esse novo esquema. O desenvolvimento cognitivo se dá por sucessivos processos de equilíbrio e desequilíbrio em estágios cada vez mais complexos. A teoria de Piaget tem como implicações na educação a necessidade do professor ter a sensibilidade de identificar o estágio de desenvolvimento da criança ou adolescente para que possa haver uma efetiva comunicação entre eles. Cabe também ao educador ativar processos de equilíbrio e desequilíbrio no educando, tendo o cuidado de fazê-lo no nível de desenvolvimento cognitivo do educando, a fim de que ele possa chegar, através de um novo esquema de assimilação, novamente ao equilíbrio (Ibid., p.103). 1.1.2 – APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA David Ausubel era médico-psiquiatra de formação, mas dedicou sua carreia acadêmica à psicologia educacional. A idéia central da teoria de Auzubel é a de que o fator isolado mais importante influenciando a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já sabe (MOREIRA, 2006, p.17). Na teoria de Ausubel, um dos conceito mais importante é a aprendizagem significativa, que se trata de um processo pelo qual uma informação nova se relaciona com um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do individuo. Isso quer dizer que a nova informação se relaciona com uma estrutura de conhecimento específica, definida por Ausubel como subsunçor, que já existe no sujeito. A aprendizagem significativa ocorre quando a nova informação ancora-se em subsunçores relevantes preexistentes na estrutura cognitiva de quem aprende. O processo de ancoragem da nova informação resulta em crescimento e modificação do conceito subsunçor (MOREIRA, 2006, p.19). O armazenamento de informações na mente humana é visto por Ausubel como um processo altamente organizado, onde uma hierarquia 15 conceitual é formada e na qual elementos mais específicos de conhecimento são relacionados a conceitos e proposições mais gerais (Ibid., p. 17). Em contraste com a aprendizagem significativa, Ausubel define a aprendizagem mecânica como sendo aquela em que novas informações não se relacionam a conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. Nesse caso, a nova informação é armazenada de maneira arbitrária, pois não há interação entre a nova informação e aquela já armazenada. Ausubel não dicotomiza aprendizagem significativa e aprendizagem mecânica. A aprendizagem mecânica é sempre necessária quando um indivíduo adquire informação numa área de conhecimento completamente nova para ele. À medida que a aprendizagem se torna significativa, esses subsunçores vão ficando cada vez mais elaborados e mais capazes de ancorar novas informações (Ibid., p.18). Em crianças pequenas, os conceitos são adquiridos mediante um processo conhecido como formação de conceitos, que é a aquisição espontânea de idéias genéricas por meio da experiência empírico-concreta. Ao atingir idade escolar, a maioria das crianças já possui um conjunto adequado de conceitos que permite a ocorrência da aprendizagem significativa por recepção. A assimilação de conceitos é a forma pela qual as crianças mais velhas e os adultos adquirem novos conceitos pela recepção de seus atributos com idéias relevantes já estabelecidas em sua estrutura cognitiva (Ibid., p. 20). De acordo com Moreira (Ibid., p. 21), a aquisição de conceitos por meio de aprendizagem receptiva não é apenas um processo passivo de internalização. Apesar de não ser do mesmo tipo do da formação de conceitos, é basicamente caracterizada por um processo ativo de interação com os conceitos já adquiridos. Para Ausubel (1968, p. 37-41), a essência do processo de aprendizagem significativa está em que ideias simbolicamente expressas sejam relacionadas de maneira não-arbitrária e não literal ao que o aprendiz já sabe, ou seja, a algum aspecto relevante da sua estrutura de conhecimento. Segundo Moreira (2006, p. 32), Auzubel sustenta o ponto de vista de que cada disciplina acadêmica tem uma estrutura articulada e hierarquicamente organizada de conceitos que constitui o sistema de informações dessa disciplina. Acredita, prossegue Moreira, que esses 16 conceitos estruturais podem ser identificados e ensinados a um aluno, constituindo para ele um sistema de processamento de informações, um verdadeiro mapa intelectual que pode ser usado para analisar o domínio particular da disciplina e nela resolver problemas. Percebemos, portanto, que a teoria de Auzubel é construtivista e o papel da interação professor-aluno é importante para, a partir dos subsunçores que o aluno possui, construir novos subsunçores e modificar os antigos. Dentre algumas implicações da teoria de Auzubel para o ensino, Mees (2004, p. 35) destaca o papel fundamental por ele atribuído ao conhecimento prévio, cabendo ao professor: • Organizar o conteúdo a ser ensinado, partindo da visão geral para chegar ao conteúdo específico. • Identificar quais subsunçores o aluno deve ter para que aprenda de maneira significativa determinado conteúdo. • Verificar o que o aluno sabe do assunto a ser ensinado e, caso lhe falte subsunçores, de uma forma ou outra, levar o aluno a adquirir estes subsunçores. 1.2 – HISTÓRIA DA CIÊNCIA “Se vi mais longe que alguns outros homens, foi por me colocar nos ombros de gigantes”. No dia 5 de fevereiro de 1675, Isaac Newton resumia a história da astronomia numa carta ao seu colega cientista Robert Hooke. Em apenas uma frase, Newton foi capaz de suscitar os esforços de incontáveis homens e mulheres na busca por compreender o cosmos. Utilizar a história da ciência no ensino de física pode melhorar a compreensão dos conteúdos trabalhados em sala de aula. Defendemos então o ensino de física sob um enfoque histórico, na busca por relações significativas especialmente na comparação da construção do conceito cientifico com o do aluno. (VILLATORRE, 2009. p.126) Para os alunos, é estimulante perceber as relações que unem a construção de determinado conceito científico e as características de seu universo cultural (VILLATORRE, HIGA, TYCHANOWICZ, 2009, p.133). 17 É possível promover a reflexão e análise entre os saberes do aluno e o saber científico estabelecendo estratégias para uma reformulação do sistema cognitivo dos indivíduos. Essa reformulação tende a ser bem-sucedida à medida que leva a uma construção de consciência dos alunos no que se refere à diferença entre sua forma de pensar e a formulação cientifica sobre determinado assunto (VILLATORRE, HIGA, TYCHANOWICZ, 2009, p.132). Diversos autores observam a importância da história da ciência nos diversos níveis de ensino. Matthews (1995), uma importante referência nos estudos sobre o uso da história da ciência no ensino, apresenta pontos importantes para o uso da história das ciências no seu ensino. Dentre elas, destacamos: 1. A história da ciência não deve ser incluída no ensino como mais um item do currículo, mas deve ser incorporado à disciplina para dar uma maior abrangência aos estudos. Estes, quando consideram aspectos históricos, filosóficos e sociológicos, melhoram e enriquecem a compreensão dos conteúdos. 2. Existe uma relação significativa entre “episódios da história da ciência” e a “herança cultural” das pessoas. 3. O ensino de ciências que usa de aspectos históricos e filosóficos em suas reflexões humaniza as idealizações científicas, tornandoas mais compreensíveis. 4. A história e a filosofia das ciências apoiam o estudo dos conteúdos científicos ao se traçar relações com as concepções prévias e a mudança conceitual. Pode-se perceber que o estudo dos contextos históricos com seus elementos e relações desperta, motiva e melhora a compreensão ao considerar o processo de sua construção, pois transforma o aluno de mero espectador em sujeito de sua aprendizagem, principalmente quando humaniza esse ensino através de sua história (VILLATORRE, HIGA, TYCHANOWICZ, 2009, p.129). De acordo com Villatorre, Higa e Tychanowicz (Ibid., p.130), professores que têm um interesse especial por elementos históricos dos conteúdos científicos, objetivando a facilitação do entendimento dos alunos sobre o tema 18 abordado, vêm utilizando-se de relações significativas para a construção de um conhecimento que permita aos alunos compreender o mundo cientifico. Entende-se que apresentar os conceitos científicos destacando sua construção leva certo “conforto” ao estudante quando este percebe a proximidade entre sua forma de pensar e elementos presentes na história da construção das ideias científicas (Ibid., p.135). A reflexão sobre conceitos científicos, considerando o contraponto de ideias dentro de sua história e sobre a forma de pensar do aluno, pode ser um valioso mecanismo em favor da reformulação do discurso do indivíduo, desejando que o mesmo demonstre clareza na compreensão do discurso cientifico (Ibid., p.137). É importante que informações sobre a qualidade das interpretações históricas sejam trazidas nas fontes bibliográficas, a fim de evitar, por exemplo, “alegorias”, que podem desvirtuar o raciocínio do aluno para outros pensamentos fora dos conceitos pretendidos como, por exemplo, a contemplação de genialidades e feitos grandiosos (Ibid., p.131). O objetivo principal é que o enfoque histórico leve o aluno a perceber o tempo e a maneira como se constrói a ciência, os conflitos e os consensos que ocorreram entre cientistas e demais figuras ao longo da história (Ibid., p.131). Villatorre, Higa e Tychanowicz (Ibid., p.131) reafirmam que a importância desse enfoque recai sobre as relações e as ideias que vão auxiliar o processo cognitivo do aluno, pretendendo que este compreenda o complexo cientifico como uma construção humana que se dá através de muita pesquisa e esforço coletivo. 1.3 – ATITUDE No cotidiano, o termo atitude é utilizado para indicar pensamentos ou sentimentos de uma pessoa diante de coisas ou pessoas. As atitudes das pessoas tendem a se refletir na forma de falar, agir e de se comportar nas relações com outras. A psicologia social, na tentativa de compreender e explicar o comportamento humano, também utiliza o conceito de atitude. Durante o desenvolvimento da psicologia como ciência foram elaboradas algumas 19 hipóteses na tentativa de compreender o comportamento humano – os construtos hipotéticos. Denomina-se construto hipotético um processo ou entidade que supomos que existe, ainda que não seja mensurável. Um exemplo é a atração entre duas pessoas, pois essa é uma característica mais ou menos estável que pode ser detectada a partir dos elementos envolvidos nela e que são objeto de observação direta. Desta forma, os psicólogos consideram a uma atitude um construto hipotético e este deve ser definido pelas propriedades que lhe são atribuídas. Observemos definições de três autores distindos. Para eles, uma atitude é: • “Uma organização duradoura de processos motivacionais, emocionais, perceptivos e cognitivos em relação a algum aspecto do mundo do indivíduo”. (KRECH e CRUTCHFIELD apud SARABIA, 2000, p.122) • “Uma tendencia ou predisposição do indivíduo para avaliar um objeto ou símbolo desse objeto.” (KATZ e STOTLAND apud SARABIA, 2000, p.122) • “Uma predisposição relativamente estável da conduta em relação a um objeto ou setor da realidade.” (CASTILLEJO apud SARABIA, 2000, p.122) De acordo com essas definições, se o componente motivacional não estivesse presente, não poderíamos falar em atitude. Entendemos, então, que uma atitude envolve tanto um componente afetivo quanto uma tendência à ação. Quando a atitude se manifesta de maneira verbal, esta é denominada opinião. A partir da análise dessas conceituações o autor sintetiza seus elementos, formulando uma conceituação ampla de atitudes: “Podemos definir, então, as atitudes como tendências ou disposições adquiridas e relativamente duradouras a avaliar de um modo determinado um objeto, pessoa, acontecimento ou situação e a atuar de acordo com essa avaliação”. (SARABIA, 2000, p. 122) 20 As atitudes são compostas por três ítens básicos, que atuam de modo interrelacionado e que refletem a complexidade da realidade social. São eles: a componente cognitiva, a compenente afetiva e a componente de conduta. As atitudes “além de conteúdos concretos de ensino, impregnam a totalidade do processo educacional e ocupam um papel central em todo ato de aprendizagem. As atitudes guiam os processos cognitivos que conduzem a aprendizagem de qualquer tipo de conteúdo educacional, procedimental ou atitudinal” (ibid, p.136). A escola funciona como agente socializador e, por isso, sempre está num contexto gerador de atitudes. O processo educacional está num contexto de dinâmica de interação, onde cada estudante tem atitudes difentes em relação à outros estudantes, professores, disciplinas e a todos os elementos que compoe o universo escolar. As atitudes que cada aluno apresenta não foram ensinadas de maneira sistemática ou consciente. Isso levou os profissionais da educação a prestarem mais atenção aos processos de criação de atitudes. Assim como os conceitos e os procedimentos, as atitudes estão inseridas nos conteúdo de ensino e não constituem uma disciplina separada, pois são parte integrante de todas as matérias de aprendizagem. Em cada disciplina escolar é exigido o aprendizado de uma série de atitudes, que, em alguns casos, é comum a todas as disciplinas. A clara preocupação pelo ensino das atitudes concretas tem como objetivo principal conseguir que a aprendizagem dos conteúdos concretos seja mais produtiva e enriquecedora para o aluno. Isso faz com que o funcionamento da aula ocorra de maneira mais harmônica e as relações entre os atores do processo educacional sejam mais fluidas e satisfatórias. Acerca desse assunto, Sarabia (2000) afirma: Se as atitudes têm um objetivo ao qual se dirigem, a valoração que foi feita desse objetivo dependerá, primeiro, do conteúdo de cada uma das matérias ministradas (componente cognitivo); segundo, das relações afetivas e emocionais que existam dentro do grupo e da sua influência no indivíduo e, terceiro, do poder desse objeto para suscitar no sujeito uma disponibilidade para 21 realizar uma série de ações (trabalhos e grupo, debate, etc.). Assim, o aluno desenvolverá atitudes positivas ou negativas em relação a determinadas matérias não somente em função do conteúdo de cada disciplina, mas também e de um modo inevitávelmente inter-relacionado, em função do ambiente que for gerado durante a aprendizagem desses conhecimentos e das possibilidades que surgirão ao realizar uma série de atividades e de mostrar um comportamento que seja aceitável para os outros. (ibid, p. 137) O ensino de atitudes tem se mostrado complexo. Se, por um lado, a inclusão das atitudes amplia as pespectivas pedagógicas dos professores, por outro, o professor se vê sem um modelo unificado e é necessário realizar uma escolha. Na psicologia existe uma grande diversidade de modelos teóricos, mas há também uma consequente falta de acordo entre os autores. Essa amplitude na abordagem do tema das atitudes é enriquecedora para aqueles que se interessam pelo estudo da mesma, mas a inexistência de um modelo unificado leva a uma escolha que implica na limitação da aplicação de métodos na escola. Em contextos interativos, como na escola, um importante conceito se destaca: a socialização. Trata-se de um processo de aprendizagem ou aquisição de atitudes e comportamentos. Durante a vida, os indivíduos vivem diversas situações, de complexidade crescente, que os leva a modificar valores e atitudes. A sociedade submete o indivíduo a uma série de exigências diferentes, fazendo-o modificar sua postura diante de situações complexas. Sarabia (2000) observa que dois aspectos diferenciam processos de socialização de outros tipos de mudança aos quais o indivíduo é submetido. Para ele, “ somente as mudanças atitudinais e comportamentais que ocorrem através da aprendizagem se enquadram dentro do que chamamos de socialização” e “somente as mudanças no comportamento e nas atitudes que têm suas origens na interação com outras pessoas são consideradas produtos da socialização” (ibid, 139). Ao longo da vida escolar, meninos e meninas adquirem conhecimento, habilidades analíticas e verbais e aprendem a trabalhar com uma série de 22 instrumentos e técnicas. Além disso, para o bom funcionamento da instituição de ensino e o bom convívio entre os indivíduos, é necessário que uma série de normas e papéis sejam internalizados. Para que isso aconteça, crianças e adolescentes aprendem uma série de atitudes sobre si mesmos, sobre os outros e sobre o mundo que os cerca. Com a inserção na escola, a criança é submetida a uma avaliação pública por parte do professor, das outras crianças e de sua família. Um dosobjetivos da escola é que o aluno tenha sucesso pessoal e isso reflete-se no método de avaliação (ou reprovação) das atuações pessoais. Além das conquistas pessoais, a escola valoriza outros fatores, como a acomodação do indivíduo à ordem estabelecida. A este último, os traços de personalidade influenciam de maneira marcante. Os traços de persolidade, como a perseverança, a constância, o esforço e a complexidade intelectual estão associados à construção de atitudes, assim como fatores situacionais e que tenham relação com os demais membros da sala de aula. As atitudes e o comportamento são afetados pelo grupo no qual está inserido o indivíduo e, consequentemente, a aprendizagem escolar é um processo interacional (SARABIA, 2000, p. 141). Geralmente, nos primeiros anos escolares, as atitudes dos alunos ficam limitadas a uma imitação do modelo representado pelo professor ou do grupo no qual a criança está inserida, pois nessa fase o indivíduo busca evitar possíveis castigos ou favorecer possíveis recompensas. Mas ao longo da vida escolar, o aluno desenvolve um série de atitudes. Parte desse desenvolvimento depende da ideia ou definição que o aluno possui do papel do professor, outra parte depende da aproximação ou afastamento do comportamento dele em relação à essa definição e das respostas afetivas que o professor despertar no aluno (SARABIA, 2000, p. 142). Para Sarabia (2000) uma característica marcante do papel do professor em relação aos alunos é a mutabilidade. “Um professor representa a figura de autoridade enquanto dura o curso, mas essa figura muda a cada ano e também o conceito individual de autoridade” (Ibid. , p.150). O professor é a figura de autoridade da sala e como tal, pode usar recursos que julgue importantes para levar os alunos a ter uma série de atitudes e valores desejáveis. Mas os professores possuem recursos limitados 23 como figuras de autoridade. Sua atuação pode ser como conselheiro, amigo, especialista, professores, etc. Nem todos farão uso de seus recursos, pois eles não se comportam da mesma maneira e os alunos vão tendo consciência disso ao longo de sua trajetória escolar. Ao mesmo tempo, os alunos também não reagirão da mesma forma diante das diferenças dos professores. Durante a trajetória escolar, o professor é a principal - mas não a única – fonte de reforço social, positivo e negativo para os alunos. A atitude que um aluno desenvolverá diante de uma avaliação do professor dependerá da adequação entre a avaliação do aluno e do professor. Em algumas ocasiões, o professor avalia o aluno com reciprocidade, isto é, como avaliaria a si mesmo. Em outros momentos, o professor avaliará o aluno de maneira distinta da que se avaliaria. Quando o professor avalia o aluno mais negativamente que ele próprio, este pode se julgar injustiçado e mudar sua atitude em relação ao professor. Por outro lado, o aluno pode responder acusando a si próprio pelo fracasso, ao julgar-se com inteligência insuficiente ou inabilidoso. Este atentado contra sua auto-estima pode resultar na idenficação dos pontos falhos de sua conduta e leva-lo a estudar mais, a mudar de atitude (o que pode ou não refletir em seus rendimentos) ou ambas as coisas. No entanto, essa situação também irá exercer influência na crença de que o professor tem ou não boa vontade em relação ao aluno. Este seria um caso de atribuição situacional, de identificação das causas das atitudes e o comportamento pessoal no meio físico e social. Embora nos pareça natural a afirmação de que preferimos os que nos avaliam positivamente, alguns autores sustentam que as pessoas julgam as avaliações de outros com agrado sempre que sejam consideradas corretas (EISER, 1989, apud2 SARABIA, 2000, p.151). Uma avaliação superior aquela que o indivíduo considera justa pode neutralizar os efeitos da recompensa. Os alunos tenderão a aceitar mais facilmente as avaliações do professor, quando avaliarem de forma positiva o seu poder de especialista ou perícia (ibid, 152). No âmbito escolar, crianças e jovens estabelecem uma relação voluntária de amizade com outros de idades semelhantes. Na escola há o 2 EISER. J. R. Psicologia Social. Madrid: Ediciones Pirâmide, 1989. 24 encontro involuntário de sujeitos que estão expostos as mesmas pressões acadêmicas e esse ambiente é muito propício ao surgimento de grupos de pares. Frequentemente, esses grupos se desenvolvem numa direção oposta com respeito aos principais objetivos da socialização da instituição. Esse efeito se dá principalmete na adolescência. A socialização de grupos tem um efeito decisivo em três grandes áreas do desenvolvimento da criança, de acordo com Sarabia (2000, p.153): 1. Desenvolvimento do autoconceito e de valor pessoal. Para alguns pesquisadores, a escola investe contra a auto-estima do estudante, pois apresenta diversas possibilidades para o fracasso (inclusive público) e os grupos de pares ofereceriam a possibilidade de restaurar ou fortalecer a auto-estima do estudante diante do fracasso acadêmico. 2. O desenvolvimento da competência na apresentação da pessoa diante de seus semelhantes por meio do desempenho do papel de aluno e da demonstração de certas capacidades e habilidades que não se mostram normalmente na sala de aula. 3. A aquisição de conhecimentos considerados tabu. Podemos chamar este último ponto de “currículo extra-escolar”, pois tem influências como a leitura extra-acadêmica, meios de comunicação em geral (especialmente a televisão) e grupos de pares de vizinhança. Um papel de enorme relevância é desempenhado na criação das atitudes. Muitas fontes evidênciam a inter-relação entre amizade e comunicação. Uma parte importante da amizade é colocar-se em situações que facilitam a comunicação, o intercâmbio de informações e a mútua transmissão e recepção de estimulação. Fatores como proximidade geográfica, comunicação, intercâmbio de informações e semelhanças de papéis favorecem a semelhança de atitudes e os processos de identificação e atração. Ao longo da vida, o indivíduo ocupa diferentes papéis, interage com pessoas de diferentes status e vê-se sujeito a uma mobilidade geográfica e social que contribui para a descontinuidade de papéis. Todos esses fatores influem e pressionam o indivíduo para que modifiquem suas atitudes e valores e mudem ou ajustem suas condutas às novas situações que se vêem 25 envolvidos. Portanto, as atitudes são realidades dinâmicas e mutantes e estão sujeitas a um contínuo processo de aprendizagem que têm lugar na ação. A tentativa deliberada por parte de uma pessoa ou grupo de influênciar nas atitudes ou condutas de outros, com o objetivo de modificar essas atitudes ou comportamentos, recebe o nome de persuasão (Vander Zanden, 1990, p.222). De acordo com Secord e Backman, o conceito de influência tem lugar quando “as ações de uma pessoa são condição para as ações de outra pessoa”. A diferença entre persuasão e influência reside, de acordo com tais definições, no fato de a primeira envolve mais intensionalidade que a segunda. Isto é, podemos influenciar uma pessoa de forma não-intencional, mas, nunca haverá uma tentativa de persuadir uma pessoa sem que essa seja a intenção. Ensinar envolve diversos processos de influência e persuasão no sentido de propor como objetivo ensinar atitudes, valores e comportamentos que com frequência exigem o abandono daqueles previamente aprendidos. Durante o processo de planejamento do ensino de atitudes na escola é preciso ter como um de seus critérios básicos de orientação a necessidade de adequar a seleção de atitudes que se pretende incitar aos valores e normas encontrados na sala de aula e na escola como um todo. CAPÍTULO 02 26 METODOLOGIA Neste capítulo apresentar-se-á, inicialmente, uma descrição detalhada da experiência didática (AUGÉ, 1996) a partir da qual se obteve os dados para a pesquisa, e a seguir, tratar-se-á propriamente da investigação, que versa sobre a relação entre a experiência didática citada e o problema da atitude dos alunos frente ao ensino de ciências, especialmente física. 2.1 – O ENSINO Segue uma descrição detalhada do material didático e sua relação com livros didáticos. Será feita também uma caracterização do ambiente de aplicação da proposta didática. 2.1.1- O MATERIAL DIDÁTICO Uma proposta didática deseja que haja a construção de conteúdos, sejam eles verbais, procedimentais ou atitudinais (POZO; GÓMEZ CRESPO, 1998). Portanto, uma reflexão permanente sobre os processos envolvidos na implementação da proposta se faz necessária para que ajustes sejam procedidos. Tal reflexão deve inspirar-se em aspectos relevantes, como, por exemplo, se os conhecimentos prévios estão sendo devidamente valorizados, se os conteúdos estão sendo apresentados de forma significativa e estão adequados ao nível de desenvolvimento cognitivo do aluno, se os desafios são alcançáveis e promovem conflito cognitivo, se os mesmos desafios são fomentadores de atitudes favoráveis pelo conteúdo e respeito ao grupo, se estimulam a auto-estima, se promovem o ‘aprender a aprender’ e a pensar criticamente, dentre outros aspectos (ZABALA, 1998). Novas propostas de ensino devem ser pensadas considerando as diversas concepções pedagógicas e a adequação do conteúdo de cada ciência especifica. Nessa nova formulação, os aspectos que podem ser mais relevantes são: valorização do aprendiz como sujeito da aprendizagem (já proposto pela Escola Nova); valorização das concepções prévias (obstáculos epistemológicos) que o sujeito possui a respeito de determinado tema; 27 adequação dos objetos de ensino às estruturas cognitivas do aprendiz; postura docente que privilegie o diálogo com o educando; valorização da experimentação por meio de situações-problema que permitem o contato com o objeto do conhecimento, enfocando sua dimensão interdisciplinar, sempre que possível; ênfase na construção não apenas de conteúdos verbais, mas também, procedimentais e atitudinais; valorização das relações sociais no aprendizado, momento propício para confronto de idéias (AUGÉ, 2004). De uma forma genérica, o material didático (anexo I) da proposta de ensino aqui investigada segue os seguintes passos: a) Coleta das ideias dos alunos (por escrito) através de perguntas instigadoras; b) Colocação de uma problemática no âmbito da ciência, seja na forma de um ‘obstáculo epistemológico’, de um paradoxo científico ou de uma curiosidade científica, de um experimento desafiador ou de um problema tecnológico; c) Leitura de cunho histórico sobre o tema com o intuito problematizador; d) Leitura sobre o desenvolvimento do tema com ênfase na história da ciência; e) Perguntas que demandam tomada de posição por parte dos alunos, agora de posse das idéias aceitas pela comunidade científica, e comparação com o item a; f) Sistematização do conteúdo aceito cientificamente. A proposta pode ser chamada de ‘pluridimensional’ em dois aspectos: primeiramente por valorizar algumas tendências no ensino de física, como a utilização da história da ciência; em segundo lugar, por absorver aspectos de diversas tendências em pedagogia e recursos didáticos. Sem seguir rigorosamente uma tendência pedagógica específica, esta proposta encontra ressonância em estratégias que valorizam a participação e as concepções do aluno, discussões, registro de postura discente como elemento integrante da proposta. Poder-se-ia classificar tal postura como um ‘projeto’ altamente direcionado. Há flexibilidade para que o aluno imprima ritmo 28 próprio aos trabalhos, tendo apenas que cumprir um prazo final correspondente a um tema específico. Tratando-se especificamente no ensino de ciências, pode-se associar a proposta didática aqui investigada com o modelo de ensino apresentado por Gil Perez (1983), caracterizado por estar de acordo com o processo de produção científica, chamado de modelo de ensino e aprendizagem por investigação. Tal proposta, segundo Gil Perez (1986), valoriza, dentre outros aspectos, o trabalho em equipe, a participação do aluno na formulação de hipóteses e a construção discente de modelos explicativos. O intento é fomentar nos alunos “uma imagem menos linear e mais criativa” do trabalho cientifico (Ibid., 118). O tema do material didático é a astronomia, o estudo dos astros, teoria da evolução do Universo e evolução estelar. Utilizando esse tema, é possível o estudo da física como um todo, desde mecânica (estudo do movimento dos corpos) a física moderna (relatividade geral e física quântica), passando pela termodinâmica, óptica, acústica e eletromagnetismo. A questão que se evidencia é: de que maneira a física pode ser explorada no contexto astronômico? O material apresentado aos alunos é de autoria do docente e privilegia a história das ciências da natureza. Galileu, Newton e Einstein podem não ser reconhecidos especificamente como astrônomos, como Ptolomeu, Copérnico e Kepler, mas seus trabalhos foram essenciais à Astronomia e, reciprocamente, esta foi essencial para seus trabalhos. Ao investigar o Universo e, nosso lugar nele, a Astronomia adquire um significado especial, tornando-se um estudo fundamental para a cultura humana, de forma que uma educação voltada para a construção da cidadania não poderia abrir mão desse tema. Com base nas considerações acima expostas, a proposta foi organizada na seqüência histórica tradicional, focada em grandes temas ligados a Astronomia. Num primeiro momento, apresenta-se um breve relato da busca da compreensão do céu pela humanidade ao longo da história, passando rapidamente por algumas visões cosmológicas antigas, pela concepção de Universo da Grécia clássica, pelo sistema geocêntrico de Ptolomeu, 29 predominante no ocidente por muitos séculos, chegando ao heliocentrismo de Copérnico. Na sequência, a análise do sistema solar é o foco, assim como a teoria da gravitação, iniciando por uma contextualização histórica dos trabalhos de Copérnico, Tycho Brahe, Kepler, Galileu e Newton, passando pela apresentação do conhecimento que temos hoje sobre objetos que compõem o Sistema Solar. Logo após, discute-se teorias de surgimento e evolução do Universo, com particular ênfase na teoria do Big Bang. Após, o foco de estudo é a evolução estelar, que começa com a localização do Sistema Solar na galáxia e inclui noções da interpretação quântica dos espectros ópticos da luz emitida por estrelas e da classificação dos astros de acordo com o diagrama H-R3, além de uma discussão referente à formação dos elementos químicos a partir das reações nucleares. Tradicionalmente, a astronomia não costuma ser tratada no ensino médio. No Brasil, o estudo do Sistema Solar está delegado à geografia ainda no ensino fundamental, enquanto gravitação é estudada no ensino médio, em física. Dos diversos livros didáticos analisados, a maioria não contempla a astronomia (ALVARENGA; MÁXIMO, 2010; SANT’ANNA et al., 2010; YAMAMOTO; FUKE, 2010; TORRES et al., 2010). Apenas a coleção ‘Quanta Física’ (ALVES et al., 2010) possui uma parte do programa direcionado a astronomia e a utiliza privilegiando diversos assuntos tratados pela física, como uma forma de cumprir o currículo escolar. Dessa forma, torna-se desnecessária a inserção de uma nova disciplina no programa. A análise detalhada dos livros citados não é o objetivo desta pesquisa; as referências aos livros constituem apenas uma tentativa de situar o material didático aqui investigado. No texto didático apresentado por essa pesquisa, a inovação consiste na utilização da história da ciência inserida estruturalmente na condução do processo de ensino, através de texto didático de cunho construtivista. Além disso, foi repensada a ordenação dos conteúdos no sentido de sua Resumidamente, o diagrama de Hertzsprung-Russell é um gráfico de distribuição que mostra a relação entre a classificação estelar e a temperatura efetiva. 3 30 precedência histórica, ou seja, procurou-se seguir o encaminhamento histórico na construção dos conceitos. 2.1.2 – A SALA DE AULA A proposta foi aplicada no ano de 2012 em uma turma do primeiro ano do ensino médio matutino. A carga horária era de seis tempos de cinqüenta minutos cada e as atividades duraram três semanas. A proposta teve sua inserção autorizada pela professora, pois, a partir desse ano, esse conteúdo passou a compor o currículo mínimo de física para as escolas do Estado do Rio de Janeiro. Porém, a professora titular da turma é licenciada em matemática e apresenta dificuldades em trabalhar esse tipo de conteúdo com os alunos. A turma foi previamente sensibilizada para o trabalho a ser desenvolvido, não só quanto às características do material didático elaborado, como também quanto à sua participação como avaliadores da proposta. Frisouse a importância do engajamento de todos para o sucesso dos objetivos desejados, que eram a construção dos conceitos e possíveis ajustes na proposta didática. Inicialmente, um questionário (anexo II) com três questões discursivas foi entregue aos alunos. O objetivo era obter os conhecimentos prévios, gerar conflito cognitivo e possibilitar a construção gradativa dos conceitos. O material didático foi lido aos poucos, para eventual participação coletiva da turma, onde curiosidades foram levadas ao conhecimento de todos. Muitos assuntos apresentados em filmes foram evidenciados pelos alunos, principalmente os temas ligados ao fim da Terra. A cada etapa, uma pequena síntese era feita, sempre a cargo do docente. Vídeos4 também foram apresentados ao fim das discussões para reforçar o que foi discutido de uma forma diferente, onde o uso de animações propiciou o engajamento de todos sobre os fenômenos apresentados. Ao término dos trabalhos, foi realizada uma entrevista com o objetivo de avaliar a proposta o que será detalhado no próximo item. Foram apresentados vídeos da série “Poeira das Estrelas”, exibida originalmente no programa “Fantástico”, da Rede Globo, no ano de 2006. 4 31 2.2 – A PESQUISA Alves (1991) chama a atenção para as diversas denominações que uma pesquisa qualitativa possui: naturalista, pós-positivista, antropológica, etnográfica, estudo de caso, humanista, fenomenológica, hermenêutica, idiográfica, ecológica, construtivista, entre outras. Portanto, sua caracterização não se dá de forma simples, mesmo porque reflete origem e ênfase diversas. O termo qualitativo utilizado não quer sugerir uma oposição a quantitativo, constituindo-se uma questão de ênfase e não de exclusividade. Patton (1986 apud5 ALVES, 1991) identifica três características que, apesar de não constituírem um consenso absoluto, são tidas por diversos autores como essenciais aos estudos qualitativos: • Visão holística, que parte do princípio que a compreensão de um evento se dá em função da compreensão do contexto; • Abordagem indutiva, em que o pesquisador parte de observações mais livres e durante o processo de coleta e análise dos dados percebe as relevâncias; • Investigação naturalista, em que se minimiza a intervenção do pesquisador no contexto, apesar daquele ser o principal instrumento de investigação. O presente trabalho busca uma identificação com tais características e tem como foco o estudo das atitudes de alunos frente ao ensino de ciências, mais especificamente frente à experiência didática anteriormente detalhada. A avaliação de atitudes, no entanto, é um assunto em discussão. Sarabia (2000, p. 170) chama a atenção para o caráter abstrato das atitudes, pois esse conceito é uma construção hipotética dos psicólogos sociais. Avaliá-las implica em observar as manifestações verbais e/ou comportamentais do sujeito: “a linguagem e as ações manifestas das pessoas são [...] as ferramentas mais eficazes com as quais contamos para poder ter acesso e avaliar as atitudes” (Ibid., p. 170). O uso de questionários e escalas de atitude é comum no processo de manifestação das atitudes, verbais ou comportamentais. Há críticas a tais instrumentos, pois usam técnicas de pesquisa quantitativa para medir algo 5 PATTON, M. Qualitative evaluation methods. Beverly Hills: Sage Publ., 1986. 32 subjetivo; além disso, esses instrumentos pressupõem que uma mesma pergunta tenha o mesmo significado para todos os sujeitos (Ibid., 171). Na escola, o fator comportamental é um importante veículo de medição de atitudes. O professor, nesse caso, é um observador privilegiado, ocupando um papel semelhante ao de ‘observador participante’, em que exerce dupla função: de pesquisador e participante ativo dos acontecimentos que estuda (Ibid., 172). Nesse sentido, de posse da convicção de que o comportamento e a fala deixam pistas importantes sobre atitudes, torna-se possível proceder à análise dos dados na presente pesquisa. A seguir, apresentamos os critérios relevantes para a escolha dos sujeitos e detalhamos o processo de construção do roteiro de entrevistas. 2.2.1 - OS SUJEITOS O grupo alvo da pesquisa consiste de uma turma de 30 alunos do primeiro ano do ensino médio, matutino, composta por indivíduos de diferentes classes sociais e formação escolar diferenciada. Dentre os alunos da turma, quatro foram selecionados para fazer parte das entrevistas: Camila, Raquel, Tamires e Giovani6. Critérios para escolha dos entrevistados: Camila possui desempenho insatisfatório na disciplina física, não demonstrou interesse no início da proposta. Porém, teve um bom nível de interesse durante a aplicação, representando uma série de alunos do mesmo perfil. Raquel não possui um bom desempenho em física, mas demonstrou interesse desde o início. Tamires possui excelente desempenho em física e se mostrou interessada desde o início. Apesar da aptidão para os cálculos, não rejeitou a proposta por não contemplá-los. 6 Para garantir o anonimato dos sujeitos, foram criados nomes fictícios. 33 Giovani possui desempenho mediano em física e demonstrou muito interesse pela proposta. Muito curioso, fez diversas perguntas durante a aplicação da mesma. 2.2.2 – OS INSTRUMENTOS Observações docentes Durante a aplicação da proposta, chamou a atenção a curiosidade aguçada de alguns alunos. Um grupo, liderado por Giovani, pediu ao docente um material com mais informações “de física em astronomia”, como eles mesmos classificaram. O pedido desse grupo foi atendido, e o material sofreu alterações a fim de satisfazer curiosidades relacionadas, inclusive, com a física quântica, causando surpresa em Giovani a possibilidade de tratar astronomia e física quântica num mesmo contexto. De uma maneira geral os alunos se mostraram participativos e fizeram perguntas interessantes. Questionário prévio O objetivo do questionário era fazer com que os alunos pensassem nos fenômenos cotidianos e mostrassem se tem domínio ou não de temas relacionados ao cosmos. Após a realização dessas perguntas, muitos alunos começaram a se questionar se o que eles sabiam era correto. Alguns alunos, por exemplo, acreditavam que, durante o dia, não é possível ver as estrelas devido à presença de nuvens. Depois da aplicação do questionário, muitas perguntas foram feitas a fim de esclarecer se essa interpretação era ou não correta. Após reflexão sobre os dias que apresentam ausência de nuvens, os alunos procuraram outra explicação, que foi sugerida por um aluno que respondeu corretamente a questão. No geral, os alunos se mostraram bastante curiosos, apresentaram constantes trocas de opinião, compartilharam relatos de experiências vividas por eles, etc, o que gerou muita satisfação para a docente, pois o objetivo era a intensa participação dos alunos. 34 Roteiro de entrevista O roteiro de entrevistas (anexo III) possui um caráter semi-estruturado, sendo que a primeira e a última perguntas são mais abertas. O objetivo é coletar as impressões mais marcantes dos alunos com relação à estratégia didática e será alvo privilegiado no processo de categorização e análise dos dados. De acordo com Bogdan e Biklen (1994, p.209), as perguntas abertas garantiriam uma das características dos estudos qualitativos, que é uma maior preocupação com os “processos e significados”. A questão 1 tem como objetivo fazer com que o aluno verbalize suas lembranças das atividades realizadas por ocasião da proposta didática, evidenciando o que mais lhe chamou atenção. Esse momento tem importância singular na entrevista, pois propicia o afloramento das impressões mais marcantes e duradouras, fornecendo pistas para a análise dos elementos que tiveram influência na atitude dos alunos frente ao ensino do tema da física em questão. Como se deseja frisar a utilização da história da ciência inserida nos textos do material didático, um dos pilares teóricos da proposta didática, na questão 2 deseja-se saber quais momentos o aluno se recorda e qual sua impressão sobre a utilização desse recurso didático no ensino de ciências, se a história da ciência foi um elemento propiciador de mudança de atitude frente ao ensino de física. Na questão 3, o objetivo é levar o aluno a verbalizar sua impressão acerca da utilização de um tema que não costuma ser tratado no ensino médio, apesar do Governo do Estado do Rio de Janeiro ter inserido o assunto no currículo mínimo. A questão 4 tem como objetivo a verbalização por parte do aluno sobre o desenvolvimento da atividade. Deseja-se perceber se o modo como a atividade foi desenvolvida foi o satisfatório do ponto de vista didático, se o momento de desequilíbrio citado despertou um sentimento de desconfiança que, possivelmente, teria provocado uma tomada de consciência frente à necessidade de mais rigor e reflexão frente as concepções prévias. 35 Na questão 5 deseja-se saber qual foi o momento em que o aluno teve sua atenção despertada. Quais os possíveis conflitos foram gerados e se a explicação foi satisfatória para o aluno. A questão 6 propõe uma distinção entre o material didático e a dinâmica como um todo. Esta última pergunta retoma o objetivo da primeira, isto é, pretende evidenciar as impressões mais marcantes, que podem gerar pistas para a identificação dos elementos que mais contribuem para um possível incremento de atitude discente para o ensino de física. 36 CAPÍTULO 3 ANÁLISE DOS DADOS Este capítulo será dedicado à análise dos dados da pesquisa. Em primeiro lugar será apresentada a análise dos questionários aplicados antes do início das atividades. Após, a análise das entrevistas com os alunos selecionados: Camila, Raquel, Tamires e Giovani. Em seguida, encaminhar-seá uma análise das entrevistas, enfocando-se as perguntas norteadoras, ou seja, quais os pontos convergentes entre os entrevistados para cada tema abordado nas perguntas. Por fim, após a seleção das categorias de análise, haverá o confronto entre a fala dos alunos e o referencial teórico. 3.1- ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS A primeira questão deseja avaliar se os alunos entendem o motivo da impossibilidade de visualizar estrelas durante o dia. A maioria dos alunos respondeu que a luz do Sol é a responsável pela falta de visão, concepção cientificamente aceita. Porém, algumas respostas foram bastante criativas. Por exemplo: um aluno respondeu que as estrelas ficam invisíveis durante o dia, enquanto outro aluno acredita que as nuvens cobrem as estrelas. A segunda pergunta objetiva avaliar se os alunos compreendem por que os astros ficam ‘presos’ no céu, sem caírem na superfície terrestre. A maioria respondeu que esse fato se deve à força gravitacional. Apenas um aluno respondeu que eles flutuam no espaço. A terceira questão é, aparentemente, mais complexa. Quer saber se o aluno conhece o formato do planeta Terra e onde se localizam o Brasil, o Japão, a Lua e o Sol. Todos acertaram o formato da Terra, mas muitos não souberam explicar a localização dos dois países citados na superfície terrestre, além de explicar que a Lua orbita a Terra, enquanto esta orbita o Sol. Um dos objetivos desse questionário é fazer com que os alunos reflitam sobre suas próprias convicções de Universo. Esta atividade foi realizada antes que qualquer discussão sobre o assunto fosse feita, afim de não influenciar as respostas dos alunos. Posteriormente, o docente conduziu discussões sobre estes assuntos. O objetivo era mostrar aos alunos que há, ainda hoje, muitas 37 ideias semelhantes as que predominavam nas antigas civilizações. Foi comentado ainda que as idéias passadas não devem ser ridicularizadas ou ironizadas por parecerem estranhas ou absurdas, uma vez que são fruto do esforço intelectual de uma cultura e fundadas em conhecimentos e crenças próprias de determinado período histórico. 3.2 - ANÁLISE DAS ENTREVISTAS POR ALUNO Análise da entrevista com Camila 1 - Comentários gerais Com relação à primeira pergunta do roteiro, Camila inicia suas colocações chamando a atenção para o uso de vídeos como elemento facilitador do processo de ensino-aprendizagem de astronomia. “Os vídeos nos ajudaram a ver o que acontece no Universo. Também gostei de saber das curiosidades sobre o céu, tipo, buraco-negro, Big Bang, estrelas...”. 2 - História da ciência e sua utilização didática Apesar de se recordar da utilização da história da ciência, Camila não se recorda de nenhum episódio em específico, mas destaca que “foi maneiro, porque deu pra entender que as coisas não são descobertas de repente. Dá trabalho!”. Camila se refere ao uso mais comum da história da ciência, onde as descobertas científicas não são tratadas como uma construção, mas sim, como algo acabado e possível apenas para “mentes geniais”. 3 – Astronomia no ensino médio De acordo com Camila, “[...] faz falta estudar esses assuntos, porque é mais interessante. Além disso, o que deixa a física mais chata são as contas que a gente 38 tem que fazer. Desse jeito, eu entendi tudo e não precisei fazer conta nenhuma. Foi mais interessante.” Camila faz referência ao uso de um material teórico como uma alternativa ao método tradicional de ensino de física. É importante salientar que esse tipo de recurso não deve ser utilizado indiscriminadamente, pois a física se desenvolveu utilizando a matemática como ferramenta e é necessário que o aluno saiba trabalhar tanto com o aspecto teórico, quanto com a aplicação da matemática. A utilização de fórmulas para resumir teorias físicas é um dos recursos que a matemática oferece para maior compreensão de inúmeros fenômenos físicos. Porém, a interpretação de cada fórmula matemática aplicada na física irá depender do estudo da teoria. 4 – Comentário sobre a forma de desenvolvimento do trabalho “Foi bom.” Camila não quis fazer nenhum outro comentário acerca do desenvolvimento do trabalho. 5 – Assunto que mais chamou atenção Para Camila, a possibilidade de fazer perguntas sobre o assunto foi muito bom, pois “[...] a gente aproveitava o momento em que o assunto era discutido para fazer perguntas. É bom quando o professor responde na hora pra gente não esquecer e não desinteressar”. Camila demonstrou bastante interesse e alto nível de curiosidade durante a aplicação da proposta. De acordo com ela, foi à biblioteca pesquisar a respeito para se preparar para a próxima aula. 6 – Comentário geral sobre material didático e dinâmica Camila afirma que “[...] ‘a apostila’ é bem completa e interessante, mas muito longa, e como não ia dar tempo de ler tudo, o jeito que você trabalhou 39 lendo apenas algumas partes foi bom para não cansar e os vídeos fizeram diferença. Se fosse pra ficar lendo o tempo todo seria muito ruim.”, finaliza. O comentário de Camila não se aprofunda na questão sobre o conteúdo da proposta, evidenciando que não fez uma leitura completa do material. Fica claro que a utilização dos vídeos foi o que mais chamou a atenção da aluna. QUADRO - CAMILA 1- Comentários iniciais 2- História da ciência e sua utilização didática 3-Astronomia no ensino médio 4- Desenvolvimento do trabalho 5- O que mais chamou a atenção 6- Comentários material didático e dinâmica - Destaca a utilização de vídeos. -Não se recorda de nenhum episódio específico. -Entende o conhecimento como construção. -Acha interessante, mas foge ao tema quando desvia o assunto para a utilização da matemática pela física. -É bastante sucinta ao opinar. -Alto nível de curiosidade. -Interesse pelo assunto. -Pesquisa na biblioteca. -Acha o material didático completo e interessante. Análise da entrevista com Raquel 1 - Comentários gerais De acordo com a aluna Raquel, o conteúdo [astronomia] foi o aspecto mais marcante para ela. De acordo com a aluna, foi mais marcante porque “é diferente do que a gente realmente estuda na escola, pois não tinha matemática, era mais história”. 2 - História da ciência e sua utilização didática A parte histórica está presente em suas lembranças desde o início da entrevista, pois, esse foi o aspecto mais marcante do material didático. Quando questionada acerca da recordação de algum episódio da história da ciência, Raquel afirma que “por falarem muito, a gente sempre pensa no Galileu”, fazendo uma referência a programas de televisão. “Mas para mim”, continua, “um que chama a atenção é o Tycho Brahe e o fato dele ter perdido um pedaço 40 do nariz numa briga”. Ao ser questionada acerca da razão dessa lembrança, ela diz que essa foi uma informação a mais no material e que lhe chamou a atenção este fato. Mas para ela, sempre se destacarão Newton e Galileu, por serem os mais famosos. Sobre a utilização da história da ciência no material, Raquel afirma que “[...] foi bom utilizar a história da ciência porque é diferente do que a gente sempre estuda na sala de aula, chama mais a atenção e desperta a curiosidade”. “Como a gente vive num mundo onde muita coisa já foi descoberta, a gente não fica com grande curiosidade de saber como as coisas acontecem porque já descobriram isso pra gente. Mas aí, mostrando a curiosidade mesmo, aí a gente fica curiosa. Nos livros só falam de fulano, que ganhou isso, ganhou aquilo e só!”. 3 – Astronomia no ensino médio Raquel afirma que gostaria que o assunto fosse trabalhado no ensino médio, por ser um tema em que as pessoas têm curiosidade. “[...] Digo a maioria porque, afinal de contas, você não vai ensinar para apenas uma pessoa, mas para a maioria. Então, pro negócio funcionar, pra despertar a curiosidade das pessoas, astronomia é melhor, porque é muito provável que a pessoa vá querer saber”. 4 – Comentário sobre a forma de desenvolvimento do trabalho Sobre a utilização de vídeos, Raquel julga “[...] que foi válido pro que a gente estava fazendo ali na hora, mas não é uma coisa muito necessária para ser utilizada em todas as aulas”. Para a aluna, o desenvolvimento foi bom, pois garantiu o interesse dos alunos. No pós-aula, surgiram discussões sobre o assunto, interesse por pesquisa e consulta ao docente. “Depois da aula, eu e meus amigos procuramos saber mais.” 5 – Assunto que mais chamou atenção 41 De acordo com a aluna, a teoria do Big Bang teria lhe chamado mais a atenção. “Comecei a ler por curiosidade, mas achei o início meio confuso. Foi difícil aceitar aquela ideia de toda a matéria do Universo num ponto menor que um pontinho final numa folha, além dos elementos que tinha no início e que foram se juntando [...]. Foi meio difícil visualizar e aceitar. Mas depois da explicação, eu acho que entendi”. Fica evidente que a aluna recorda-se vagamente do conteúdo do material referente a esse assunto, mas o conflito cognitivo gerado parece ter sido marcante. 6 – Comentário geral sobre material didático e dinâmica Sobre o material didático, “foi um bom material”. Quando questionada sobre o fato de ter ficado um pouco longo, a aluna afirma que “[...] não ficou cansativo, pois o assunto é interessante”. “Quando você começa a ler, fica curioso pra saber o final, como num livro normal!”, afirma. Destaca o material didático, pois acredita que diversos elementos da dinâmica vão sendo esquecidos ao longo do tempo, mas é possível guardar o material para consultas posteriores. QUADRO - RAQUEL 1- Comentários iniciais 2- História da ciência e sua utilização didática 3-Astronomia no ensino médio 4- Desenvolvimento do trabalho 5- O que mais chamou a atenção 6- Comentários material didático e dinâmica - Destaca a utilização da história da ciência. - Faz referencia genérica à história da ciência e a Galileu e Newton. - Destaca a importância didática da contextualização proporcionada pela história. -Acha interessante a utilização da astronomia no ensino médio por despertar a curiosidade do aluno. -Acredita que a utilização de vídeos não é fundamental para a compreensão do conteúdo. -Teoria do Big Bang -Recorda-se vagamente do conteúdo do material referente a esse assunto, mas lembra do conflito cognitivo gerado. -Material didático interessante. -Destaca o material didático e a utilização da história no mesmo. 42 Análise da entrevista com Tamires 1 - Comentários gerais Para Tamires, “descobrir como o Universo foi formado” foi mais marcante. De acordo com ela, “é uma questão de curiosidade e de conhecimento também”. 2 - História da ciência e sua utilização didática Para Tamires, um episódio marcante da história da ciência “foi aquela parte que o Universo era como se fosse uma caixa”. Apesar de recordar-se acerca do uso da história da ciência no material, Tamires demonstra insegurança e imprecisão ao mencionar o modelo de Universo dos antigos egípcios. Esse modelo lembra uma caixa, comprida e estreita, com o lado mais longo acompanhando a direção do Rio Nilo e com as estrelas (na tampa) sendo sustentadas pelos deuses. De acordo com Tamires, ela se identificou com esse episódio porque, quando criança, tinha um modelo de Universo muito parecido com esse. Sobre a utilização da história da ciência no material didático, Tamires afirma “[...] que ajuda o aluno a entender como os povos antigos pensavam e é importante pra gente acompanhar a evolução do pensamento [científico]”. “Qualquer assunto, você tendo o conhecimento desde o início, sabendo como foi se desenvolvendo o processo, sabendo como as civilizações pensavam [...]. Quando acreditavam no místico para explicar coisas que eles não entendiam [...] a evolução foi acontecendo, então, eu acho que é muito importante estudar a história da ciência.” 3 – Astronomia no ensino médio Tamires entende que “[...] astronomia deveria ser incluída no ensino médio porque é um assunto bem atual e interessante de ser discutido”. Ela lembra que não é incomum a mídia noticiar algum assunto ligado à astronomia 43 e entende que tratar esse assunto em sala de aula ajuda a trabalhar o lado social, pois, quando a pessoa compreende o assunto tratado, ela está incluída. 4 – Comentário sobre a forma de desenvolvimento do trabalho “Foi bom, por que só de sair da sala de aula [as aulas foram ministradas na sala de vídeo da escola], do dia-a-dia, do quadro, de ficar lendo o livro [...]. O material estava bem ‘explicadinho’, a apostila estava muito boa [...] e o vídeo completando a explicação da professora nos deu um maior conhecimento sobre o assunto”. Tamires explica que é importante ter um material para levar para casa, pois constitui um material de consulta e os vídeos ajudam entender alguns assuntos e são mais dinâmicos que uma aula convencional. 5 – Assunto que mais chamou atenção Para Tamires, a frase final da apostila [“Somos todos poeira das estrelas”, Carl Sagan] chamou a atenção, pois, para ela, é sucinto e bastante verdadeiro: “depois que entendemos como os elementos que estão na tabela periódica se formam e que eles fazem parte da gente, essa frase faz todo sentido!”. 6 – Comentário geral sobre material didático e dinâmica Para Tamires, o material didático possui linguagem acessível, explicação completa e boas ilustrações. Destaca a utilização da história da ciência, pois facilita entender como se deu determinado conhecimento. Além disso, amplia a visão de mundo do estudante ao levá-lo a entender o contexto histórico que se deu determinada interpretação da natureza. QUADRO - TAMIRES 1- Comentários iniciais 2- História da ciência e sua utilização didática - Destaca a curiosidade sobre o assunto. - Faz referencia genérica a história da ciência. -Chama a atenção para o modelo de Universo dos antigos povos Egípcios. -Destaca a importância da utilização da história das ciências. 44 3-Astronomia no ensino médio 4- Desenvolvimento do trabalho 5- O que mais chamou a atenção 6- Comentários material didático e dinâmica -Classifica o tema como “interessante”. -Chama a atenção para o caráter social da astronomia. -Utilização de vídeos como elemento facilitador da aprendizagem. -Apostila como material de apoio e eventual consulta. -Formação dos elementos. -Material didático acessível. -Destaca a utilização da história. Análise da entrevista com Giovani 1 - Comentários gerais De acordo com Giovani, o conteúdo foi mais marcante para ele: “a parte que mais me chamou a atenção foi a que os gregos não testavam as idéias deles. Pra mim é muito obvio que você precisa testar alguma coisa!”. Giovani afirma ter o ‘conteúdo’ como parte marcante no trabalho, mas cita também o uso da história da ciência como relevante. 2 - História da ciência e sua utilização didática Giovani percebeu o uso da história da ciência e cita diversas passagens: “[...] o texto falava, por exemplo, de Copérnico, Galileu, Newton [...]”. “O uso da história foi bom pra saber o desenrolar das coisas - inicio, meio e fim -, como foi construída a ciência, as várias visões de um mesmo tema e como as coisas mudam com o passar do tempo”. 3 – Astronomia no ensino médio O discente afirma que “astronomia deveria ser mais abordada, porque o trabalho cientifico em torno da astronomia acaba influenciando em outras áreas também. Por exemplo, Galileu Galilei, estudando astronomia e procurando fundamento prático influenciou outros a buscar fundamento prático para o que estavam fazendo também”. 45 4 – Comentário sobre a forma de desenvolvimento do trabalho Giovani classificou o trabalho com a turma como ótimo. E justifica sua posição afirmando que “[...] a aula ajuda a tirar qualquer dúvida, porque a gente pode interromper o professor e fazer perguntas a qualquer momento, o texto estava bem detalhado e os vídeos servem pra ilustrar”. Quando questionado acerca da eficiência dos vídeos, Giovani explica que “[...] os vídeos explicam de um jeito diferente do professor, o que ajuda se ficou alguma dúvida. Você acaba tendo dois jeitos diferentes de falar da mesma coisa, que se complementam, e o vídeo tem o recurso da ilustração (o vídeo ilustrava o tempo todo como seria o sistema heliocêntrico e geocêntrico), mostra a cara dos filósofos e fica mais fácil guardar aquela ideia”. 5 – Assunto que mais chamou atenção Para Giovani, o fato de uma parte do texto falar de quântica no meio de um assunto ligado a astronomia chamou a atenção: “achei interessante que você enxertou um assunto que, a principio, não tem nada a ver. Quando a gente estuda astronomia, acaba sendo só uma aula de história”. 6 – Comentário geral sobre material didático e dinâmica Sobre a dinâmica como um todo, Giovani classifica o material como ‘bem escrito’ e os vídeos como ‘muito bem produzidos’. O aluno ainda destaca a importância da aula, quando afirma que “um assunto como esse de átomos e quantum precisa de um professor para explicar porque pode surgir alguma pergunta sobre o tema que só o professor para esclarecer. Além disso, dá pra perceber que essa explicação não é o objetivo do texto, mas complementa o assunto”. QUADRO - GIOVANI 1- Comentários iniciais 2- História da ciência e sua utilização didática - Conteúdo marcante. - Cita passagens da história da ciência. - Experimentos como parte relevante para ciência. - Cita história de maneira genérica. 46 3-Astronomia no ensino médio 4- Desenvolvimento do trabalho 5- O que mais chamou a atenção 6- Comentários material didático e dinâmica - Cita vários nomes relacionados à história. - Percebe ciência como construção humana. - Deve ser utilizada. - Chama a atenção para o caráter prático da astronomia. - Texto detalhado. - Aula expositiva como primeiro contato com o assunto. - Vídeos como recurso complementar à aula. - Conteúdo de física moderna na astronomia. - Material bem escrito. - Dinâmica como forma de esclarecer dúvidas. 3.3 – ANÁLISE DAS ENTREVISTAS POR QUESTÃO A primeira pergunta da entrevista deseja saber o que foi mais marcante para o aluno durante a realização da proposta e é particularmente relevante por coletar as impressões mais significativas para os alunos. Ficam evidentes as recordações dos alunos referentes ao material didático, item particularmente marcante em suas diferentes características. Com excesão da aluna Camila, que destacou a utilização dos vídeos, todos os outros citaram alguma caracteristíca do material didático. Dois dos alunos, Raquel e Giovani, destacaram a utilização da história da ciência no material didático, um dos pilares da proposta de Augé e que também foi alvo de comentários positivos pelos alunos. Por ocasião da pergunta que aborda este assunto (segunda), todos se recordaram vivamente. Um outro aspecto que é levantado pelos alunos é a forma como eles qualificaram a dinâmica, referindo-se a estratégias didáticas presentes no projeto didático como um todo. Camila destaca a utilização de um material puramente teórico para estudar física. Raquel diz que o projeto foi motivador e destaca a história da ciência presente no material didático. Tamires, por sua vez, faz menção a “curiosidade” como elemento motivador ao estudo da física. Giovani se refere à dinâmica quando afirma que teria proporcionado esclarecimento das questões, suscitando mais atenção dos alunos. Vale à pena observar que os temas levantados pelos alunos na primeira questão da entrevista antecipam os temas da maior parte das perguntas seguintes. Isso evidencia que as lembranças dos alunos estão em sintonia com os objetivos da entrevista. 47 Com relação à segunda pergunta, seu objetivo é sondar as recordações acerca da utilização da história da ciência no material didático e/ou na dinâmica. Todos os alunos apresentaram recordações acerca de sua utilização. Camila não se recordou de um episódio específico, mas citou as transformações do pensamento humano motivado pelo avanço do conhecimento, reconhecendo o mesmo (conhecimento) como uma construção humana. Raquel recorda-se de cientistas como Tycho Brahe, Newton e Galileu. Ela destaca a curiosidade como objeto motivador a aprendizagem. Tamires cita o modelo de Universo dos antigos egípcios e afirmou que a utilização da história da ciência leva o aluno a compreender a evolução do pensamento cientifico. Já Giovani recordava-se de diversos episódios da história da ciência e também a percebe como uma construção. Três alunos passaram a reconhecer o conhecimento como construção humana após estudo da história da ciência e, para Raquel, a história despertou a curiosidade, permitindo um aprofundamento dos conceitos. A ausência da astronomia no ensino médio foi o assunto da terceira pergunta da entrevista. Todos os alunos entrevistados concordam que o tema deveria ser mais abordado. Para justificar essa posição, dois deles (Camila e Tamires) afirmaram que é um tema interessante, Raquel destacou a curiosidade causada e Giovani fala da compreensão acerca da evolução da ciência, voltando a citar a evolução do pensamento científico. A forma como o conteúdo foi trabalhado é o tema da quarta pergunta. Camila foi bastante sucinta ao opinar. Demonstrou falta de entusiasmo ao responder essa questão, afirmando apenas que a dinâmica teria sido boa. Raquel julga interessante a utilização de vídeos, apesar de não julgar como algo essencial. O tema, porém, lhe causou bastante curiosidade e a forma de desenvolvimento, de acordo com ela, manteve alto o nível de interesse dos alunos. Tamires julga interessante a mudança de ambiente. Para ela, sair do ambiente da sala de aula para a sala de vídeo é uma mudança válida, que estimula o interesse. Ela também cita os vídeos como uma forma de reforçar a explicação do docente. Para Giovani, a dinâmica é um momento para discussão do tema e eliminação de possíveis dúvidas. Ele também avalia positivamente a utilização de vídeos. 48 A quinta pergunta busca o destaque, por parte dos alunos, de algum tema trabalhado. Nessa questão o aluno recorre a suas lembranças do momento da aplicação da proposta. Ainda assim, Camila não citou nenhum assunto específico. Raquel citou o Big Bang, Tamires citou a evolução estelar, motivada pela frase final da apostila e Giovani destaca assuntos ligados à física quântica. Inicialmente, este tema não estava presente no material, mas um grupo de alunos pediu ao docente para acrescentar “coisas interessantes de física”. Somente esses alunos tiveram acesso ao material modificado e Giovani foi um deles. A sexta pergunta busca um comentário geral sobre o material didático e/ou a dinâmica. Dois alunos destacaram a dinâmica e dois alunos destacaram o material. Camila julga a apostila como completa, porém longa. Por isso, destaca a dinâmica como ponto fundamental para manter alto o nível de interesse. Raquel discorda de Camila sobre o tamanho do material. Para ela, o material é o destaque por ser completo e interessante, o que não deixaria a leitura cansativa. Tamires também destaca o material didático e a utilização da história da ciência no mesmo. Giovani evidencia a dinâmica como forma de eliminar dúvidas. 3.4 - DIALOGANDO COM OS REFERENCIAIS TEÓRICOS O comportamento dos alunos, por ocasião da implementação da estratégia didática, está presente na fala dos alunos durante a entrevista e lança fortes suspeitas de um envolvimento atitudinal satisfatório para com o ensino de física nas circunstâncias observadas. Tal comportamento, identificado pelo docente durante a aplicação da proposta, foi um elemento que auxiliou a construção do roteiro de entrevistas. Camila estava bastante interessada e curiosa sobre o assunto durante a aplicação da proposta; Raquel pediu um livro emprestado para pesquisa (não costuma fazer isso); Tamires fez um estudo individual da apostila e Giovani e seu grupo de amigos solicitou ao docente um material mais completo para estudo fora do momento da aplicação da proposta. Sarabia (2000) salienta que avaliar atitudes pressupõe observar as manifestações verbais e/ou comportamentais das pessoas. Portanto, “a 49 linguagem e as ações manifestas das pessoas, são [...] as ferramentas mais eficazes com as quais contamos para poder ter acesso e avaliar as atitudes” (ibid, p.170). Segundo Eggen (1978), em psicologia, o comportamento não verbal é aceito como indicador de atitudes, o que sugere que em sala de aula o comportamento dos sujeitos seja preditor de atitudes, observa ele. Bloom (BLOOM; KRATHWOHL; MASIA, 1974, p. 124; 129) também sugere critérios indicativos se o sujeito encontra-se em situações relacionáveis a atitudes positivas. Dos critérios apresentados (Ibid., p. 124; 131) destacar-se-ão os seguintes: procura voluntária de livros de informação, interesse em participar ativamente de um projeto, contribuição para discussões em grupo, fazer perguntas pertinentes, interesse científico através de leituras, sentir prazer em realizar as atividades em sala e outras atividades em casa (como leituras), etc. Nesse sentido, de posse da convicção de que o comportamento observado pelo professor e recordado pelos alunos deixa pistas importantes sobre uma possível atitude positiva, é que se realizará esta etapa da análise da entrevista. A categorização dos dados da investigação se norteará pela possibilidade de fazer apreensões com relação às características da proposta, que possam clarificar a atitude positiva identificada pelo comportamento dos alunos. As questões da entrevista tem o objetivo de levar o aluno a verbalizar suas lembranças da ocasião da aplicação da proposta. Sarabia (2000) define atitude como uma tendência adquirida e relativamente duradoura a avaliar um acontecimento, por exemplo, e a atuar de acordo com essa avaliação (ibid., p.122). Ainda de acordo com Sarabia (ibid., p.122) “as manifestações verbais das atitudes são denominadas opiniões e expressam um posicionamento avaliativo ou preditivo da pessoa em relação ao objeto de sua opinião”. A terceira questão do roteiro de entrevistas objetiva incentivar o aluno na tomada de posição para expressar sua opinião acerca da não utilização da temática “astronomia” no ensino médio. Para finalizar esta análise abordar-se-ão dois aspectos da proposta que possuem implicações didáticas importantes, mas que se referem estreitamente ao estatuto epistemológico da física enquanto ciência: a história da física e o conteúdo de física. 50 História A história, um dos pilares da proposta de Augé (1996), é um recuso muito utilizado por educadores e frequentemente investigado por pesquisadores na sua relação com o fomento do ensino. Aqui, deseja-se lançar um olhar sobre a construção de atitudes mais positivas para com o ensino de ciências (física). Já na primeira etapa da entrevista, Raquel e Giovani fazem referência à história. Na etapa da entrevista cujo tema específico era a história, vários comentários interessantes são identificados. Os entrevistados recordam-se da presença da história inserida no texto da proposta e fazem algumas referências específicas, como o nome dos personagens Galileu, Newton, Copérnico e Tycho Brahe. Os alunos não descrevem momentos específicos da história referenciada no texto da proposta didática, mas todos os entrevistados apontam pontos positivos referentes à importância didática da história, principalmente a contextualização e facilitação do aprendizado. Para Camila, a história ajuda a compreender como se dão as descobertas científicas; para Raquel, a curiosidade foi fomentada; Tamires e Giovani tiveram a mesma interpretação: de que a história da ciência ajuda a compreender como o pensamento científico evolui. Raquel é a aluna que mais destaque dá à história como facilitadora do aprendizado. De uma maneira geral, os alunos destacam a facilitação do aprendizado. Segundo Mattews (1995), a tradição ‘contextualista’ defende que a história da ciência contribui para o ensino porque motiva os alunos; humaniza a matéria; promove uma melhor compreensão dos conceitos; mostra uma ciência mutável e instável; dentre outros aspectos. A contribuição da história com relação à atitude parece estar relacionada à compreensão dos conceitos. No entanto, a história da ciência também permite a construção de uma concepção de ciência dinâmica, em construção, sujeita a influências histórico-sociais, o que pode suscitar uma mudança de atitude por causa da nova visão que se constrói da ciência em contexto de ensino. Alguns alunos não se identificam com a física pelo fato de ser uma ciência marcada pelo rigor do formalismo matemático, tomando Camila como um exemplo. A história apresenta-se, assim, como um auxílio para amenizar tal 51 problema, introduzindo um ambiente de interdisciplinaridade que requer uma atenção a temas não ligados à matemática como, por exemplo, a caracterização histórico-filosófica referente ao desenvolvimento de uma determinada etapa da construção do conhecimento. Portanto, a história pode colaborar para o desenvolvimento de uma nova visão da ciência, o que pode influenciar em aspectos motivacionais do aluno (MARTINS, 1990, p. 4). Para Solbes e Vilches (1989), a imagem de ciência que chega aos alunos nas escolas através dos livros didáticos não leva em consideração aspectos qualitativos de caráter histórico, tecnológico, sociológico e humanístico. Para eles, esses aspectos podem contribuir para a construção de uma imagem de ciência mais próxima do trabalho científico e superar o desinteresse e atitudes negativas. Os autores sugerem que o enfoque Ciência, Tecnologia e Sociedade (C.T.S.) pode contribuir nesse sentido. Raquel foi uma aluna que deu um destaque maior à história, principalmente por facilitar o aprendizado. A importância dada por ela é relevante, pois foi uma aluna que se mostrou bastante impressionada com a estratégia, sendo sua atitude diante do ensino, no período aqui investigado, favorável. Sua preferência era pelas disciplinas da área humana, o que explica seus comentários. Tudo isso parece supor que a história da ciência teve um papel importante na atitude para com a intervenção didática. Segundo Castro e Carvalho (1992, p. 324), por intermédio da história, os alunos obtêm informação, “mas, sobretudo, desenvolvem atitudes”. Conteúdo Por fim, serão analisadas as recordações dos alunos sobre o conteúdo de física em específico. De uma maneira geral as principais lembranças dos alunos se referem aos nomes da ciência mais famosos. Já no primeiro momento da entrevista, Raquel e Giovani citam vários nomes, dando ênfase a importância dos trabalhos por eles realizados. Tamires destaca o modelo de universo dos antigos egípcios e demonstra entender que a ciência evolui utilizando modelos para explicar as teorias. Camila recorda-se da mudança de sua concepção de como se dão as descobertas científicas. Antes da aplicação da proposta, ela demonstrou 52 acreditar que somente pessoas com um dom específico poderiam fazer alguma descoberta científica. Portanto, houve uma aproximação da realidade científica com a compreensão do aluno. Raquel destaca o conflito cognitivo que lhe causou a teoria do Big Bang. O fato de ter ocorrido o conflito cognitivo mereceu comentários positivos por parte dos alunos, principalmente por despertar a curiosidade e o interesse, melhorar o nível de atenção e participação, suscitar o aprendizado autônomo e uma certa cautela diante das demais atividades. Tamires recorda-se da surpresa que sentiu ao descobrir que os elementos quimicos são formados nas estrelas. Giovani cita, surpreso, a possibilidade do estudo de aspectos ligados à física quântica inserido no tema ligado à astronomia. As lembranças dos alunos são relevantes, dado o distanciamento temporal entre a implementação da estratégia e a entrevista. No entanto, não era objetivo da entrevista fazer uma avaliação de conteúdo. Tentar fazer apreensões com relação à atitude para com o ensino, tendo como base as recordações dos alunos sobre conteúdo de física nesta pesquisa, não parece algo que se estabeleça explicitamente. Vázquez Alonso e Manassero (1997) salientam que as atitudes podem ser consideradas como causa e como efeito do aprendizado. Uma atitude positiva parece favorecer o aprendizado. Pode-se então dizer que se eles se recordam é por que possuíam atitudes positivas? Qual a influência da atitude sobre a retenção? A resposta a estas perguntas parece fugir aos objetivos dessa pesquisa. Vale frisar, no entanto, que os comentários dos alunos são indicadores de que houve um engajamento cognitivo que mereceria ser analisado com mais cautela. 53 CONSIDERAÇÕES FINAIS O conhecimento acerca da Astronomia, assim como os demais ramos da ciência, não deve ser considerado pronto. Durante a história, muitas teorias que eram consideradas definitivas foram abandonadas com a descoberta de novos fatos que elas não puderam explicar. Hoje, pode-se estar tão distante da resposta a perguntas sobre o Universo como os pensadores que imaginavam a Terra como sendo o casco de um barco virado de cabeça para baixo, com os limites circundados pelo mar. A astronomia está em constante evolução e o avanço tecnológico tem possibilitado a construção de equipamentos que vasculham, de maneira jamais realizada, desde astros mais próximos da Terra até os recantos mais afastados do Universo. Isso tem possibilitado a coleta de grande quantidade de dados e a produção de novos conhecimentos. Com frequência, jornais diários, revistas de divulgação científica e sites da Internet têm publicado novas descobertas nos vários campos da astronomia. Apesar da importância do tema, esse ainda é um assunto pouco discutido nas escolas brasileiras. Um passo para mudar esse cenário foi dado pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, ao incluir astronomia/cosmologia em seu currículo mínimo (anexo IV) do ensino médio. Porém, durante a execução desse trabalho, foi possível constatar o despreparo dos docentes em relação a esse assunto. Em seu currículo mínimo, o Governo do Estado do Rio de Janeiro propõe que o assunto seja tratado em um bimestre. O tempo utilizado para a aplicação desta proposta foi de três aulas geminadas. Esse tempo foi considerado insuficiente, pois diversos assuntos foram tratados com menos importância do que mereciam para que fosse possível contemplar outros assuntos. Portanto, um ponto deste trabalho que merece ser reconsiderado é o tempo de aplicação da proposta, sendo um bimestre letivo um período razoável para o desenvolvimento do mesmo. A pesquisa objetivou avaliar a atitude dos alunos frente ao ensino de física. Sarabia (2000, p. 170) salienta várias formas de avaliar e/ou qualificar a atitude. De acordo com ele, a linguagem e as ações manifestas das pessoas 54 são as ferramentas mais eficazes para poder ter acesso e avaliar as atitudes dos demais. A turma onde a proposta foi aplicada não havia tido contato anterior com o tema. De modo geral, demonstraram bastante interesse no assunto. A curiosidade foi uma constante durante e após a aplicação da proposta. Para avaliar se houve mudança de atitude dos alunos, após a aplicação da proposta, uma entrevista foi feita com quatro alunos, previamente selecionados. O comportamento foi o critério para a escolha dos discentes. Ainda de acordo com Sarabia (2000, p.172), na escola as atitudes podem ser avaliadas principalmente a partir do comportamento e atendendo às respostas dos indivíduos diante da mensagem persuasiva; noutras palavras, trata-se de avaliar se os alunos aprenderam as atitudes, observando se manifestam de fato os comportamentos que se pretendia lhes ensinar, como, por exemplo, se um aluno que normalmente se mostrava retraído e calado modifica o seu comportamento demonstrando uma maior participação e cooperação com seus colegas nas tarefas de grupo. Portanto, por meio da análise das respostas da entrevista, é possível dizer que houve fortes indícios de mudança atitudinal por parte dos alunos. A entrevista propiciou a observação de mudanças comportamentais como, por exemplo: procura voluntária de livros de informação, interesse em participar ativamente de um projeto, contribuição para discussões em grupo, fazer perguntas pertinentes, interesse científico através de leituras, sentir prazer em realizar as atividades em sala e outras atividades em casa (como leituras), etc. Porém, ainda que a pesquisa tenha obtido êxito, alguns aspectos da proposta poderiam sofrer alterações, a fim de tornar a experiência mais prazerosa. A utilização de experimentos em sala de aula é uma boa metodologia, pois possibilita aos alunos momentos únicos de contato prático com a matéria que está sendo lecionada. É importante considerar que a utilização da experiência como forma de aprendizagem é uma metodologia de ensino válida, pois instiga os alunos a buscarem e relacionarem o conteúdo aprendido com o experimento que está sendo exposto pelo professor. Assim, nas próximas investigações, o projeto será aperfeiçoado, tanto com relação ao tempo quanto a utilização de atividades experimentais. 55 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALONSO, Marcelo; FINN, Edward J. Física: um curso universitário. Trad. Giorgio Moscati – São Paulo: Edgard Blucher, 1972. Tradução de: Fundamental University Physics. ALVES, Alda Judith. O planejamento de pesquisas qualitativas em educação. Cadernos de Pesquisa, São Paulo: Fundação Carlos Chagas/Cortez, 77, p. 5361, maio 1991. AUGÉ, Pierre Schwartz. Uma proposta didática diferenciada e a atitude dos alunos frente ao ensino de ciências. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2004. AUSUBEL, D.P.; NOVAK, J. D.; HANESIAN, H. Psicologia educacional. 2oed. Trad. Eva Nick e outros. Rio de Janeiro: Interamericana, 1980. 620 p. Tradução de: Educational Psycology. BLOOM, B.S.; KRATHWOHL, D.R.; MASIA, B.B. Taxionomia de objetivos educacionais: domínio afetivo. 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Assim, como em outras culturas do mundo antigo, tinha-se ali um bom conhecimento do céu, representado principalmente nas atividades religiosas, ainda que não desprovido de sentido prático. Grande parte das cerimônias estava relacionada com agricultura e, entre os objetos celestes, o Sol era a principal divindade reverenciada. As festas mais importantes aconteciam em junho, no solstício de inverno no hemisfério sul, quando a duração da noite é a mais longa do ano, e em dezembro, no solstício de verão, quando a duração da 62 noite é a mais curta do ano. Até hoje, a predominância de imagens do Sol na arte andina tem a ver com aquele passado glorioso. A excelente qualidade visual do céu andino permitiu aos incas estabelecerem o conceito de constelações escuras, zonas negras dentro do conjunto brilhante da Via - Láctea, diferentemente da maioria dos povos, que as nomeavam de acordo com os grupamentos de estrelas. Nas manchas, eles viam diversas figuras representativas de animais, como a serpente, a perdiz e a lhama, animal de grande importância na cultura andina. Para os antigos egípcios, a Astronomia, além de ter caráter prático ligado à contagem do tempo, correspondia a uma visão de mundo relacionada ao rio Nilo, em torno do qual eles desenvolveram sua cultura. Seu modelo de universo era o de uma caixa comprida e estreita, com o lado mais longo acompanhando a direção do rio. A tampa da caixa era o céu, onde brilhavam as estrelas sustentadas pelos deuses. Essa tampa estava apoiada em montanhas, e correndo por trás delas havia um enorme rio, do qual o Nilo era afluente. Diariamente, o Sol e a Lua eram transportados nesse rio, do leste para oeste, por enormes barcos, e o caminho inverso era feito em um rio subterrâneo. Os eclipses solares e lunares eram explicados por ataques que os dois astros sofriam de serpentes que habitavam esses rios. No verão, em 63 virtude das inundações, o rio saía do leito, fazendo com que o sol ficasse mais alto no céu. Entre as diferentes tradições que contribuíram para a atual construção da compreensão do céu, uma das mais influentes foi a do pensamento da Grécia antiga, particularmente entre os séculos VI e V a.C. No século VI a.C., o grego Anaxímenes pensava nas estrelas como se estivessem presas a uma esfera de cristal que girava em torno da Terra. Não devemos estranhar essa teoria, pois a impressão que temos quando observamos as estrelas girando no céu é que, de fato, estão fixas e distribuídas nele, formando uma superfície curva. A “esfera das estrelas fixas” foi uma ideia tão plausível que passou a fazer parte das explicações sobre o universo até início dos tempos modernos, nos últimos séculos. O filósofo grego Platão propôs que o Universo era esférico e que todos os movimentos celestes eram perfeitos: circulares e uniformes. Essa idéia estética, mais poética que científica, representou para os astrônomos gregos um difícil problema, pois elaborar um sistema que descrevesse os movimentos dos planetas como realmente observados no céu – que não são circulares e uniformes – e satisfazem essa exigência foi uma tarefa de quase dois séculos. 64 A busca por nosso lugar no espaço – geocentrismo e heliocentrismo Muitos modelos de Universo foram elaborados pelos antigos filósofos gregos até chegar ao mais completo conhecido na antiguidade: o de Claudius Ptolomeu (90 d.C. – 168 d.C.), filósofo grego que viveu em Alexandria, no Egito. Em seu tratado de Astronomia, Ptolomeu descreve a Terra como sendo esférica e imóvel, localizada no centro do Universo, com todo o cosmos girando em torno dela a cada 24 horas. Cada astro tinha uma órbita circular, em ordem de distância da Terra: Lua, Mercúrio, Vênus, Sol, Marte, Júpiter, Saturno e, por fim, a esfera das estrelas. Entretanto, essa teoria sobre o Universo não era suficiente para explicar todos os movimentos no céu que os astrônomos observavam. Para dar conta da complexidade dos movimentos planetários, o astrônomo e matemático grego Hiparco (190 a.C.- 126 a.C.) desenvolveu a ideia dos epiciclos, circunferências adicionais, de raio menor que o da órbita do planeta e com seu centro localizado sobre essa órbita. No entanto, Hiparco só aplicou os epiciclos para as órbitas do Sol e da Lua, tendo Ptolomeu generalizando para os demais planetas. Complicado? Basta pensar numa roda-gigante. Enquanto ela gira, as gôndolas penduradas nela precisam também girar, para que as pessoas dentro não fiquem de cabeça para baixo. E esse conjunto de círculos associados a círculos (chamados de epiciclos e deferentes) era razoavelmente eficiente para explicar e prever os movimentos celestes, de forma que passou quase quinze séculos sem ser questionado seriamente. Mas isso não duraria para sempre. No século XV, as ideias do monge polonês Nicolau Copérnico (1473-1543), passaram a ser levadas em conta como alternativa à ideia de Ptolomeu. Para Copérnico, o Sol era o centro do Universo e todos os planetas estavam presos a esferas cristalinas que giravam ao seu redor. Essa visão do Universo acabou substituindo, após algum tempo, a de Ptolomeu. O sistema de Universo proposto por Ptolomeu é conhecido como geocêntrico (a Terra, geo em grego, no centro) e o de Copérnico como heliocêntrico (o Sol, hélios em grego, no centro). 65 No modelo copernicano, a distância entre os planetas e o Sol estava relacionada à velocidade de giro das esferas. Assim, a esfera de Mercúrio, mais próxima do Sol, tinha a maior velocidade, e o último dos planetas conhecidos até aquela época, Saturno, movia-se com a menor velocidade de todos os planetas. A última esfera, a das estrelas, permanecia imóvel. A mudança da teoria ptolomaica para a copernicana não tinha razões cientificas experimentais, mas, sobretudo, razões de ordem espiritual e estética. A “grande simplicidade” do modelo copernicano, com a velocidade das esferas aumentando de fora para dentro, era “agradável ao espírito” e junto com outra característica do modelo, a simetria, seria prova da existência de Deus como criador do Universo. O sistema heliocêntrico de Copérnico não era tão mais simples que o de Ptolomeu, porque também usava as complicadas combinações de circunferências e epiciclos, mas sem dúvida abriu caminho para visões estruturalmente mais modernas, no fim do século seguinte, com os trabalhos 66 do astrônomo dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601), do astrônomo e matemático Johannes Kepler (1571-1630), do astrônomo e matemático italiano Galileu Galilei (1564-1642) e do físico e matemático inglês Isaac Newton (16431727). A esfera celeste, constelações e os planetas Numa noite sem nuvens, identificamos no céu uma grande quantidade de estrelas que parecem estar distribuídas na superfície de uma esfera que envolve a Terra: a esfera celeste. Porém, não existe uma esfera limitando o Universo nem esferas de cristal com estrelas presas nela, como pensavam alguns povos. Na verdade, quase todos os astros que podemos observar estão a distâncias tão grandes que não conseguimos ter noção de profundidade; é como numa fotografia, em que todos os objetos parecem estar no mesmo plano, embora estejam a diferentes distâncias da câmera fotográfica. Assim, as estrelas parecem estar todas a uma mesma distância sobre uma esfera que envolve a Terra. Observando o céu ao longo da noite, podemos verificar que, com o passar das horas, novas estrelas surgem no horizonte leste, enquanto outras desaparecem no horizonte oeste, de forma que todo o céu parece girar ao redor da Terra. Devido a esse movimento aparente do céu ao redor da Terra, durante séculos, diversos povos acreditaram que era o céu que se movia. Existe, porém, dois pontos da esfera celeste que realmente “não se movem”, nem aparentemente: o pólo celeste sul e pólo celeste norte, que são os pontos onde, costuma-se dizer, “o eixo de rotação da Terra fura a esfera celeste”. A constância do céu, com as estrelas mantendo suas posições umas em relação às outras, permitiu o surgimento da ideia de constelações, agrupamentos de estrelas que formam figuras imaginárias no céu. A palavra “constelação” etimologicamente significa “estado do céu”. Muitos povos antigos projetaram e registraram suas lendas no céu por meio das constelações. 67 Constelação de escorpião Atualmente, as constelações compreendem 88 regiões do céu, definidas pela União Astronômica Internacional. Assim, um mapa das constelações apresenta alguma semelhança com um mapa geográfico terrestre em que estão representados países e cidades. Com a informação de que, por exemplo, a estrela Antares está localizada na constelação de Escorpião, é mais fácil achá-la no céu. Para cada estação do ano, existe um grupo de estrelas, sempre visíveis no céu noturno. No hemisfério Sul, é o caso da constelação de Órion, no céu noturno de verão, e da constelação de Escorpião, no céu de inverno. Entre os astros observáveis no céu noturno, além da Lua, há cinco outros que não se comportam da mesma maneira que os demais. Enquanto todos os outros parecem manter suas posições relativas em uma configuração fixa, esses cinco se movem entre os outros e por isso recebem o nome de planetas, que significa errantes. Esses cinco corpos celestes não são estrelas e encontram-se muito mais próximos de nós do que elas. Essa proximidade faz com que seu movimento aparente, projetado contra o fundo das estrelas “fixas”, seja o 68 resultado da combinação dos movimentos dos próprios planetas com o movimento relativo da Terra. São cinco planetas que podem ser observados a olho nu e que, no século XVII, já eram conhecidos: Marte, Vênus, Mercúrio, Júpiter e Saturno. Outros dois planetas, Urano e Netuno, foram identificados mais tarde, além de milhares de objetos menores existentes no Sistema Solar. A determinação do movimento característico dos planetas requer uma observação prolongada do céu; é ao longo de dias, ou mesmo de semanas, dependendo do planeta, que podemos verificar seu deslocamento contra o fundo das estrelas. Esse deslocamento, visto aqui da Terra, ocorre, na maior parte do tempo, de oeste para leste, ainda que Marte, Júpiter e Saturno, algumas vezes, pareçam estacionar no céu e, depois, mover-se em sentido oposto. Isso pode ser explicado considerando a combinação do movimento do planeta com o da Terra. Como a Terra tem um período de translação menor do que os planetas exteriores, quando ela ultrapassa um desses planetas em seu movimento de translação, tem-se a impressão de que o planeta está “andando atrás”, como um avião visto de um automóvel. A visão moderna do sistema solar O modelo de Ptolomeu, que imaginava a Terra no centro do universo, com tudo o mais girando ao redor dela, foi dominante desde o início da era cristã até a Renascença, quando Copérnico propôs outra concepção, com o Sol no centro e os demais astros circulando ao redor dele. O astrônomo dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601) foi o maior astrônomo de seu tempo. Muito rico e um encrenqueiro de primeira (conta-se que perdeu o nariz, substituído por uma prótese metálica, após um duelo disputado por uma discordância sobre uma equação matemática), o homem construiu na ilha de Hven o mais suntuoso observatório da época, Uraniborg. Lá, durante muitos anos, ele fez as medições mais exatas jamais vistas. Na mesma época, Johannes Kepler (1571-1630), matemático e astrônomo alemão, buscava explicações para a estrutura do Universo e apresentou suas conclusões publicando o livro Mistérios do universo, que continha idéias equivocadas. Mais tarde, ele mesmo se encarregou de corrigir 69 sua proposta, trazendo então uma contribuição notável à astronomia e à ciência em geral. O trabalho de Kepler, mesmo que equivocado e depois renegado por ele próprio, não foi de todo inútil, porque lhe valeu um convite para trabalhar com Tycho Brahe no estudo da órbita de Marte. O dinamarquês sabia o quanto era árdua a tarefa de determinar essa órbita, pois sendo um dos planetas mais próximos da Terra, sua trajetória já era bastante conhecida e não se encaixava em nenhuma das previsões feitas pelos modelos de universo existentes. Resultado: a despeito de sua genialidade, Kepler levou oito anos para decifrar o enigma, que cobrou do astrônomo alemão o sacrifício da única coisa que unia os conceitos cosmológicos de então: a esfera. Em seus estudos, Kepler descobriu que as órbitas dos planetas não eram exatamente circulares, mas elípticas. Ao observar que os planetas são mais rápidos em suas órbitas quando ficam mais próximos do Sol, percebeu que o dogma existente entre os estudiosos de sua época, de que os movimentos dos planetas eram circulares e uniformes, era um equívoco. Enquanto Kepler desvendava os mistérios cósmicos, Galileu Galilei também se preocupava com as coisas do céu, construía uma nova física das coisas da Terra, substituindo a mera especulação pela procura de causas físicas dos fenômenos. Embora não tenha inventado a luneta, como alguns dizem, o italiano foi um dos grandes responsáveis pelo aperfeiçoamento desse aparelho. Foi também o primeiro a realizar observações astronômicas sérias com ele. Um novo universo, invisível a olho nu, se revelou. Galileu descobriu, por exemplo, ao examinar o planeta Júpiter, que este era cercado por quatro pequenos satélites que giravam em torno dele – logo nem tudo orbitava a Terra como acreditavam Aristóteles e Ptolomeu. Além disso, Galileu viu que a superfície da Lua não era lisa, mas recoberta de montanhas e crateras, o que mostrava que os corpos celestes não possuíam a perfeição a eles atribuída. Observou também manchas no Sol, novas estrelas e os anéis de Saturno. As observações de Galileu não constituíam prova da teoria de Copérnico, mas ajudaram a abalar a crença na “perfeição e imutabilidade” do cosmos, além de mostrar que havia outro centro de rotação além da Terra. 70 Tudo isso contrariava os dogmas da época, denunciando crenças falsas e abrindo caminho para cogitar que o sistema geocêntrico também poderia ser um equívoco. Por isso tudo, Galileu escreveu um grande tratado que lhe proporcionou um lugar de honra na história da ciência, mas lhe trouxe também sérios problemas com o Tribunal do Santo Oficio, a Inquisição, que julgava os suspeitos de heresia contra os dogmas da Igreja Católica, poderosa instituição durante toda a Idade Média, e que subscrevia as teses de Ptolomeu; segundo teólogos da Igreja Católica, a Terra era o centro do Universo, visto que Deus deveria querer sua criatura, o ser humano, nesse centro. O responsável por derrubar esse ranço do pensamento aristotélico foi o britânico Isaac Newton, tecnicamente um sucessor intelectual de Kepler e Galileu, mas na prática muito mais audaz do que eles. Newton é hoje considerado por muitos como a mais poderosa mente que já surgiu na ciência, e não há como ignorar a atuação fundamental desse físico e matemático na reformulação das bases da astronomia. Com a teoria da gravitação universal, Newton estabelece uma lei da natureza que não faz distinção entre o mundo celeste e o mundo terreno. A mesma gravidade que faz a maçã cair também faz a Lua girar ao redor da Terra e a Terra girar ao redor do Sol. A Lei da Gravitação Universal pode ser enunciada da seguinte forma: “A interação gravitacional entre dois corpos pode ser expressa por uma força central, atrativa, proporcional às massas dos corpos e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles.” Alonso & Finn, vol 1, pág 396. É a visão de Newton que dá verdadeiro sentido aos sucessos de Kepler e Galileu; o alemão e o italiano já haviam feito grandes coisas para explicar o movimento dos astros e a ação da gravidade terrestre, mas nenhum dos dois conseguiu costurar tudo e enxergar mais longe, percebendo que o universo lá fora e o mundo aqui embaixo são ambos partes de um todo, que obedece às mesmas leis naturais. Modesto e gracioso com seus predecessores, Newton disse que só conseguiu ver mais longe porque estava “sobre os ombros de gigantes”. 71 Com esse passo precioso, Newton estabeleceu as bases para a ciência moderna. Isso, não só por demonstrar seu caráter literalmente universal (que abarca todos os espaços observáveis pelo ser humano), mas também por criar um novo formalismo cientifico. Sua obra-prima, chamada Philosophiae Naturalis Principia Mathematica [Princípios Matemáticos da Filosofia Natural], é tida como um dos primeiros livros a adotar o rigor e a precisão das narrativas cientificas modernas. Na função de brilhante pioneiro, Newton fez escola e lançou os alicerces de um novo modo de fazer ciência. Atualmente, consideramos que o Sistema Solar é composto pelo Sol, pelos oito planetas conhecidos e seus satélites, pelos planetas anões, pelos asteróides e por corpos ainda menores, como meteoróides, gás e poeira interplanetária. Nosso lugar no espaço: nem centro nem periferia A Terra perdeu seu lugar de máxima importância no Universo quando a revolução na Astronomia, iniciada por Copérnico, mostrou que ela é só um dos muitos planetas, partilhando com outros o brilho do Sol, único e central, ao redor do qual tudo girava. Não durou muito para essa outra ilusão desfazer-se quando os astrônomos revelaram que o Sol era só mais uma estrela entre tantas outras de uma enorme comunidade, parte da qual pode ser vista como uma grande faixa de estrelas no céu, a Via-Láctea, denominação que se estendeu a galáxia em que vivemos! Já no início do século XVIII, pensadores como o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) levantaram a hipótese de que o Universo era composto por muitas galáxias, de forma que, assim como nosso Sol é só mais uma estrela entre muitas na Via-Láctea, esta também seria apenas uma galáxia entre tantas outras. A investigação dessa hipótese foi feita de fato por astrônomos experimentais, como o inglês Willian Herschel (1738-1822), que desde o final daquele século empreenderam um ambicioso projeto de mapear nossa galáxia, conseguindo situar nela o Sol. Alguns desses astrônomos pensavam que a Via-Láctea fosse todo o Universo, e consideraram Andrômeda, só mais tarde identificada como uma galáxia semelhante à nossa, 72 como se fosse uma nuvem de gás e poeira no interior da Via-Láctea, denominada nebulosa. Vivemos, enfim, na superfície de um planeta, entre vários, orbitando uma estrela amarelada, entre bilhões de outras, na face interior de um dos braços de uma galáxia em espiral, como há bilhões de outras. Nem por isso estamos na periferia do Universo, que também não tem centro. Representação artística da Via-Láctea Levou um bom tempo para que se conhecesse melhor as reais dimensões de nossa galáxia. É tão grande que foi necessário criar outra unidade de medida de distância: o ano-luz, correspondente a distância percorrida pela luz em um ano. A Via-Láctea tem mais de 100 mil anos-luz de diâmetro, cerca de três mil anos-luz de espessura na região em que está o Sol, sendo mais espessa no centro. A teoria do Big Bang A famosa teoria do Big Bang, acredite se quiser, nada diz sobre o Big Bang em si. Ela é extremamente eficiente em explicar como o Universo evoluiu desde aquele momento singular até hoje, e extrapolações dela permitem imaginar como o cosmos será daqui a muitos trilhões de anos, mas o chamado 73 instante t = 0, aquele em que tudo começou, permaneceu firmemente postado além de nossa compreensão. A razão disso é que nossa física hoje é fraturada em dois grandes mundos. De um lado, a física quântica, que descreve o funcionamento das coisas muito, muito pequenas, e explica com precisão o funcionamento de três das quatro forças conhecidas na natureza: força nuclear forte (que mantém os prótons no núcleo atômico, apesar da repulsão entre cargas de mesmo sinal), força nuclear fraca (que explica processos de decaimento radioativo) e a força eletromagnética (que está ligada aos campos elétricos e magnéticos e às propriedades da luz). De outro lado, existe uma força que se recusa a receber tratamento quântico: a gravidade. Sua melhor explicação teórica hoje vem da teoria da relatividade geral de Einstein, que interpreta os campos gravitacionais como curvaturas num espaço-tempo quadridimensional (composto pelas três dimensões espaciais mais o tempo). Sendo esta a menos intensa das quatro forças conhecidas (embora seja a que percebemos e compreendemos com maior facilidade), a gravidade se faz sentir quando trabalhamos com grandes escalas. Não é a toa que a cosmologia moderna – o estudo do Universo como unidade – nasceu com a teoria einsteiniana, e os sucessos até hoje na explicação da evolução do cosmos atestam o grande sucesso das ideias do físico alemão. Ocorre que, quando falamos do Big Bang em si, a relatividade não basta. É preciso incluir também as influências geradas pelas outras três forças da natureza, descritas pela mecânica quântica. O problema é que essas duas grandes teorias são incompatíveis entre si. Elas apresentam diferentes perspectivas a respeito da natureza e suas equações não combinam entre si. Alguns sucessos parciais no esforço de agrupar a relatividade e a teoria quântica foram obtidos pelo físico britânico Stephen Hawking (1942-), que combinou as duas teorias para explicar, por exemplo, como buracos negros emitem radiação. No entanto, a reunião final de toda a física elementar numa única teoria ainda não aconteceu, de modo que não é possível compreender exatamente tudo o que aconteceu no Big Bang. A busca por essa “teoria do tudo”, que começou com o próprio Einstein, continua, mas, enquanto ela não 74 termina, temos que aceitar que não há arcabouço teórico capaz de nos dizer o que teria acontecido no momento do Big Bang. Em compensação, se deixarmos isso de lado, somos brindados com detalhes riquíssimos sobre a evolução do Universo. Por exemplo, muito antes que um segundo tivesse decorrido desde o Big Bang, sabemos que o cosmos provavelmente sofreu um aumento radical de tamanho, numa velocidade maior que a da luz! Esse processo de crescimento rápido e descontrolado é chamado de inflação, e foi graças a ele que o Universo não voltou a entrar em colapso logo no inicio, implodindo sobre si mesmo. Quando a gravidade se deu conta do que estava acontecendo, era tarde demais para reunir toda a matéria e energia no ponto em que ela estava originalmente – o Universo havia nascido. Ainda assim, naquele momento o cosmos estava muito quente, composto apenas pelas partículas mais simples. Eram os quarks (que hoje existem como componentes dos prótons e nêutrons), os elétrons e os fótons (partículas de luz). Àquela temperatura altíssima do inicio do Universo, eles não conseguiam combinar uns com os outros. A única coisa que ocorreu naquele momento foi a aniquilação de matéria. Assim como os quarks logo surgiram, surgiram também os antiquarks (partículas com propriedades em tudo similares, mas com carga oposta). E para acompanhar os elétrons, surgiram os antielétrons (também chamados de pósitrons). Quando partículas idênticas de matéria e antimatéria se encontram, elas se destroem mutuamente, produzindo fótons (energia). Foi o que aconteceu naquele momento. As partículas estavam em altíssima temperatura, muito agitadas, e encontravam seu fim ao se chocar com suas antipartículas equivalentes. Ao final desse processo de aniquilação mútua, havia um mar imenso de fótons e umas poucas partículas de matéria que ficaram sem par e foi delas que o Universo tirou a matéria-prima para construir tudo que apareceu depois. Note que tudo isso, a inflação e a aniquilação de matéria com antimatéria, aconteceu antes que decorresse o primeiro segundo. Até que o primeiro segundo chegou. Conforme a expansão continuava, agora não mais no ritmo inflacionário, a temperatura geral do cosmos baixava. Estava em cerca de 10 bilhões de graus Celsius (aproximadamente mil vezes a temperatura no centro do Sol) quando os quarks remanescentes conseguiram começar a se juntar em prótons e nêutrons. E, durante cerca de três minutos, o 75 Universo iniciou o processo de fabricação de seus principais elementos químicos. Nessa fase, os prótons e os nêutrons começaram a se grudar formando os primeiros núcleos atômicos. Esse processo, conhecido como fusão nuclear, fabricou muitos núcleos de hélio e alguns de lítio. Mas três minutos depois a expansão já havia diluído suficientemente o conteúdo do cosmos para interromper o processo. Resultado: de todos os prótons recémformados pelos quarks que sobraram da aniquilação, apenas 25% foram “reprocessados” pela fusão para formar hélio e lítio. Cerca de 75% deles permaneceram intocados, compondo a principal matéria-prima do Universo em evolução: o hidrogênio. Trata-se do núcleo mais simples, composto por um único próton, com ou sem nêutron para acompanhá-lo. Dali em diante, não iria acontecer muita coisa imediatamente. O cosmos continuaria se esfriando, como um mar de elétrons, fótons e núcleos atômicos livres. A ação só voltaria a se intensificar em cerca de 300 mil anos. A temperatura universal baixou para cerca de 3000°C, e a essa altura, os elétrons não estavam tão agitados a ponto de escapar da atração eletromagnética exercida pelos núcleos atômicos. Nesse momento, começam a surgir os primeiros átomos estáveis. Quando isso aconteceu, foi um ato de libertação para os fótons daquele mar primordial de partículas. Os fótons deixaram de perturbar os elétrons e passaram a circular livremente pelo cosmos. Diz-se que o Universo tornou-se “transparente”, e esses fótons primordiais são exatamente os que são detectados na radiação cósmica de fundo, na forma de microondas. Hoje, observações detalhadas dessas microondas nos dão informações importantes para explicar como tudo começou. Foi principalmente a partir delas que conseguimos estimar com muita precisão em que momento do passado aconteceu o Big Bang. De acordo com observações feitas pela Sonda Wilkinson de Anisotropia Microondas, o Universo tem cerca de 13,7 bilhões de anos. E o fato de que a radiação vem de todas as direções ajuda a esclarecer um engano muito comum: pensar que o Big Bang foi uma explosão no sentido convencional, de onde a matéria e a energia se espalham por um espaço vazio previamente existente. Não é nada disso! Na verdade, o Big Bang aconteceu em todo o Universo, inclusive no lugar em que você está agora. Ocorre que o lugar em que você está agora, 13,7 bilhões de anos atrás, era muito menor, e 76 estava compactado junto com todos os outros lugares do Universo atual. A melhor forma de visualizar esse efeito é imaginar que o Universo inteiro fosse uma a superfície tridimensional de uma bexiga. Você pode pintar vários pontinhos nesse balão, e, ao inflá-lo, notará que os pontos se afastam uns dos outros – como as galáxias se afastam umas das outras -, mas o Universo continuará sendo o que sempre foi, a superfície da bexiga. Ocorre que agora ela está mais esticada, inflada, de modo que as distancias entre os objetos são maiores. O fato de que a radiação cósmica vem de toda parte ajuda a entender que o Big Bang aconteceu em toda parte! Essas microondas originárias de quando o Universo tinha apenas 300 mil anos também nos dão pistas do que viria depois. Isso porque a radiação é muito homogênea em todas as direções, denotando hoje a temperatura de cerca 2,73 Kelvin (cerca de 270 graus Celsius negativos), mas não exatamente; há pequeninas variações, que indicavam uma distribuição ligeiramente heterogênea lá no começo, provavelmente, antes da era inflacionária. Foi dessas “sementes” mais densas que nasceram as primeiras galáxias. A diferença de densidade “facilitou” o trabalho da gravidade mais para frente, repartindo o Universo em regiões relativamente mais ricas em hidrogênio, hélio e lítio, e outras quase completamente vazias. Via - Láctea: nascimento, vida e morte das estrelas Enquanto o ser humano acreditou estar no centro do Universo, não havia tanta curiosidade em saber por que razão lá estavam, pois dizia-se que era vontade de Deus. No entanto, como hoje nos vemos junto a uma pequena estrela, entre bilhões de outras, de determinada galáxia, também entre bilhões de outras, queremos saber como viemos parar aqui e como tudo começou. A investigação sobre a origem e evolução do Universo depende de conhecermos uma grande variedade de astros, podendo fazer hipóteses de que alguns dos objetos astronômicos são mais recentes, outros mais antigos, e, dessa forma, imaginar uma sequência evolutiva. Entretanto, para que se possa classificar as estrelas, é preciso conhecer seu brilho real, pois o que observamos aqui na Terra é o brilho aparente, que 77 depende da distância entre a Terra e a estrela. Para isso, inventou-se uma forma de medir distâncias interestelares chamada método da paralaxe. Além disso, é preciso saber quais substâncias constituem as estrelas e qual a temperatura de seu interior e de sua superfície. Mas como saber de que são constituídas e que temperaturas têm se estão a enormes distâncias? Felizmente, é possível utilizar uma técnica conhecida há mais de um século: decomposição, em um prisma, da luz recebida das estrelas e comparando-as com a decomposição da luz de vapores de substâncias incandescentes conhecidas aqui da Terra. Com essa técnica, uma série de linhas características, que constituem a “impressão digital” do elemento químico analisado. (1) Espectro continuo (2) Espectro solar e espectros de emissão de sódio, hidrogênio e cálcio 78 No início do século XX, a partir de estudos na área de física quântica, esses espectros luminosos foram relacionados com a estrutura atômica e com as transições de estado de elétrons, de um nível quântico para outro, em diferentes átomos. O físico alemão Max Plank (1858-1947) propôs que a luz se apresenta em pequenos “pacotes de energia”, os quanta de luz, também denominados fótons. Esses fótons são partículas de luz, portanto, partículas sem massa, compostas apenas por energia. O físico dinamarquês Niels Bohr (1885-1962) criou um modelo atômico em que os elétrons (negativos) giram ao redor de um núcleo (positivo) com órbitas definidas a partir de equações matemáticas. Isso significa que o átomo só pode ter certos valores de energia; dizemos que, nos átomos, os elétrons têm níveis de energia quantizados. Bohr, na realidade, criou um modelo para o átomo de hidrogênio, mas a física quântica foi, em seguida, generalizada para descrever os demais átomos – tanto formando moléculas independentes, como nos gases, quanto reunidos em cristais; e utilizada para interpretar o infinitesimal domínio dos núcleos atômicos. A teoria quântica mostrou que as energias dos átomos podem ter somente determinados valores, isto é, não variam de forma continua. Esses valores de energia, discretos, correspondem aos níveis quantizados de energia dos elétrons. Dessa forma, o fóton que os elétrons emitem ou absorvem, ao mudarem de um nível para outro, tem energia igual à diferença dos valores de energia entre os níveis. Quanto maior for à diferença de energia, maior a energia do fóton emitido ou absorvido, correspondendo à emissão ou absorção de uma radiação eletromagnética de maior freqüência. Uma vez que a frequência da luz azul, por exemplo, é maior do que a da luz vermelha, um fóton de luz azul tem mais energia que um fóton de luz vermelha e corresponde a um salto de maior desnível energético do que os saltos correspondentes a luz vermelha. A relação entre a diferença de energia E e a freqüência f, que define a cor da luz emitida, é E = h . f, sendo h a constante de Planck8. 8 h = 6,63×10-34J.s 79 Quando um elétron passa do estado de mais baixa energia para um nível de maior energia, dizemos que está em um estado excitado. Quando volta para níveis mais baixos de energia, dizemos que o elétron decai. Um elétron de um átomo pode ser excitado absorvendo um fóton. Quanto mais quente uma substância está, mais elétrons ocupam níveis nos estados excitados. Quando esses elétrons decaem para os níveis de energia mais baixos, emitem a energia que haviam absorvido na forma de fótons, isto é, de energia radiante, com determinada freqüência. Assim, quanto maior a temperatura de uma substância, maior é a energia que ele emite, uma vez que maior é a freqüência dos fótons emitidos ao decaírem. Por isso, estrelas emitindo luz branco-azulada, de freqüências mais elevadas que estrelas emitindo luz avermelhada, de freqüências mais baixas. Um importante exemplo de classificação das estrelas é o digrama H-R, que as distribui de acordo com suas características de brilho e de cor e nos dá uma percepção da evolução estelar. Diagrama H-R Na segunda década do século XX, dois astrônomos, o dinamarquês Ejnar Hertzprung (1873-1967) e o norte-americano Henry Russel (1877-1957), construíram um diagrama, hoje conhecido como diagrama H-R, em que representaram a luminosidade das estrelas em função de sua temperatura superficial. 80 No diagrama H-R, cada estrela está representada por um ponto; assim, as estrelas localizadas na parte inferior, de pouca luminosidade, são de pequena dimensão, e as localizadas na parte superior são enormes. As estrelas do lado direito do diagrama são mais vermelhas e mais frias, e as do lado esquerdo são branco-azuladas e mais quentes. Estrelas vermelhas têm temperatura superficial de até 4.500 K; desse valor até 8.000 K suas superfícies são amareladas. Nas estrelas brancas, as temperaturas da superfície estão entre 8.000 K e 10.000 K; acima desse valor as estrelas são azuis. Portanto, uma estrela localizada na parte superior esquerda do diagrama é uma estrela gigante e azul, ao passo que outra, localizada no canto inferior direito, é vermelha e anã. A distribuição das estrelas pelo gráfico não é uniforme; elas estão agrupadas em três conjuntos, por características comuns: um grupo que forma uma faixa diagonal; outro grupo acima, à direita; e outro abaixo, à esquerda. As estrelas da faixa diagonal, chamada de seqüência principal, comportam-se como o previsto: quanto maior a sua temperatura, mais brancoazulada é a sua luz e maior a sua luminosidade. Surpreende, no entanto, que estrelas avermelhadas – portanto, mais frias – como as localizadas no canto superior direito, possam emitir tanta energia quanto as mais quentes. Isso só pode acontecer se forem muito grandes, já que, embora emitam menos energia 81 por unidade de área, acabam por aumentá-la em razão de seu tamanho. Por isso, as estrelas do canto superior direito são chamadas gigantes vermelhas. O inverso ocorre com as estrelas da parte inferior esquerda, pois sua cor branca indica que são bastante quentes, mas, como emitem pouca energia, conclui-se que são pequenas, sendo por isso chamadas de anãs brancas. Os estudos mostram que as estrelas se transformam com o tempo, tendo cor e tamanho dependentes de seu estágio ou idade. A distribuição das estrelas pelo diagrama H-R é resultado das alterações. O número de estrelas na seqüência principal, no grupo de gigantes vermelhas ou no grupo de anãs brancas, é proporcional ao período de suas vidas em que elas mantêm as características correspondentes a essas posições no diagrama. Essa compreensão deu início a investigação da evolução estelar. O diagrama H-R reúne estrelas, corpos que brilham, e é preciso também perguntar como e por que começaram a brilhar. Ao que todas as observações e hipóteses passaram a indicar, a formação das estrelas, como de qualquer outro astro, ocorre a partir de nuvens de gás e poeira, denominadas nebulosas, e observadas em muitas regiões da galáxia. As nebulosas têm regiões mais densas que outras, e a matéria aí concentrada exercem maior atração gravitacional sobre os gases ao seu redor. Disso resultam globos gasosos, que se contraem por gravitação, dando origem a estrelas, cuja evolução posterior depende unicamente da massa desses globos iniciais. Com a contração do globo gasoso, que é a queda gravitacional sobre si mesmo, sua temperatura vai aumentando e pode atingir valores suficientes para desencadear reações nucleares no centro da futura estrela. No entanto, se a massa da nuvem de gás for inferior a um décimo da massa do Sol, a contração não produzirá temperaturas suficientes para ocorrerem reações nucleares, e o globo não se converterá em estrela. De pequenos fragmentos de nebulosas, insuficientes para dar origem a estrelas, podem surgir planetas. O combustível das estrelas: a formação dos elementos A fabricação dos elementos químicos (ou nucleossíntese, como é chamada) começou com o Big Bang, mas o mundo não seria como 82 conhecemos se só houvesse hidrogênio, hélio e lítio, pois a vida, como a conhecemos, é baseada em compostos complexos estruturados em cadeias de carbono. Felizmente, a arquitetura das estrelas permite a elas completarem o serviço da “grande explosão”. Foi no núcleo das primeiras estrelas que apareceram os primeiros átomos mais pesados, como carbono, oxigênio e ferro. A fusão se dá no interior das estrelas primeiro usando o hidrogênio como combustível. Ao fim de milhões ou bilhões de anos (dependendo do porte da estrela: quanto mais massa, mais rápido ela gasta combustível), o hidrogênio se torna escasso e ela passa a fundir hélio, convertendo-o em carbono; dali, o carbono será fundido em átomos diversos, como neônio, oxigênio, sódio e magnésio. Finalmente, se tiver massa suficiente, a estrela fundirá esses átomos em ferro. A fusão é uma maneira que as estrelas encontram para defender sua estabilidade. Ao fundir elementos em seu núcleo elas produzem uma pressão de radiação na direção de dentro para fora, que compensa a pressão exercida por sua própria gravidade, de fora para dentro. Ocorre que, quando se chega a átomos ferro, há um impasse: o processo de fusão desse elemento não produz mais energia, ao contrário, exige que mais energia seja depositada no processo – energia que a estrela já não tem de onde tirar. Como resultado, o astro já não consegue equilibrar a própria gravidade, implode. Se sua massa for algumas vezes maior que a do Sol, ela explodirá na forma de uma supernova, que apesar de parecer uma nova estrela, trata-se de um astro no fim da vida. É como um suspiro final para uma estrela de grande 83 massa. Após esgotar todas as possibilidades de fazer fusão, ela explode suas camadas exteriores. No instante inicial, ela brilha mais que a galáxia em que reside. Ao longo de dias e semanas, seu brilho se torna mais intenso do que o de todas as estrelas de sua galáxia de origem. É um evento literalmente celestial. Nesse processo violento são produzidos os elementos mais pesados que o ferro – é da supernova que vem a energia extra requerida para a produção de átomos como os de urânio e plutônio. E o espalhamento desses materiais pelo cosmos após a explosão faz com que aquela região do espaço seja semeada com todos esses elementos pesados. Com o tempo, uma nuvem de gás se condensará ali e dará origem a futuras estrelas, que terão incorporados em si os restos de suas antepassadas. Foi graças a esse processo que o Sol, uma estrela comum pertencente à terceira geração de astros desse tipo, formada a cerca de 4,7 bilhões de anos atrás, obteve seus elementos mais pesados. Da mesma maneira, foi essa presença marcante que permitiu o surgimento de planetas como a Terra, cujo interior é rico em ferro. Com essa assombrosa constatação, a humanidade encontrou um elo profundo com o Universo. Não fosse por todos esses processos violentos que têm ocorrido cosmos afora nos últimos 13 bilhões de anos, não haveria como estarmos aqui. Fecha-se o elo entre a busca humana por origens e a própria história do Universo. Como gostava de dizer o astrônomo e divulgador de ciência norte-americano Carl Sagan, “somos todos poeira das estrelas. 84 Sugestões de leitura CINIATO, R. O que é astronomia.5ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. GLEISER, Marcelo. A dança do universo: dos mitos de criação ao Big Bang. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. GONICK, L; HUFFMAN, A. Introdução ilustrada à Física. São Paulo: Editora Harbra, 1994. GUERRA, Andréia [et al].Galileu e o nascimento da ciência moderna.São Paulo: Atual, 1999. KERROD, Robin. Fique por dentro da astronomia.São Paulo: Cosac Naify, 2001. KRAUSS, Lawrence M. A física de Jornada nas Estrelas – Star Trek, tradução de Eduardo Teixeira Nunes. São Paulo: Makron Books, 1996. MARTINS, L.C. O Universo: teorias sobre sua origem e evolução. 3ª ed. São Paulo: Moderna, 1995. MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas. Nascimento, vida e morte das estrelas: a evolução estelar. Petrópolis: Vozes, 1995. MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas. Kepler – a descoberta das leis do movimento planetário. São Paulo: Odysseus, 2003. SAGAN, Carl. Cosmos, tradução de Ângela do Nascimento Machado. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 4ª edição, 1983. 85 Bibliografia ALONSO, Marcelo; FINN, Edward J. Física: um curso universitário. Trad. Giorgio Moscati – São Paulo: Edgard Blucher, 1972. Tradução de: Fundamental University Physics. COHEN, Bernard I. O Nascimento de uma Nova Física. Trad. Maria Alice Gomes da Costa. Lisboa: Gradiva, 1988. 305 p. Tradução de: The birth of a new Physics. COUPER, Heather; HENBEST, Niegel. A história da astronomia. Trad. Henrique Monteiro. São Paulo: Larousse do Brasil, 2009. Tradução de The history of astronomy. GILMORE, Robert. Alice no país do quantum: a física quântica ao alcance de todos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. GREENE, Brian. O Universo elegante: supercordas, dimensões ocultas e a busca da teoria definitiva. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. HAWKING, Stephen W; MLODINOW, Leonard. Uma nova história do tempo, tradução de Vera de Paula Assis. Rio de Janeiro: Ediouro, 2005. HAWKING, Stephen W. O universo numa casca de noz, tradução de Ivo Korytowski. São Paulo: Mandarin, 2001. MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas. Nascimento, vida e morte das estrelas: a evolução estelar. Petrópolis: Vozes, 1995. RESNICK, R.; EISBERG, R. Física quântica: átomos, moléculas, sólidos, núcleos e partículas. Rio de Janeiro: Campus, 1994. 86 Hipertextos Nacionais http://astro.if.ufrgs.br/vialac/centro.htm Acesso 07/05/2012 http://resulmocientifico.blogspot.com.br/2011/04/via-lactea-no-universo.html Acesso 07/05/2012 http://stoa.usp.br/fap0181/files/193 Acesso 07/05/2012 http://mail.colonial.net/~hkaiter/life_cycle_of_a_star.htm Acesso 08/05/2012 http://www.on.br/site_edu_dist_2011/site/index_ee.html Acesso 10/05/2012 http://www.on.br Acesso 10/05/2012 87 ANEXO II 88 Projeto didático para trabalho de conclusão de curso Questionário: 1) Para onde vão o Sol, a Lua e as estrelas nos períodos em que não estão visíveis no céu? _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ 2) Como esses astros ficam “lá em cima” sem cair “aqui no chão”? _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ 3) Como é o formato da Terra e em que partes dela ou próximas a ela se situariam, no mesmo instante, o Brasil, o Japão, a Lua, o Sol e as estrelas? _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ 89 ANEXO III 90 ROTEIRO DE ENTREVISTAS 1- Há algumas semanas realizamos uma atividade didática diferenciada. O que foi mais marcante para você? Faça alguns comentários. 2.a - Você se recorda que o texto utilizado fazia referências a episódios da história da ciência? Você se recorda de algum? 2.b- Faça comentários sobre a utilização da história da ciência nos textos do material didático, justificando suas posições. 3- Normalmente astronomia não é tratada no ensino médio. Faça um comentário sobre o tema do trabalho desenvolvido. 4- Faça agora um comentário sobre a forma como o trabalho foi desenvolvido com a turma. 5- Você destacaria algum assunto tratado durante a aplicação da proposta que tenha lhe chamado mais a atenção? 6- Faça um comentário geral sobre o material didático e sobre a dinâmica como um todo. Quais os elementos – história e dinâmica – você destacaria? 91 ANEXO IV